O recuo de Trump e a tensão no ar - Míriam Leitão
O Globo
Evidente nervosismo de Trump mostrou que ele viveu um revés
Houve um claro recuo do presidente Trump
ontem e ficou evidente a pressão dos chefes militares para que os
Estados Unidos não entrassem em nova guerra no Oriente Médio.
No final
da tarde, notícias de mísseis katyusha, próximos à embaixada americana
em Bagdá, reduziram a sensação de alívio que havia se espalhado após a
fala de Trump. Qualquer que seja a evolução dos eventos, contudo,
aumentou muito o clima de desconfiança no mundo nos últimos dias. Este
ano, em que o presidente americano lutará contra a ameaça de impeachment
e pela reeleição, será um tempo pantanoso. Trump fará o que lhe trouxer
dividendos eleitorais.
[ótimo;
os EUA são considerados a maior democracia do mundo, situação que acumula com a economia, tecnologia, poder militar, etc.
Só que o PODER MILITAR é comandado por Trump, mas, em qualquer lugar e época do mundo, o PODER MILITAR é comandado por quem o detém - em principio, este comando é conferido pela Constituição do País.
Mas, se o exercício deste atributo constitucional coloca em risco outros valores e sem que haja uma justificativa de interesse da SEGURANÇA NACIONAL, adequações da leitura do texto constitucional podem ocorrer, devem ocorrer.
e, por ser os ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA, o maior do mundo em praticamente tudo, quem vai ter condições de intervir e questionar tais alterações.
Claro que a democracia vai continuar vigorando isto é apenas um lembrete de quem realmente manda. ]
No Brasil também houve recuo. Aquela nota da sexta-feira, apoiando o
assassinato de Qassem Soleimani, foi apagada pelas palavras e pelos
silêncios. Ela era estranha à tradição diplomática brasileira e não
defendia os interesses do Brasil. Desde terça-feira à noite, o Planalto
começou a sair de fininho da primeira posição e corrigiu a rota. É
demorada demais a curva de aprendizado do governo Bolsonaro. Ontem, ele
disse que “muitos acham que o Brasil deve se omitir”. Defender o
entendimento, a negociação, os órgãos multilaterais não é se omitir. É
ter uma posição. A mais sensata.
O que fica de todo esse episódio é que a forma imprevisível e
intempestiva de Trump agir teve um duro embate com a realidade. Segundo
os analistas da televisão americana os comandantes militares deixaram
claro para ele que não apoiariam uma guerra com o Irã. A cópia do pronunciamento sendo trocada no pódio, a demora em começar
a falar e o evidente nervosismo de Trump mostraram que ele viveu um
momento de revés. Por outro lado, aproveitou para fazer campanha.
Criticou o acordo nuclear que foi firmado pelo ex-presidente Barack
Obama e do qual ele saiu. Porém, se ele insistisse nas ameaças iniciais e
houvesse qualquer retaliação no território americano — apesar da
desproporção das forças — “o impacto psicológico entre os americanos
seria devastador”, avalia um diplomata que acompanha os eventos. E
poderia ter consequências eleitorais negativas para o presidente.
Trump minimizou o ataque às bases no Iraque, deixando claro que não
pretende responder ao “tapa na cara” do líder iraniano Ali Khamenei. O
fato de o sistema de alerta ter funcionado, e não ter havido mortes,
deixa-o confortável com essa posição. Mas, ao longo dos últimos dias,
Trump recuou várias vezes, como daquela ideia tresloucada de atacar
monumentos históricos persas. Outro sinal de recuo foi Trump ter falado
ontem em entrar em contato com líderes parceiros da Otan. Ele dizia
antes que era uma instituição falida e agora diz que quer que a
organização multilateral assuma um papel preponderante na região.
Trump flertou com a guerra, teve vários problemas, inclusive críticas
do seus próprios aliados por estar traindo a promessa de retirar os
Estados Unidos dos conflitos do Oriente Médio. Por outro lado, é
fundamental que ele consiga que os outros signatários do acordo com o
Irã — Alemanha, França, Rússia, China, Reino Unido e União Europeia —
também queiram renegociá-lo. Quando o acordo foi assinado, o ministro da
Economia da Alemanha foi com uma delegação comercial a Teerã para
mostrar que o país queria estabelecer fortes laços econômicos com o Irã.
Os interesses são outros.
O temor de analistas é que o bombardeio das bases não seja
considerado suficiente para a opinião pública iraniana, que vive clima
de comoção. E ontem a retomada das hostilidades mostrava que a história
ainda não terminou. Os mísseis katyusha, contudo, são de pouca precisão e
baixa autonomia de voo. São muito usados pelos palestinos para fustigar
Israel ou pelas milícias. Os observadores acham que o uso deles ontem
confirma a impressão de que o Irã pode ter optado por uma série de ações
de desgaste dos americanos, seus aliados e suas bases no Iraque.
Para a economia do Brasil tudo isso vem em hora muito ruim, em que
começam a aparecer dados de recuperação. O aumento da incerteza não
ajuda. Ontem o Banco Central divulgou que a saída de dólares na conta
financeira foi a maior em 37 anos, de US$ 62,2 bi. Em parte é a aversão a
risco que subiu com a guerra comercial entre Estados Unidos e China, em
parte é fuga de capital especulativo, com a queda dos juros. Não dá
para negar, no entanto, que o grande fator foi o governo Bolsonaro e sua
impressionante capacidade de criar crises e conflitos. Isso afasta
investidores.
Blog da Míriam Leitão, jornalista - Alvaro Gribel, São Paulo
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