Greve contra fechamento de fábrica deficitária sinaliza resistência ao plano de modernização da estatal
Pela visão sindicalista da Petrobras, a estatal é um “bem do povo”,
intocável. Este é o dogma que sustenta a decretação de greve, pela
Federação Única dos Petroleiros (FUP), contra o fechamento de uma
deficitária fábrica de fertilizantes no Paraná. Até a década de 70, não era possível sequer associação com petroleiras
privadas internacionais para explorar a Bacia de Campos, àquela altura
uma área geológica promissora. Não havia dinheiro para explorá-la.
Por ironia da história, o general Ernesto Geisel, ex-presidente da Petrobras, nacionalista, viu-se obrigado, na Presidência da República, a aprovar a assinatura de “contratos de risco” com grupos privados. A estatal não conseguiria sozinha avançar naquela região, entendera Geisel. Era o certo, e a Bacia de Campos começou a reduzir a grande dependência que o país tinha do petróleo importado.
A questão da fábrica de fertilizantes do Paraná parece diferente, mas tem a mesma razão de fundo: a corporação sindical petroleira se considera dona da estatal e tem apenas compromisso com empregos e salários, mesmo que a empresa seja deficitária. Pode ser compreensível, mas empregos e salários desaparecerão cedo ou tarde, pela inviabilização da empresa. No caso do Paraná, a debacle já aconteceu: a fábrica de fertilizantes, a Fafen, já paralisada, acumula R$ 2 bilhões de prejuízos, desde que foi comprada da Vale em 2013. Empregava 396 funcionários.
Assim como foi imperioso abrir a exploração de petróleo a empresas de fora, é essencial rever o posicionamento estratégico da Petrobras, o que está sendo feito. A greve indica que pode haver resistências semelhantes à venda anunciada de refinarias, um setor no qual a estatal se manterá, porém com um número menor de unidades. A empresa, com US$ 87 bilhões de dívidas, ainda é uma das petroleiras com o maior passivo financeiro do mundo. Precisa reduzi-lo e, ao vender refinarias, ainda ajudará a quebrar oligopólios existentes no mercado de derivados, que impedem que a queda de preços no refino chegue aos postos de abastecimento. A privatização da BR Distribuidora está dentro deste
contexto.
O acúmulo de derrotas do lulopetismo — impeachment de Dilma, prisão de Lula — acabrunhou a esquerda, mais ainda com a vitória de Jair Bolsonaro, de extrema direita. A reação ao necessário fechamento da fábrica de fertilizantes sinaliza que o movimento sindical próximo ao PT aproveita para tentar se reerguer.
A Justiça do Trabalho exerce sua função de mediadora. A greve foi suspensa ontem para novas negociações. [Dizer a greve foi suspensa é o eufemismo para acabou, findou. Empregos estão difíceis e a turma da Petrobras ganha muito bem e não quer perder a boquinha.
Lamentamos pelos terceirizados, apesar dos terceirizados são sempre os primeiros alcançados em qualquer medida de contenção de despesas.] Porém, deve-se entender que o que
está em jogo não são 396 empregos, mas a necessidade de a estatal
garantir sua sobrevivência a longo prazo, o que passa pela exploração do
pré-sal antes que o consumo de combustíveis fósseis comece a cair. Não
faz sentido manter negócios inviáveis. O tempo corre. Ou um custo
crescente será cobrado da sociedade.
Editorial - O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário