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segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

A chefona da Europa queima largada na guerra das vacinas

Fiasco total: A racional e equilibrada Ursula von der Leyen tem que recuar de decisão intempestiva para “capturar” vacinas destinadas ao Reino Unido

[E os 'inimigos do Brasil' ainda cometem a suprema burrice de considerar o presidente Bolsonaro um estabanado. A propósito: a digna 'presidenta' da UE ainda teve a cara de pau de colocar desequipados soldados alemães para realizarem treinamento  conjunto usando cabos de vassouras como fuzis. Parece que a ojeriza aos militares não costuma ser acompanhada de inteligência, competência, bom senso.]

Pelo lado positivo, Ursula von der Leyen reconheceu rapidamente o tamanho do erro que estava sendo cometido sob sua gestão quando foi anunciado que a União Europeia bloquearia a exportação de vacinas da Pfizer feitas na Bélgica e destinadas ao Reino Unido. O lado negativo foi todo o resto. Tão escandalosamente negativo que surgiu até um certo clamor para que renunciasse pouco mais de um ano depois de assumir a presidência da Comissão Europeia, colocando uma boa dose de calma e equilíbrio no lugar da jocosidade algo excessiva de Jean-Claude Juncker.

Tendo presidido as iniciativas lentas e burocráticas da Comissão de Saúde para a aquisição de vacinas destinadas aos 27 países da União Europeia, Von der Leyen despertou para o tamanho da crise quando os dois grandes laboratórios que estão fornecendo o grosso das vacinas para os países desenvolvidos, Pfizer e AstraZeneca, tiveram problemas de produção. “A Europa está enfrentando um desastre em termos de vacina”, resumiu, algo dramaticamente, a revista Der Spiegel.

Para piorar, a Grã-Bretanha, recém-saída do bloco (num processo em que contou a racionalidade da alemã), está colhendo os frutos por ter sido mais ágil e mais rápida na aprovação e compra das vacinas. Pela narrativa dominante, deveria ser o contrário: os pérfidos ingleses amargariam no fim da fila, enquanto a nobre e solidária União Europeia dava um exemplo do valor do trabalho conjunto.

Vendo o tamanho da encrenca, os burocratas europeus resolveram agir. Foi aí que Ursula Von der Leyen fez o “gol contra” – metáfora futebolística usada por praticamente toda a grande imprensa europeia.  Recorrendo a um dispositivo reservado a grandes emergências, a presidente resolveu bloquear a entrada de vacinas no Reino Unido através da fronteira entre a República da Irlanda e a Irlanda do Norte.

Quem acompanhou as torturantes negociações para permitir a saída dos ingleses talvez se lembre que resolver a situação pós-Brexit essa fronteira foi um dos maiores problemas.  Pelo acordo de paz que encerrou a luta armada dos católicos na Irlanda do Norte, a linha divisória com os irmãos da república independente deve ser aberta ao livre trânsito de pessoas e mercadorias.  Para manter o status quo entre as duas partes da ilha irlandesa, uma remanescente na União Europeia e outra levada, de má vontade, ao Brexit, foram necessários vários e sofridamente negociados malabarismos regulatórios.

A decisão impensada, que durou apenas algumas horas, de Ursula von der Leyen, de interferir exatamente nesse ponto de alta sensibilidade, provocou o impossível: ingleses e irlandeses, normalmente cheios de animosidade mútua, reagiram furiosamente dos dois lados da fronteira. O governo de Boris Johnson não demorou a vazar que, em dois telefonemas “apimentados” com a presidente da Comissão Europeia, o primeiro-ministro disse que a intervenção nos contratos com a Pfizer, afetando o fornecimento de 3,5 milhões de doses de vacina, poderia ser diretamente responsabilizada pela morte de idosos que aguardavam a segunda dose da imunização.

Levar a culpa por matar avozinhos aposentados não é exatamente uma perspectiva promissora. A condenação à decisão atabalhoada da presidente da Comissão Europeia foi unânime entre os grandes jornais europeus, de esquerda ou de direita. Como uma pessoa com o nível de preparo de Ursula von der Leyen não percebeu as dimensões catastróficas de uma intervenção ditada pelo “nacionalismo supranacional”, em tudo oposta aos valores mais fundamentais da União Europeia?

Pertencer à casta da alta burocracia europeia, sem nunca ter precisado fazer algo tão banal como ganhar eleições, pode ter sido um dos fatores. Economista interrompida e médica, Ursula von der Leyen, é democrata-cristã, o partido de centro-direita de Angela Merkel, com quem está desde o primeiro dia de governo, tendo servido em vários ministérios.

Foi a primeira mulher a ser ministra da Defesa da Alemanha, com atuação criticada, principalmente depois que desequipados soldados do Exército alemão participaram de treinamentos conjuntos europeus com cabos de vassoura no lugar de fuzis, episódio de um ridículo doloroso. Nascida e criada na Bélgica, onde seu pai era funcionário do incipiente Mercado Comum Europeu, e com sete filhos já adultos, certamente um curso intensivo de administração de conflitos, Ursula von der Leyen parece talhada desde o berço para ocupar o topo das vasta burocracia da UE.

É justo culpá-la pela crise das vacinas, com um componente importante causado pelos laboratórios que não conseguem honrar as encomendas? “A Comissão foi pega totalmente de surpresa”, escreveu a Spiegel, geralmente alinhada mais com a centro-esquerda. “Frustração e indignação têm crescido através da UE. A Europa, uma das regiões mais ricas do mundo, está se mostrando incapaz de proteger seus cidadãos de uma doença mortal”.

A revista ouviu o secretário-geral da Social Democracia, Lars Klingbeil, que desceu o chicote: “Estou absolutamente chocado com a negligência de Ursula von der Leyen no comando do início da vacinação nos últimos meses”. Detalhe: os social-democratas fazem parte, no sistema de coalizão, do governo de Angela Merkel, a grande eleitora de von der Leyen para a Comissão Europeia. Pois são os social-democratas que estão pedindo a cabeça dela, em termos nada gentis. “Enquanto outros países, como a Grã-Bretanha, encomendavam grandes quantidades de vacinas meses antes, a UE sob o comando de Ursula von der Leyen fracassou em agir a tempo e depois se enrolou em cláusulas contratuais com companhias farmacêuticas”, fuzilou Jörg Meuthen, um dos líderes dos social-democratas.

“Ser responsável também significa assumir a responsabilidade. Isso é o que Frau von der Leyen deveria fazer agora. Ela causou muitos prejuízos não só à Alemanha, mas a toda a União Europeia”. Enquanto isso, os tabloides ingleses deitam e rolam com a oportunidade imperdível de espetar os alemães, em particular, e europeus, em geral. “Nossos vizinhos e amigos”, como diz Boris Johnson, cujos pecados estão sendo temporariamente perdoados, estão se dando mal. Schadenfreude, a alegria secreta sentida quando os próximos de ferram, nunca foi tão pouco secreta.

Blog MundialistaVilma Gryzinski, jornalista  - Revista VEJA

sábado, 21 de dezembro de 2019

Até que enfim: Brexit aprovado e Boris Johnson consagrado - VEJA - Mundialista


Por Vilma Gryzinski

Pelo menos até o Natal, com muita boa vontade até o Ano Novo, a vida sorri a quem deu duro para selar o divórcio; depois, vem o choque de realidade


Boris Johnson merece seu momento de glória, Jeremy Corbyn merece ser tripudiado, a rainha Elizabeth merece um descanso – ainda mais agora, com o marido hospitalizado.  Com o espírito de boa vontade que cerca o período natalino – sem contar o recesso geral –, o primeiro-ministro que conseguiu o aparentemente impossível terá um respiro.

Bem curto. Fazer o Parlamento aprovar o acordo de separação com a União Europeia, mesmo com dificuldades internas que pareciam insuperáveis, vai acabar parecendo a parte fácil, com o passar do tempo. E o tempo vai passar muito depressa. Romper as infinitas florestas de regulamentos, empreendimentos comuns e entendimentos comerciais que uniam a Grã-Bretanha à União Europeia é algo que nunca foi feito antes na história. Nem o mais ardente partidário do Brexit pode achar que vai ser fácil.  Aos primeiros resultados negativos – que, inevitavelmente, existirão – e muito antes que os resultados positivos comecem aparecer, as animosidades voltarão a aflorar.

É por isso que ele já se antecipou e prometeu um “Governo do Povo”, no discurso, uma retribuição aos eleitores que abandonaram em massa o Partido Trabalhista e votaram nos conservadores, dando ao partido de Boris a acachapante maioria de 80 parlamentares que destrancou o Brexit. Na prática, significa fazer o que o povo gosta de ver o governo fazer: gastar e gastar mais um pouco, preventivamente, para contrabalançar potenciais impactos do Brexit. Na compreensível embriaguez das vitórias sucessivas, e nada, nada fáceis, o círculo mais ligado ao primeiro-ministro já está falando numa era de dez anos com o conservadorismo renovado no poder.
Aí, evidentemente, mora um dos muitos perigos.

Boris Johnson costumava dizer, antes de virar um conservador populista, que era capaz de recitar, de cor, os cem primeiros versos da Ilíada, em grego, claro para isso servem os estudos clássicos em Oxford.  Conhece, portanto, perfeitamente, o significado profundo de hubris, a palavra grega que mistura o excesso de confiança dos vitoriosos com a arrogância, sempre resultando em tragédia.
Quando Theresa May foi eleita primeira-ministra pelo Partido Conservador e prometeu que ia fazer o Brexit exatamente como o povo havia votado no referendo, convenceu muita gente. Sua popularidade disparou.
Parecia competente, equilibrada, durona, capaz. Na realidade, não foi nada disso, talvez pela dificuldade interna em fazer algo em que não acreditava.

Existe, portanto, um exemplo muito próximo de como popularidade e ventos a favor podem durar pouco, pouquíssimo, em política.
A vitória eleitoral de Boris Johnson reverberou muito além da Grã-Bretanha por colocar em choque dois adversários representativos dos tempos atuais.
Jeremy Corbyn é exatamente o que a esquerda de manual, renascida em Marx, depois da fase de se aproximar do centro e abraçar o racionalismo econômico, hoje deseja.
Só esqueceu de combinar com os eleitores tradicionais do Partido Trabalhista, especialmente os fartos da enrolação do Brexit e com o orgulho nacional ferido pelos desaforos da União Europeia.

Falar em orgulho nacional no bioma esquerdista convencional, obviamente, é tabu. E vale, logo de cara, um “fascista”.
Deu no que deu.
Com cara de ódio mal disfarçado, Jeremy Corbyn ainda se deu ao desfrute de não renunciar imediatamente e acompanhar todos os rituais parlamentares dos últimos dias.
Para piorar, sua falange mais próxima deu de culpados os próprios eleitores – burros, ignorantes, onde foi mesmo que já ouvimos isso – pelo fracasso da liderança do partido.

Ter um trabalhismo enfraquecido apenas amenizará, inicialmente, as dificuldades de Boris, um típico integrante das castas privilegiadas que ainda bebe nas raízes profundas do conservadorismo inglês, mas é antenado com as elites em matéria de comportamento. E ainda tem uma namorada 24 anos mais jovem, a primeira companheira não casada a morar em Downing Street.  Agora, ele vai ter que mostrar serviço em áreas quase conflitantes: comandar o Brexit (e levar a culpa por tudo que não der certo); ser um conservador preocupado com o povão (ou que pareça como tal); aplacar as elites da bolha, os inconformados com o divórcio europeu; reinventar o potencial comercial independente do Reino Unido.
E mantê-lo unido – os independentistas da Escócia saíram reforçados da eleição e os anti-unionistas da Irlanda do Norte também estão loucos para aproveitar a brecha do Brexit.

Ser conseguir, ainda que em parte, terá alguns anos em Downing Street – quantos, é impossível dizer.
E talvez seu discurso cheio de otimismo que a rainha leu no Parlamento tenha sido um dos últimos, ou até o último, do longo reinado de Elizabeth II.
Pelo menos, um final digno.
Já pensaram se a rainha tivesse que ser um discurso preparado pela ala marxista-corbinista?

Blog Mundialista - VEJA - Vilma Gryzinski

quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

Meia-volta, volver!

“A Argentina é o terceiro parceiro comercial do Brasil, atrás da China e dos Estados Unidos, mas é  principal parceiro para a nossa indústria”

O encontro do presidente Jair Bolsonaro com o presidente da Argentina, Mauricio Macri, serviu para reposicionar o novo governo em relação ao Mercosul. Foi uma espécie de “meia-volta, volver!”, depois das declarações do ministro da Economia, Paulo Guedes, logo após as eleições, de que as relações comerciais do Brasil com os vizinhos do Cone Sul não eram uma prioridade. Guedes chegou a contextualizar o comentário de maneira a desdizer seu significado, mas foi preciso o encontro de ontem para que as coisas ficassem realmente mais claras, principalmente para os vizinhos. Bolsonaro e Macri acertaram trabalhar conjuntamente para fortalecer o bloco sul-americano. O ministro Paulo Guedes, nas conversas com os argentinos, procurou desfazer a imagem de que estava de costas para o Mercosul. A Argentina é o terceiro parceiro comercial do Brasil, atrás da China e dos Estados Unidos, mas é  principal parceiro para a nossa indústria.

Isso significa que tudo ficará como dantes? Não, diplomatas do Brasil e Argentina discutiram mudanças nas regras do Mercosul que proíbem os países-membros de negociarem separadamente acordos de livre comércio com outros países. No caso brasileiro, Bolsonaro quer enxugar os encargos do Mercosul, reduzir tarifas e burocracia. Abre-se a possibilidade de avanços nas conversas com a União Europeia. Além disso, Paraguai e o Uruguai desejam fazer seus acordos bilaterais. O patinho feio do Mercosul é a Venezuela, que foi outro assunto abordado no encontro. Nesse caso, a afinação entre Bolsonaro e Macri é total: ambos pretendem endurecer o jogo ainda mais com o presidente do país vizinho, Nicolás Maduro, que assumiu novo mandato de seis anos e é considerado um ditador pela maioria dos países do continente.

Macri foi o mais enfático nos ataques a Maduro. Ressaltou que Argentina e Brasil reconhecem apenas a Assembleia Nacional da Venezuela, que é comandada pela oposição e considera Maduro um usurpador. “Reafirmamos nossa condenação à ditadura de Nicolás Maduro. Não aceitamos esse escárnio com a democracia, e, menos ainda, a tentativa de vitimização de quem na verdade é o algoz”, disse Macri. Bolsonaro foi mais comedido em relação a Maduro, mas reiterou que Brasil e Argentina jogarão juntos no caso da Venezuela: “Nossa cooperação na questão da Venezuela é o exemplo mais claro do momento. As conversas de hoje (ontem) com o presidente Macri só fazem reforçar minha convicção de que o relacionamento entre Brasil e Argentina seguirá avançando no rumo certo: o rumo da democracia, da liberdade, da segurança e do desenvolvimento”, disse.

Recessão
O fato de o Brasil e a Argentina terem governos ultraliberais tem um peso específico no continente, mas há uma variável imponderável: ao contrário de Bolsonaro, que acabou de assumir o governo, Macri está terminando seu mandato, em meio a um tremendo fracasso econômico. Os preços na Argentina subiram 2,6% em dezembro, com inflação anual de 2018 em 47,6%, a maior desde 1991. A meta de inflação de 23% em 2019, já considerada muito alta, dificilmente será alcançada, num ano de eleições presidenciais, nas quais Macri ainda pretende disputar a reeleição.

Com os preços descontrolados, o Banco Central argentino fez um ajuste duríssimo, com juros de até 70% e retirada de pesos do mercado. O dólar estabilizou em 37 pesos, mas a economia está em recessão: 2,5% em 2018; previsão de 2%, em 2019. Macri terá dificuldades para manter esse ajuste, quando nada porque os salários sofreram uma perda de poder de compra próxima a 10%, a maior desde 2002. Até o FMI prevê dificuldades para manter o ajuste, cujas projeções apontam que somente em 2024 os argentinos conseguirão recuperar o nível de vida de 2017. Será difícil para Macri resistir às pressões dos sindicatos por aumentos de salários e manter o acordo feito com o FMI.

À deriva
A propósito, a Inglaterra nunca esteve tão à deriva. Conservadores britânicos e unionistas da Irlanda do Norte salvaram a primeira-ministra Theresa May, derrotando por apenas 19 votos a moção de desconfiança apresentada pelos trabalhistas para evitar que o líder da oposição, Jeremy Corbyn, a substituísse, depois de a maioria esmagadora do parlamento do Reino Unido ter rejeitado o acordo de saída da União Europeia. O Brexit continua um salto no escuro, porque a primeira-ministra ainda não tem um plano B.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - CB

domingo, 19 de agosto de 2018

Sob a tutela dos juízes

A Lei da Ficha Limpa é ruim, e o caso de Lula prova que é preciso revogá-la


Lula, “ficha-suja”, terá sua candidatura barrada. A eleição será legal, pois o veto obedece à legislação. Nem tudo o que é legal é legítimo. Mas a eleição sem Lula será legítima, pois a regra do jogo derivou de um consenso entre gregos e troianos, não de uma imposição unilateral. O PT reconhecerá essa legitimidade, trocando Lula por Haddad. Na Presidência, em 2010, Lula sancionou sem vetos a Lei da Ficha Limpa, que contou com o voto unânime da bancada do PT. Legal e legítima, a eleição distorcerá um pouco mais a representação democrática. O fato inescapável é que 30% dos eleitores não poderão votar no candidato de sua preferência (que, por sinal, tem a rejeição de 54%). [esse pessoal que quer votar no presidiário mais outros que votaram o condenado e em seu 'poste', já prejudicaram demais o Brasil e agora para o BEM DO BRASIL devem ser ignorados e se possível perderem o título eleitoral.]

O PT não tem direito de reclamar. Lá atrás, os poucos que ousaram criticar a Lei da Ficha Limpa (entre eles, este colunista) sofreram os previsíveis insultos das “correntes de opinião” petistas. De fato, o partido jamais reviu sua posição sobre a lei. Seus líderes dizem que a lei é boa, mas Lula deveria ser admitido como candidato pois teria sido condenado injustamente.  A implicação lógica do raciocínio seria adicionar à lei uma cláusula conferindo ao PT o privilégio exclusivo de revisar terminativamente as sentenças judiciais. A lei, porém, é ruim —e o caso de Lula prova que é preciso revogá-la.  A ideia da tutela do eleitor pelos juízes é estranha à tradição democrática. No Reino Unido, em abril de 1981, a morte súbita de um parlamentar provocou uma eleição avulsa no seu distrito, na Irlanda do Norte.

Para substituí-lo, os eleitores escolheram um certo Bobby Sands, 27, militante do Exército Republicano Irlandês (IRA), que cumpria pena numa penitenciária de Belfast. Sands morreu um mês depois, vítima da greve de fome conduzida por sua célula de prisioneiros, sem assumir sua cadeira.  Na greve de fome, a célula reivindicava o estatuto de presos políticos aos condenados do IRA. Mas Sands não foi privado de liberdade por suas ideias, mas pela participação em um ato de terror. Foi na condição de preso comum que Sands disputou (e venceu) a eleição parlamentar.  Logo depois daquela eleição, o Parlamento aprovou uma lei vetando candidaturas de sentenciados a mais de um ano de prisão. [reconhecimento pelo Parlamento britânico, que criminoso condenado NÃO PODE ser candidato - o exercício de uma pretensa cidadania, não justifica isentar um criminoso da pena a qual foi condenado.] Editada em meio à tragédia do conflito irlandês, a lei representou um retrocesso da democracia britânica: a intrusão do Poder Judiciário na esfera da representação popular.

O PT pode gritar o que quiser, mas Lula também não é um preso político, pois foi condenado pela prática de corrupção, por um tribunal independente que emitiu um veredito (certo ou errado) usando suas prerrogativas legais.  Lula deve cumprir a pena imposta pelos juízes. Contudo, assim como Azeredo, Cunha ou Dirceu, deveria ter o direito que não foi negado a Sands. Pelo simples motivo de que não compete aos juízes estabelecer limites ao exercício do direito de voto.

Sem o desenlace da greve de fome, Sands seria diplomado mas não poderia comparecer às sessões parlamentares. Daí, nada: problema de seus eleitores, não dos tribunais —ou dos eleitores de outros. Sem a Ficha Limpa, Lula poderia concorrer. Triunfando, receberia a faixa presidencial, mas suas funções ficariam a cargo dos ministros.  Ridículo, certamente. Mas o que fazer se o povo decidisse ser governado por paus-mandados de um presidiário? Chamar o Mourão?

A Lei da Ficha Limpa transfere poder do povo para os juízes. [a Lei da Ficha Limpa foi promulgado pelo Poder Legislativo que representa o POVO BRASILEIRO, para isso deputados e senadores são eleitos, e os juízes cumprem as leis originadas no Congresso Nacional.] Sua base filosófica é o conceito de que o eleitorado precisa da tutela de um estamento de sábios. Seus arautos fogem à obrigação de defender tal proposição antidemocrática, desviando o debate para o terreno “pragmático”: a lei reduziria a proporção de corruptos em cargos públicos.

A tese solicita a crença no pressuposto absurdo de que existe um estoque fixo de corruptos na sociedade. O Congresso eleito em 2014, sob a Ficha Limpa, é melhor que o eleito em 2010?


Demétrio Magnoli, sociólogo e doutor em geografia humana pela USP.

sexta-feira, 8 de setembro de 2017

Globalismo e Bioética: a desumanização dos serviços públicos de saúde

“A vida que professar será para benefício dos doentes e para o meu próprio bem, nunca para prejuízo deles ou com malévolos propósitos. Mesmo instado, não darei droga mortífera nem a aconselharei; também não darei pessário abortivo às mulheres’’.
Juramento de Hipócrates

Alfie Evans corre o risco de ter o mesmo destino trágico de Charlie Gard.

A pergunta que fazem: Por que tratar um doente dispendioso se é possível matá-lo?
Quantas vezes, no Brasil e no mundo, sob o jugo de um sistema unificado de Saúde, nos deparamos com hospitais mal geridos e postos de saúde burocratizados e sem estrutura, nos quais a medicina é colocada sob provas extremas? Quantas vezes, nas últimas décadas, não nos defrontamos com situações limítrofes, nas quais a dor causada pelo indiferença criminosa e pelos e maus tratos, notórios pela evidente negligência do Estado, se contrapoem aos princípios inspiradores de Hipócrates, o pai da medicina ocidental? Quantas vezes, no decorrer destes sombrios anos que marcam a escalada do socialismo, assistimos a morte ser exaltada em detrimento da vida, por parte de defensores de supostos “direitos humanos”, por meio de cânticos carregados de traição àqueles a quem juram salvaguardar e proteger?


Densas razões estratégicas de longo prazo
É a demografia, estúpido, a única questão importante. A Europa no final do século será um continente depois da bomba de nêutron. As grandes construções ainda estarão lá, mas as pessoas que as fizeram terão desaparecido”.
Mark Steyn, analista político canadense.


O National Health Service (NHS), o sistema de saúde britânico, maior sistema público de saúde e o mais antigo do mundo, é designado pelos globalistas como ‘’a solução da saúde para o mundo’’. Implantado no Reino Unido, Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte, chegou a ser homenageado de forma enigmática na cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de Londres, no verão de 2012.  Ele forma a base dos cuidados médicos do Reino Unido. É interessante observar que os NHS foram criados por legislações separadas e começaram a funcionar em 5 de julho de 1948, logo após a Segunda Guerra Mundial. Seu slogan é : “Somos o Número Um”. ( “NHS ranked ‘number one’ health system”). Conforme o atual secretário de saúde da Inglaterra, Jeremy Hunt, “é motivo de orgulho e seu modelo é “classificado como o melhor sistema de saúde dentre 11 países ricos”. Para Hunt, “esse resultado excelente é um testemunho da dedicação da equipe do NHS. ”

(...) 
 
Doentes graves acumulam-se em filas intermináveis sem receber tratamento. Em certa ocasião, Paul Corriggnan, secretário do então primeiro-ministro da Inglaterra, Tony Blair, declarou que para o NHS corrigir  seus problemas agudos no tratamento de doenças crônicas, teria que contratar serviços externos, algo tão grandioso (ou seja impossível), segundo ele, e que seria notado por todos. Sem recursos suficientes, os tratamentos não estão sendo  realizados. Uma suposta correção para o problema, que foi a pauta de intensas discussões, e que parece ter sido implementada, foi disposta por meio três ações necessárias. Primeira, financiamento; segunda: hospitais eficientes e dedicados a tratar especialidades; terceira, e a mais crítica: reduzir a procura de tratamentos desnecessários, através de uma melhoria da saúde pública unida a cuidados individuais.
 
Passados quase um ano das supostas soluções apresentadas e perante os casos gritantes dos bebês ingleses (Charlie Gard e Alfie Evans, entre outros, que foram abandonados em hospitais sem receber tratamento algum), a verdade veio à tona.

Ao analisarmos o histórico ocorrido com Charlie Grad, torna-se patente que o NHS optou por reduzir essa “terceira ação”. Sobretudo no sentido de abandonar todo e qualquer investimento em pesquisa, medicina experimental, e o caminho do progresso científico. Por motivos econômicos, optou por designar todos seus doentes crônicos como desnecessários.
Kate Andrews, do Instituto Economic Affairs, expressou, publicamente: “O NHS está longe de ser a inveja do mundo”; “não são apenas aos trabalhadores pobres que recebem cuidados precários; a provisão de cuidados do NHS é igualmente precária para todos, independentemente da renda”.
A verdade é que o Reino Unido tem uma das taxas mais elevadas de mortes evitáveis ​​na Europa Ocidental e dezenas de milhares de vidas poderiam ser salvas a cada ano se os pacientes do NHS em condições graves fossem tratados por sistemas de seguro social de saúde em outros países, ou ainda em cooperação mútua.

MATÉRIA COMPLETA, Clique aqui
 

quinta-feira, 23 de junho de 2016

Mortes por H1N1, gripe Influenza A, já passam de mil

Sobe para 1.003 número de mortos por H1N1 no Brasil em 2016


A gripe Influenza A (H1N1) já causou a morte de 1.003 pessoas este ano no Brasil, país que sediará os Jogos Olímpicos em menos de dois meses, em pleno inverno no hemisfério sul, quando o vírus costuma se proliferar, informaram as autoridades sanitárias.

Entre 3 de janeiro e 11 de junho foram reportados 5.214 casos de contaminação e 1.003 mortes pela H1N1, segundo um boletim epidemiológico divulgado nesta quarta-feira pelo Ministério da Saúde.  Trata-se do maior número de mortes causadas por esta doença no Brasil desde a pandemia de 2009, quando morreram 2.060 pessoas.  O vírus H1N1 costuma aparecer entre maio e junho, quando as temperaturas caem. Mas o surto deste ano começou antes do fim do verão e já atinge 22 estados do país, uma evolução que pegou as autoridades de surpresa. “Como a epidemia veio antes do esperado, a população vulnerável, ou seja, sem vacina, estava desprotegida”, disse o infectologista Caio Rosenthal, do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, ao portal de notícias G1.

Cerca da metade dos casos se concentrou na região sudeste – 2.606 infectados e 540 mortos. O estado de São Paulo é o mais afetado, com 2.197 infectados e 434 mortos.
No início de junho, o governo informou que tinha vacinado mais de 97% da população prioritária paulista – crianças de até 5 anos, idosos, gestantes, indígenas e profissionais da saúde. 

No Rio de Janeiro, que entre 5 e 21 de agosto sediará os primeiros Jogos Olímpicos realizados na América do Sul, foram reportados 150 casos e 44 mortes.  O Brasil vive também um surto do vírus da zika desde outubro de 2015, transmitido principalmente pelo mosquito Aedes aegypti, assim como a dengue. O zika vírus pode causar transtornos neurológicos e microcefalia, uma malformação rara e grave que se caracteriza por um tamanho abaixo da média da cabeça de recém-nascidos e que causa problemas de desenvolvimento. 

De outubro a 18 de junho foram confirmados 1.616 casos de microcefalia no país, segundo dados do Ministério da Saúde. As autoridades estimam, porém, que a probabilidade de contaminação pelo zika vírus durante os Jogos é de menos de um caso entre o meio milhão de turistas estrangeiros que vão visitar o país.  O jogador de golfe norte-irlandês Rory McIlroy, o quarto melhor do mundo, anunciou nesta quarta-feira que não virá ao Rio-2016 por medo ao zika.

 Fonte: AFP
 

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

MAIORIDADE PENAL AOS 16 ANOS - no Brasil ela já foi de 14 anos


A DISCUSSÃO SOBRE MAIORIDADE PENAL AOS 16 ANOS: Muitos que debatem o assunto não se lembram, ou não sabem, que, no Brasil, ela já foi de 14 ANOS — e há mais de um século!

A interminável discussão sobre se no Brasil devemos ou não baixar a idade de responsabilidade criminal de 18 para 16 anos é, naturalmente, um assunto complexo, sobre o qual se debruçam juristas, policiais, integrantes do Ministério Público, organizações de direitos humanos, psicólogos e todo um elenco de estudiosos de diversos setores.

No Congresso, as tentativas de concretizar a medida não têm prosperado, a despeito da contradição que é considerar alguém de 16 anos apto e suficientemente maduro para dirigir veículos e para escolher o presidente da República, mas não para entender completamente a gravidade e as consequências do ato criminoso — inclusive o mais grave de todos, o homicídio.

Nesse terreno, como em tantos outros, deixamos de levar em conta exemplo de países muito mais avançados do que o nosso, inclusive no respeito aos direitos humanos. Uma olhada sobre países civilizados e democráticos com índice de desenvolvimento humano muito superiores ao Brasil, e com grau de impunidade muito melhor, revela coisas assim: na velha e sólida Inglaterra, a maioridade penal é de 10 anos — sim, isto mesmo, DEZ anos. O mesmo no País de Gales e na Irlanda do Norte. Na Escócia, onde durante muito tempo foi de 8 anos — sim, OITO anos de idade –, agora é de 12.

Os mesmos 12 anos vigoram em países como o Canadá e a Holanda. No Japão, é de 14, e na Suécia de um ano mais — 15. Agora, acreditem, amigos do blog: na civilizadérrima Suíça, um garoto de 7 anos que cometa um crime grave vai para a cadeia, tal qual um adulto.

O mais curioso é que boa parte dos que discutem a questão ignoram a própria história do Brasil. Pois no comecinho da República, há precisos 124 anos — numa época, portanto, em que as crianças não amadureciam tão rapidamente como no mundo de hoje e seus infinitos recursos de informação –, o Código Penal estatuía em 14 ANOS A MAIORIDADE PENAL NO BRASIL.

Catorze anos!

O Código não foi elaborado por uma comissão nem votado por um Parlamento, mas redigido pelo jurista Baptista Pereira e baixado como decreto pelo então presidente provisório Deodoro da Fonseca.

Vejam o texto, na linguagem original, trecho do decreto que promulgou o Código Penal que passou a vigorar menos de um ano após a queda do Imperador D. Pedro II:

“Decreto nº 847, de 11 de Outubro de 1890
Promulga o Código Penal.
O Generalíssimo Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação, tendo ouvido o Ministro dos Negócios da Justiça, e reconhecendo a urgente necessidade de reformar o regimen penal, decreta o seguinte:
CÓDIGO PENAL DOS ESTADOS UNIDOS DO BRAZIL
(…)
Art. 27. Não são criminosos:
§ 1º Os menores de 9 annos completos;
§ 2º Os maiores de 9 e menores de 14, que obrarem sem discernimento;
§ 3º Os que por imbecilidade nativa, ou enfraquecimento senil, forem absolutamente incapazes de imputação;
§ 4º Os que se acharem em estado de completa privação de sentidos e de intelligencia no acto de commetter o crime;
§ 5º Os que forem impellidos a commetter o crime por violência physica irresistivel, ou ameaças acompanhadas de perigo actual;
§ 6º Os que commetterem o crime casualmente, no exercicio ou pratica de qualquer acto licito, feito com attenção ordinária;
§ 7º Os surdo-mudos de nascimento, que não tiverem recebido educação nem instrucção, salvo provando-se que obraram com discernimento.”

Quem porventura duvidar pode consultar a íntegra do Código Penal de 1890 aqui, neste link.

O Código Penal de 1890 vigorou durante 42 anos, até ser substituído pela Consolidação das Leis Penais, aprovada por decreto do então presidente provisório Getúlio Vargas em dezembro de 1932, pouco mais de dois anos depois do triunfo da Revolução de 1930. Essa Consolidação estabeleceu punições especiais para pessoas entre 14 e 18 anos, que fixou como idade de responsabilidade penal plena.

Fonte: Blog do Ricardo Setti