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domingo, 3 de julho de 2022

Defesa - Quem são os adversários da OTAN? - Luis Kawaguti

Vozes - Jogos de Guerra

 Cúpula da OTAN em Madri, nesta semana: declaração feita pelos países da aliança deixa claro que o mundo caminha para uma escalada de confrontação - Foto: EFE/EPA/LUKAS COCH

A OTAN (aliança militar ocidental) realizou nesta semana uma reunião de cúpula histórica, que formalizou a nova realidade da política mundial provocada pela guerra na Ucrânia. Nela, a Rússia não é mais vista pelo Ocidente como uma parceira em potencial, mas sim como a maior ameaça à aliança.

A China foi classificada, por sua vez, como um “desafio” à segurança, aos interesses e aos valores da ordem internacional. A Declaração da Cúpula de Madri também relevou que a OTAN permanece preocupada com a ameaça do terrorismo global e com a mudança climática. A cúpula foi uma tentativa do Ocidente de demonstrar força e coesão. Mas ainda não está claro se essa união vai se manter em meio às crises energética e de alimentos, que foram drasticamente agravadas pela guerra na Ucrânia.

Veja Também: Guerra Fria 2.0: qual será o impacto de uma nova expansão da OTAN?

Brasileiro conta os segredos da Legião Estrangeira

O ponto de vista que aparenta predominar entre os países da aliança é o de lideranças como os Estados Unidos e a Grã-Bretanha. Eles defendem um reforço de tropas na frente oriental da OTAN, o aumento dos gastos militares na Europa e o apoio à Ucrânia até a expulsão completa das tropas de seu território. [irrealizável - prevalecendo essa posição a Ucrânia se acaba. Essa postura só interessa aos mercadores de armas.]

A ideia é fazer com que a Rússia não seja mais capaz de invadir militarmente outro país vizinho, segundo afirmou a chanceler britânica Liss Truss à BBC. Londres disse, durante a reunião, que enviará mil combatentes para defender a Estônia. [mil combatentes? cada um deles com uma arma nuclear tática, será mais que suficiente para resolver a questão = será iniciada uma guerra nuclear.]

Os Estados Unidos disseram que mandarão dois esquadrões de caças F35 (que são alguns dos mais avançados do Ocidente) para a Grã-Bretanha, dois navios contratorpedeiros para a Espanha e milhares de tropas para a Romênia.

A ideia é que essa mobilização continue até que, no ano que vem, as tropas na frente oriental da OTAN (próxima da Rússia) passem de 40 mil para 300 mil. Para se ter ideia dessa dimensão, Moscou usou cerca de 200 mil tropas para invadir a Ucrânia em 24 de fevereiro.  As tropas da OTAN na Europa também vão passar a se organizar não mais em grupos de batalha, mas em brigadas e divisões de exército - unidades maiores e mais adequadas para fazer frente a guerras de alta intensidade. Em paralelo, Finlândia e Suécia, países historicamente neutros, devem entrar na aliança.

Estrategicamente, o objetivo é que a Europa passe a gastar mais com armas para que sua defesa dependa menos dos EUA - liberando Washington para se voltar mais para a região do Indo-Pacífico (por causa da expansão chinesa). A recente Declaração da Cúpula de Madri diz que “a Federação Russa é a ameaça mais significativa e direta para a segurança dos aliados e para a paz e estabilidade na área euro-atlântica”.

A Rússia, por sua vez, vem afirmando que foi a OTAN quem adotou uma postura agressiva, com seu movimento de expansão para leste desde o fim da Guerra Fria. O motivo geoestratégico da Rússia para invadir a Ucrânia foi criar uma área neutra entre a aliança militar ocidental e o território russo.

Na cúpula de Madri, não surgiram vozes dissidentes da postura da aliança de armar a Ucrânia e reforçar as capacidades militares dos europeus. Seus maiores defensores, além de EUA e Grã-Bretanha, são os países mais próximos da Rússia, que já sofreram com invasões e dominação durante o período soviético - como a Polônia, a República Tcheca, os países bálticos e a própria Ucrânia.

Quando visitei um centro de recrutamento de civis na Ucrânia, em março deste ano, me impressionei com as colocações dos voluntários. Eles disseram preferir morrer no campo de batalha a ver suas famílias assassinadas ou passando fome nas mãos dos russos. Essas atrocidades cometidas pelos russos estão na história e na cultura desses países.

Mas, em nações mais distantes da fronteira russa, começam a surgir críticas à abordagem de confrontação, que foi oficializada na cúpula de Madri. Seu argumento é que a Ucrânia deveria ceder parte de seu território à Rússia em troca de um cessar-fogo. Em tese, isso evitaria uma matança maior tanto para ucranianos como para russos. Estima-se que a Ucrânia perde cerca de 200 militares por dia na Batalha de Donbas.

Contudo, as críticas à postura da OTAN não são motivadas apenas por razões humanitárias. As sanções econômicas à Rússia vêm causando uma alta no preço dos derivados de petróleo e o bloqueio do Mar Negro - por onde era escoada a produção de grãos da Ucrânia, impasse que elevou o custo global dos alimentos.  Na prática, a maioria dos países vem experimentando insatisfação da população, provocada pelas seguidas altas de preços nos postos de gasolina e nas lojas e supermercados.

Segundo analistas, isso pode levar ao fortalecimento de políticos ou partidos populistas e de tendência isolacionista no Ocidente. Em teoria, a ascensão deles pode, no futuro, diminuir o apetite da OTAN para confrontar a Rússia. O maior exemplo é a política de “América primeiro”, do governo de Donald Trump. O ex-presidente americano chegou a cogitar retirar os EUA da OTAN em 2018.

Porém, mesmo que um governo isolacionista seja eleito em 2024 nos EUA, é pouco provável que o país se retire da OTAN. Em 2018, Trump levantou essa possibilidade em um cenário de descontentamento com seus aliados europeus que não estavam cumprindo o estabelecido na aliança de investir anualmente 2% de seu PIB (Produto Interno Bruto) em defesa.

A vontade do Ocidente em apoiar a Ucrânia contra a Rússia por ora não parece abalada, mas a situação pode mudar. Com a chegada do inverno no hemisfério norte, pode faltar gás para aquecer as casas. Além disso, as empresas do Ocidente já começam a sentir o efeito de competição de empresas asiáticas - que vêm comprando petróleo e derivados da Rússia a preços mais baixos que os do resto do mercado.

Sabe-se,
por exemplo, que a Rússia já está entre os maiores fornecedores de petróleo da China e da Índia. Esse tipo de negociação de preços é sigilosa, mas já foi confirmado que refinarias indianas estão comprando petróleo russo com ao menos US$ 30 de desconto por barril. Elas refinam o petróleo e revendem seus derivados com preços mais altos para o mercado do Ocidente, burlando o embargo a Moscou.

Países industrializados da Europa, como a Alemanha e a Itália, já estão sentindo os efeitos da concorrência e também buscam alternativas ao gás russo. Porém, mesmo contrariados, continuam apoiando a resolução dos colegas da OTAN. [até quando?]  A principal resposta do governo do americano Joe Biden deve ser uma tentativa inédita de congelar globalmente os preços do petróleo russo. Mas analistas estão céticos sobre a viabilidade do projeto, pois os EUA não controlam a maioria da produção de petróleo mundial.

China
“Nós nos defrontamos com competição sistemática daqueles, incluindo a República Popular da China, que desafiam nossos interesses, segurança e valores, à procura de minar a ordem mundial baseada em leis”, diz o texto da declaração dos chefes de Estado da OTAN.

A China é a única nação citada nominalmente quando a aliança descreve no documento estar sendo confrontada por ameaças cibernéticas, espaciais, híbridas e assimétricas. A declaração conjunta também cita o “uso malicioso de tecnologias disruptivas”. A OTAN não diz exatamente quais são as ameaças específicas relacionadas a Pequim. Mas sabe-se que a China usou espionagem cibernética para roubar tecnologia do Ocidente e agora trava uma guerra comercial com os Estados Unidos.

Como cenário de fundo, Pequim também vem desenvolvendo tecnologia militar disruptiva, como os chamados mísseis hipersônicos - que não podem ser abatidos por defesas antiaéreas - e armas capazes de destruir satélites no espaço. A OTAN não relacionou no documento a questão nuclear e a China, mas a inteligência ocidental identificou em 2021 que os chineses estão construindo ao menos 230 silos de mísseis balísticos intercontinentais (ICBM, na sigla em inglês) no deserto de Gobi e na província de Xinjiang.

Não é novidade que a China tem armas nucleares. Mas a inteligência americana afirmou que o objetivo do país é quadruplicar seu arsenal, atingindo a marca de mil armas nucleares. Se isso acontecer, o equilíbrio bipolar do poder nuclear global, exercido por Estados Unidos e Rússia (que têm 1.550 armas ativas cada), será abalado.  O crescimento do arsenal chinês tem potencial para criar um sistema tripolar e assim anular os efeitos da atual paridade de armamentos e o conceito de MAD (sigla em inglês para destruição mútua assegurada), instrumentos que por cerca de 70 anos vêm impedindo uma guerra nuclear.

Assim, a escalada chinesa poderia deflagrar, por um período de alguns anos, uma nova corrida armamentista nuclear - até o sistema se reequilibrar em um novo sistema bipolar. Além disso, antes do início da guerra na Ucrânia, China e Rússia anunciaram uma parceria estratégica irrestrita.Analistas se dividem sobre a consistência e a possível duração dessa aproximação. A única certeza é que o Ocidente fará o que estiver ao seu alcance para tentar afastar as duas potências, como ocorreu na década de 1960 durante a Guerra Fria.

Mudança climática
A mudança climática é definida pela OTAN como o “desafio do nosso tempo”. A aliança diz que o assunto terá um impacto profundo na segurança dos países aliados. O assunto também não é especificado na declaração, mas parece apontar para o esforço do Ocidente para diminuir o uso de combustíveis fósseis - não só para preservar o meio ambiente, mas para diminuir a influência da Rússia no cenário energético global.

Mas uma parte da declaração preocupou alguns analistas brasileiros: “Nós vamos integrar considerações sobre mudança climática em todas as funções principais da OTAN”, afirma a Declaração de Madri. O temor desses analistas é que a OTAN use esse argumento para intervir na região amazônica no futuro. A possibilidade não pode ser descartada, embora seja pouco provável. Os recursos e a atenção da aliança militar ocidental estão voltados para a Europa, a região do Indo-Pacífico e para o Oriente Médio.

O argumento do clima pode ser usado para tentar criar barreiras comerciais para produtos agrícolas brasileiros, mas isso também é pouco provável em um contexto de possível crise mundial de alimentos. Porém, uma alegada invasão da Amazônia pode ser usada em campanhas cibernéticas de desinformação para gerar polarização na América Latina e eventual sentimento de repulsa às ações globais da OTAN. [se tentarem invadir a Amazônia e for impossível evitar, receberão uma Amazônia a qual não poderão ter acesso por séculos.] 

Esse tipo de campanha já está em curso na Europa, mas envolvendo o tema dos refugiados. Segundo relatório recente da Microsoft, a Rússia tem lançado campanhas de desinformação para tentar explorar eventuais divisões entre os governos ocidentais ou incentivar distúrbios sociais. Hackers russos teriam criado, por exemplo, grupos e perfis falsos no aplicativo de mensagens Telegram, para difundir mensagens reais e falsas. Seu objetivo é incentivar o ódio contra refugiados ucranianos em nações europeias - ressaltando aumento de despesas dos governos locais e aumento do desemprego. Ação dessa natureza já teria sido descoberta na Polônia.

Como fica o Brasil?
A OTAN aponta como seus adversários a Rússia, a China, o terrorismo e as mudanças climáticas, entre outros desafios. Nos bastidores, a guerra econômica, a vulnerabilidade das democracias liberais a campanhas de desinformação e a polarização política ameaçam os objetivos atuais da aliança. No início da guerra da Ucrânia, analistas levantaram a possibilidade de que Moscou poderia fazer um ataque restrito a um dos países da OTAN, para pôr à prova o artigo quinto da aliança - que diz que um ataque a um membro é um ataque a todo o grupo.

Uma eventual falta de reação do Ocidente, com o objetivo de não deflagrar a Terceira Guerra Mundial, poderia fazer a OTAN ruir. Mas o governo de Vladimir Putin também não arriscou estratégia tão ousada e parece agora apostar em uma nova crise do petróleo para enfraquecer a aliança.  Nesse contexto, o Brasil vem sendo cortejado por meio do bloco econômico dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) e depende da importação de fertilizantes produzidos na Rússia. A chancelaria brasileira vê o Brics como uma boa oportunidade econômica, mas se sente desconfortável com a atual tentativa chinesa de ampliar o grupo, para transformá-lo em bloco de oposição política ao Ocidente.

Por outro lado, durante o governo Trump, o Brasil foi aceito como “aliado extra-OTAN”. Isso abriu oportunidades de comprar armamentos ocidentais com restrições, mas que são importantes para o Brasil. Trump costurava com o governo de Jair Bolsonaro uma aproximação ainda maior com a OTAN, mas a ideia não avançou devido à derrota eleitoral do americano.

O governo brasileiro quer agora permanecer em uma posição de equilíbrio, tentando não pender para nenhum dos dois lados. Mas a Declaração da Cúpula de Madri mostra que isso vai ser cada vez mais difícil em um mundo que tende para uma escalada de confrontação.

  Luis Kawaguti, colunista - Gazeta do Povo - Jogos de Guerra 

 

segunda-feira, 21 de março de 2022

OS PONTOS DE NEGOCIAÇÃO DA UCRÂNIA - Isabel Van Brugen, em Epoch Times

O presidente krainiano, Volodymyr Zelensky, em um discurso na quinta-feira delineou as principais prioridades do país para as negociações de paz com a Rússia. “As negociações estão em andamento. Negociações pelo bem da Ucrânia”, disse Zelensky. “Minhas prioridades nas negociações são absolutamente claras: o fim da guerra, garantias de segurança, soberania, restauração da integridade territorial, garantias reais para nosso país, proteção real para nosso país”, disse ele. [comentando: entendemos que o senhor Zelensky precisa, pelo bem do seu país e dos ainda seus governados, entender que a Ucrânia está perdendo a guerra - a Rússia, potência invasora, é quem dita o ritmo das operações, especialmente, por a Ucrânia ter praticamente ZERO em termos de capacidade  contraofensiva. A Rússia pode diminuir, ou mesmo parar, o ritmo de bombardeios de artilharia, do avanço de tropas, não correndo o risco de uma contraofensiva. O presidente ucraniano precisa aceitar que está sozinho nessa guerra - seus 'aliados' não lhe fornecem o  mais necessário.

IMPORTANTE: a mídia, incluindo a militante pró esquerdismo progressista, começa a diminuir o ritmo da cobertura. 
É questão de tempo, entendemos, que a tão noticiada guerra Rússia x Ucrânia, loca esteja recebendo a cobertura das guerras que ocorrem há anos no Iémen, Somália, Etiópia e outras =  esquecidas.]

Seus comentários vêm depois que Mykhailo Podoliyak, conselheiro de Zelensky e um dos representantes da Ucrânia nas negociações de cessar-fogo Rússia-Ucrânia, sinalizou que os dois países parecem ter encontrado algum terreno comum em meio às negociações. "A única coisa que confirmamos neste estágio é um cessar-fogo, a retirada das tropas russas e garantias de segurança de vários países”, escreveu ele em um post no Twitter, incentivando um diálogo direto entre Zelensky e o presidente russo, Vladimir Putin.

Putin lançou uma invasão em grande escala contra a Ucrânia em 24 de fevereiro, descrevendo-a como uma “operação militar especial”. Três semanas depois, o Ministério da Defesa da Grã-Bretanha disse em uma atualização de inteligência que a ofensiva “em grande parte parou em todas as frentes”.

As forças russas fizeram progressos mínimos em terra, mar ou ar nos últimos dias e continuam a sofrer pesadas perdas, enquanto a resistência ucraniana permanece firme e bem coordenada, disse a atualização. “A grande maioria do território ucraniano, incluindo todas as grandes cidades, permanece em mãos ucranianas”, disse o ministério.

Podoliyak confirmou a autenticidade de um esboço de acordo de cessar-fogo relatado pelo Financial Times, mas disse que representa apenas a posição do lado russo.

Zelensky sinalizou na terça-feira que a Ucrânia não espera ingressar na Otan, uma preocupação crítica russa que foi usada para justificar a invasão. “A Ucrânia não é membro da OTAN. Nós entendemos isso. Ouvimos há anos que as portas estavam abertas, mas também ouvimos que não poderíamos participar. É uma verdade e deve ser reconhecida”, disse Zelensky durante um discurso por videoconferência aos líderes da Força Expedicionária Conjunta liderada pelo Reino Unido.

“Estou feliz que nosso pessoal esteja começando a entender isso e confiar em si mesmo e em nossos parceiros que nos ajudam”, acrescentou Zelensky. Zelensky, em seu discurso na quinta-feira, também agradeceu aos Estados Unidos por emprestar “forte apoio” em meio à invasão. O presidente Joe Biden anunciou na quarta-feira um adicional de US$ 800 milhões em assistência de segurança à Ucrânia.

“Sou grato ao presidente Biden por isso. Sou grato pela liderança que uniu o mundo democrático”, disse ele.

*        Allen Zhong contribuiu para este relatório.

**      Isabel van Brugen é uma jornalista premiada e atualmente repórter do Epoch Times. Mestre em jornalismo de imprensa escrita, pela City University of London.

Transcrito do site Percival Puggina  

 

segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

Uma eleição para muitos anos - Revista Oeste

Ana Paula Henkel

Contra o ativismo ou o silêncio judicial, a letra fria da lei e nossa vigília diária

Caso Roe <i>versus</i> Wade | Foto:  Montagem Revista Oeste/Shutterstock
Caso Roe versus Wade | Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock

Para falarmos da Suprema Corte Americana (SCOTUS – Supreme Court of The United States), é preciso voltar um pouco na história do país. A Declaração de Independência, assim como a Constituição americana, enxuta com suas 27 emendas, não mostra apenas a solidez dos documentos mais importantes da nação mais próspera do mundo. Quando alguns bravos homens das 13 colônias britânicas na América do Norte se encontraram no Segundo Congresso Continental e decidiram se unir contra a Coroa britânica, nem tudo foi suave como alguns historiadores proclamam. Havia 13 colônias independentes com suas peculiaridades e identidades. Houve muito debate e questões regionais conflitantes foram levantadas, mas mesmo assim eles decidiram colocar as diferenças de lado e escrever seus nomes em um pergaminho que declarava a independência da Grã-Bretanha.

Todos estavam cientes dos tempos difíceis que os aguardavam, mas também era muito claro o que era defendido na escrita daqueles homens: independência, liberdade, representatividade no governo, republicanismo, um processo legal de um Estado Democrático de Direito que não existia para os colonos. Mesmo com muitas diferenças entre eles, aqueles homens se uniram em torno do maior ponto em comum que os conectava: o empenho em criar uma grande nação na terra com o maior documento governante que a humanidade já conheceu. E eles foram bem-sucedidos.

A Constituição americana estabeleceu um governo beneficente limitado e protegeu a sociedade civil para nutrir a liberdade, a família e os direitos religiosos e civis. Na Declaração de Direitos, elaborada durante anos, os pilares sagrados para a nação norte-americana:  
a proteção ao indivíduo contra o governo central, a proteção à liberdade de expressão, de imprensa e religiosa e a sagrada proteção contra a tirania e a opressão o direito de manter e portar armas contra os inimigos, tanto indivíduos quanto governamentais.

Os Pais Fundadores dos Estados Unidos ainda fizeram questão de deixar explícito na Magna Carta o devido processo legal, a necessidade de mandados com base em causa provável, julgamentos rápidos, cláusulas pétreas de proteção às propriedades e tudo o que é crucialmente importante para uma sociedade civil livre. 

Nenhum documento na face da terra é como a Constituição americana, baseada nas declarações de independência e nos direitos naturais inalienáveis. O federalismo, implementado pelos Pais Fundadores e que concede autonomia sólida aos Estados, forma mais um filtro institucional adicionado à espetacular teia de freios e contrapesos para evitar a tirania do Executivo e o ativismo do Judiciário. Mesmo assim, a nação estabelecida no império da lei não é perfeita e também tem cicatrizes de raros ativismos judiciais. Infelizmente, o que é uma rara praga para os ianques é a regra para nós, brasileiros.

Se procurarmos no renomado dicionário americano Webster o termo “ativismo judicial”, encontraremos a seguinte descrição: “prática no Judiciário de proteger ou expandir direitos individuais por meio de decisões que se afastam de precedentes estabelecidos ou são independentes, ou opõem-se a supostas intenções constitucionais ou legislativas”.

Ativismo judicial
O termo “ativismo” é usado tanto na retórica política quanto na pesquisa acadêmica. No uso acadêmico, ativismo geralmente significa apenas a disposição de um juiz para derrubar a ação de outro ramo do governo em um precedente judicial em que juízes reforçam as próprias opiniões sobre os requisitos constitucionais ou ações de tribunais anteriores. Por essa ótica, o ativismo pode não ser considerado pejorativo, e estudos sugerem que não possui uma valência política consistente.

Na retórica política, no entanto, o ativismo judicial não é apenas um termo ruim, é uma ação nociva. Descrever os juízes como ativistas nesse sentido é argumentar que eles decidem casos com base em suas próprias preferências políticas e opiniões, em vez de uma interpretação fiel da lei, abandonando assim o papel judicial imparcial e “legislando da bancada”. As decisões podem ser rotuladas de ativistas por derrubar uma ação legislativa ou executiva, ou por simplesmente permitir que ela permaneça. Esse ativismo no Judiciário ocorre exatamente quando juízes se recusam a aplicar a Constituição ou as leis de acordo com seu significado público original, ou ignoram o precedente obrigatório e decidem os casos com base em preferências pessoais.

Roe versus Wade
Nos Estados Unidos, um dos casos mais conhecidos e polêmicos sobre o ativismo do Judiciário, até hoje centro de intermináveis batalhas políticas e protestos pelo país, é a decisão da Suprema Corte Americana no caso Roe versus Wade. Em 1969, Norma McCorvey ficou grávida de seu terceiro filho, mas decidiu que não queria ter o bebê. Na época, a lei do Texas, onde McCorvey residia, só permitia o aborto em casos de estupro, incesto ou para salvar a vida da mãe. Ela chegou a ser aconselhada por suas amigas a afirmar falsamente que havia sido estuprada, mas não havia nenhum relatório da polícia para apoiar essa alegação. Então McCorvey tentou fazer um aborto ilegal, mas logo descobriu que as autoridades haviam fechado algumas clínicas.

Depois de visitar um advogado, “Jane Roe” (nome fictício usado para proteger a identidade da requerente, Norma McCorvey) decidiu entrar com uma ação federal contra o Distrito de Dallas, Texas, pela impossibilidade de realizar o aborto. O caso foi parar na Suprema Corte, e, numa decisão histórica, os magistrados esticaram malandramente a Décima Quarta Emenda Americana, que protege, entre outros pontos, o direito à privacidade para criar uma nova legislação que protegeria “o direito ao aborto”. A Corte com maioria progressista entendeu que ali caberia uma “interpretação” [naturalmente uma interpretação criativa, tão em voga no Brasil] de que a emenda também protegia a liberdade e a privacidade de uma mulher grávida de optar por um aborto sem a restrição do governo.

Desde 1973, ano em que a lei entrou em vigor em todos os Estados americanos, ferindo gravemente o federalismo estabelecido na Constituição do país, o caso tem trazido enorme comoção nacional. Em 2016, eleitores motivados por uma ou duas vagas na Suprema Corte, e a possibilidade de reversão do pernicioso ativismo do tribunal nos anos 1970, acabaram se tornando uma das razões da vitória de Donald Trump. Em uma pesquisa em 2018, um em cada cinco eleitores do candidato republicano disse à CNN que a Suprema Corte foi uma das razões pelas quais votaram em Trump. Além disso, mais de 56% dos eleitores que votaram no republicano afirmaram que esse foi o “fator mais importante” em sua decisão.

Donald Trump, que saiu das primárias de maneira surpreendente, foi visto como a chance que os eleitores conservadores e constitucionalistas queriam: enviar um republicano à Casa Branca para fazer uma enorme diferença na composição do tribunal por uma geração. E ele entendeu o recado. Durante seu discurso na Convenção Nacional Republicana, quando aceitou a nomeação para ser o candidato à Casa Branca, Trump mencionou a Suprema Corte: “Também vamos nomear juízes para a Suprema Corte dos Estados Unidos, juízes que defenderão nossas leis e nossa Constituição”, disse. “Não deixem essa oportunidade escapar. Não temos mais quatro anos. Eles vão começar a nomear juízes para a Suprema Corte. Temos uma chance e não podemos deixar isso escapar.”

Conservadores e independentes concordaram, e muitos votaram em Trump com a Suprema Corte em mente. Presidentes estaduais do Partido Republicano propagaram a necessidade de apoiar Trump, deixando explícito em suas reuniões que a Suprema Corte desempenhava um papel significativo em sua escolha. O presidente eleito daquele ano provavelmente indicaria dois ou mais juízes e apenas um candidato, Donald Trump, escolheria conservadores sólidos para ocupar as cadeiras. 

Em julho de 2016, o comentarista conservador Hugh Hewitt escreveu em um artigo, intitulado “É a Suprema Corte, estúpido”, que sua decisão de votar em Trump havia sido baseada em grande parte nas repercussões catastróficas de uma Presidência de Hillary Clinton no tribunal mais importante do país. A um mês das eleições, em outubro de 2016, Manny Klausner, libertário e cofundador da Reason Foundation, disse que votaria no candidato do Partido Libertário, Gary Johnson, mas acrescentou que, para outros milhões de libertários, “a probabilidade de o próximo presidente nomear vários juízes para a Suprema Corte nos próximos quatro anos era uma razão suficiente para que os eleitores em Estados que poderiam decidir as eleições (swing States) votassem em Trump em vez de Johnson”.

Se há algo que une democratas e republicanos nos Estados Unidos é o respeito quase religioso à Constituição

Bem, o pragmatismo do voto conservador em 2016 em Donald Trump, mesmo com todas as críticas às suas aparições públicas, parece começar a servir a seu propósito. Trump nomeou três juízes para a Corte mais importante dos EUA, e, na semana passada, o tribunal ouviu os argumentos orais no processo Dobbs versus Jackson Women’s Health Organization — um caso sobre aborto que visita a constitucionalidade da Lei da Idade Gestacional do Mississippi, que, com algumas exceções, proíbe o aborto após 15 semanas. Enquanto concedia o certiorari (ouvirão o caso), a Suprema Corte limitou a questão do recurso a “se todas as proibições de pré-viabilidade de abortos eletivos são inconstitucionais”, e os argumentos se concentraram mais amplamente em se o Tribunal Superior deveria revisitar e anular Roe versus Wade. A porta para corrigir o ativismo de 1973 foi finalmente aberta, e com uma Corte com maioria conservadora (6-3), o voto calculado de católicos e evangélicos no malcriado do Twitter pode finalmente pagar dividendos.

Supremo Tribunal Federal
Já no Brasil, na última semana, finalmente testemunhamos a sabatina de mais um nome indicado ao Supremo Tribunal Federal pelo presidente Jair Bolsonaro. André Mendonça teve seu nome aprovado no Senado para ocupar a vaga deixada pela aposentadoria do ministro Marco Aurélio Mello, indicado por Fernando Collor de Mello e que permaneceu 31 anos na Corte. Diante de tantos desmandos à nossa Constituição por parte do tribunal, a sabatina de André Mendonça foi vista por milhões de brasileiros que estavam atentos à TV como uma final de campeonato de futebol. Para milhões que foram às ruas no 7 de Setembro para pedir um basta no ativismo político da Corte, há esperança e dúvidas se, de fato, teremos alguém no STF que protegerá nossas leis e nosso devido processo legal.

Em seu discurso, André Mendonça assumiu publicamente compromissos importantes e disse “que se compromete com a democracia e o Estado Democrático de Direito conforme expresso desde o preâmbulo da Constituição Federal”. Ele também declarou que “o Judiciário é o garantidor da legítima atuação dos demais Poderes — sem ativismos nem interferências indevidas”. O indicado de Jair Bolsonaro também afirmou que “cabe ao Supremo Tribunal Federal não legislar - sem executar as políticas públicas com base na lei”.

Assim como na Suprema Corte Americana em 1974, o Supremo Tribunal Federal no Brasil não esconde seu desejo quase incontrolável de legislar sobre o aborto. Gostaria de poder acreditar sem pestanejar nas declarações do senhor André Mendonça, mas só o tempo e suas decisões mostrarão o legado que será escolhido por ele — e colhido por todos nós.

Se há algo que une democratas e republicanos nos Estados Unidos é o respeito quase religioso à Constituição e aos limites dos Poderes. A transformação do STF nos últimos anos é preocupante. Quanto mais interpretação livre do texto constitucional pela última instância, quanto mais liberdade para atuar fora de sua esfera e quanto maior o silêncio da mais alta Corte do país quando leis são criadas por prefeitos e governadores, cerceando nossos direitos fundamentais, mais risco corremos. Contra o ativismo ou o silêncio judicial, a letra fria da lei e nossa vigília diária. É a última garantia para as nossas liberdades.

Antonin Scalia, um dos mais respeitados juízes da Suprema Corte Americana, falecido em 2016, era categórico quanto ao papel dos tribunais para a manutenção de democracias saudáveis e dos pilares do império da lei e da ordem: “Enquanto juízes mexerem na Constituição para ‘fazer o que as pessoas querem’ em vez do que o documento realmente comanda, os políticos que escolherem e confirmarem os novos juízes, naturalmente quererão apenas aqueles que concordam com eles politicamente. A Constituição não é um documento vivo, é um documento legal”, dizia Scalia — certamente um norte na América até hoje quando o assunto são as prerrogativas e os limites de cada Poder.

Em suas declarações a respeito do novo ministro do STF, o presidente Jair Bolsonaro disse que um dos pontos para a indicação de André Mendonça era o fato de que ele era “terrivelmente evangélico”. Assim como Donald Trump em 2016, o presidente que sairá da eleição presidencial de 2022 no Brasil terá a chance de indicar dois ministros para a Corte Suprema em 2023. Indicações que podem afetar toda uma geração. O Brasil é um país que abraça e respeita todas as religiões, mas tenho certeza de que reza para que essas indicações sejam, antes de qualquer coisa, terrivelmente fiéis às nossas leis.

Leia também “O preço do radicalismo”

Ana Paula Henkel, colunista - Revista Oeste


terça-feira, 14 de setembro de 2021

Em tempos de turbulência, as lições históricas - Ana Paula Henkel

Revista Oeste

Não podemos ser soldados de uma batalha, é necessário a paixão de um patriota, a sabedoria de um estudioso observador e o fôlego de um general

Nota de US$ 1, estampada com a imagem de George Washington
Nota de US$ 1, estampada com a imagem de George Washington

Muita gente pelo mundo, quando pensa em independência e autonomia, tem na mente os Estados Unidos da América como farol da liberdade, ou a cidade no topo da colina (a city upon a hill) — termo pelo qual o país é chamado desde os tempos da colonização. A expressão bíblica “Uma cidade sobre uma colina” é uma frase presente no Sermão da Montanha de Jesus, e, em um contexto moderno, é usada na política dos Estados Unidos para se referir à América agindo como “farol de esperança” para o mundo.

Grande parte dessas pessoas, no entanto, não conhece ou talvez não se atente aos detalhes do que fez os Estados Unidos um ponto de luz em tempos obscuros. Não foram apenas políticas acertadas e lições extraídas dos erros que colocaram nos pilares genéticos dessa nação a palavra resiliência. Também não é difícil achar frases inspiradoras de grandes presidentes norte-americanos, como Abraham Lincoln e Ronald Reagan, por exemplo, para serem usadas em tempos de dúvidas e destemperos. O que muitos não visualizam é que a persistência na vontade do progresso diário desses presidentes e do povo americano está na concepção da nação, nas escolhas pensadas das 13 colônias originais, que, de maneiras diferentes, encontraram um ponto importante em comum. E, claro, em homens como Samuel Adams, John Adams e George Washington.

Durante os anos que precederam à Revolução Americana, Samuel Adams, também considerado um dos Pais Fundadores da América e primo de John Adams, o segundo presidente norte-americano, foi um propagandista e político apaixonado que não era excessivamente escrupuloso em seus ataques às autoridades e políticas britânicas. Em inúmeras cartas de jornais e ensaios com várias assinaturas, ele descrevia as medidas britânicas e o comportamento dos governadores reais, juízes e homens da alfândega nas cores mais escuras. Ele era um mestre da organização, planejava auspiciosamente a eleição de homens que concordavam com ele, obtendo influência em comitês que agiriam como desejasse, assegurando a aprovação das resoluções que almejava.

Sam Adams era também um agitador. Muitas vezes usou seu inquietante espírito para inflamar manifestações e chegou até a pedir o enforcamento dos soldados britânicos no famoso episódio do Massacre de Boston — erroneamente, sem o julgamento adequado (vale muito a pena assistir ao primeiro episódio da série John Adams, da HBO que trata sobre esse evento!) Samuel foi membro da convenção que moldou a Constituição de Massachusetts de 1780 e participou da convenção de seu Estado que ratificou a Constituição Federal. Ele foi, a princípio, um antifederalista que se opôs ferozmente à ratificação da Constituição por medo de que ela atribuísse muito poder ao governo federal. Abandonou sua oposição radical quando os federalistas prometeram apoiar uma série de emendas futuras, incluindo o projeto de lei de direitos. Por amor a seus propósitos e comprometido com a liberdade, jurou lutar contra a tirania dos atos britânicos e foi um dos homens que ajudaram a montar uma forte milícia e uma rede de inteligência contra uma superpotência.

Já seu primo, John Adams, um excelente advogado de Boston, havia se tornado membro visível do movimento de resistência que questionava o direito dos britânicos de tributar as colônias americanas sem que elas tivessem nenhuma representação no Parlamento. Intensamente combativo, cheio de dúvidas particulares sobre suas próprias capacidades, mas nunca sobre sua causa, Adams tornou-se uma figura importante na oposição à Coroa inglesa. Depois da revolução, por ser a personificação oficial da independência americana do Império Britânico, John Adams foi ignorado e relegado para a periferia do centro político com a Corte britânica durante os quase três anos em que morou em Londres. No entanto, foi durante esse tempo que Adams se dedicou ao aprofundamento da história da política europeia em busca de padrões e lições que pudessem ajudar o incipiente governo americano em seus esforços para alcançar o que nenhuma grande nação europeia havia conseguido produzir: uma forma republicana estável de governo.

O resultado foi uma coleção maciça e heterogênea de três volumes de citações e observações pessoais intitulada Uma Defesa das Constituições de Governo dos Estados Unidos da América (A Defense of the Constitutions of Government of the United States of America –1787). Esses longos trabalhos continham os insights de John Adams como pensador político. Ele desejava alertar seus compatriotas americanos contra todos os manifestos revolucionários que visavam a uma ruptura com o passado e uma transformação abrupta na natureza humana ou na sociedade que supostamente produziu uma nova era. Adams acreditava que todas essas expectativas reacionárias eram utópicas, impulsionadas pelo que chamou de “apenas ideologia” — a crença de que ideais imaginários, tão reais e sedutores em teoria, eram capazes de ser implementados no mundo e na nova nação, mas com um alto preço a ser pago. Como segundo presidente, evitou escolher a glória, a elevação de seu nome e uma fácil reeleição ao negar entrar em uma guerra ao lado da França, por amor e proteção à sua pátria. O ego não foi o seu norte.

Samuel e John Adams tornaram-se líderes da facção que rejeitou as perspectivas de reconciliação com a Grã-Bretanha. Primeiros a pedir uma separação final dos ingleses, assinaram a Declaração de Independência e exerceram considerável influência no Congresso. Porém, os primos, muitas vezes chamados de “Adams brothers”, eram totalmente diferentes nas estratégias que ajudaram a impulsionar as 13 colônias britânicas na América do Norte a status de nação, hoje bastião da liberdade no Ocidente.

Dentre os bravos — e profundamente distintos — homens que forjaram a nação mais próspera do mundo, está George Washington, o personagem mais influente a enfeitar as páginas dos livros de história americana. Seu efeito no mundo é incomensurável e ilimitado. Washington liderou as colônias, contra todas as probabilidades de vitória, a derrotar o Império Britânico para se tornar uma nação livre. Mais tarde, comandou o novo país durante os primeiros oito anos sob a Constituição e deu o exemplo para todos os futuros presidentes. O primeiro governante norte-americano decidiu fortalecer a América e fez exatamente isso, criando uma potência mundial que se tornaria o farol para a liberdade no mundo. Seu legado, além da forte administração, está nas lições de comprometimento durante toda a Revolução Americana.

Quando olham para uma pintura de George Washington, muitos imaginam um general destemido e imbatível, que derrotou uma grande potência. Destemido, sim. Imbatível, nem tanto. O que poucos sabem quando seguram uma nota de US$ 1, onde o seu rosto está estampado, é que, apesar da pouca experiência prática na gestão de grandes exércitos convencionais, Washington provou ser um líder capaz e resiliente das forças militares americanas durante a Guerra Revolucionária. E — acredite! — perdeu mais batalhas do que venceu. Antes de sua nomeação como chefe do Exército Continental, Washington nunca havia comandado um grande exército no campo. Contudo, a escolha de prioridades e estratégias lhe renderam vitórias cruciais — como a Batalha de Trenton, em 1776, e de Yorktown, em 1781 — que fizeram com que uma revolução praticamente impossível contra um gigante fosse vitoriosa.

O próprio Washington não foi o mais brilhante intelectualmente dos Pais Fundadores. Não era o mais ambicioso nem o mais capaz. Na verdade, Washington não era um Thomas Jefferson. Nem um Alexander Hamilton. E certamente não era um Benjamin Franklin. Ele não elaborou a Constituição, mas a apoiou com suas ações e palavras. Representou tudo o que a América precisava e ajudou a dar o exemplo do que era um americano. Liderou pessoas implementando os pensamentos e os planos de outras mentes brilhantes, para que o país um dia prosperasse. George Washington nunca foi o homem mais inteligente, espirituoso, ambicioso ou carismático. Mas ele foi George Washington, e era exatamente disso que a América precisava.

Na política, como na guerra, você precisa de poder para vencer e não dissipar suas forças lutando em batalhas que, com certeza, perderá

Quando nos falta o ar em desespero contra algo injusto e maior, tento imaginar o que homens como George Washington nos diriam. Seus discursos caem como uma luva, ou como um cobertor quente em corações cansados, como andam os nossos. Em uma sociedade coberta de platitudes vazias e discursos imediatistas, é um alento mergulhar no universo de quem esteve em uma situação muito pior do que a nossa e deparar com mensagens como essa: “Quanto mais difícil for o conflito, maior será o triunfo. A felicidade humana e o dever moral estão inseparavelmente ligados”.

Somos um povo apaixonado, feliz por natureza, mas que está cansado da luta diária contra um emaranhado de configurações políticas que insistem em frear nosso desenvolvimento como nação. Não é difícil desanimar, confesso. Mas é necessário seguir. Sejamos líderes inspiradores em nossas famílias, em nossas comunidades, com os amigos. É preciso tentar incorporar características desses grandes homens nos sonhos, sim, mas, principalmente, na eficácia e no pragmatismo das ações. Na certeza de que existe a utopia de vencer todas as batalhas.

E não precisamos vencer todas as batalhas, mas as certas. Durante os oito anos da Revolução Americana, o general Washington gastou muito mais tempo, pensamento e energia como organizador e administrador das forças militares do que como estrategista tático. Ele enfrentou duras realidades de alistamentos de curto prazo, deserções, soldados malvestidos e sem equipamentos, congressistas e legisladores estaduais lenientes, traidores do movimento. Mesmo assim, soldados e civis confiaram em sua causa, ideais de todos que estavam cansados das injustas arbitrariedades da Coroa britânica.

Essa semana, li um post de um querido amigo em sua rede social que dizia o seguinte: “Thomas Sowell escreveu um tempo atrás que em uma guerra você não trava batalhas que certamente perderá, apenas porque precisará de suas tropas para lutar mais tarde em batalhas que pode vencer. E cita as tropas britânicas que escaparam de Dunquerque e voltaram à França quatro anos depois, como parte das forças de invasão maciça que invadiram as praias da Normandia, libertaram a França e avançaram para a Alemanha para a derrota final do regime nazista. Na política, como na guerra, você precisa de poder para vencer e não dissipar suas forças lutando em batalhas que, com certeza, perderá. ‘Simbolismo e autoindulgência emocional simplesmente não valem a pena’, disse Sowell. O exército comandado pelo general Washington não era páreo para o exército britânico, nem em experiência militar, nem em poder de fogo. O exército americano repetidamente teve que se retirar, recuar e até mesmo fugir para evitar ser aniquilado. Quando Washington fez sua célebre travessia do Delaware, ele se dirigia para uma vitória dramática, usando soldados que selecionou para aquele momento. Guerras são para vencer, não para gestos simbólicos fúteis que a deixam pior”, completou meu amigo em sua brilhante publicação.

Acredito que, no momento, haja apenas um caminho para nós: a história. Em tempos de pura escassez de líderes mundiais inspiradores, é preciso resgatar os bravos exemplos não apenas de liderança, mas de resiliência, estratégia e inteligência emocional. Nosso Brasil não foi contaminado por agentes do retrocesso em poucos anos. E não será em um ou dois ciclos presidenciais, ou trocando algumas cadeiras do Congresso por parlamentares realmente engajados com o nosso futuro, que veremos nosso horizonte ser ampliado. Não estamos em uma corrida de 100 metros, mas em uma maratona olímpica. 

Para isso, não podemos ser soldados de uma batalha, é necessário a paixão de um patriota, a sabedoria de um estudioso observador e o fôlego de um general. 

É necessário que saibamos ouvir nossa assembleia de vozes com inteligência e escolher a quem ouvir com a alma, jamais com o fígado.

Leia também “A história como liderança”

Ana Paula Henkel, colunista - Revista Oeste 

 

quarta-feira, 30 de junho de 2021

É preciso derrubar os muros contra as liberdades

Queda do Muro de Berlim, em 9 de novembro de 1989
Queda do Muro de Berlim, em 9 de novembro de 1989 | Foto: Arquivo Wikimedia Commons 
 
Há alguns dias, um dos mais famosos discursos políticos da história completou mais um aniversário. 
Foi em 12 de junho de 1987 que Ronald Reagan, o 40º presidente norte-americano, proferiu as palavras que se tornaram imortais: “Mr. Gorbachev, tear down this wall!” (“Sr. Gorbachev, derrube este muro!”). O discurso do Muro de Berlim, como também é conhecido, é hoje um dos mais citados e estudados na ciência da política, não apenas pelas circunstâncias — um muro dividia a Alemanha em duas —, mas pela coragem de dizer o que precisava ser dito sem perder a diplomacia e a razão.

Um dos grandes males da atual geração, a mais rica em termos de acesso a informações, é não mergulhar na história e nos ensinamentos preciosos que ela deixa em páginas, imagens e relatos. Às vezes, tenho enorme vontade de sair por aí perguntando aos jovens, como um instituto de pesquisa, se eles sabem dizer como o Muro de Berlim caiu. Não ficaria surpresa se entre as respostas ouvíssemos “caiu de velho; como um celeiro antigo…”. Pela superficialidade das discussões políticas atuais, e pela perigosa falta de entendimento sobre como precisamos proteger nossas liberdades, a falta de conexão desta geração com o passado e seu legado é preocupante.

O Muro de Berlim foi erguido pela Alemanha Oriental comunista e pela União Soviética em 1961 para impedir que trabalhadores e intelectuais qualificados da Alemanha Oriental fugissem para Berlim Ocidental, um enclave urbano administrado pelos Estados Unidos, Grã-Bretanha e França. Na década de 1980, o muro tornou-se símbolo da relação tensa entre o Oriente e o Ocidente durante a Guerra Fria, bem como um ícone da opressão soviética.

As décadas passam e a história não deixa apenas legados, mas rastros e pistas, como um mapa a ser redefinido a partir de similaridades e eventos conectados. Novos contextos são trazidos para a sociedade atual. Novas palavras, novos personagens e desafios. No entanto, os valores que perduram contra as armadilhas do mal ao longo de décadas não mudam. São eles que fazem com que homens e mulheres abandonem o conforto de seu lar para lutar em guerras e derrotar o mal — visto em várias formas.

Há uma guerra em curso. Num novo contexto, é verdade. Mesmo assim, é preciso sair do nosso conforto e enfrentar não apenas o inimigo invisível, mas os adversários de nossas liberdades. Muros e divisões estão sendo levantados. E o silêncio não pode ser uma opção. Há duas semanas, o Senado brasileiro aprovou o projeto de lei que institui o Certificado de Imunização e Segurança Sanitária — o “passaporte da vacina”. Na prática, o “documento” segregará cidadãos. O texto, elaborado pelo senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), foi assustadoramente aprovado por unanimidade e segue agora para votação na Câmara dos Deputados. A ideia é que o comprovante seja utilizado como autorização para ingressar em instituições e eventos públicos, comércios, hotéis, parques, assim como para o uso de meios de transporte coletivos. O projeto também prevê a restrição e até a suspensão da circulação de pessoas em locais públicos e privados.

Juristas já se levantam contra a imposição e ressaltam, além do ponto principal que mexe com os direitos básicos do cidadão, outra questão importante: a de que as vacinas contra a covid-19 foram desenvolvidas em caráter emergencial e experimental;  
e que, por mais louvável que possa ser a intenção de querer frear a pandemia, não é possível equiparar esses imunizantes às demais vacinas obrigatórias no Brasil, que contam com anos de desenvolvimento e monitoramento (o que permite mensurar, entre outras coisas, eficácia, segurança, contraindicações e efeitos adversos).

Por que a pressa para passar o projeto?
Por mais que nosso Senado tenha errado de maneira grotesca na votação desse projeto, medidas legislativas que ferem seriamente as liberdades individuais não são exclusividade das ações irresponsáveis de nossos parlamentares. A União Europeia adotará algo semelhante a partir de julho. Nos Estados Unidos, contudo, sempre embasados nos pilares do federalismo, Estados começam a aprovar legislações locais para que nenhum passaporte sanitário entre em curso.

Governadores republicanos declararam guerra contra o novo muro invisível que burocratas e políticos aliados às Big Techs e Big Farmas querem impor aos cidadãos norte-americanos. Na contramão, algumas propostas dos governos estaduais democratas tentam implementar as chamadas “restrições civis”. A proibição de entrada em certos locais não seria apenas uma restrição física e inconstitucional, mas colocaria de maneira invisível no peito das pessoas a letra escarlate da “vergonha de não ter tomado a vacina”. O próximo passo provavelmente seria a pecha de genocida.

Alguns cientistas sérios como o dr. Luc Montagnier, vencedor do Nobel de Medicina pela descoberta do vírus da aids, o respeitado epidemiologista da Harvard, dr. Martin Kulldorff, e um dos inventores da tecnologia do RNA mensageiro, o dr. Robert Malone, vêm manifestando a preocupação de que os riscos dos imunizantes contra a covid-19 tenham sido subestimados. Eles são unânimes quanto à importância das vacinas, inclusive essa, para grupos que possam desenvolver os estágios mais graves da doença, como idosos, por exemplo. No entanto, advertem que os perigos de uma vacina contra a covid-19, ainda em caráter experimental, podem superar os benefícios para certas populações de baixo risco, como crianças, adultos jovens e aqueles que já tiveram a doença.

O muro não existia apenas para separar e segregar pessoas, mas para abafar ideias

Nesta semana, a própria Organização Mundial da Saúde (OMS) mudou sua diretriz para a imunização em crianças e adolescentes e atualizou o texto oficial para a NÃO RECOMENDAÇÃO do uso das vacinas contra covid-19 em menores de 18 anos. O CDC norte-americano, diante do alto número de casos de miocardite apresentados por jovens de até 22 anos, também se reuniu de maneira emergencial para tentar entender o que está acontecendo.

Há gigantesca pressão para que o assunto sobre essas vacinas seja categorizado como intocável. Espirais de silêncio são impostas e muros são erguidos contra aqueles que tentam como a boa ciência manda — questionar o que ainda não está estabelecido em pilares sólidos. O justo debate sobre as reações adversas tem sido empurrado de maneira sórdida para um quarto escuro. Por que a tentativa de silenciar até cientistas e médicos consagrados?

A segregação de quem ousou questionar está em curso. O próximo passo é a construção do muro invisível de quem não quer, pelo motivo que for, submeter-se às vacinas experimentais. Muito mais está em jogo, além do assunto imunizantes ou passaportes sanitários. Reagan, no histórico discurso, incitou uma abertura maior entre as pessoas de ambos os lados da Cortina de Ferro. O apelo do presidente norte-americano em 1987 ao líder soviético Mikhail Gorbachev para derrubar o Muro de Berlim é considerado um momento decisivo de sua Presidência. Mas, de acordo com o escritor e editor dos discursos de Reagan, Peter Robinson, as palavras que convidavam, de maneira incisiva, o líder soviético a interromper a segregação entre seres humanos quase não foram ditas.

A passagem com a frase lendária, “Sr. Gorbachev, derrube este muro!”, correu o risco de ser cortada depois que os conselheiros do Departamento de Estado e do Conselho de Segurança Nacional as consideraram provocativas. Um membro da equipe de Reagan classificou o trecho de pouco “presidencial”. Mas, depois da queda do Muro de Berlim, em 9 de novembro de 1989, o que fora tachado de audacioso tornou-se auspicioso.

O muro não existia apenas para separar e segregar pessoas, mas para abafar ideias, suprimir perguntas e engessar o pensamento. Para quem estava no lado Leste do muro, o lado frio do concreto e das marcas de bala no gélido cinza, apenas ordens. Do lado Oeste, no entanto, viam-se cores, grafitti e esperança. Esperança de quem sabia que um dia aquele maldito viria abaixo, não de velho, mas derrubado. Derrubado porque boas pessoas não parariam de fazer perguntas incômodas. Hoje, se não existem muros físicos para derrubar, há questionamentos e frases a ser ditos para impedir que eles sejam erguidos.

Ana Paula Henkel, colunista - Revista Oeste


terça-feira, 4 de maio de 2021

As commodities estão subindo e o Brasil tem outra chance de bombar - Mundialista

Recuperação pós-pandemia e gastança sem precedentes nos Estados Unidos aumentam os preços do trio básico: petróleo, comida e minérios

É um miniboom ou um novo superciclo? Economistas ainda não fecharam um consenso, mas os preços em alta não deixam dúvidas: tudo aquilo que o mundo precisa para viver, gerar energia e produzir está subindo – e deve subir mais ainda.  Dinheiro não falta. Os Estados Unidos, e em menor escala a Grã-Bretanha, estão derramando investimentos em obras de infraestrutura – dois trilhões de dólares, só no mais recente pacotão proposto por Joe Biden.

O presidente americano quer não apenas remendar estradas, pontes e similares, mas refazer tudinho de acordo com normais ambientais mais estritas. E praticamente tudo que cospe menos poluentes na atmosfera, de painéis solares a baterias elétricas para os carros elétricos  que se tornarão progressivamente obrigatórios, leva cobre. O “ouro vermelho” passou de 10 mil dólares a tonelada de pode chegar a 11 mil no ano que vem. Isso se não acontecer um cisne negro como a eleição de um ultra-esquerdista delirante como Pedro Castillo como presidente do Peru, o país que se tornou o segundo maior produtor mundial, compartilhando com o vizinho Chile, o campeão, as reservas criadas pelo choque das placas tectônicas ao longo da costa do Pacífico.

O professor primário e sindicalista, à frente nas pesquisas, já prometeu nacionalizar tudo o que a terra dá no Peru e expulsar os “estrangeiros exploradores” num prazo de 72 horas depois de eleito. Nem Mario Vargas Llosa criaria um personagem como Castillo, que faz campanha a cavalo, de poncho e chapéu de camponês, prometendo um paraíso socialista sob o lema “chega de pobres num país tão rico”.

Intervalo para rememorar: o Peru já teve um governo estatizante na década de setenta, nada menos do que um ditador militar de esquerda, Juan Velasco Alvarado, um dos vários personagens peruanos que nem o realismo mágico dá conta de retratar. Catástrofes políticas ou pura e terminal incompetência são os problemas habituais no caminho de países como o Peru. Ou do Brasil, um formidável campeão de commodities que tem agora uma nova chance de dar um salto estrutural. Ou de cair no mesmo buraco que o último superciclo propiciou, o do populismo de esquerda à moda bolivariana.

Com ou sem governantes minimamente não imbecilizados, as commodities sobem. O Goldman Sachs previu um aumento de 14% nos próximos seis meses. Minério de ferro, o paládio que diminui emissões dos carros e madeira tiveram altas recorde. O petróleo pode chegar a 80 dólares o barril. Quem ainda se lembra que, quando começou a pandemia, ele entrou no vermelho porque os espaços de armazenamento estavam com capacidade esgotada?

É claro que, com os motores do mundo esquentando, dos Estados Unidos à China, a demanda pressiona os preços. O aumento de custos é repassado e tudo acaba redundando em inflação. “Os custos estão subindo, subindo, subindo. O aço sobe todo dia,” anotou Warren Buffet, o legendário investidor, falando como dono da maior construtora dos Estados Unidos. “Estamos vendo uma inflação substancial”.

O Brasil leva tanto o bônus quanto o ônus dessa nova fase das commodities.  Um dos bônus: a previsão de que este ano o país terá o primeiro superavit nas contas externas desde 2007. Dá até para sonhar em forjar na soja o milagre do pão para todos os brasileiros – mais o bife e o iogurte, todos propiciados pela mais valiosa das commodities: os empregos.  Com todas as suas maluquices, Pedro Castillo tem razão em dizer que um país rico não pode ter tantos pobres.

Vilma Gryzinsk - Blog Mundialista - VEJA 


quinta-feira, 29 de abril de 2021

Vale a pena usar trabalho escravo em nome da causa ambiental? - Vozes

Energia solar subsidiada pelo Reino Unido usa trabalho escravo da minoria muçulmana Uigur, na China.

Dois filmes mudaram minha vida recentemente. Confesso que fiquei revoltada quando My Octopus Teacher ganhou o Oscar de melhor documentário. Eu amava arroz de polvo, tinha ótimas lembranças de momentos importantes em que compartilhei arroz de polvo com pessoas amadas. Foi ver esse bendito desse filme que nunca mais comi polvo.

O outro filme é Seaspiracy, que fala das ONGs ambientais destinadas a diminuir o volume de plástico no mar. Se você também desconfia que usar aquele canudo de papel horroroso não salvará a humanidade e a terra, veja ontem. O ruim desse filme é que a gente sai desconfiado de todo mundo que posa de bonzinho. Eu costumava ter confiança absoluta em avós que usam capa em filtro de água, mas fui corrompida. Felizmente, o jornal britânico The Guardian fez algo mais útil com a desconfiança. O documentário Seaspiracy roda o mundo mas começa na Grã-Bretanha, onde mora o documentarista. Pouco a pouco, ele vai descobrindo que havia se engajado em uma série de campanhas completamente inócuas. Pior que isso, quem o atraiu para as campanhas sabia. Algumas vezes, a ONG era financiada por quem causava o problema que ela dizia combater. [no Brasil é a regra: os interessados na destruição do meio ambiente - especialmente responsabilizando o Brasil - bancam as Ong's vendidas (ironicamente formadas por brasileiros que buscam dinheiro fácil e sujo) = o preço padrão são as trinta moedas.]

Na onda da cúpula do clima, [pacífico que todos sabem  que essa 'cúpula do clima' está mais para cópula e com certeza não será a turma da Noruega (que f... o meio ambiente no Pará), da França e outros que serão os copulados - também pretender escapar de serem copulados os brasileiros que se venderam para as ONGs que querem nos copular.]  o jornal britânico The Guardian resolveu mergulhar nos programas de energia solar subsidiados pelo governo. A descoberta é perturbadora: 40% dos projetos subsidiados de fazendas com painéis solares usam produtos ligados a denúncias de trabalho escravo da minoria Uigur.  
Na semana passada, o Reino Unido declarou oficialmente que a China comete genocídio contra os uigures.

Placas solares são feitas de polissilício. Segundo um estudo aprofundado da consultoria norte-americana Horizon Advisory, especializada em geopolítica, 1/3 do suprimento mundial do material vem da província de Xinjiang, na China
É precisamente lá que ficam os campos de trabalhos forçados da minoria muçulmana uigur. 
O material indica que as empresas fabricantes do polissilício estão ligadas à exploração dessa população.

Não se trata apenas de ilação do jornal. O material que abasteceu 4 das 10 fazendas de painéis solares subsidiadas veio de 3 grandes empresas chinesas: Jinko Solar, JA Solar e Trina Solar. Todas elas são nominalmente citadas no documento que fundamentou a decisão do governo britânico de declarar a ocorrência de um genocídio de uigures pelo governo da China. A acusação também é da instituição de campos de trabalhos forçados para essa população desde 2016.

No meio corporativo, fala-se muito em ESG, a junção de governança corporativa, governança social e governança ambiental. Na verdade, não há como separar uma da outra. Painéis solares são indiscutivelmente uma excelente alternativa energética, mas tornam-se um problema gigantesco se tiverem a produção atrelada a trabalho escravo e genocídio. O desafio do governo britânico agora é ser coerente.

As empresas chinesas sabem quais são os parâmetros ocidentais para avaliar empresas e têm utilizado artifícios eficientes para conseguir vender para os britânicos. Operações são concentradas em outros países asiáticos e apenas o fornecimento da matéria-prima fica atrelado a Xinjiang, onde ficam os campos de trabalhos forçados. Executivos britânicos da área de energia solar admitem que a manobra traz um grau de complexidade enorme para avaliar a sustentabilidade da cadeia produtiva. Trabalho escravo é desumano e também insustentável, não contribui para melhorar o meio ambiente.

Os interesses das fábricas de polissilício em Xinjiang são defendidos pela "Xinjiang Production and Construction Corps". Não é um sindicato, é uma organização econômica e paramilitar. O governo dos Estados Unidos os acusa de envolvimento direto nos campos de trabalhos forçados. Estariam por trás da remoção dos uigures de suas casas para os campos e dos programas de "reeducação" promovidos pelo Partido Comunista Chinês. O relatório da Horizon Advisory, utilizado pelo governo norte-americano, conclui que toda a cadeia produtiva de placas solares está ligada a atrocidades de direitos humanos.
O soft power chinês é muito habilidoso ao lidar com a cultura ocidental. A questão ambiental há muito deixou de ser um objetivo concreto para se tornar um atributo qualitativo de pessoas e marcas. Placas solares são tão bem vistas que muitos preferem não procurar o que há por trás delas. Acabamos na situação bizarra em que o mesmo governo que condenou o genocídio dos uigures o patrocina. O que mais haveria embaixo do tapete das boas intenções?

A China tem uma cultura milenar, uma mentalidade comunista muito bem estabelecida e não pretende mudar sua forma de pensamento. Aliás, a intenção declarada é estabelecer a predominância mundial dessa forma de pensar. No mundo ocidental, a dignidade humana é inerente à condição humana e inegociável. Não é essa a visão do Partido Comunista Chinês. A dignidade humana é vinculada à aderência daquele ser humano às ideias e ordens do partido e seus dirigentes.

Há muitos grupos que funcionam dessa forma no mundo, mas nenhum que controle tantas pessoas ao mesmo tempo por tantos anos quanto o governo comunista da China. Essa continuidade inevitavelmente gera conflitos entre a individualidade, a cultura popular e a imposição de uma uniformidade ou submissão de ideias. A questão dos muçulmanos uigures tomou uma proporção internacional gigantesca nos últimos 5 anos. 
Outros grupos étnicos e religiosos também são perseguidos, mas o que tem sido feito com os muçulmanos uigures é cruel até para os padrões do governo chinês
São tirados de suas casas, despojados do que têm, separados das famílias, torturados, assassinados. 
Os campos de trabalhos forçados de uigures já se tornaram tão normais na vida chinesa que são parte importante da vida econômica de Xinjiang.

Reino Unido e Estados Unidos cobraram da ONU responsabilização do governo da China pelo genocídio da população Uigur. O Partido Comunista Chinês responde com narrativa: “A mentira mais absurda do século, um insulto e afronta ultrajante ao povo chinês e uma violação grosseira do direito internacional e das normas básicas que regem as relações internacionais”. Enquanto isso, o Reino Unido compra de fábricas que escravizam uigures e os políticos ocidentais estão aprendendo a responder acusações igualzinho aos chineses.

A política ocidental está cada vez mais lotada de gente que fala igualzinho ao Partido Comunista Chinês, alguns que o idolatram e outros que dizem odiá-lo. As iniciativas mais badaladas do bom mocismo ocidental estão sendo colocadas em xeque uma a uma, já que não tiveram uma preocupação global de governança, focaram no sucesso a qualquer custo e deixaram valores humanos em segundo lugar.  A era da hipercomunicação multiplicou exponencialmente os holofotes. É natural da alma humana a dificuldade para domar o próprio ego. Gostamos de nos imaginar bons, úteis, altruístas. Causas importantíssimas como a preservação do planeta acabaram virando produtos de consumo. Pouco importa o planeta, importa ser reconhecido como alguém que o defenda, nem que seja só da boca para fora. O pior da alma humana tem sido vendido como virtude. Para salvar o planeta, precisamos urgentemente resgatar nossos valores humanos.
 

Madeleine Lacsko, colunista - VOZES  - Gazeta do Povo


segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

A chefona da Europa queima largada na guerra das vacinas

Fiasco total: A racional e equilibrada Ursula von der Leyen tem que recuar de decisão intempestiva para “capturar” vacinas destinadas ao Reino Unido

[E os 'inimigos do Brasil' ainda cometem a suprema burrice de considerar o presidente Bolsonaro um estabanado. A propósito: a digna 'presidenta' da UE ainda teve a cara de pau de colocar desequipados soldados alemães para realizarem treinamento  conjunto usando cabos de vassouras como fuzis. Parece que a ojeriza aos militares não costuma ser acompanhada de inteligência, competência, bom senso.]

Pelo lado positivo, Ursula von der Leyen reconheceu rapidamente o tamanho do erro que estava sendo cometido sob sua gestão quando foi anunciado que a União Europeia bloquearia a exportação de vacinas da Pfizer feitas na Bélgica e destinadas ao Reino Unido. O lado negativo foi todo o resto. Tão escandalosamente negativo que surgiu até um certo clamor para que renunciasse pouco mais de um ano depois de assumir a presidência da Comissão Europeia, colocando uma boa dose de calma e equilíbrio no lugar da jocosidade algo excessiva de Jean-Claude Juncker.

Tendo presidido as iniciativas lentas e burocráticas da Comissão de Saúde para a aquisição de vacinas destinadas aos 27 países da União Europeia, Von der Leyen despertou para o tamanho da crise quando os dois grandes laboratórios que estão fornecendo o grosso das vacinas para os países desenvolvidos, Pfizer e AstraZeneca, tiveram problemas de produção. “A Europa está enfrentando um desastre em termos de vacina”, resumiu, algo dramaticamente, a revista Der Spiegel.

Para piorar, a Grã-Bretanha, recém-saída do bloco (num processo em que contou a racionalidade da alemã), está colhendo os frutos por ter sido mais ágil e mais rápida na aprovação e compra das vacinas. Pela narrativa dominante, deveria ser o contrário: os pérfidos ingleses amargariam no fim da fila, enquanto a nobre e solidária União Europeia dava um exemplo do valor do trabalho conjunto.

Vendo o tamanho da encrenca, os burocratas europeus resolveram agir. Foi aí que Ursula Von der Leyen fez o “gol contra” – metáfora futebolística usada por praticamente toda a grande imprensa europeia.  Recorrendo a um dispositivo reservado a grandes emergências, a presidente resolveu bloquear a entrada de vacinas no Reino Unido através da fronteira entre a República da Irlanda e a Irlanda do Norte.

Quem acompanhou as torturantes negociações para permitir a saída dos ingleses talvez se lembre que resolver a situação pós-Brexit essa fronteira foi um dos maiores problemas.  Pelo acordo de paz que encerrou a luta armada dos católicos na Irlanda do Norte, a linha divisória com os irmãos da república independente deve ser aberta ao livre trânsito de pessoas e mercadorias.  Para manter o status quo entre as duas partes da ilha irlandesa, uma remanescente na União Europeia e outra levada, de má vontade, ao Brexit, foram necessários vários e sofridamente negociados malabarismos regulatórios.

A decisão impensada, que durou apenas algumas horas, de Ursula von der Leyen, de interferir exatamente nesse ponto de alta sensibilidade, provocou o impossível: ingleses e irlandeses, normalmente cheios de animosidade mútua, reagiram furiosamente dos dois lados da fronteira. O governo de Boris Johnson não demorou a vazar que, em dois telefonemas “apimentados” com a presidente da Comissão Europeia, o primeiro-ministro disse que a intervenção nos contratos com a Pfizer, afetando o fornecimento de 3,5 milhões de doses de vacina, poderia ser diretamente responsabilizada pela morte de idosos que aguardavam a segunda dose da imunização.

Levar a culpa por matar avozinhos aposentados não é exatamente uma perspectiva promissora. A condenação à decisão atabalhoada da presidente da Comissão Europeia foi unânime entre os grandes jornais europeus, de esquerda ou de direita. Como uma pessoa com o nível de preparo de Ursula von der Leyen não percebeu as dimensões catastróficas de uma intervenção ditada pelo “nacionalismo supranacional”, em tudo oposta aos valores mais fundamentais da União Europeia?

Pertencer à casta da alta burocracia europeia, sem nunca ter precisado fazer algo tão banal como ganhar eleições, pode ter sido um dos fatores. Economista interrompida e médica, Ursula von der Leyen, é democrata-cristã, o partido de centro-direita de Angela Merkel, com quem está desde o primeiro dia de governo, tendo servido em vários ministérios.

Foi a primeira mulher a ser ministra da Defesa da Alemanha, com atuação criticada, principalmente depois que desequipados soldados do Exército alemão participaram de treinamentos conjuntos europeus com cabos de vassoura no lugar de fuzis, episódio de um ridículo doloroso. Nascida e criada na Bélgica, onde seu pai era funcionário do incipiente Mercado Comum Europeu, e com sete filhos já adultos, certamente um curso intensivo de administração de conflitos, Ursula von der Leyen parece talhada desde o berço para ocupar o topo das vasta burocracia da UE.

É justo culpá-la pela crise das vacinas, com um componente importante causado pelos laboratórios que não conseguem honrar as encomendas? “A Comissão foi pega totalmente de surpresa”, escreveu a Spiegel, geralmente alinhada mais com a centro-esquerda. “Frustração e indignação têm crescido através da UE. A Europa, uma das regiões mais ricas do mundo, está se mostrando incapaz de proteger seus cidadãos de uma doença mortal”.

A revista ouviu o secretário-geral da Social Democracia, Lars Klingbeil, que desceu o chicote: “Estou absolutamente chocado com a negligência de Ursula von der Leyen no comando do início da vacinação nos últimos meses”. Detalhe: os social-democratas fazem parte, no sistema de coalizão, do governo de Angela Merkel, a grande eleitora de von der Leyen para a Comissão Europeia. Pois são os social-democratas que estão pedindo a cabeça dela, em termos nada gentis. “Enquanto outros países, como a Grã-Bretanha, encomendavam grandes quantidades de vacinas meses antes, a UE sob o comando de Ursula von der Leyen fracassou em agir a tempo e depois se enrolou em cláusulas contratuais com companhias farmacêuticas”, fuzilou Jörg Meuthen, um dos líderes dos social-democratas.

“Ser responsável também significa assumir a responsabilidade. Isso é o que Frau von der Leyen deveria fazer agora. Ela causou muitos prejuízos não só à Alemanha, mas a toda a União Europeia”. Enquanto isso, os tabloides ingleses deitam e rolam com a oportunidade imperdível de espetar os alemães, em particular, e europeus, em geral. “Nossos vizinhos e amigos”, como diz Boris Johnson, cujos pecados estão sendo temporariamente perdoados, estão se dando mal. Schadenfreude, a alegria secreta sentida quando os próximos de ferram, nunca foi tão pouco secreta.

Blog MundialistaVilma Gryzinski, jornalista  - Revista VEJA