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sexta-feira, 23 de junho de 2023

Um homem sem preço - Augusto Nunes

 Revista Oeste

Sobral Pinto é uma espécie quase extinta na floresta infestada de zanins


Cristiano Zanin e o jurista Heráclito Fontoura Sobral Pinto | Foto: Montagem Revista Oeste/Geraldo Magela/Agência Senado/Wikimedia Commons
 
Dono da Tribuna da Imprensa, deputado federal pela UDN do Rio de Janeiro, tribuno de primeira grandeza, Carlos Lacerda nem esperou a abertura da temporada de caça ao voto para deixar claro, em meados de 1955, que a disputa pela Presidência da República seria especialmente feroz. Às vésperas da convenção do Partido Social Democrático que lançaria a candidatura de Juscelino Kubitschek, o parlamentar da União Democrática Nacional avisou que o governador de Minas Gerais estava proibido de governar o Brasil. “Juscelino não pode ser candidato”, começou a sequência de ameaças encadeadas pelo grande domador de palavras. “Se for candidato, não pode ser eleito. Se for eleito, não pode tomar posse. Se for empossado, não pode governar.” Decidido a provar que Deus o poupara do sentimento do medo, Juscelino foi à luta. Vitorioso na convenção, JK representou o PSD na eleição de 3 de outubro. Com 35,6% dos votos, derrotou por uma diferença superior a cinco pontos percentuais o Marechal Juarez Távora, candidato da UDN. 


 
Carlos Lacerda, em 1954 | Foto: Wikimedia Commons

O presidente eleito preparava-se para a posse quando Lacerda, apoiado por militares inconformados com a derrota do marechal Juarez, decidiu bloquear a porta de entrada do Palácio do Catete com uma invencionice de chicaneiro: só poderia governar o país o candidato que conseguisse a maioria absoluta dos votos. 
 Como JK não passara de 50%, deveria ser realizada outra eleição. Aquele pontapé na Constituição foi a senha para a entrada em cena do doutor Heráclito Fontoura Sobral Pinto, o maior advogado da história do Brasil. O desconforto com certas ideias do candidato do PSD mantivera o combativo mineiro de Barbacena distante da campanha. Mas compreendeu que o disparo contra Juscelino ferira a Constituição. 
Era hora, portanto, de garantir a posse do presidente eleito. Ao lado de juristas providos de vergonha, Sobral fundou a Liga de Defesa da Legalidade. Mais brasileiros se juntaram à ofensiva, a investida lacerdista perdeu força, e Juscelino assumiu a Presidência sem sobressaltos.

Pouco depois da posse, o presidente ofereceu a Sobral uma vaga no Supremo Tribunal Federal. Nenhuma surpresa. Era exemplarmente ilibada a reputação do doutor que também merecia nota 10 com louvor no quesito “notável saber jurídico”.  
Além do mais, a presença de um jurista de tamanho porte poderia tornar respiráveis até mesmo tribunais que lutam o tempo todo para demonstrar que o que já está péssimo sempre pode piorar
Sobral Pinto recusou a toga. De novo, nenhuma surpresa.  
Ao agradecimento de praxe seguiu-se a ponderação: tanto inimigos juramentados quanto aliados preteridos logo estariam enxergando na nomeação parte do pagamento pelo desempenho na batalha que havia abortado outro estupro da Constituição
Foi essencialmente para preservar a legalidade que se aliara a JK. Sobral tinha pela obediência às normas constitucionais o mesmo apreço dedicado a palavras de tal forma robustas que dispensam complementos. 
Sobral Pinto, um dos mais respeitados juristas do país | Foto: Wikimedia Commons

O que estaria dizendo o esplêndido homem defensor da lei se vivesse para ver estes tempos estranhos?


Admiradores de regimes ditatoriais amam penduricalhos inúteis, constatou Sobral. “Eles vivem sonhando com uma democracia à brasileira”, ironizava. “Isso não existe. O que existe é peru à brasileira.”  
O amor à Justiça também orientava a aceitação de clientes. “O advogado é o primeiro juiz da causa”, ensinou. Agarrado a esse princípio, jamais tentou transformar culpados em inocentes, jamais recorreu a vigarices de rábula para livrar do castigo quem merecia cadeia
Antes de assumir a defesa de qualquer acusado ou já cumprindo pena, tratava de saber o que efetivamente ocorrera ou o que se passava no cárcere. Porque a causa não lhe pareceu defensável, recusou honorários de espantar um emir das arábias e rechaçou com frequência pedidos formulados por amigos. Católico praticante, radicalmente democrata, era avesso a golpes de Estado e tentativas de tomada do poder por métodos violentos. Mas socorreu com bravura de gladiador sem cobrar um só centavo — o líder comunista Luís Carlos Prestes e o ativista alemão Harry Berger, presos depois da fracassada revolta comunista
Para interromper a sequência de torturas impostas a Berger por seus carcereiros, recorreu à lei de proteção aos animais. O prisioneiro já perdera a saúde e a razão. [saúde talvez; razão não perdeu, não se perde o que não se possui e, para ser comunista tem que ser desprovido de razão.]

O que estaria dizendo o esplêndido homem defensor da lei se vivesse para ver estes tempos estranhos?  
O presidente da República entrega a Alexandre de Moraes o leme do barco à deriva para ver como é, visto de longe, o país que visita uma vez por mês, presenteia a primeiríssima-dama com 12 passeios internacionais por ano, não decorou o prenome de 23 dos 37 ministros, fecha negócio com integrantes de outros Poderes em churrascos e jantares que proíbem o ingresso com celulares, insulta o antecessor de meia em meia hora, rebaixa o vice, Geraldo Alckmin, a porteiro do Gabinete Presidencial, exige que um ministro comunista emagreça uma arroba em sete dias, desanda em lives sem plateia às 8 da madrugada, diz ao Papa que Daniel Ortega agora frequenta reuniões dos Poderosos Pedófilos, traz Maduro a Brasília e manda Dilma para a China, fora o resto. 
Por que negar uma toga ao advogado que fez o durão Gilmar Mendes sucumbir ao pranto convulsivo sem lágrimas? 
 
Morto em 1991, aos 98 anos, não poderia ser outro o título do documentário que resume a trajetória luminosa do singularíssimo mineiro de Barbacena: O HOMEM QUE NÃO TEM PREÇO.  
Quantos mais não estão à venda?, pergunto-me na semana da sagração de Cristiano Zanin. 
Em maio de 1969, ao visitar seu escritório no Rio para entregar-lhe um livro, enfim pude apertar a mão daquele homem de terno e colete pretos como a gravata, as meias e os sapatos, em harmonioso convívio com o branco da camisa social e dos cabelos nevados. Vestia-se sempre assim. E assim se trajava a lenda em 1983, quando empunhou o microfone no palanque do mitológico comício da Candelária. Foi o mais comovente momento da campanha das Diretas Já. “Peço silêncio”, disse Sobral antes de começar a leitura do artigo primeiro da Constituição: “Todo o poder emana do povo, e em seu nome deve ser exercido…”.  
O uivo da multidão completou sem palavras a frase esquecida em algum lugar do passado.

Sobral Pinto, avô de Guilherme Fiuza, combinou honradez e destemor para protagonizar por quase cem anos de vida o espetáculo da bravura sem bravatas. Essa espécie de brasileiro é tão rara quanto a ararinha-azul. Numa floresta infestada de zanins, talvez já esteja extinta.

Leia também “O ministro sem dúvidas e o país das incertezas”
 
 
Augusto Nunes, colunista - Revista Oeste

sexta-feira, 28 de janeiro de 2022

Doutor em cinismo - Augusto Nunes

 Revista Oeste

Advogado de bandidos irrecuperáveis ganha o prêmio reservado à frase mais cretina da década


Antônio Mariz | Foto: Divulgação/ Estadão Conteúdo
Antônio Mariz | Foto: Divulgação/ Estadão Conteúdo
 
Por ser amigo do presidente da República, o advogado Heráclito Fontoura Sobral Pinto recusou a vaga no Supremo Tribunal Federal que Juscelino Kubitschek lhe ofereceu no primeiro ano de mandato conquistado nas urnas. Contestada pela feroz oposição liderada por Carlos Lacerda, a vitória de JK em outubro de 1955 foi assegurada também pela mobilização de Sobral Pinto e outros juristas que, em defesa da Constituição e da vontade popular, destroçaram as vigarices urdidas por chicaneiros a serviço dos golpistas. Ao justificar a recusa, o convidado ponderou que a indicação para o STF poderia ser interpretada como um agradecimento do presidente, que havia apoiado “em defesa da legalidade presente, não em busca de favores futuros”.

Por ser amigo do presidente da República, o advogado Antônio Claudio Mariz de Oliveira mandou encomendar o terno azul-Brasília quando o impeachment de Dilma Rousseff era apenas um brilho nos olhos de Marcela Temer. Enquanto ganhava força o movimento que afastou o poste fabricado por Lula do gabinete que desonrou, Mariz caprichava na pose de ministro (da Justiça, de preferência, mas até da Eucaristia se “o Michel”, como se referia ao futuro presidente, topasse incluir a segunda alternativa no primeiro escalão federal). Três vezes preterido, acompanhou pelos jornais a passagem pelo ministério de Alexandre de Moraes, Osmar Serraglio e Torquato Jardim. Mas o sonho continua, sugere o que anda fazendo para tornar-se amigo de infância de Lula.

A última proeza de Mariz foi encerrar, em 27 de dezembro de 2021, o concurso instituído para premiar a frase mais imbecil da década. Os anos 20 estão em seu começo, mas nenhuma sumidade do ramo conseguirá ultrapassar a marca estabelecida, com apenas nove palavras, por esse colosso do Prerrogativas ajuntamento de bacharéis em direito que enxergam uma Madre Tereza de Calcutá no mais medonho serial killer de filme americano.  
O surto de cretinice já foi desmoralizado pelo ótimo Caio Coppolla em seu artigo de estreia nesta Oeste. Mas o vídeo que documenta o momento histórico irrompeu na internet quando eu estava longe, e peço licença para revisitar a noite do espanto.

Lula chefiou o maior esquema corrupto de todos os tempos. Mas a roubalheira estava consumada, o que que adiantou punir?

O rosto afogueado, o olhar de quem flutua sobre nuvens gloriosamente azuis, as pausas impostas pela busca exasperante da palavra certa — não faltaram sinais de que o orador cruzara a fronteira além da qual são permitidas quaisquer obscenidades retóricas. O ator Humphrey Bogart dizia que a humanidade está três doses abaixo do normal. 
 Não se sabe quantos mililitros foram necessários para que Mariz desandasse no surreal: “O crime já aconteceu. O que que adianta punir?”. 
 
Enfim abrira o coração o ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, a referência imoral do Prerrogativas, o eterno candidato a ministro de qualquer coisa e, desde aquele momento, o autor da mais cretina frase da década. Bandido é coisa que Mariz conhece como poucos viventes. É respeitado por todos os corruptos da classe executiva pelo desempenho na guerra suja movida contra a Operação Lava Jato. Mas craque genuíno joga nas onze. Enquanto lidava com empreiteiros gatunos e assaltantes fantasiados de executivos, encontrou tempo para canonizar os assassinos Suzane von Richthofen e Antônio Pimenta Neves. 
A discurseira no jantar em homenagem a Lula foi uma declaração de amor à ladroagem vip. 
Mas seu trecho mais pornográfico resume uma tese que se estende a todas as ramificações da grande tribo dos fora da lei: se a norma legal já foi atropelada, castigar o atropelador é perda de tempo, mania de gente perversa.
 
Suzane, por exemplo, planejou a morte do pai e da mãe, que supervisionou acomodada num sofá da sala de visitas
A condenação da parricida vai acaso ressuscitar o casal? Não, não vai. Portanto, instalar numa cela essa jovem órfã é pura maldade. 
Sim, Pimenta Neves executou a ex-namorada com um tiro nas costas e outro na cabeça. 
Mas o que tira o sono de Mariz é a curtíssima temporada na cadeia do cliente que manteve em liberdade por dez anos recorrendo a rabulices de constranger o mais desinibido 171. 
Aos olhos do doutor, contudo, ninguém merece mais afagos do que a vitima da maior iniquidade produzida pela Justiça desde o surgimento do primeiro tribunal. 
Quando Lula foi para o xilindró, a Petrobras já fora saqueada (até havia recebido de volta algumas fatias do imenso produto do roubo). 
Os empreiteiros tinham embolsado o naco que lhes cabia, alguns até dormiram longas noites na prisão. 
Sim, Lula chefiou o maior esquema corrupto de todos os tempos. 
Mas a roubalheira estava consumada, o ex-presidente da República já fora deposto do comando da quadrilha pelos cruéis integrantes da Lava Jato. 
O crime já acontecera. O que que adiantou punir?

As nove palavras compõem mais que uma frase irretocavelmente cretina. Resumem uma tese grávida de originalidade, que pode desdobrar-se na mais revolucionária proposta do programa de governo do PT no campo da Justiça. 

Até agora, a menos que tenha sido capturado pela imaginação do ministro Alexandre de Moraes, nenhum brasileiro pode ser preso antes de cometer um crime. Mariz foi muito mais longe: se for assentado por Lula no Ministério da Justiça, e montar sua equipe com as sumidades do Prerrogativas (Prerrô, para os pais fundadores), não será preso mesmo alguém que resolver metralhar às 3 da tarde aquela multidão que circula pelas calçadas da Avenida Paulista e, em seguida, sentar-se no meio-fio para consumir em paz um saquinho de pipoca. 

Por falta de punidos, a população carcerária deixará de existir. Por se tornarem desnecessárias, as cadeias serão demolidas e os terrenos vazios, fraternalmente repartidos pelo MST e pelo MTST. O único problema é que o fim do risco de cadeia provocará o sumiço da freguesia que garante a sobrevivência dos milhares de advogados que ganham a vida tentando provar que todo culpado é inocente — e que não há pecadores no País do Carnaval.

Finalmente ministro, Mariz saberia o que fazer para poupar a categoria profissional do fantasma do desemprego. A frase campeã informa que não lhe faltam ousadia e criatividade. Some-se a isso o buquê de prerrogativas com cara de salvo-conduto e tudo estará pronto para a disseminação de cursos de reciclagem profissional. Instaladas nas sedes e subsedes da entidade, as escolinhas da OAB transformariam bacharéis desempregados em doutores na prática de crimes sem remorso, sem sustos e sem perigo de cadeia.

Leia também “A esperança venceu a vergonha”

Augusto Nunes, colunista - Revista Oeste


quinta-feira, 30 de abril de 2020

Dos meios e dos fins - Nas entrelinhas


“No Estado de direito democrático, uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) não se discute, cumpre-se. Quando isso não acontece, é um mau agouro


O presidente Jair Bolsonaro vive num mundo só dele, que não é bem o país que governa. É difícil fechar um diagnóstico sobre as razões, mas é possível identificar os sintomas de que idealizou uma agenda, um governo e um Estado centralizador e agora se vê diante de uma realidade muito diferente daquela que imaginava. Primeiro, a agenda do país não é a sua, focada nos costumes e nos interesses imediatos de sua base eleitoral. [a agenda que o presidente Bolsonaro tentou seguir e não permitiram, é compatível com o desejo de quase 60.000.000 de eleitores.] Já lidava com dificuldades na economia quando a pandemia de coronavírus virou tudo de pernas para o ar.

Todas as suas prioridades foram alteradas. Ninguém sabe exatamente quando e como voltaremos à normalidade, mas sua insistência em antecipar esse processo de retomada da economia, num momento de aceleração da epidemia, vem se revelando um desastre do ponto de vista da saúde pública. É como aquele sujeito que erra de conceito: seus bons atributos, como iniciativa, coragem, combatividade, criatividade, força etc. só servem para aumentar o tamanho do desastre. A agenda do país é epidemia, epidemia e epidemia, pelo menos nas próximas duas semanas.

Também idealizou um governo no qual seu poder seria absoluto, como vértice do sistema. Está descobrindo que não é assim que funciona. Na democracia, há uma tensão permanente entre os que governam e a burocracia de carreira, responsável pela legitimidade dos meios empregados na ação político-administrativa. A ética das convicções, que motiva os políticos, não basta; ela é limitada pela máquina do governo, que foi organizada, treinada e instrumentalizada para observar as leis antes de agir, ou seja, zelar pela ética da responsabilidade. Bolsonaro não consegue lidar com isso. Em todas as frentes, tenta atropelar, substituir ou desmoralizar os que não aceitam decisões que são equivocadas tecnicamente e/ou contrariam a boa política e o interesse público.

Bolsonaro também tem dificuldade de lidar com os mecanismos de freios e contrapesos do Estado democrático de direito. Ontem, levou uma invertida do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, que sustou a nomeação do novo-diretor da Polícia Federal, Alexandre Ramagem, por desvio de finalidade. Diante da decisão, revogou a nomeação para mantê-lo à frente da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), o que gerou uma situação de perda de objeto da ação do mandado de segurança acolhido por Moraes. Foi por essa razão que a Advocacia-geral da União desistiu de recorrer ao plenário do Supremo.
[O ato que nomeava André Mendonça e Alexandre Ramagem, foi suspenso na parte que cuidava da nomeação do Ramagem por ato do ministro do STF, Alexandre de Moraes.
Na sequência, o presidente Bolsonaro torna sem efeito, via decreto, a nomeação de Ramagem e com isso a ação no STF perde o objeto.
Pergunta que não quer calar: o que impede agora que Alexandre Ramagem seja nomeado, via Decreto, para o cargo de Diretor-Geral da PF?]

Mesmo assim, Bolsonaro não caiu na real de que a Polícia Federal (PF) é técnica e judiciária, em cujas investigações não pode interferir. Ontem, após a decisão do ministro do STF, mesmo assim, Bolsonaro disse que pretende recorrer da decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e voltar a nomear Alexandre Ramagem como diretor-geral da Polícia Federal. “Eu quero o Ramagem lá. É uma ingerência, né? Vamos fazer tudo para o Ramagem. Se não for, vai chegar a hora dele, e vamos colocar outra pessoa”, declarou. Questionado sobre o posicionamento da AGU, disse que recorrer é um “dever do órgão”. E disparou: “Quem manda sou eu”. Se isso ocorrer, é muito provável que haja uma decisão unânime do STF contra a nomeação.

Recado claro
O que houve, ontem, foi um recado do Supremo Tribunal Federal (STF) de que o sistema de freios e contrapesos da Constituição de 1988 está funcionando e que o Supremo ainda exerce o papel de Poder Moderador, em decorrência do fato de que cabe àquela Corte dar a palavra final em matéria constitucional. Como o STF é um poder desarmado, Bolsonaro provavelmente não se conforma muito com isso. Afinal, historicamente, esse papel foi exercido pelos militares, tanto na República Velha quanto na Segunda República. E seu governo tem mais generais do que qualquer outro no primeiro e no segundo escalões, mesmo comparado aos do regime militar. Quando diz que ainda vai nomear o Ramagem para o cargo de diretor-geral, Bolsonaro desnuda sua inconformidade, nos dois sentidos.


No Estado de direito democrático, uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) não se discute, cumpre-se. Quando isso não acontece, é um mau agouro. No governo Castello Branco, ou seja, após o golpe militar de 1964, o primeiro conflito sério com o Supremo ocorreu em 19 de abril de 1965. A Corte concedeu um pedido de habeas corpus impetrado pelo famoso jurista Sobral Pinto, católico e liberal, em favor do ex-governador de Pernambuco Miguel Arraes, que estava preso na ilha de Fernando de Noronha, na costa daquele estado, desde a deposição do presidente João Goulart. Dias antes, o coronel Ferdinando de Carvalho, já prevendo a decisão, havia transferido o político pernambucano para a Fortaleza de Santa Cruz, em Niterói (RJ).

O chefe do estado-maior do Exército, general Édson de Figueiredo, recusou-se a cumprir a decisão. O presidente do STF não teve outra alternativa a não ser mandar prendê-lo, o que provocou uma crise, somente debelada devido à intervenção pessoal de Castello, que chamou o magistrado e o general para uma conversa a três. Nesse meio tempo, um grupo de militares da chamada “linha-dura”, liderado pelo coronel Osneli Martinelli, sequestrou Arraes e levou-o para um quartel da Polícia do Exército. Foi preciso que Castello interviesse novamente, mandando soltá-lo. Arraes, que não era bobo, vendo que havia em marcha um golpe dentro do golpe, liderado pelo ministro da Guerra, o general Costa e Silva, tratou de pedir asilo na embaixada da Argélia. Era o começo de um processo que desaguou no Ato Institucional No. 5, em 13 de dezembro de 1968, mas isso isso já é outra história.


Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense


domingo, 1 de dezembro de 2019

Uma patrulha selvagem contra a Bishop - Elio Gaspari

As críticas à escolha de Elizabeth Bishop evitaram a discussão de sua poesia

Onda de intransigência envenena a Feira Literária Internacional de Paraty

O sujeito soube que a poeta americana Elizabeth Bishop seria homenageada pela Flip do ano que vem e temeu pelo início de mais um debate indigente. Festejar uma lésbica e alcoólatra seria um prato feito para o ministro Abraham Weintraub. Eis que o pedagogo bolsonarista ficou calado, e a escolha de Elizabeth Bishop foi condenada com outras críticas selvagens. Como um bolsonarismo de sinal trocado, essa intransigência malversa a História, tentando mudar o resultado de um jogo no replay. 

As críticas à escolha de Bishop evitaram a discussão de sua poesia e centraram-se em três pontos. Ela viveu no Brasil por mais de dez anos, mas olhava para a terra de forma condescendente, menosprezando seus literatos (falou mal de Manuel Bandeira). No pior dos pecados, em 1964, apoiou a deposição do presidente João Goulart.  
[convenhamos que qualidades não sobram na Bishop, enquanto os defeitos abundam;
mas, o simples fato de ter apoiado o Movimento Revolucionário de 1964, já é bastante para  permitir que alguns dos seus inúmeros defeitos sejam ignorados.

Uma atualização que se impõe: a menção na matéria de que a polícia do Rio  matou, este ano, 1.546 pessoas.
Deixa a impressão que foram execuções, quando na realidade as mortes ocorreram em operações policiais, principalmente contra o tráfico, não houve execuções.
Alguns casos de mortes por balas perdidas são e sempre serão tristes e lamentáveis, e o pior, é que sempre quando noticiados é dado um destaque de forma a parecer que as balas perdidas foram sempre da polícia.

Foram situações de confrontos que, infelizmente, causaram mortes de inocentes, mas, os disparos causadores em sua maior parte foram proveniente das armas do bandidos.
Aliás, é voz corrente, que muitas das balas perdidas que resultam em mortes, não foram perdidas e sim disparadas por bandidos tendo como alvo  civis inocentes, incluindo crianças, para indispor a população  contra a polícia e as operações policiais.]

Bishop não olhou para o Brasil como o francês Claude Lévi-Strauss, que passou por aqui nos anos 1930. Ela era poeta e ele, antropólogo. As opiniões de Bishop foram expostas em cartas, enquanto Lévi-Strauss ponderou suas ideias no livro “Tristes trópicos”. Ela disse que toda a poesia latino-americana cabia num poema de Dylan Thomas. Exagerou, mas Lévi-Strauss traçou um retrato fiel e devastador da elite cultural brasileira. Livrou Euclides da Cunha e Heitor Villa-Lobos. 

O caroço das críticas a Elizabeth Bishop esteve no seu apoio à deposição de Goulart: “Foi uma revolução rápida e bonita, debaixo de chuva — tudo terminado em menos de 48 horas”. Bonita não foi, mas naqueles dois dias morreram sete brasileiros. (Neste ano a polícia do Rio matou 1.546 pessoas.) 

Bishop era uma americana elitista e liberal. No Brasil, era também amiga de Carlos Lacerda. Em 1964 ele governava o Rio e era um feroz adversário de Goulart. Lacerda foi o melhor administrador que a cidade teve, nada a ver com o político acuado e decadente de seus últimos anos. A poeta era companheira de Lota de Macedo Soares, amiga do “Corvo” e criadora da maravilha do Aterro do Flamengo. 

Em 1963, liberais como Arthur Schlesinger Jr. e Richard Goodwin, assessores do presidente John Kennedy, defendiam a alternativa de um golpe contra Goulart. Um ano depois, quando ele foi derrubado, o “New York Times” disse, num editorial, que não lamentava a queda de um governante “tão incompetente e irresponsável”. (Muito provavelmente essa peça foi escrita por Herbert Matthews, o jornalista que ajudou a criar o mito do guerrilheiro Fidel Castro.) 

Em Pindorama também havia liberais contra Jango. Para ficar num só exemplo, o advogado Sobral Pinto, que tanto fez pela liberdade do brasileiros, disse, em janeiro de 1964, que “começou ontem, sob proteção abusiva e violenta de tropas do Exército (...), a revolução bolchevique brasileira (...) Não existe mais, nesta hora, no país, nem lei nem autoridade pública”. (Ele condenava a proteção dada pelos militares a estudantes que haviam invadido uma faculdade, hostilizando Lacerda.) 


(....)

A caça ao AI-5
Há um mistério no processo de criação do partido dos Bolsonaro. Até os mármores do Tribunal Superior Eleitoral sabem que o partido não poderá ser criado neste ano, nem no próximo. Admar Gonzaga, o advogado dos Bolsonaro, é um veterano conhecedor do tribunal, onde foi ministro.
Fica a suspeita de que se esteja criando um clima de conflito com o Judiciário.

(.....)

MATÉRIA COMPLETA Folha de S. Paulo e O Globo - Elio Gaspari, colunista

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

De Manchinha@auau para Todo Mundo

Se a PM tivesse matado 13 mastins, talvez o governador Witzel fosse mais caridoso

[entre mastins e bandidos, que morram os bandidos - quando os primeiros bandidos forem abatidos, as coisas vão começar a mudar e para melhor.]

Sou a cadela Manchinha, que um segurança de supermercado matou em Osasco, em dezembro passado. Fiquei comovida com a comoção criada pelo meu caso e sugeri que vocês continuassem a reclamar quando os bichos fossem maltratados, mas pedi que cuidassem melhor dos bípedes. Escrevi o seguinte: "Vira e mexe, vocês leem que agentes da segurança pública entraram em bairros de pessoas pobres, confrontaram-se com bandidos e mataram 'suspeitos'. Nossa inteligência canina não entende o que seria um 'suspeito'. De quê? Em casos extremos, dois 'suspeitos' de portar armas foram abatidos. Um carregava uma furadeira e o outro, um guarda-chuva."
Outro dia, a PM do Rio matou 13 pessoas ("suspeitos", claro) e o governador Wilson Witzel disse que foi "uma ação legítima da polícia para combater narcoterroristas". Palavra de cachorro não vale nada, mas meus pares que andam pelo morros do Rio argumentaram que, mesmo que estivessem metidos com drogas, não é assim que funciona a Justiça dos bípedes. Quadrúpedes, vocês sabem, só atacam quando estão com fome, mas vocês nos chamam de irracionais. Irracionais são vocês. Vejam o caso do garoto Pedro Henrique Gonzaga. Era consumidor de drogas, mas acho que o doutor Witzel não o chamaria de "narcoterrorista". Teve um surto e encrencou-se com um segurança do supermercado Extra. [o agora chamado garoto era viciado em drogas - são os viciados, os noiados, os chamados usuários, que sustentam o tráfico de drogas - sem usuário não há consumo, não há demanda, o tráfico perde o sentido.
Os usuários precisam ser punidos com severidade de forma a desestimular o consumo e, consequentemente, o tráfico.] Tomou um mata-leão e foi estrangulado durante quatro minutos, diante de dezenas de pessoas e de pelo menos outro segurança. Sua mãe pedia para que saísse de cima do rapaz, pois ele estava dominado e tomou um "cala a boca, puta". Pedro Henrique morreu.

O segurança que me espancou talvez não quisesse me matar. Além disso, a cena da violência que sofri foi muito mais rápida. O bípede que estrangulou Pedro Henrique e chamou a mãe dele de "puta" teve impávida assistência. Garanto que se ele estivesse fazendo a mesma coisa com um cachorro a reação da plateia seria mais solidária. Se a PM tivesse matado 13 mastins, talvez o governador Witzel fosse mais caridoso. Os doutores do Extra disseram que "uma investigação interna constatou de forma inicial que se tratou de uma reação a uma tentativa de furto a arma de fogo de um dos seguranças". Patranha. Isso teria acontecido depois do início do incidente, quando Pedro Henrique já estava no chão. A repórter Ana Carolina Raimundi mostrou que a polícia ainda não comprou essa história.
Ela mostrou mais: o segurança Davi Amâncio era um condenado da Justiça. Tendo espancado uma companheira, em 2017, foi sentenciado a três meses de prisão em regime aberto. Um advogado da Group Protection, empresa terceirizada para garantir a segurança do supermercado, disse que a atribuição de checar a ficha criminal dos seguranças é da Polícia Federal. Tudo bem, e nós os quadrúpedes é que somos irracionais. Daqui do meu canil fiquei sabendo que o ministro Sergio Moro brindou os brasileiros com um pacote de medidas contra o crime. Tomara que dê certo, mas a cachorrada sabe que os bípedes latem à maneira deles e que ministro não morde.
No parque onde nós passeamos, vem com frequência um senhor meio rabugento, sempre vestido num terno preto. Dizem que é advogado e se chama Sobral Pinto. Durante o Estado Novo ele pediu que um preso político tivesse seus direitos respeitados de acordo com a lei de proteção aos animais. [tratar bem a bandido, seja um político bandido tipo Lula, ou um traficante, usuário, é deixar espaço para que o crime aumente;
é preciso valer a regra: bandido bom é bandido morto.
O segur]
Vai aqui um pedido ao ministro Moro. Amplie o seu pacote anticrime com um dispositivo:
"Ficam estendidos aos bípedes os direitos que a lei confere aos animais."
Grrrrrrr
Manchinha
Elio Gaspari, jornalista
 

 
 

quarta-feira, 18 de abril de 2018

Lula foi condenado à pena de reclusão - regime fechado - e não pode ficar recebendo visitas e vomitando bazófia

Senadores chamam cela de Lula de 'masmorra' e 'solitária'

[Renan Calheiros está preocupado é como será acomodado quando for preso; ele sabe que é questão de tempo ser condenado nos inúmeros processos a que responde.

Se deixar por conta dos senadores petistas logo eles vão querer instalar uma piscina na cadeia em que Lula está recolhido para instalar pedalinhos - serão usados os do sítio de Atibaia que vai render alguns anos a mais de cadeia para o condenado Lula.]

Renan Calheiros mencionou episódio do Estado Novo para criticar prisão 


Senadores criticaram, nesta quarta-feira, a cela em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está preso na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba. O local foi classificados pelos parlamentares como "solitária" e "masmorra". Eles reclamaram ainda da juíza Carolina Lebbos, que tem negado autorização para visitas ao ex-presidente Lula fora das regras previstas na Lei de Execuções Penais. [Lula está preso, cumprindo uma pena estando sujeito à Lei de Execuções Penais e a juíza Carolina Lesbos tem o DEVER de aplicar referida Lei a qualquer condenado.]
 
Renan Calheiros (PMDB-AL) chegou a dizer, em discurso no plenário no Senado, que talvez seja necessário recorrer a Lei de Proteção dos Animais, como fez o advogado Sobral Pinto no Estado Novo (1937-1945).  Na terça-feira, um grupo de senadores, integrantes da Comissão de Direitos Humanos, encontrou Lula. Um deles, o líder da minoria, Humberto Costa (PT-PE), disse na tribuna que eles constataram que a inspeção foi bem sucedida. Mas afirmou que Lula está sofrendo com o isolamento e a proibição das visitas.  — Ele está em instalações adequadas e está sendo bem tratado. No entanto, constatamos a condição de isolamento, praticamente de confinamento numa solitária. E essa condição é absolutamente degradante a uma pessoa que sempre teve a sua vida pautada pelo diálogo, pela conversa. Está em situação de confinamento, como eu disse, numa espécie de solitária, a qual só têm acesso seus advogados e, uma vez por semana, seus familiares — protestou Humberto Costa. [senador, apesar de petista o senhor deve saber que pena de reclusão implica no isolamento do preso - agora o senhor poderia apresentar um projeto para Lula cumprir pena em uma das galerias do presídio Aníbal Bruno, em Pernambuco, lá ele teria a companhia de uns vinte presos em cada cela - não sentiria solidão e teria abundância de calor humano.]
 
Roberto Requião (PMDB-PR) reclamou contra a decisão da juíza de não permitir as visitas de senadores que não faziam parte da delegação da Comissão de Direitos Humanos . — Eis que, de repente, não mais que de repente, a juíza de execuções, num despacho, uma espécie de uma sentença, em tom de discurso, proíbe alguns Senadores de fazerem uma visita ao ex-presidente Lula pela Comissão de Direitos Humanos, e me inclui nessa proibição: "Senador Roberto Requião não faz parte da Comissão e não pode fazer a visita". Materialmente eu não poderia, porque não estava no Paraná e não pedi para fazer a visita. Fiquei afrontado com a publicidade dada à sua medida — reclamou Requião no plenário, seguido por outros senadores lulistas na mesma reclamação.

Em seu discurso, Renan Calheiros disse que o Senado é um todo, não é uma comissão. E o que precisa ser discutido não são as condições da prisão do Lula, mas saber é se a prisão é legal ou ilegal, constitucional ou inconstitucional.  — A condição da masmorra é consequência do descumprimento da ordem constitucional. O fundamental é sabermos agora se alguém ou alguns poucos podem se colocar acima da lei maior do País, se o Supremo Tribunal Federal vai ou não garantir a Constituição. Depois, se for o caso, pede-se para que façam com Lula o que Sobral Pinto fez no Estado Novo com Graciliano Ramos e evoque-se a Lei de Proteção dos Animais. Fora disso, é contabilizar os danos às garantias individuais e coletivas, é transformar as eleições de 2018 em Constituinte e aprovarmos uma nova ordem constitucional para o Brasil — discursou Renan. 

Renan se referia a um episódio em que o jurista Sobral Pinto, defensor de comunistas presos no Estado Novo, para garantir a visita negada um advogado americano ao preso alemão Harry Berger, em seu requerimento invocou a Lei de Proteção aos Animais para acabar com os maus tratos denunciados ao preso. Com tal requerimento, sustentado pela Lei de Proteção aos Animais, Sobral Pinto teria conseguido melhorar as condições carcerárias do alemão preso. [esse criminoso alemão, comunista e cúmplice do comunista Luís Carlos Prestes e da alemã terrorista e também comunista Olga Benário Prestes, foi preso e o jurista Sobral Pinto considerava que submeter o prisioneiro a interrogatórios era torturá-lo.

Apesar do grande respeito que Sobral Pinto merece, ele estava equivocado. O comunista alemão apenas tinha que ser interrogado para fornecer informações que permitissem desbaratar a quadrilha comunista comandada por Prestes e que pretendia transformar o Brasil em satélite da extinta União Soviética.
O interrogatório também buscava obter informações para possibilitar a prisão do próprio Prestes.]

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