A empreiteira e o amigão de Lula
Documento do BC comprova que José Carlos Bumlai contraiu um empréstimo irregular de R$ 12 milhões junto ao banco da construtora Schahin. Em troca, a empreiteira ganhou contratos com a Petrobras. Parte do dinheiro teria sido usada para comprar o silêncio
SURGE A PROVA
Amigo de Lula, o empresário José Carlos Bumlai sempre negou
o empréstimo de R$ 12 milhões confirmado agora por documentos
do Banco Central (abaixo) obtidos por ISTOÉ
Amigo de Lula, o empresário José Carlos Bumlai sempre negou
o empréstimo de R$ 12 milhões confirmado agora por documentos
do Banco Central (abaixo) obtidos por ISTOÉ
Segundo Valério, Ronan ameaçou envolver o ex-presidente Lula, e os ex-ministros José Dirceu e Gilberto Carvalho no assassinato do então prefeito de Santo André Celso Daniel. Valério tentava um acordo de delação premiada e disse ainda que, como contrapartida ao empréstimo a Bumlai, a Schahin foi recompensada com contratos bilionários de arrendamento de sondas para a Petrobras. Os contratos estão na mira da Operação Lava Jato, que incluiu a Schahin no inquérito aberto para apurar o esquema de pagamento de propina e desvios na Petrobras, conforme antecipou ISTOÉ em sua última edição.
No documento do BC, datado de 7 de agosto
de 2008, Bumlai aparece numa lista de 24 devedores do Banco Schahin
beneficiados com empréstimos concedidos de forma irregular, “sem a
utilização de critérios consistentes e verificáveis”. Para liberar a
bolada, o Banco Schahin burlou normas e incorreu em seis tipos de
infrações diferentes.
NEBULOSO
Até hoje o assassinato do então prefeito de Santo André Celso Daniel (PT),
ocorrido em 2002, está envolto em mistério. No ano passado, o processo,
que estava no STF, foi anulado desde a fase dos interrogatórios
Até hoje o assassinato do então prefeito de Santo André Celso Daniel (PT),
ocorrido em 2002, está envolto em mistério. No ano passado, o processo,
que estava no STF, foi anulado desde a fase dos interrogatórios
Desconsiderou, por exemplo, a apresentação pelo
cliente de dados cadastrais completos e atualizados, não procedeu
qualquer análise da capacidade financeira de Bumlai ou mesmo de seus
avalistas. Em outras palavras, o empréstimo milionário ao amigo de Lula
foi liberado sem as garantias exigidas de qualquer cidadão comum. Ainda assim, quando Valério revelou a
operação, Bumlai poderia ter admitido o empréstimo e alegado outro
destino para o dinheiro. Mas preferiu dizer que nunca teve nada a ver
com o Banco Schahin. Todos os citados por Valério adotaram a mesma
estratégia. Questionado novamente, Bumlai, por meio de seu advogado,
negou “qualquer envolvimento com os fatos objeto de depoimento de Marcos
Valério”. E o grupo Schahin classificou o caso como “uma rematada
mentira que jamais foi comprovada”.
Não bastasse a inobservância das regras
para a concessão do empréstimo a Bumlai, o Banco Schahin, segundo o
documento do Banco Central, maquiou o nível de risco da operação,
classificando-a como “B”, quando na verdade era “E”, de acordo com a
análise do BC. O ranking de risco do mercado financeiro obedece a uma
escala crescente de nove níveis, começando em AA, praticamente nulo, e
depois seguindo de A até H, o pior. Ao classificar o empréstimo com
nível de risco inadequado, o Schahin “constituiu provisão insuficiente
para fazer face às perdas prováveis”, informou o Banco Central. Além de
apontar inúmeras deficiências nos controles internos da área de crédito
bancário, o BC ainda determinou um ajuste contábil de R$ 108,7 milhões.
EM TODAS
Mencionado por Marcos Valério, o ex-ministro José Dirceu,
que cumpre prisão domiciliar, sempre negou qualquer
envolvimento no episódio do assassinato de Celso Daniel
Mencionado por Marcos Valério, o ex-ministro José Dirceu,
que cumpre prisão domiciliar, sempre negou qualquer
envolvimento no episódio do assassinato de Celso Daniel
Não à toa Bumlai foi escolhido, segundo
Marcos Valério, para ser um dos pontas de lança da operação. Pecuarista
oriundo da região Centro-Oeste, o empresário foi apresentado ao
ex-presidente Lula pelo ex-governador de Mato Grosso do Sul Zeca do PT. A
afinidade foi tanta que uma das fazendas de Bumlai serviu de palco para
um dos programas da campanha de Lula em 2002. Com a ascensão de Lula à
Presidência, Bumlai passou a desfrutar de acesso livre no Palácio do
Planalto. Era recebido sem marcar hora e tornou-se um conselheiro de
Lula para o agronegócio. Por indicação do ex-presidente, integrou o
chamado Conselhão do governo – Conselho de Desenvolvimento Econômico e
Social.
(...)
Até hoje, a Petrobras não explica por que não contratou diretamente os
fornecedores. Na ocasião da celebração desses contratos, Estrella era
diretor de exploração e produção e foi o arquiteto do modelo de
exploração do pré-sall. Ele dizia que os
negócios com as empresas nacionais gerariam uma economia de 25% em
relação ao mercado internacional, mas não contou que essas mesmas
empreiteiras tinham que comprar as sondas no exterior. O que se vê hoje é
que a estatal pagou muito mais do que deveria em contratos
superfaturados que serviram para o pagamento de propinas a executivos e
políticos. Como já foi revelado por ISTOÉ em sua última edição, o grupo
Schahin cresceu ainda mais dentro da Petrobras nos anos seguintes,
negociando o arrendamento e a operação de mais oito navios-sonda e
navios FPSO, sigla para definir embarcação de produção, armazenamento e
descarregamento de petróleo e gás.
Questionada, a estatal não revela o valor
total dos contratos com a Schahin, mas estima-se que cheguem facilmente
aos R$ 15 bilhões. Os pagamentos são feitos em mais de 50 offshores
abertas em uma dezena de paraísos fiscais diferentes. Nas contas da PF,
existiriam em nome de empresas de fachada do grupo Schahin mais de uma
centena de contas bancárias no exterior, que os investigadores suspeitam
terem sido usadas para distribuição da propina. Além de offshores, o
grupo Schahin mantém empresas de fachada no Brasil. Todas localizadas no
mesmo endereço: na Vila Mariana, em São Paulo.
Uma delas é a 2S
Participações Ltda., que, segundo a PF, seria uma espécie de “empresa
espelho” da S2 Participações Ltda., de Marcos Valério. Várias empresas
do grupo Schahin são identificadas pelos dois “S”, em referência aos
irmãos Salim e Milton Schahin. No ano passado, a PF apreendeu no
escritório de Meire Poza, contadora do doleiro Alberto Youssef, um
contrato de empréstimo no valor de R$ 6 milhões, firmado entre a 2S
Participações e a Expresso Nova Santo André, de Ronan Maria Pinto, o
chantagista do caso Celso Daniel. Durante o processo do mensalão,
descobriu-se que a 2S serviu de entreposto para repasses de diversas
outras empresas, inclusive a corretora Bônbus Banval, de Enivaldo
Quadrado, mensaleiro condenado e que está também envolvido na operação
Lava Jato. Para a PF, o contrato entre Valério e Ronan teria servido
para simular o repasse de metade dos recursos obtidos por Bumlai, com o
objetivo de ocultar sua origem. A PF desconfia que o restante do
empréstimo, os outros R$ 6 milhões, possa ter sido embolsado por Bumlai,
retornado para o grupo Schahin ou ido parar na conta de uma terceira
pessoa. Outra opção é que o dinheiro também tenha ido para Ronan, que
adquiriu inicialmente 50% do “Diário do Grande ABC”, mas depois comprou
os 50% restantes.
Fonte: Revista IstoÉ
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