O
Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) não pode invocar o sigilo bancário para impedir que instituições públicas de
controle, como o Tribunal de Contas da União (TCU), tenham acesso a informações sobre suas operações de crédito. A
decisão diz respeito a um processo específico – o financiamento da JBS/Friboi –, mas deverá servir de referência
para outros casos em que o BNDES for questionado. Ainda que tal desfecho possa
inibir os negócios do banco no futuro, pois os clientes demandam discrição para
proteger seus dados estratégicos, a exigência de maior
transparência é uma medida razoável tendo em vista o fato de que, afinal, se
trata de dinheiro público.
Em
setembro de 2014, o TCU requereu do
BNDES acesso a dados referentes aos contratos de operações de crédito com a
JBS/Friboi desde agosto de 2009. A intenção era realizar uma auditoria para
entender os critérios usados para a escolha da empresa
beneficiada, verificar as vantagens sociais da operação e observar o
cumprimento das cláusulas contratuais, além de saber se o banco teve
prejuízo com a aquisição de debêntures e sua troca por posição acionária na
empresa – o BNDES passou a deter 24,58% das ações
globais da JBS/Friboi e, para isso, investiu mais de R$ 8 bilhões.
Em
resposta, o BNDES forneceu apenas parte
dos dados, dizendo que os demais estavam protegidos pelo sigilo bancário, conforme o artigo 5.º da Constituição. Em seguida, o
banco entrou com um mandado de segurança no Supremo para tornar sem efeito o
acórdão do TCU sobre o contrato com a JBS/Friboi. No mandado, o BNDES apoiou-se em uma decisão do Supremo, de 2007, segundo a qual o
TCU não tem poder para quebrar sigilo, num caso em que havia exigido acesso
irrestrito a dados do sistema do Banco Central. O BNDES alegou também que o tribunal estava
invadindo áreas de competência do Banco Central e da Comissão de Valores
Mobiliários para fiscalizar o sistema financeiro nacional.
Para o
banco, a operação com a JBS/Friboi não caracteriza
subvenção, e sim um financiamento, e que os recursos utilizados não são “genuinamente públicos, aqueles previstos no
Orçamento da União”,
pois se trata de dinheiro próprio ou de terceiros. E o BNDES sustentou
que a política de juros mais baixos que os de mercado em seus empréstimos é
exatamente o que justifica a própria existência do banco estatal. “Há que se indagar: qual seria a utilidade
de uma instituição financeira pública que pratica a mesma política de juros dos
demais agentes privados?”, questionou o BNDES no mandado. Para o banco, seu
papel é “exercer uma função desruptora na
economia”.
A 1.ª Turma do STF, porém,
entendeu que os contratos do BNDES envolvem recursos públicos – os juros subsidiados e o capital do banco, inteiramente estatal – e
que, nesse caso, o sigilo bancário não
se aplica, razão pela qual o TCU deve ter amplo acesso a esses dados para
realizar seu trabalho de fiscalização. Para
o relator do mandado, ministro Luiz Fux, a preservação
dos dados bancários, embora seja uma
condição essencial para o exercício da atividade econômica, não é uma garantia absoluta.
Para Fux, as empresas que fazem contratos com o BNDES devem “aceitar que a exigência de transparência,
tão estimada em nossa República contemporânea para o controle da legitimidade
dos que exercem o poder, justifica o conhecimento por toda a sociedade de
informações que possam influenciar seu desempenho empresarial”.
A decisão do STF vai na
contramão da decisão da presidente Dilma Rousseff de vetar a quebra do sigilo das operações de crédito do BNDES, prevista em projeto aprovado pelo
Congresso em abril. Para Dilma, tal
restrição visa a preservar “a
competitividade das empresas brasileiras no mercado global”. Mas o Supremo considera, com razão, que nenhum argumento de caráter comercial
pode se sobrepor
ao imperativo da transparência no trato da coisa pública.
Fonte: O Estado de São
Paulo - Editorial
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