Há esperança de que novos meios de aplicar punições a criminosos estejam nascendo no país
[a pena de morte apresenta várias vantagens e bastam as três adiante citadas para torná-la insubstituível:
- efeito didático, a força do exemplo;
- certeza que cada um dos executados não cometerá mais crimes;
- o caráter irreversível da condenação.]
Em junho deste ano jornais
americanos e britânicos ficaram cheios de manchetes denunciando a
execução de um prisioneiro — o centésimo — na Arábia Saudita, notando
que tinham matado mais presos nos primeiros seis meses de 2015 do que em
todo o ano passado (97), e que estavam a caminho a quebrar o seu
próprio recorde de 192 execuções, em 1995.
Mas por que essa atenção especial para o reino quando havia outros países que tinham executado mais prisioneiros? No Paquistão, até mês passado 150 pessoas foram executadas depois que uma moratória de seis anos da pena de morte foi levantada (em dezembro 2014), na sequência de um ataque terrorista contra uma escola em Peshawar. Em março, a pena de morte passou a ser aplicada em todo tipo de crime, e não somente em casos de terrorismo.
E não podemos nos esquecer da China e do Irã, que são campeãs mundiais em execuções de prisioneiros. A ONG de direitos humanos Anistia Internacional estima que a China executou mais de mil pessoas em 2014, e o Irã, pelo menos 289. A Anistia diz que somente pode estimar estes números porque os dois países não divulgam números oficiais de execuções.
Os Estados Unidos também estão na lista dos cinco países que mais executam no mundo, com 35 execuções em 2014. Os americanos ainda apoiam a pena de morte, com 56% a favor da execução para aqueles culpados de assassinar alguém. Lá, cada estado decide se aplica a pena ou não. Apesar de 31 estados americanos ainda a adotarem, somente alguns a praticam. Os estados que executam mais são o Texas, Geórgia, Oklahoma, Florida, Virginia e Ohio.
Na Arábia Saudita os condenados são executados a espada, tendo suas cabeças decapitadas. A maioria das execuções é de mulas de drogas, geralmente homens paquistaneses humildes que são persuadidos a engolir balões cheios de heroína e depois embarcar para o reino, onde, mais frequentemente, são apreendidos nos aeroportos. Os sauditas conhecem bem essa rota de contrabando. Eles usam cães farejadores para cheirar malas e o raio-x para perscrutar o estômago de passageiros suspeitos.
Com o grande número de paquistaneses executados todo ano, não entendo por que eles ainda se arriscam. Deve ser o desespero de tentar sair da miséria ou para pagar uma dívida. Até eu fui quase submetido a uma revista corporal nos anos 1990, quando voltava de uma viagem ao Paquistão. O policial saudita no aeroporto de Jidá só desistiu de me revistar quando viu meu passaporte saudita.
Eu acho que a Arábia Saudita atrai muito mais atenção que outros países para suas execuções por causa da forma como elas são feitas. O uso de uma espada é visto no Ocidente como excepcionalmente medieval e talvez mais cruel do que o emprego de cadeira elétrica, injeção letal ou fuzilamento. Com isso em mente, o Conselho do Shoura, que aconselha o rei saudita sobre assuntos de Estado, fez um estudo ano sobre formas alternativas de execução, como as três citadas. O pesquisador Abdulaziz Al Tuwaijiri relatou que qualquer nova forma de execução adotada pela Arábia Saudita deveria evitar métodos que causem sofrimento excessivo ou mutilação do corpo. Por isso, a cadeira elétrica e o fuzilamento foram descartados como inadequados, e a injeção letal foi considera a mais adequada. Para mim isso é um passo à frente.
Temos que nos lembrar de que, mesmo com essa punição severa (para homicídios e o adultério), há versos no Alcorão e o hadith (dizeres do profeta Maomé) em favor da misericórdia que definem condições estritas para as punições mais severas. Por exemplo, para ser condenado por adultério o casal adúltero tem que ser visto no ato sexual de penetração por quatro testemunhas adultas masculinas, coisa muito difícil, senão quase impossível, de acontecer no cotidiano. Em casos de homicídio, as famílias das vítimas podem perdoar o assassino e com isso poupar a sua vida. Muitos assassinos foram poupados da execução assim, incluindo vários estrangeiros culpados de assassinar seus chefes brutalmente a facadas.
Eu pessoalmente acho que a pena de morte não deveria ser usada, por causa dos muitos meios em que ela pode ser aplicada de um jeito errado. Mas vejo como ela ajuda a botar medo em criminosos em países que a adotam. Na Arábia Saudita e em Cingapura, por exemplo, você pode andar à noite nas ruas sem ter receio de ser assaltado ou estuprado, uma segurança que não temos na maioria das cidades grandes brasileiras.
Na Arábia Saudita a nova geração está abrindo um debate sobre o uso excessivo da pena de morte e de chibatadas. A discussão se desenvolve nas redes sociais, principalmente no Twitter, coisa que não se via antes da internet. E alguns juízes estão usando sentenças alternativas para punir malfeitores de pequeno cunho, usando trabalho comunitário para evitar que essas pessoas fiquem presas e longe de suas famílias.
Esses desenvolvimentos me dão esperança que um novo jeito de encarar a punição de crimes está nascendo na Arábia Saudita. Temos que enfatizar mais o lado justiceiro do Islã, que é muito amplo e mal conhecido no Ocidente, para construir uma sociedade mais justa e nobre para todos nós. Nessa religião há perdão para pecados. Não é tudo punição violenta, como as decapitações demagógicas televisadas desse Estado, autodenominado Islâmico.
Fonte: Rasheed Abou-Alsamh é jornalista
Mas por que essa atenção especial para o reino quando havia outros países que tinham executado mais prisioneiros? No Paquistão, até mês passado 150 pessoas foram executadas depois que uma moratória de seis anos da pena de morte foi levantada (em dezembro 2014), na sequência de um ataque terrorista contra uma escola em Peshawar. Em março, a pena de morte passou a ser aplicada em todo tipo de crime, e não somente em casos de terrorismo.
E não podemos nos esquecer da China e do Irã, que são campeãs mundiais em execuções de prisioneiros. A ONG de direitos humanos Anistia Internacional estima que a China executou mais de mil pessoas em 2014, e o Irã, pelo menos 289. A Anistia diz que somente pode estimar estes números porque os dois países não divulgam números oficiais de execuções.
Os Estados Unidos também estão na lista dos cinco países que mais executam no mundo, com 35 execuções em 2014. Os americanos ainda apoiam a pena de morte, com 56% a favor da execução para aqueles culpados de assassinar alguém. Lá, cada estado decide se aplica a pena ou não. Apesar de 31 estados americanos ainda a adotarem, somente alguns a praticam. Os estados que executam mais são o Texas, Geórgia, Oklahoma, Florida, Virginia e Ohio.
Na Arábia Saudita os condenados são executados a espada, tendo suas cabeças decapitadas. A maioria das execuções é de mulas de drogas, geralmente homens paquistaneses humildes que são persuadidos a engolir balões cheios de heroína e depois embarcar para o reino, onde, mais frequentemente, são apreendidos nos aeroportos. Os sauditas conhecem bem essa rota de contrabando. Eles usam cães farejadores para cheirar malas e o raio-x para perscrutar o estômago de passageiros suspeitos.
Com o grande número de paquistaneses executados todo ano, não entendo por que eles ainda se arriscam. Deve ser o desespero de tentar sair da miséria ou para pagar uma dívida. Até eu fui quase submetido a uma revista corporal nos anos 1990, quando voltava de uma viagem ao Paquistão. O policial saudita no aeroporto de Jidá só desistiu de me revistar quando viu meu passaporte saudita.
Eu acho que a Arábia Saudita atrai muito mais atenção que outros países para suas execuções por causa da forma como elas são feitas. O uso de uma espada é visto no Ocidente como excepcionalmente medieval e talvez mais cruel do que o emprego de cadeira elétrica, injeção letal ou fuzilamento. Com isso em mente, o Conselho do Shoura, que aconselha o rei saudita sobre assuntos de Estado, fez um estudo ano sobre formas alternativas de execução, como as três citadas. O pesquisador Abdulaziz Al Tuwaijiri relatou que qualquer nova forma de execução adotada pela Arábia Saudita deveria evitar métodos que causem sofrimento excessivo ou mutilação do corpo. Por isso, a cadeira elétrica e o fuzilamento foram descartados como inadequados, e a injeção letal foi considera a mais adequada. Para mim isso é um passo à frente.
Temos que nos lembrar de que, mesmo com essa punição severa (para homicídios e o adultério), há versos no Alcorão e o hadith (dizeres do profeta Maomé) em favor da misericórdia que definem condições estritas para as punições mais severas. Por exemplo, para ser condenado por adultério o casal adúltero tem que ser visto no ato sexual de penetração por quatro testemunhas adultas masculinas, coisa muito difícil, senão quase impossível, de acontecer no cotidiano. Em casos de homicídio, as famílias das vítimas podem perdoar o assassino e com isso poupar a sua vida. Muitos assassinos foram poupados da execução assim, incluindo vários estrangeiros culpados de assassinar seus chefes brutalmente a facadas.
Eu pessoalmente acho que a pena de morte não deveria ser usada, por causa dos muitos meios em que ela pode ser aplicada de um jeito errado. Mas vejo como ela ajuda a botar medo em criminosos em países que a adotam. Na Arábia Saudita e em Cingapura, por exemplo, você pode andar à noite nas ruas sem ter receio de ser assaltado ou estuprado, uma segurança que não temos na maioria das cidades grandes brasileiras.
Na Arábia Saudita a nova geração está abrindo um debate sobre o uso excessivo da pena de morte e de chibatadas. A discussão se desenvolve nas redes sociais, principalmente no Twitter, coisa que não se via antes da internet. E alguns juízes estão usando sentenças alternativas para punir malfeitores de pequeno cunho, usando trabalho comunitário para evitar que essas pessoas fiquem presas e longe de suas famílias.
Esses desenvolvimentos me dão esperança que um novo jeito de encarar a punição de crimes está nascendo na Arábia Saudita. Temos que enfatizar mais o lado justiceiro do Islã, que é muito amplo e mal conhecido no Ocidente, para construir uma sociedade mais justa e nobre para todos nós. Nessa religião há perdão para pecados. Não é tudo punição violenta, como as decapitações demagógicas televisadas desse Estado, autodenominado Islâmico.
Fonte: Rasheed Abou-Alsamh é jornalista
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