Para Silva e Luna, resolução do caso Marielle vai influenciar na avaliação da intervenção
[a eficácia da intervenção não pode ser avaliada pela resolução de um caso de assassinato de um político - em mais de 60.000 ocorridos em apenas um ano e após e morte de três militares em operação de Garantia de Lei e Ordem e surpreende que essa escala peculiar, e injusta, de valorização seja da lavra de um general que também é ministro da Defesa.
A intervenção pode até fazer por merecer, até o final deste ano, uma melhor avaliação, desde que comece identificando e punindo os assassinos dos militares - que morreram no CUMPRIMENTO DO DEVER e não em uma reunião política ou algo do gênero e convencendo a população que uma VIDA HUMANA tem o mesmo valor - pouco importa que seja a de um político, a de um empresário, de um morador de rua, de um militar (alguma diferença de valorização pode, e deve, ser considerada a depender das circunstâncias em que a morte ocorreu.]
A intervenção federal no Rio caminha para uma maior letalidade, tanto em razão de uma ampliação de confrontos entre grupos rivais quanto pela atuação mais efetiva da polícia. A percepção é do ministro da Defesa, o general do Exército Joaquim Silva e Luna, em entrevista ao GLOBO.
—
(Enfrentamentos entre grupos rivais) tendem a se intensificar e gerar mais
mortes. Isso não é uma profecia. É uma conclusão — afirma o general, que
acrescenta — Ao se defrontar com o criminoso, a tendência da polícia, por falta
de meios, era se omitir. Agora, ela está disposta a enfrentar. Isso aí pode
aumentar a letalidade.
A
operação da intervenção federal no Complexo do Alemão na última segunda-feira,
que deixou três militares mortos, foi a mais letal para o lado dos militares
nas últimas décadas. Luna cita que houve mortes apenas na missão de paz no
Haiti — e isso em razão de terremotos, numa missão que durou 13 anos, entre
2004 e 2017 — e numa ação de garantia da lei e da ordem (GLO) no complexo da
Maré, em 2014, com um militar morto e 27 feridos. O ministro diz que não haverá
vingança e que a estratégia militar manda trocar tropa e comando, para que não
haja espaço para revanches.
Luna não
admite que houve erro dos militares na prisão de cinco jovens no Alemão que,
após quatro dias presos, foram soltos pela Justiça por falta de evidências de
envolvimento em práticas criminosas. — O
criminoso se sente reforçado e volta como herói.
O
ministro diz que a intervenção ainda não sabe quem matou a vereadora Marielle
Franco (PSOL), mas trabalha para que isso ocorra até o fim da presença dos
militares no Rio, em 31 de dezembro. E admite:
— O caso
Marielle vai ser parte da percepção do êxito (da intervenção). Resolvido, é uma
percepção. Não resolvido, é outra percepção. [a prioridade precisa ser, reiteramos, a identificação e punição dos assassinos dos três militares e dos seus cúmplices (incluindo eventuais moradores das favelas que apoiem, por qualquer meio, os traficantes);
à identificação dos assassinos dos militares servirá, no mínimo, para 'convencer' os traficantes que o assassinato de um MILITAR ou qualquer autoridade policial - em missão ou em qualquer outra circunstância - significará PUNIÇÃO IMEDIATA para os assassinos.
Que se investigue qualquer uma das outras mais de 60.000 mortes, mas, SEM priorizar nenhuma.
PRIORIZAR a investigação do assassinato de um MILITAR ou policial, é justificável pelo caráter exemplar que tem uma PUNIÇÃO IMEDIATA.]
A seguir,
os principais trechos da entrevista:
O senhor
tem conhecimento de outra ação militar que tenha sido tão letal aos militares
quanto esta na segunda-feira, no Complexo do Alemão, quando três morreram?
Ao entrar
numa operação como essa, o risco já está posto. Ele faz parte da missão.
Logicamente, tenta-se minimizar o risco. Aquele terreno era pouco conhecido
pelos militares. O que afeta a um, afeta a todos. Todo mundo se sente
pessoalmente atingido. Se não for assim, o comandante que deu ordem para que
esses três soldados subissem o morro corre o risco de ouvir do soldado que ele
não vai, que não se sente seguro. Na Maré, em 2014, houve uma morte e 27
feridos. No Haiti, 17 morreram, mas por causa do terremoto.
A
letalidade em ações da intervenção vai ser maior a partir de agora?
A
integração da polícia, que não existia, passou a ser feita. Uma quantidade
muito grande de policiais que estavam em atividades administrativas já está
incorporada ao trabalho. Existia uma quantidade grande de UPPs que não tinha
finalidade alguma. Foram extintas e esse pessoal foi incorporado. Eles estavam
despreparados. Tiveram que treinar, fazer tiro. Agora, essa resultante vai
atuar contra o crime organizado. Os grupos começaram a se enfrentar entre eles.
O tiroteio, o enfrentamento provocado por eles mesmos deverá ser crescente.
Balas perdidas e policiais mortos reduziram bastante. Hoje, um único disparo é
suficiente para inibir a ameaça.
Enfrentamentos
entre grupos rivais podem se intensificar?
Tendem a
se intensificar e gerar mais mortes. Isso não é uma profecia. É uma conclusão.
Houve um
aumento de 40%, no entanto, da quantidade de mortes em decorrência de ações
policiais: 636 entre março e julho deste ano, ante 460 no mesmo período do ano
passado.
Os dados
catalogados na época eram inconsistentes em razão de a polícia estar em greve.
As notificações eram abaixo do que acontecia de fato. Além disso, ao se
defrontar com o criminoso, a tendência da polícia, por falta de meios, era se
omitir. Agora, ela está disposta a enfrentar. Isso aí pode aumentar a
letalidade. A ação da polícia não é matar. Ela vai para tentar prender. Do
enfrentamento pode surgir a morte.
Diante da
morte de um PM, é comum no Rio que ocorra uma contraofensiva, muitas vezes
motivada por vingança. Isso pode vir a acontecer agora, diante da morte dos
três militares?
Eu diria
que não. Uma forma que as Forças Armadas usam até como método é trocar a tropa
empregada ali. Tira aquela tropa e coloca outra. Troca o efetivo, troca o
comandante da operação. Se nos deixarmos dominar por isso, a missão acaba.
Na mesma
operação no Alemão, cinco jovens da mesma família foram presos pelos militares
e a Justiça entendeu que não havia razão para as prisões. Eles ficaram quatro
dias presos.
O
sentimento que passa é de impunidade. [o que leva a Justiça a 'atrapalhar' o combate a criminalidade é a facilidade com que qualquer advogado de porta de cadeia (tipo de advogado que avilta a profissão) consegue convencer um juiz (especialmente no recém criado - e desnecessário - procedimento 'audiência de custódia') da inocência do acusado.
Recentemente, em Brasília, um individuo foi preso em flagrante sob acusação de desrespeitar medida protetiva a favor de sua companheira (que ele ameaçava matar) foi para a audiência, o juiz o liberou e do local da audiência ele se dirigiu a casa da companheira e a matou. É FATO.
Caso tivesse sido decretada sua prisão ele não teria cometido o crime.] Mas do outro lado está a Justiça, que fez
sua avaliação e considerou que não era o caso de se criminalizar. A primeira
percepção que passa é que estamos tirando com uma mão e colocando com outra.
Ele se sente reforçado, se é que tem alguma culpa.
Ele quem,
ministro?
O
criminoso. Ele se sente reforçado e volta como herói. Passa a exercer uma
liderança como herói dentro do seu universo.
A Justiça
se equivocou?
Não tenho
esses dados para avaliação. Estou falando da percepção que passa. Ele sendo
abraçado, ele sendo festejado. Alguém que estava envolvido naquele ambiente é
complicado. Estão dando exaltação ao crime em vez de a quem está combatendo o
crime, em proveito da sociedade.
Como viu
a morte de um adolescente de 14 anos a caminho da escola em junho, na Maré,
usando o uniforme escolar? Um helicóptero sobrevoava a comunidade e efetuava
disparos.
A gente
vê com lamento. Já há versão de que o tiro não partiu do helicóptero, mas se
for isso aí, é lamentável. [a primeira versão era que o garoto tinha sido atingido por tiros disparados de um blindado da Polícia Civil.
Vendo que a versão seria desmontada na reconstituição, os defensores dos 'direitos humanos' dos bandidos criaram uma nova: a do helicóptero.]
Já houve
avanço em investigação sobre de onde partiram os disparos?
A
trajetória da arma não veio do helicóptero.
A
intervenção tem se preocupado em investigar esses casos?
Tem.
Quando há um caso desse, ele é mais que apurado. Serve de estudo para se evitar
que aconteça de novo. Se houve uma falha, o pessoal corta na carne e corrige,
para evitar cometer erro velho. Isso aí foi um erro.
A
vereadora Marielle Franco (PSOL) e o motorista dela, Anderson Gomes, foram
assassinados há 163 dias (completados na sexta-feira). Já se sabe quem matou os
dois?
Não. Não
se sabe. Isso é uma caminhada de aproximação a um objetivo, a um ponto. [Nesses 163 dias deve ter ocorrido, por baixo, uns 20.000 sido assassinatos e se muito 100 foram objeto de alguma investigação e o VALOR de uma VIDA HUMANA, qualquer uma, TEM exatamente o MESMO VALOR DE QUALQUER OUTRA.
Priorizar a investigação de um policial morto em serviço é válido, haja vista o valor exemplar que a prisão e punição dos assassinos transmite.
Fora essa exceção nenhuma investigação de um HOMICÍDIO deve ter prioridade sobre a de outros.
O bandido aprende que POLICIAL MORTO = a BANDIDO PRESOU ou MORTO.]
Nunca
foi interrompida essa caminhada e sabe-se que se está aproximando desse ponto.
A gente
vai saber quem matou Marielle até o fim previsto no decreto da intervenção, 31
de dezembro?
Este é o
objetivo. Identificado o criminoso, essa pessoa, esse grupo, que se possa
entregar todos os instrumentos à Justiça. Seria muito ruim identificar uma
pessoa e no dia seguinte ela estar andando de short por Copacabana. Seria ruim
que os dados para provar que ele é o criminoso sejam muito frágeis. Um advogado
com pouca instrução consegue liberá-lo. A ansiedade da população brasileira é a
minha também e do próprio interventor. O caso é emblemático, embora existam
milhares de outros casos. Milhares são muito, mas outros casos também
aconteceram. Era uma pessoa que parece que tinha vida política, perspectiva na
sua área, no que ela defendia. É uma liderança que foi morta. Houve informações
precipitadas, e isso acabou retardando.
Mas houve
precipitação dentro do mesmo governo que o senhor integra, com diversas
declarações do ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann.
Tem gente
que tem ansiedade, carência de estar falando. Não vou nominar nada, mas talvez
essas informações não tenham ajudado. Puxaram pela camisa o pessoal que estava
avançando. Atrasou, e se perdeu tudo. É uma retomada. [o ministro Jungmann padece dessa carência.
Felizmente, ele ultimamente tem participado de poucos eventos o que facilita que nos prestigie com o seu obsequioso silêncio.]
A
investigação vai de fato apontar para a atuação de milícia no assassinato? Ou
vai haver surpresa nesse desfecho?
Eu
confesso que não tenho essa perspectiva. A tendência seria o grupo que se tem
ideia de que está envolvido com isso.
E a
suspeita de participação direta de políticos do MDB do Rio?
São
suspeitas e estão sendo investigadas.
O êxito
ou fracasso da intervenção depende da solução desse caso?
O êxito
da intervenção vai estar na reestruturação da polícia do Rio. O caso Marielle
vai ser parte da percepção do êxito. Resolvido, é uma percepção. Não resolvido,
é outra percepção.
O que a
população do Rio pode esperar nesses quatro meses finais de intervenção?
O que se
fez até agora foi plantar. Os resultados disso vão acontecer, já estão
acontecendo. Os índices de criminalidade baixaram. O que aumentaram foram os
homicídios por enfrentamentos. O que está aumentando é o enfrentamento de
gangues, com risco de que se tenha um pico disso aí. Elas vão ficando cercadas,
e a tendência é o desespero.
Essa
intervenção acaba mesmo em dezembro? Ou acaba antes? O senhor tem conversado
com o presidente sobre isso?
Tenho
conversado. A tendência é acabar em dezembro, mesmo. O tempo político é um
tempo diferente do tempo lógico. Joga com percepções. O que vale para hoje pode
não valer para amanhã. Ela não acaba antes, vai até o dia 31.
É que no
meio do caminho há uma eleição totalmente em aberto.
Há risco
de um estresse grande nessas eleições. Talvez se empregue o maior efetivo de
Forças Armadas numa eleição, em razão desse estado de ânimo da sociedade. Tirar
a tropa do Rio neste momento seria muito ruim.
O
presidente da República foi muito criticado pela maneira como fez a intervenção,
de forma atropelada, uma crítica que surgiu nas próprias Forças Armadas. Os
militares topariam um novo ano de intervenção?
A lei que
prevê a garantia da lei e da ordem é muito cuidadosa. Há um tempo determinado,
uma área bem definida e quando esgotados os meios naquela localidade. Uma
intervenção por prazo longo é muito ruim, desvirtua o emprego das Forças
Armadas, que estão ali fazendo um trabalho de polícia. O interesse de estender
uma missão dessa é nenhum. Tem gente querendo se apropriar até do caso
Marielle, quando percebe que o caso caminha para ser resolvido.
Como
enxerga a queda de apoio da população do Rio à presença dos militares no
estado, de 83% para 66%, conforme detectado por pesquisa do Datafolha?
Isso é um
confronto da expectativa com a realidade. Havia a expectativa de que as Forças
Armadas resolveriam tudo. A realidade encontrada é de um estado em regime de
recuperação fiscal, zero de investimento, polícia em greve, salário atrasado,
caos. Tudo isso tinha de ser recuperado para depois ser trabalhado alguma
coisa. Ao confrontar tudo isso, a expectativa foi murchando. As pessoas se
sentiram frustradas. Acharam que aquilo ali era um passeio na Praia de
Copacabana.
O
Ministério da Defesa tem alguma preocupação com radicalismos nas eleições, como
o não reconhecimento do resultado das urnas, por exemplo?
Preocupação
existe com o pleito eleitoral, com o dia da votação, apuração, capacidade de as
pessoas se deslocarem com segurança. A chance é zero de não respeito ao
resultado. Uma das missões das Forças Armadas é garantir as instituições.
Mas o
candidato Jair Bolsonaro (PSL) questiona as urnas eletrônicas e evita dizer que
respeitaria uma eventual derrota nas urnas.
Eu tenho
impressão que as pessoas têm as suas estratégias de conversar com seus eleitores.
Com a sua narrativa, desconstruir uma coisa e em cima dessa desconstrução
construir uma outra realidade. Cada um usa o artíficio que quiser.
Vale para
o lado oposto? O ex-presidente Lula (PT) está preso e registrou sua
candidatura.
Ele
aparece em tudo que é local. Está se impondo para a sociedade através da
repetição. “Está preso mas não está preso.” Hoje, o candidato que tem mais
tempo de exposição de mídia é o Lula. É um candidato que não existe. [general sendo Vossa Excelência o ministro da Defesa, talvez valha a pena esquecer um pouco a função política do Ministério de Defesa e partir para o lado prático.
NADA IMPEDE que sendo Lula um criminoso comum, condenado pela prática de CRIME COMUM, cumpra sua pena em um presídio comum.
Vale a pena transferir Lula até que ganhe liberdade condicional - de agora a no mínimo três anos - para um presídio comum.
Uma das opções previstas na Lei de Execução Penal é transferir o condenado para o seu estado de origem. Lula é pernambucano e em Pernambuco tem uma ótima penitenciária: a Aníbal Bruno.
Seria uma forma de fechar o comitê eleitoral que Lula mantém na PF de Curitiba.]
Isso
incomoda o senhor?
Eu fico
com pena do Brasil. É um país que não está estruturado ainda para definir
alguma coisa e honrar aquilo que definiu, o que a lei está dizendo. Temos
tolerância com o que não é legal.
Bolsonaro,
capitão da reserva, representa o que o alto comando das Forças Armadas pensa?
Não. A
gente tem buscado separar. Bolsonaro está na política há sete mandatos. Ele
sempre foi uma pessoa independente em suas percepções. As Forças Armadas sempre
foram apartidárias. Bolsonaro vai vendo os nichos de oportunidade que podem ser
explorados e explora aquilo que a sociedade está carente.
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