Nação e Exército - Merval Pereira
Escolas militarizadas não são modelo para o Brasil
A relação entre os militares e o presidente
Jair Bolsonaro foi mais uma vez colocada em xeque por interferência do
guru Olavo de Carvalho, que foi ao Youtube para criticar a edição do
livro do sociólogo Gilberto Freyre “Nação e Exército” pela Biblioteca do
Exército. O lançamento será amanhã na Escola de Comando e Estado-Maior do
Exército (ECEME), para comemorar os 70 anos da edição do livro. Olavo de
Carvalho estranhou, questionando se a decisão seria uma indicação de
que militares estariam se unindo a comunistas para afrontar o presidente
da República. A análise nesse sentido foi publicada no blog bolsonarista “Sociedade
Militar”, interpretando que a publicação do livro marca “o
fortalecimento de uma ala mais progressista da força terrestre” e um
“gradual afastamento do presidente da República e do governo como um
todo”. [uma obviedade óbvia: Olavo de Carvalho é uma pessoa, os filhos de Bolsonaro são pessoas diferentes entre si, diferentes do Olavo de Carvalho e do Presidente Bolsonaro e este é diferente de todos os citados e das demais pessoas.]
O que provocou a ira de Olavo de Carvalho, que normalmente é elogiado
pelo blog bolsonarista. Olavo, no seu blog, disse não acreditar que
essa análise representasse a visão do Exército. A informação de que
Gilberto Freyre, em 1949, fazia parte da Aliança Nacional Libertadora,
formada por comunistas, antifascistas e militares descontentes, e que,
portanto, o livr representaria uma visão ideológica diferente da do
Exército é rechaçada pelos militares responsáveis pela edição. Que,
aliás, começou a ser pensada cerca de três anos atrás, sendo impossível
atribuir a ideia a uma mensagem cifrada contra o governo Bolsonaro.
O neto de Gilberto Freyre, que é secretário de Cultura do governo de
Pernambuco, aprovou a ideia e fará um lançamento também em Recife. No
livro, Gilberto Freyre defende a tese de que o Exército não deve ser
convocado pela sociedade para atuar em todos os momentos de crise. Debate que continua atual devido ao acionamento do Exército para a
Garantia da Lei e da Ordem (GLO) em vários pontos do país, além de
atuações na área de infraestrutura. A mensagem de Freyre é de união
entre civis e militares para enfrentar os desafios futuros, como está
ressaltado no livro. Os militares, na verdade, não querem ser confundidos como parte do
governo Bolsonaro, como não quiseram em qualquer outro governo, pois
fazem questão de serem reconhecidos como parte de instituições do Estado
brasileiro.
A participação de militares no governo Bolsonaro não significa a
presença das instituições militares no governo, fazem questão de
afirmar. O Comandante do Exército, General Pujol, sempre acentua que o
Exército é uma instituição do Estado brasileiro, e não de governos, que
são eventuais e ligados a partidos políticos. Por isso, há uma preocupação, por exemplo, com a adoção de “escolas
militarizadas”, que fazem parte do programa do ministério da Educação e
foram prometidas na campanha por Bolsonaro como politica de governo,
embora alguns Estados já estivessem colocando em prática a ideia.
Essa proposta não conta com o apoio do Exército, cujos líderes
consideram que o que se busca com essa adjetivação das escolas é
segurança e disciplina, que não são objetivos dos Colégios Militares,
mas consequência de um programa mais amplo de preparação dos alunos para
a vida na sociedade. Tanto que eles não são restritos aos militares, havendo oficiais
superiores que não cursaram um Colégio MIlitar, e civis que cursaram e
não seguiram a carreira. Os colégios militares não fazem parte da
formação da carreira, que tem três pilares: a Academia Militar de
Agulhas Negras; a Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (Esao) e a
Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME).
Os colégios militares são considerados educação assistencial, e são
procurados por seus alunos, não impostos pelo governo. Não representam,
portanto, uma filosofia educacional militar que possa ser transferida
para o sistema nacional de educação.
Os militares como instituição consideram que muitas vezes são usados
como válvula de escape de políticos, especialmente na segurança, e agora
na educação, que os convocam quando a situação é grave, mas só assumem a
responsabilidade quando as intervenções dão certo. Recaem sobre os
militares as falhas, e seria da mesma maneira no caso de o programa
educacional baseado nos colégios militares dar errado.
Merval Pereira, jornalista - O Globo
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