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terça-feira, 12 de novembro de 2019

Só Congresso poderá mudar o entendimento do STF – Editorial

Valor Econômico

Chances de emenda à Constituição reinstituir prisão após condenação à segunda instância são pequenas

Pela terceira vez em uma década, o Supremo Tribunal Federal mudou sua posição sobre a possibilidade de um réu ser preso após condenação em segunda instância. Os ministros do STF, após o escândalo do mensalão e o sucesso da Operação Lava-Jato, oscilaram de acordo com os ventos políticos. Ao avanço da Lava-Jato correspondeu a decisão de fevereiro de 2016, que alterava outra de 2009, permitindo o cumprimento da pena a partir do julgamento em segunda instância, reafirmada em pelo menos mais um julgamento. Os desvios do script legal da Lava-Jato, apontados pelo The Intercept, ajudaram a produzir nova reviravolta, em direção à posição anterior, de a prisão só ocorrer esgotados todos os recursos - que no sistema judicial brasileiro são muitos.

A questão ganhou maior relevância porque entre os presos que poderiam ser beneficiados pela medida estava o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A decisão sobre o tema acabou seguindo o timing político da Corte. O presidente Dias Toffoli a colocou em julgamento apenas depois que Lula já podia deixar a prisão e cumprir a pena em regime semi-aberto. Lula usou seu faro político ao não aceitar a progressão para o regime semi-aberto e esperar a possibilidade, que afinal veio, de poder recorrer da decisão livremente. [o condenado petista continua  condenado, com seus crimes sobre suas costas, sentença validada pelo STJ.
E também impossibilitado de ser candidato, devido a Lei da Ficha Limpa, que proíbe a candidatura de  criminosos condenados por órgão colegiado.]

O artigo 283 do Código de Processo Penal sempre foi claro a respeito da prisão apenas em última instância, o que podia ou não estar de acordo com a Constituição, compatibilidade a que os ministros aplicaram toda a sabedoria hermenêutica para afirmar que não havia, e depois, que havia. A forma definitiva de tirar as dúvidas, disse Dias Toffoli no fim do julgamento de quinta-feira, era que o Congresso deixasse explícito que a prisão se tornaria possível após a segunda instância.

No Senado, há uma proposta de emenda constitucional nesse sentido, esposada por parlamentares do PSL. As chances políticas dela prosperar, porém, são inversamente proporcionais à possibilidade de dezenas de políticos envolvidos no petrolão e outros casos de corrupção serem condenados. Na Câmara dos Deputados, tudo indica que ela não passa. No Senado, há algum espaço para isso. O entendimento atual do STF é o da volta a um passado que em boa medida protege criminosos do colarinho branco. A necessária mudança em direção a padrões mais rígidos parece ter sido enterrada a curto prazo pela reação do Supremo contra os procuradores da Lava-Jato e seus expedientes heterodoxos e pela atitude de autoproteção dos políticos.

O resultado imediato dessa novela é que o governo de Jair Bolsonaro que, por falta de oposição, criara uma dentro de seu próprio partido, o PSL, agora terá de combater um adversário popular e hábil que não pôde enfrentar nas urnas em 2018. Lula, por sua vez, terá contra si o governo de um político de direita agressivo, que chegou ao Planalto exatamente pela desmoralização que os escândalos de corrupção causaram ao PT, e que pretende ir até aonde for possível para impedir Lula de recriar para a esquerda uma perspectiva de poder.

Há indícios de que a polarização será retomada, mas também de que essa página da história pode ser virada. As manifestações contra a decisão do STF, em São Paulo, exibiram críticas aos filhos de Bolsonaro, refletindo um racha já existente no PSL e nas forças da direita. E Lula terá de enfrentar grande rejeição e mostrar-se interessado em agrupar a esquerda em torno do PT, quando o movimento contrário parecia prevalecer. Por obra de Lula, o PT não abriu mão até hoje da primazia da condução da disputa pelo Planalto, deixando na sombra o PSB, Ciro Gomes e Psol.

A disputa presidencial é muito prematura e não se definirá logo. Com Lula na raia da esquerda e Bolsonaro na da direita, sobra para o centro político a bandeira do “novo”, que Bolsonaro na verdade não poderia empunhar. Os caminhos se estreitaram para Ciro Gomes e João Doria, mas há trilhas para novatos como Luciano Huck. O estado da economia vai decantar possibilidades.

Lula escolheu como alvo a política econômica em um momento em que ela começa a dar resultados mais visíveis, no crescimento e no emprego, sem que os programas sociais tenham sido dizimados, como o PT previa. Colocar todos os males nas costas de Guedes só colará se a economia continuar patinando. Foi a imponente ruína legada por Dilma Rousseff que trouxe consigo os males que Lula aponta. O PT não tem outro discurso. As linhas políticas terão de ser redesenhadas.
Editorial - Valor Econômico


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