Análise Política
As pesquisas convergem para duas constatações sobre 2022. O presidente
Jair Bolsonaro permanece competitivo e tem uma reserva para ir ao
segundo turno. Claro que nas condições normais, e atuais, de temperatura
e pressão. Por outro lado, todos os levantamentos indicam um segundo
turno duríssimo para ele. As margens hoje sobre os desafiantes são
estreitas, além do que seria saudável para um incumbent, como dizem os americanos.
O estilo e a linha do presidente, sabe-se, têm dois efeitos. Garantem a
fidelidade de um núcleo duro, mas também estimulam a aproximação entre
os potenciais adversários. Este segundo movimento hoje acontece numa
velocidade compatível com a era digital. A dúvida? Qual será a
capacidade de o desafiante escolhido no primeiro turno agrupar o
antibolsonarismo no segundo.
Trata-se do repisado tema da “frente ampla”. O benchmark
mais abrangente é a coalizão formada na transição para a Nova República
em 1985. O caso histórico bem conhecido do deslocamento para o
oposicionismo de personagens que haviam apoiado a deposição de João
Goulart em 1964. Na estocada final, um pedaço inteiro do governista PDS
(antes Arena) juntou-se ao PMDB (antes MDB) com a marca de Frente
Liberal. Depois viraria partido (PFL, hoje Democratas).
Mas ali foi a culminância de uma caminhada de duas décadas, na qual a
esquerda e os progressivamente convertidos foram se aproximando ao longo
de sucessivas eleições e movimentos político-sociais antirregime. Dois
(quatro?) anos não são vinte. Ainda que, como foi dito, a velocidade
seja bem maior no mundo da internet. E tem outro aspecto, ainda mais
significativo. Ali havia um acordo: todos os grupos oposicionistas
aceitavam-se na frente.
Mesmo Luiz Inácio Lula da Silva, que depois no PT construiria um caminho
próprio, apoiou Fernando Henrique Cardoso (MDB) para o Senado em 1978.
Sobre aquela época, pode-se argumentar que a aceitação mútua era
facilitada por um detalhe: a hegemonia ali estava pré-estabelecida,
havia um único partido permitido de oposição e era completamente
controlado pelo que hoje se chama de “centro”. Ainda que persistisse no
MDB uma disputa entre “autênticos” e “moderados”. Estes últimos
dispostos a uma eventual negociação com o regime em torno da transição.
Tem mais. Do emedebismo raiz à esquerda, todos estavam excluídos do
poder. E aí certa hora juntaram-se para fazer a passagem. É possível
argumentar que o PT não votou em Tancredo Neves. Verdade. Mas talvez
tenha sido também porque a vitória do mineiro era garantida. Nunca
saberemos - e esta afirmação leva a vantagem de não poder ser derrubada
pelos fatos -, mas é possível que se os votos do PT fossem decisivos
contra Paulo Maluf a posição do partido teria sido outra.
Mais um detalhe. Havia na oposição razoável consenso sobre a necessidade
de uma política econômica à época rotulada de heterodoxa. Foi a era de
ouro dos economistas nacionalistas, defensores do papel do Estado.
Depois deu errado. José Sarney atravessou sucessivas borrascas
econômicas, editou sucessivos planos econômicos, que fracassaram todos, e
quase caiu. Até cruzar a linha de chegada com a língua de fora. Mas
isso foi depois.
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