Alexandre Garcia
"Parece que vamos vivendo uma ficção bem acima da
realidade; e a realidade fica embaixo do tapete da alienação que insiste
em esperar a salvação vinda de fora de nós. Não existe essa salvação, a
não ser aquela que construirmos. Não será Deus nem os marcianos, nem a
ONU"
Domingo último foi Dia Nacional do Livro. O genial
Castro Alves escreveu: "Ó bendito o que semeia livros a mancheias/ e
manda o povo pensar". Há 150 anos o poeta sentia a necessidade de mandar
o povo pensar e, em consequência, buscar informação e conhecimento.
O
povo pensar é essencial para que ele exerça o poder que dele se espera
se o regime for democrático, em que "todo poder emana do povo, que o
exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente", como
estabelece o primeiro artigo da Constituição.
Povo que pensa, elege bons
representantes; povo que pensa fiscaliza seus representantes; povo que
pensa não permite que seus representantes ou seus servidores se desviem
de seus deveres; povo que pensa não permite que quem não tem
representação do voto vá além de seus limites; povo que pensa não se
deixa enganar por falsos rótulos, falsas verdades, falsos arautos.
Se estamos satisfeitos com a segurança pública, com
nossas cidades, com os nossos políticos, com nossa perspectiva de futuro
para nós, nossos filhos ou netos, então talvez seja porque nos
alienamos e estamos à espera da mão divina para nos trazer um país
melhor.
Anteontem fez um ano que Lula foi eleito presidente. Suponho
que seus eleitores pensaram antes de votar, pensaram mil vezes antes de
votar e se informaram, para exercer a pesada responsabilidade do voto.
Suponho que saibamos do peso de nossas decisões nas urnas e que pensamos
muito antes de dar o voto aos nossos representantes nos governos e
legislativos.
Não sei se os deputados, vereadores, senadores também são
pessoas que pensam a respeito do que eles representam e no que se espera
deles. Não consigo imaginar o que pensam os ministros do Supremo quando
lêem a Constituição ou recordam as aulas de Direito que frequentaram.
Parece que vamos vivendo uma ficção bem acima da
realidade; e a realidade fica embaixo do tapete da alienação que insiste
em esperar a salvação vinda de fora de nós. Não existe essa salvação, a
não ser aquela que construirmos. Não será Deus nem os marcianos, nem a
ONU. O crime tomou conta do Rio de Janeiro porque os cariocas ficaram
esperando uma salvação. Ou houve omissão ou concordância por décadas e o
crime foi se consolidando, a ponto de criar territórios próprios. E
esses territórios vão estar maiores nos anos que vierem. Para um
território gigantesco, a Amazônia, damos as costas, como se estivesse
muito além de Gaza. Nessa parte tão rica do Brasil com milhares de ONGs
estrangeiras, uma CPI está a nos alertar que com o tempo vamos ser
surpreendidos e perder metade do nosso país. Nosso umbigo nos prende num
cordão ainda não cortado. Não nos interessamos nem pelo ensino, pelas
escolas que formam o futuro, e o atraso se amplia. E, logo, estaremos em
busca do futuro perdido.
LEIA TAMBÉM: Pacheco responde Gleisi e diz que presidente do PT é criadora das 'emendas Pix'
As "emendas Pix" são um esquema que destina verbas públicas sem transparência e sem fiscalização para prefeituras. ...
Por falta de informação e de conhecimento, ou preguiça
de pensar, deixamos que outros pensem por nós. E temos um 1984 de Orwell
com o "Grande Irmão" esperando para tomar conta de nossas liberdades,
apenas para nos usar.
O teste da pandemia mostrou como não pensamos, e
aceitamos até o absurdo de que "esta doença não tem tratamento".
E fomos
morrendo por causa de uma mentira repetida, ensinada pelo nazista
Goebbels.
Mais do que nunca, é preciso pensar que a verdade vos
libertará, do Evangelho de João, que o jovem Castro Alves resumiu em
mandar o povo pensar. O futebol, o samba, a praia, podem trazer
alegrias. E elas podem ser anuladas pela falta de direitos e liberdades.
Imagino variantes para Descartes: Penso, logo sou cidadão. Sou cidadão,
pois penso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário