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domingo, 27 de junho de 2021

Por que o progressismo europeu não é obcecado por lei racial? - VOZES

Bruna Frascolla


Aborto, drogas e casamento gay: a tríade do progressismo europeu
Aborto, drogas e casamento gay: a tríade do progressismo europeu -  Foto: EFE/EPA/Szilard Koszticsak

No último artigo, hesitei ao escrever que as ideias progressistas vêm da Europa e consistem na tríade aborto-drogas-gays. Afinal, outro polo exportador de progressismo são os Estados Unidos, cuja obsessão por raça não se enquadra nessa tríade. Mencionei a Argentina como grande receptadora das ideias progressistas da Europa. Na verdade, enxergo a Argentina como uma Europa sem Plano Marshall: em vez de Mussolini, eles tiveram Perón, não lutaram na II Guerra e seguem idolatrando o Mussolini deles até hoje.

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Façamos então um teste. Tem cota racial na Argentina? Pesquisando “cuotas raciales Argentina”, encontrei artigos sobre o Brasil e até texto falando mal de Bolsonaro. Mas cuotas raciales na Argentina, que é bom, nada. Ou seja: a Argentina, aquele país onde o presidente fala “todes”, onde tem casamento gay desde 2010, onde o aborto foi descriminalizado, tudo democraticamente e sem canetadas de um STF, não tem cuotas raciales en las universidades.

Fiquemos assim: existem dois conjuntos de ideias chamados de progressistas ou politicamente corretos. Um é de matriz europeia, outro de matriz norte-americana. Enquanto um tem a tríade aborto-droga-gay, o outro é obcecado por raça.

Por que europeu não dá bola pra lei racial?
A ideia de racismo leva a nossa mente direto para a Alemanha. No entanto, as leis raciais são uma invenção dos EUA aplicada aos negros que os alemães importaram para aplicar aos judeus. As leis raciais surgem no sul escravista dos Estados Unidos em 1877 e começam a se federalizar com Woodrow Wilson em 1913, quando o vagabundo Adolf Hitler tinha 24 anos e encontrava um rumo na vida na condição de soldadinho austríaco. Nos Estados Unidos, a descentralização conseguiu dar uma segurada nos projetos eugenistas das autoridades médicas e dos políticos entusiastas. Na Alemanha, toda a estrutura centralizadora do poderoso Estado prussiano foi posto nas mãos de Hitler e seus médicos eugenistas, que se inspiravam nos norte-americanos. Não dá para dizer que os norte-americanos sejam mais racistas do que os alemães. Ainda assim, foi dos EUA que saiu o racismo de Estado.

A razão para isso é muito simples. Nos EUA, o critério-chave da cidadania é o nascimento em solo nacional. Você pode ser preto, branco, amarelo ou verde, e a lei, até segunda ordem, irá considerá-lo um American. Para os Estados Unidos se tornarem racistas, foi necessária uma gambiarra jurídica, as famigeradas leis Jim Crow. A raiz legal do país faz dele, de fato, a terra da liberdade.

Já na Europa, o critério-chave da cidadania se confunde com a raça. Um casal de imigrantes negros pode chegar criança à Europa, constituir família na Europa, e ainda assim os seus filhos e netos não serão cidadãos europeus. Nascerão e morrerão como estrangeiros dentro do país em que construíram suas vidas. Isso só aparece para o grande público durante a Copa do Mundo, quando as seleções europeias saem providenciando cidadania para os jogadores de futebol negros. (Não sei detalhes, mas países latinos com ex-colônias parecem mais propensos a negligenciar o jus sanguinis paraconceder cidadania a africanos das ex-colônias. O Portugal salazarista, mesmo, considerava Angola e Moçambique estados portugueses.)

Assim, uma legislação etnocêntrica dispensa os europeus de inventarem leis racistas. 
Eles já vivem em um solo habitado por cidadãos brancos e não-cidadãos negros. Evidentemente, isso cria um barril de pólvora de ressentimento e culpa.

Brancos sem cidadania na Europa
Mas o critério é, frisemos, etnocêntrico, não racial. Um casal de italianos que migrasse para a Alemanha antes da União Europeia também viveria como um perfeito estrangeiro. O europeu é bastante sedentário: veja-se que no Brasil, onde há uma migração interna muito grande, um acriano e um gaúcho se entendem perfeitamente em português, mas um italiano de Nápoles e um do Piemonte, não, pois há a barreira do dialeto. Antes da descoberta da América, os europeus migravam muito pouco, então faz sentido que o seu critério de cidadania histórico seja étnico.

Quem eram os estrangeiros nesse critério? Os judeus. Eram estrangeiros errantes, viviam em guetos separados dos cristãos desde a Idade Média até Napoleão. Foi Napoleão, no século XIX, quem saiu conquistando a Europa e emancipando judeu. Portugal se diferencia do resto da Europa por ter resolvido a questão judaica em 1497. Tendo que deixar o Reino livre de todos os judeus por pressão espanhola, Portugal deu uma solução que hoje diríamos ser bem brasileira: em vez de matar ou expulsar todo mundo, batizou todo mundo e proibiu sinagogas. Mas o batismo podia ser mera formalidade; ademais, se você abrisse uma sinagoga, ninguém ia lá verificar, ou, se verificasse, você molhava a mão.

Funcionou assim até D. Sebastião ficar encantado em Alcácer-Quibir e deixar a Coroa na mão da Espanha, com sua temível Inquisição. Os ex-judeus então começam a cultuar a figura d’O Esperado, pois D. Sebastião voltaria e instauraria um paraíso terrestre. Surge o sebastianismo, uma heresia perseguida pela Inquisição. E, sendo a Inquisição muito mais relaxada no Brasil, aqui se tornou um bom lugar para ser sebastianista. Ao cabo, os ex-judeus não só foram integrados à nacionalidade portuguesa, apagando a ideia de um português étnico, como criaram um poderoso símbolo nacional.  Só a Península Ibérica entrou na modernidade sem guetos. Assim, não é de admirar que a mania racial tenha sido importada da América pelos europeus menos civilizados e usada contra os judeus. Toda essa Europa que se manteve com guetos judaicos hoje tem guetos de imigrantes, tudo não-cidadão.

O nome de gueto é aplicado no Brasil a favelas. Curiosamente, porém, gringos que vêm para o Brasil fazem turismo em favela, mas não em no-go areas europeias. A favela brasileira é cheia de eleitores, de cidadãos e de gente que fala o mesmo idioma que os demais brasileiros. Quem tem gueto é quem aponta o dedo para nós.


Individualismo radical
Penso que o que caracteriza melhor o progressismo de matriz europeia é o individualismo radical, a atomização da sociedade. Por mais que reconheçamos o amor romântico entre gente do mesmo sexo, e por mais que o casamento cristão moderno seja centrado nesse tipo de amor, ninguém razoável discordará de que as relações entre homens gays costumam ser mais fugazes do que as relações tradicionais entre homens e mulheres com filhos. A fugacidade do casamento me parece ser uma meta desse tipo de progressismo.

Filhos são um tipo de laço entre casais. Para impedir esses laços, basta vender o aborto como grande ícone de liberação feminina. A mulher ideal, então, faz sexo loucamente – sem se prender a nenhum homem – e, acontecendo de ficar grávida, irá ao médico tirar. Caso o bebê nasça – e natalidade da Europa é pequenininha –, tem o Estado de bem-estar social para bancar o bebê e deixar a mulher dispensar o homem e até os avós.  Assim, a vida ideal desse tipo de progressista se divide entre o trabalho bem remunerado e a balada, esta regada a drogas caras. Nas banlieues ficam os não-cidadãos responsáveis pelo trabalho braçal.

Bruna Frascolla, colunista - Gazeta do Povo - VOZES 

 

quinta-feira, 29 de outubro de 2020

Pandemia: até quando o povo e a economia aguentam?

 Vilma Gryzinski

Na primeira onda, havia um clima de medo diante do desconhecido; agora, mesmo entre os resignados, imperam a descrença e até o repúdio

E se as vacinas tiverem efeitos limitados? 
E se os mais prejudicados em seu ganha-pão não aceitarem resignadamente o que os novos confinamentos prenunciam? 
E se as economias nacionais não suportarem continuar a manter trabalhadores que não trabalham e empresas que não empreendem?

A semana nem chegou ao meio e a sucessão de más notícias na Europa já derrubou as bolsas, os ânimos e os planos de recuperação dos que escaparam dos estragos da primeira onda da pandemia. Os governantes que juraram nunca, jamais decretar de novo um confinamento tiveram que voltar atrás depois que o número de mortos, reduzidos a quase zero, voltou a entrar na casa das centenas por dia.

Como num jogo de dominó, foram tombando Espanha, França, Itália, Inglaterra, Alemanha. Todos tentando preservar as escolas, cujo fechamento se mostrou tão deletério para as crianças, ou dar alguma esperança de sobrevivência a setores tão devastados como o de bares e restaurantes. Deixá-los funcionar apenas até as 18 horas, como na Itália, não acalmou protestos de garçons, taxistas e oportunistas em geral. 

No mesmo país que, com todo seu poder de dramaticidade, a união nacional diante da peste foi orgulhosamente proclamada das sacadas em que se cantava ópera, o clima está mais para desunião. “Liberdade, liberdade, liberdade”, entoavam manifestantes em Milão, Turim e Nápoles, como na época do Ressurgimento, o movimento do século 19 que levou à unificação da Itália dividida. Também houve protestos na Espanha e na Alemanha, nessa de trabalhadores da “veranstaultungsbranche”, a indústria de eventos, uma das mais atingidas. 

A passividade temerosa dos primeiros meses da pandemia está menos unânime nessa nova fase de proibições. No início da crise, a oposição ao fechamento total partiu principalmente da direita libertária, afetada em seus fundamentos pela intervenção em massa nas atividades privadas. Agora, são as camadas mais prejudicadas pela paralisação que se manifestam.

Para qualquer lugar que se olhe, as perspectivas são negativas. “Vai ser pior dessa vez, com mais mortes”, disse ao Telegraph uma fonte com conhecimento dos prognósticos apresentados a Boris Johnson pelos especialistas que assessoram o governo britânico. “Foi essa a projeção apresentada ao primeiro-ministro, agora fortemente pressionado a impor um novo confinamento”. O cenário projetado é parecido com o do platô infernal que reinou no Brasil durante os meses em que as mortes estabilizaram-se num patamar alto e demoraram para começar a cair.

Na pior projeção, poderia haver 85 mil mortes, quase o dobro do atual total de 45 mil. Os prognósticos altamente negativos estão sendo vazados para convencer a opinião pública a aceitar restrições maiores ainda.

Boris Johnson, Emmanuel Macron e outros líderes europeus estão lidando com a possibilidade de que um confinamento total ou parcial em novembro possibilite um pequeno relaxamento no Natal, um respiro para não estragar totalmente as festas em família. Está difícil. A polícia britânica avisou que, embora não seja sua função, poderá registrar flagrantes de famílias que não obedeçam a regra proibindo que integrantes de domicílios diferentes se reúnam sob o mesmo teto  e cometam o grave crime de comemorar o Natal.

Os pequenos ditadores que moram no fundo de todas as instituições afloraram. No País de Gales, um dos quatro componentes do Reino Unido,  o governo mandou selar todas as gôndolas de supermercados que não tenham produtos de primeira necessidade. E o que são eles? É claro que o governo baixou uma diretiva definindo-os. Brinquedos e enfeites de Natal estão na lista dos proibidões, provavelmente feita por gente que não precisa administrar crianças presas em casa na época das festas de fim de ano.

Um desses burocratas tinha proibido, inicialmente, os tampões absorventes. Certamente não foi uma “pessoa que menstrua”,  a nova designação de mulher. 

Blog Mundialista Vilma Gryzinski, jornalista - Veja - leia MATÉRIA COMPLETA


quarta-feira, 8 de abril de 2020

Hamburgo, 1892 - No século 19, negacionismo dos notáveis de Hamburgo durou pouco, até elite ser vítima da doença - Elio Gaspari

Folha de S. Paulo - O Globo

O andar de cima sabia mais, e assim a cólera matou 10.000 pessoas na última epidemia do bacilo na Europa


No século 19, negacionismo dos notáveis de Hamburgo durou pouco, até elite ser vítima da doença     

Há os conservadores e há os atrasados, mas os comerciantes e banqueiros de Hamburgo achavam que eram conservadores iluminados, mas eram também atrasados. Em agosto de 1892, a cidade era administrada pela plutocracia local. Tinha o maior porto da Alemanha e macaqueava os ingleses. Morreu gente nos bairros pobres, mas não podia ser cólera, pois essa peste já teria sido controlada na Europa. 

A cidade tinha lindos prédios, mas não havia começado a obra para tratar sua água. Em 1871 seus notáveis haviam recusado a obrigatoriedade da vacina contra a varíola, porque ofenderia o direito das pessoas. (33 anos depois, Rui Barbosa usou o mesmo argumento, estimulando a rebelião de alguns militares e a maior revolta popular do Rio de Janeiro.) Tudo em nome dos princípios do liberalismo político e econômico que administrava a cidade.

Os plutocratas de Hamburgo acreditavam que a cólera disseminava-se por miasmas do ambiente, mais perigosos nos bairros de gente pobre e suja. Nove anos antes, o médico Robert Koch havia demonstrado que a cólera era transmitida por um bacilo e circulava com a água. Como eles acreditavam nos vapores, recusaram-se até a endossar a obrigatoriedade de fervê-la. (Em 1904, quando Oswaldo Cruz fumegava as casas do Rio para matar o mosquito da febre amarela, vários médicos ilustres insistiam na teoria do miasma.)

Até o verão de 1892 os plutocratas de Hamburgo entendiam que tudo dependia da higiene individual. O negacionismo dos notáveis durou pouco, até que começou a morrer gente no andar de cima. A imprensa havia evitado o assunto e a imediata instituição de uma quarentena foi descartada, pois prejudicaria os negócios. Quando as ruas estavam tomadas por cadáveres, o governo de Berlim mandou Robert Koch a Hamburgo e ele contou: “Senhores, eu esqueci que estava na Europa”. Oito anos antes, Nápoles, velha cidade insalubre com seu porto, havia derrubado a cólera com uma quarentena.

Uma médica americana que estava em Hamburgo escreveria: “Treze epidemias leves não haviam conseguido mostrar aos governantes da cidade que deveriam botar a casa em ordem.” A história dessa epidemia, com dez mil mortos, foi contada pelo historiador inglês Richard Evans (“Death in Hamburg: Society and Politics in the Cholera Years, 1830–1910.” De 1988, infelizmente só existe em papel.)

Sir Richard evitou atribuir o desastre a um mero interesse econômico. Ele foi mais fundo, mostrando que as opiniões dos médicos não são autônomas, mas têm raízes e funções sociais. Os donos das teorias do miasma eram médicos, como o doutor Osmar Terra. Aos 72 anos, numa entrevista ao repórter Isaac Chotiner, Evans rebarbou a teoria segundo a qual ditaduras e democracias lidam com epidemias de maneiras diferentes.

“[Epidemias] exigem grandes intervenções dos governos. Seja qual for a sua forma, seja qual for o tipo do Estado ou o partido que está no poder. De certa maneira, é a epidemia quem dá as cartas.”  Hoje, na praça em frente à Bolsa e à prefeitura de Hamburgo, um monumento lembra os mortos da epidemia de cólera. Ele foi esculpido em 1896. Oito anos depois, no Brasil, ainda se falava em miasma. O presidente Rodrigues Alves e o médico Oswaldo Cruz tiveram que enfrentar uma revolta contra a vacina obrigatória. Grande presidente, esse Rodrigues Alves.

Folha de S. Paulo - O Globo - Elio Gaspari, jornalista


sábado, 17 de agosto de 2019

Pessoas e pragas - J R Guzzo

Veja - Fatos

Se estivessem pondo "veneno" na comida, você iria ver gente caindo morta na sua frente em cada esquina, todo dia. Em vez disso, a população só aumenta


Publicado na edição impressa de VEJA
Todo mundo sabe o que é um tomate. Ou melhor, falando uma linguagem mais científica: grande parte dos 7 bilhões de habitantes do planeta, talvez a maioria, sabe o que é um tomate. O que bem menos gente sabe é que o tomate é também um dos vegetais que mais recebem defensivos químicos em toda a agricultura mundial — ou “agrotóxicos”, como diz o universo ecológico brasileiro. Não muitos, enfim, sabem que os melhores tomates do mundo são cultivados na área do vulcão Vesúvio, vizinha a Nápoles, na Itália (pelo menos na opinião praticamente unânime dos italianos). O tomate dali é maravilhoso, mas não é mágico. Recebe toneladas de defensivos agrícolas todos os anos, sem falar de fertilizantes, produtos para aumentar o rendimento das culturas e intervenções genéticas de última geração. Os napolitanos não fazem isso porque gostam de gastar dinheiro com “agrotóxicos”, mas porque, se não o fizerem, seus tomates morrerão. E aí: o que seria da pizza? E do molho al sugo? E do ketchup?

O problema não seria só com a pizza de Nápoles e do resto da Itália. Sem tomate iria acabar, do mesmíssimo jeito, a pizza da Mooca, de São José dos Ausentes e da Groenlândia, porque ninguém ainda descobriu como seria possível cultivar tomates, em volume que faça algum sentido, com a ação natural das abelhas, trato de algas marinhas e outras lendas presentes no aparelho mental da população naturalista, orgânica, vegana, e por aí afora. Você decide, então: ou existe tomate do jeito que ele é na vida real, ou não existe tomate. A lógica comum diria que é melhor deixar os tomates quietos, como eles estão — mesmo porque, ao que se sabe, pouquíssima gente morre neste mundo por comer a macarronada da mamma. Mas vá você dizer isso a um combatente a favor da alimentação natural e contra “o veneno na minha comida”. Será acusado de ser um “defensor do agronegócio”, da “indústria química”, da “ganância”, do “lucro” e daí para baixo. Mais: vai ser carimbado como retrógrado, fascista e inimigo da saúde humana em geral.

Não se trata de uma questão só de tomates. O trigo e a soja, o arroz e o feijão, o milho e a batata, e todos os alimentos produzidos em massa na face da Terra têm de receber hoje montanhas de produtos químicos para sobreviver — ou é assim ou desaparecem. O problemão, nesse caso, é como alimentar na prática os 7 bilhões de cidadãos citados acima. Não apareceu até agora uma única resposta coerente para isso. O que existe mesmo, no mundo das realidades, é a seguinte opção: ou você alimenta as pessoas ou alimenta as pragas. Pior ainda, quem vai levar na cabeça são os mais pobres, pois a maioria da população global é constituída de pobres — e, por eles serem muitos, criam o incômodo de consumir mais comida que todas as classes médias, altas ou altíssimas do mundo somadas. São eles os que vão comer menos — até porque não têm dinheiro para comprar sua janta nas lojas “biô”, orgânicas ou naturalistas do Leblon.

Nunca houve tanto agronegócio no mundo. Nunca se consumiram tanta carne, frango e outras proteínas básicas. Nunca houve tanto alimento para o homem — e nunca se produziu e vendeu tanto produto artificial para o campo. Ao mesmo tempo, jamais a população do planeta foi tão grande como hoje. Nem tão bem alimentada, até por questões legais — uma Volkswagen, por exemplo, é obrigada por lei a oferecer pelo menos dois tipos de proteína em seus refeitórios, no almoço e no jantar, todos os dias. Só consegue cumprir a lei se acha frango e boi em quantidade suficiente — e para isso frangos e bois têm de engordar cada vez mais depressa, o que é impossível sem hormônios, rações com componentes químicos, vacinas. Milhares de outras empresas brasileiras precisam, por lei, fazer exatamente a mesma coisa — ou os fiscais vão lhes socar em cima uma quantidade de multas capaz de levar até o Google à falência.

Como fica, então? Se estivessem pondo “veneno” na comida, você iria ver gente caindo morta na sua frente em cada esquina, todo dia. Em vez disso, a população só aumenta. É óbvio que o uso da química, biogenética e outras tecnologias na agricultura é uma questão de doses certas, produtos de qualidade, mais segurança quanto aos seus danos potenciais à saúde, mais competência no manejo. Mas nunca, também, houve progressos tão espetaculares na melhoria científica dos adubos, pesticidas, transgênicos e tudo o mais que se põe nas lavouras. São os fatos. A alternativa é voltar à Idade da Pedra, quando a alimentação era 100% natural — e o sujeito precisava ter uma sorte do cão para chegar vivo aos 30 anos de idade.

J R Guzzo - Blog Fatos - Veja