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sexta-feira, 26 de janeiro de 2024

Corte de Haia determina que Israel tome medidas contra 'atos de genocídio' em Gaza ... - O Globo

A Corte Internacional de Justiça (CIJ) declarou nesta sexta-feira que a operação militar de Israel contra Gaza representa um risco plausível de danos irreversíveis e imediatos à população palestina em Gaza, determinando que o Estado judeu tome todas as medidas em seu poder para evitar violações da Convenção das Nações Unidas sobre Genocídio, de 1948, e permita a entrada de ajuda humanitária no enclave palestino.

A determinação não é um reconhecimento da prática de crime de genocídio por Israel — o que poderá ou não ser determinado apenas ao fim do julgamento do mérito do processo, que pode levar anos — e não atende à principal medida cautelar solicitada pela África do Sul, que pedia o fim da operação militar contra Gaza. 
Apesar disso, as medidas provisórias, que incluem o pedido para que Israel informe a Corte em 30 dias sobre seus esforços para cumprir suas determinações, pareceram uma repreensão para os israelenses e uma vitória moral para os palestinos.

— O Estado de Israel deve, em acordo com suas obrigações sob a Convenção Sobre a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio, em relação aos palestinos em Gaza, tomar todas as medidas em seu poder para prevenir o cometimento de todos os atos descritos no Artigo 2º da convenção — declarou a presidente da corte, a americana Joan Donoghue.

O artigo mencionado pela jurista na decisão define genocídio como os seguintes atos, desde que cometidos com a intenção de destruir "no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso": a) matar membros do grupo; b) causar lesão grave à integridade física ou mental de membros do grupo; c) submeter intencionalmente o grupo a condição de existência capazes de ocasionar-lhe a destruição física total ou parcial; d) adotar medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio de grupo; e) efetuar a transferência forçada de crianças do grupo para outro grupo.

A corte também disse que estar "gravemente preocupada" com o bem-estar de mais de 200 pessoas feitas reféns pelo Hamas durante os ataques de 7 de outubro de 2023, que deixaram 1,2 mil mortos, e pediu sua imediata libertação. A resposta de retaliação de Israel em Gaza já deixou mais de 26 mil mortos, segundo o Ministério de Saúde de Gaza, território que é controlado pelo Hamas desde 2007.

Veja as medidas cautelares determinadas pelo CIJ a Israel:

  • Tomar todas as medidas em seu poder para prevenir o cometimento de todos os atos descritos no Artigo 2º da convenção;
  • garantir, imediatamente, que seus militares não cometam nenhum ato descrito como genocídio pela convenção;
  • tomar todas as medidas para prevenir e punir incitações diretas e públicas sobre cometimento de genocídio em relação aos palestinos em Gaza;
  • tomar medidas efetivas para prevenir a destruição e garantir a preservação de evidências relacionadas a atos de genocídio contra palestinos em Gaza.;
  • submeter um relatório à Corte, dentro de um mês, mostrando o que fez para garantir que as medidas cautelares estão sendo colocadas em prática.

Todas as medidas cautelares determinadas pela Corte foram alcançadas por ampla maioria entre os juízes (por 16 votos a favor e 1 contra ou 15 a favor e 2 contra).

'Baita símbolo'

Para muitos israelenses, o fato de um Estado fundado após um genocídio ser acusado de outro é um "baita símbolo", disse ao New York Times Alon Pinkas, um comentarista político israelense e ex-embaixador.— Só o fato de sermos mencionados na mesma frase em que o conceito de genocídio é citado, não mesmo atrocidade, força desproporcional, crime de guerra, mas genocídio, é extremamente desconfortável — disse Pinkas.

Para muitos palestinos, apesar de a intervenção da CIJ trazer pouco alívio prático, há um breve sentimento de validação à sua causa, especialmente considerando-se que, sob sua perspectiva, Israel raramente é obrigado a prestar contas de suas ações. — A matança e a destruição continuam — disse Hanan Ashrawi, uma ex-autoridade palestina. — [Mas a decisão reflete] uma séria transformação na forma de percepção e tratamento de Israel globalmente: está prestando contas pela primeira vez, e perante a mais alta corte e por uma decisão quase unânime.

Contudo, para muitos israelenses, o mundo impõe a Israel um padrão mais alto do que à maioria dos outros países, com as determinações da CIJ parecendo o exemplo mais recente de preconceito contra o país em um fórum internacional. O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, reagiu à decisão classificando como "escandaloso" o caso de genocídio movido pela África do Sul. "A acusação de genocídio levantada contra Israel não é apenas falsa, é escandalosa, e pessoas decentes em todo o mundo deveriam rejeitá-la", disse em um vídeo.

A liderança do Hamas classificou a decisão como "importante" e disse contribuir para "isolar Israel e expor seus crimes em Gaza". A Autoridade Nacional Palestina afirmou que a decisão da CIJ mostra que "nenhum Estado está acima da lei". Os Estados Unidos, por sua vez, reiteraram sua posição de que as alegações de genocídio são "infundadas".

A África do Sul saudou as medidas provisórias ordenadas pela CIJ chamando-as de "uma vitória decisiva para o Estado de Direito internacional e um marco significativo na busca de justiça para o povo palestino".

“Em uma decisão histórica, a Corte Internacional de Justiça determinou que as ações de Israel em Gaza são plausivelmente genocidas e indicou medidas provisórias com base nisso”, diz o comunicado. "A África do Sul continuará a agir no âmbito das instituições de governança global para proteger os direitos, incluindo o direito fundamental à vida, dos palestinos em Gaza — que continuam em risco urgente, incluindo devido ao ataque militar israelense, à fome e às doenças — e para obter a aplicação justa e igualitária do direito internacional a todos."

Contexto da acusação

A acusação de genocídio contra Israel foi apresentada pela África do Sul no ano passado e começou a ser avaliada pelo tribunal internacional há duas semanas. 
Pretória acusa o Estado judeu de violações à Convenção sobre Genocídio durante a operação militar em Gaza. 
Israel já classificou o caso publicamente como difamação, e líderes políticos, como Netanyahu, puseram em dúvida o cumprimento de uma eventual decisão desfavorável. — Ninguém vai nos parar, nem Haia [sede da CIJ], nem o Eixo do Mal [Irã e grupos e países aliados no Oriente Médio] nem ninguém — afirmou o primeiro-ministro israelense em 14 de janeiro, dois dias depois de a defesa do país apresentar seus argumentos na CIJ.

A equipe jurídica sul-africana apresentou a denúncia na sede do tribunal, em Haia, em 11 de janeiro. O cerne da acusação foi demonstrar que o governo israelense teria demonstrado "intenção genocida" ao lançar sua operação contra Gaza. Para isso, os juristas apresentaram imagens da destruição e do impacto civil provocado pelas forças de Israel em Gaza, além de declarações públicas de autoridades do país que, sob a tese sul-africana, comprovam que houve uma tentativa de desumanizar o povo palestino e de sinalizar sua eliminação.

A África do Sul solicitou que a corte declarasse a suspensão das operações militares israelenses "em" e "contra" Gaza; a garantia de que os militares israelenses (ou quaisquer forças relacionadas) parassem as operações ofensivas; o fim do assassinato e deslocamento do povo palestino; a normalização do acesso a alimentos, água, infraestrutura e saúde; e que Israel tomasse "todas as medidas razoáveis ao seu alcance" para prevenir um genocídio.

Israel rebateu as acusações um dia depois da apresentação do caso pela África do Sul. A defesa tentou descaracterizar o argumento da acusação de que houve tentativa deliberada de destruição do povo palestino, apresentando a tese jurídica de que os impactos provocados por uma ação militar a civis não é o mesmo que o crime de genocídio.

Na quinta-feira, o New York Times revelou que Israel, como parte de sua defesa, apresentou à CIJ mais de 30 ordens antes secretas dadas por líderes governamentais e militares que, diz, mostrariam os esforços do país para diminuir as mortes entre os civis no enclave palestino.

Além disso, a equipe israelense também exibiu imagens da violência cometida pelo Hamas durante os ataques de 7 de outubro a Israel e acusou a equipe sul-africana de apresentar uma visão "totalmente distorcida" e manipuladora sobre os fatos ocorridos na região.

A decisão desta sexta-feira é apenas a primeira dentro de um processo que deve se arrastar por anos. A CIJ ainda precisa julgar o conteúdo material da acusação, ou seja, a suposta responsabilidade do Estado de Israel em crime de genocídio, para além das medidas emergenciais pedidas pela África do Sul.

De acordo com Sylvia Steiner, ex-juíza do Tribunal Penal Internacional (TPI), também em Haia, há diferentes desafios das cortes internacionais para determinar a responsabilidade em um caso de genocídio, em que a intenção de dizimar um grupo precisa ser evidente.— Aquilo que no começo do conflito a gente já dizia que se tratava de crimes de guerra, agora se alega que esses crimes de guerra têm um objetivo genocida — explicou ao GLOBO Steiner, única brasileira a já ter integrado o TPI. — Existem desafios de diferente natureza para provar o genocídio em uma corte internacional. No TPI, o mais difícil é determinar a responsabilidade penal individual, como o dolo e o nexo de causalidade entre as ações e o resultado. Por outro lado, determinar a responsabilidade do Estado, como a África do Sul está fazendo, é mais fácil pelo número de provas que podem ser coletadas.

Em Mundo - O Globo  - MATÉRIA COMPLETA

 

sábado, 18 de novembro de 2023

Por miopia, ignorância e preconceito, esquerda apoia ditaduras - Carlos Alberto Sardenberg

quarta-feira, 8 de novembro de 2023

O que é um judeu? O caso Herzl - Gazeta do Povo

Bruna Frascolla - VOZES

Sionismo

 

 Theodor Herzl com sua família perfeitamente europeia. O menino não é circuncidado.| Foto: Domínio público

A escalada do conflito em Israel voltou os holofotes para o sionismo. De um lado, diz-se que o sionismo é uma coisa essencialmente maléfica; de outro, diz-se que ser contra o sionismo é o mesmo que tatuar uma suástica na testa
Arrisco dizer, porém, que a imensa maioria dos que falam sobre sionismo não fez mais que seguir as exortações e invectivas dos seus influencers prediletos, sem se dar ao trabalho de averiguar nada. 
Ninguém tem obrigação de saber sobre tudo, claro. 
Mas o mínimo que se espera é que, quando não temos a pretensão de conhecer um assunto, não subamos em palanques virtuais para pedir cabeças e dar chiliques.

Como faz parte da minha profissão escrever sobre as coisas – e como, ainda por cima, tenho interesse em história do pensamento racial por causa das semelhanças entre o neorracismo negro e o nazismo –, fiz o elementar: li O Estado Judeu (1895), de Theodor Herzl, a fim de comentá-lo aqui. Esse opúsculo é a fundação do sionismo (ou do “sionismo moderno”, como dizem os sionistas mais ousados que alegam que o sionismo está na Torá).

Theodor Herzl (1860 – 1904) nasce em Peste (metade de Budapeste), no Império Austro-Húngaro, numa família de judeus assimilados. O que é um judeu assimilado?

Bom, o judaísmo é pelo menos duas coisas ao mesmo tempo: uma religião e uma etnia
Ao contrário das demais religiões abraâmicas, o judaísmo não faz proselitismo e não está de portas abertas para a entrada de qualquer um. Nem sempre foi assim. 
Na Antiguidade tardia, os judeus converteram pelo menos dois grupos populacionais relevantes: algumas tribos nômades dos cazares, que ficavam rodando pela atual Ucrânia, Rússia e Cazaquistão, e algumas vilas etíopes. 
Os etíopes ficaram em relativo isolamento na maior parte da História, mas hoje judeus negros têm direito à cidadania israelense e, de fato, a esmagadora maioria vive lá hoje. 
Já os cazares, que deixaram de existir enquanto povo ou tribo, deixaram descendentes entre os judeus asquenazitas. Isso não quer dizer que os judeus asquenazitas não têm origem hebraica; quer dizer somente que são mestiços que têm o sangue dessa tribo extinta de língua túrquica.
De meados do século XIX a meados do século XX, floresceu o racismo científico. Por isso, o judaísmo era facilmente identificado com uma raça. À epoca de Herzl, portanto, um “judeu assimilado” era um indivíduo de raça judaica que aderiu à cultura do seu meio. 
Isso poderia incluir a conversão à cristandade, ou a adoção de um cientificismo ateu.
 
Theodor Herzl, então, era um judeu assimilado no Império Austro-Húngaro. Sua primeira língua era o alemão e ele era um fervoroso germanófilo em sua juventude: achava que a germanização progressiva faria os indivíduos de origem judaica, como ele, a evoluírem. No âmbito pessoal, tinha planos de ser um grande engenheiro. 
O motivo era o Canal de Suez, um grande um projeto utópico dos sansimonianos que acabou dando certo. 
Os sansimonianos eram engenheiros utópicos e predecessores tanto do positivismo como do marxismo. 
 Fizeram parte do movimento, inclusive, judeus sefarditas franceses, os Irmãos Pereire (um afrancesamento de Pereira), que eram banqueiros rivais dos Rothschild, também banqueiros judeus, porém asquenazitas.
 
Herzl não deu certo na engenharia e foi para as humanas. Virou jornalista, poeta e folhetinista (profissão hoje extinta, a do escritor de romances que saíam em capítulos nos jornais, como novela de TV, só que por escrito: Machado de Assis e Victor Hugo eram folhetinistas). 
Um episódio, porém, o converteu num ativista político: o Caso Dreyfus (1894 - 1906). 
Em resumo, um militar francês de origem judaica, Alfred Dreyfus, perdeu as patentes e foi condenado pela França à prisão perpétua por traição, mesmo sendo inocente.  
No fim, após grande comoção pública, Dreyfus foi inocentado e recuperou as patentes. A França é um país bem antissemita (basta comparar a boa vontade dos franceses para delatar aos nazistas gente de sangue judaico); assim, restou claro que o preconceito contra a origem racial de Dreyfus foi o motivo da condenação.
 
Para piorar, o demagogo Karl Lueger, na Áustria-Hungria natal de Herzl, arrastava multidões com sua pauta antissemita. Foi um modelo para o jovem austríaco Adolf Hitler. 
Assim, Theodor Herzl viu frustrada a sua ideia de viver reconhecido como um germânico pleno, cultor da língua. Daí resultou a sua ideia do Estado Judeu. O Caso Dreyfus começa em 1894; em 1895 sai Der Judenstaat, ou O Estado Judeu.

Mas o que é um judeu? Essa é uma questão com a qual Herzl se bate no seu opúsculo. Herzl decididamente não era um religioso: não se deu nem mesmo ao trabalho de circuncidar o filho. No entanto, a “fé” é apenas a segunda das duas coisas apontadas que unem o povo judeu, e aparece como fator de união só do meio para o fim do escrito. A primeira dela é o antissemitismo. Diz ele: “Nós somos um povo: nossos inimigos nos fizeram um só sem o nosso consentimento, como sempre acontece na História. Nós nos unimos no sofrimento, e no sofrimento descobrimos, de repente, a nossa força. Sim, nós temos a força para construir um Estado; na verdade, um Estado Modelo.” (Eis o alemão para quem quiser comparar: “Wir sind ein Volk – der Feind macht uns ohne unseren Willen dazu, wie das immer in der Geschichte so war. In der Bedrängniss stehen wir zusammen und da entdecken wir plötzlich unsere Kraft. Ja, wir haben die Kraft, einen Staat, und zwar einen Musterstaat zu bilden.” Basta ir no Wikisource, pois o texto original está em domínio público. Os direitos das traduções são outra história.)

Abstraída a questão religiosa, o que é um judeu? Para Herzl, um judeu é aquele que é perseguido por ser judeu. Assim, uma consequência óbvia tirada pelos contemporâneos de Herzl é que ele fomentaria o antissemitismo para fazer prosperar o seu projeto político. Do mesmo jeito que os líderes do movimento negro precisam aumentar o racismo para provar que o seu próprio trabalho é fundamental. A pretensão de falar em nome da coletividade dos judeus também lembra o identitarismo. Mas o que me salta às vistas nesse trecho é a possibilidade de criar uma identidade baseada na opressão social, em vez de numa realidade concreta. Transfira isso para a definição de “mulher” e pense no que pode dar.

Herzl se defende das acusações de que ele precisa criar antissemitismo onde não há, ou aumentar onde já há. A sua defesa consiste em atacar a “assimilação”, dizendo ser ela impossível, exceto por meio dos casamentos mistos. Só por meio da miscigenação os judeus poderiam ser assimilados: “A assimilação, pela qual compreendo não só a mera aparência exterior das roupas, dos estilos de vida, dos costumes e da língua, mas, em vez disso, uma identificação em um sentido e um tipo... A assimilação generalizada dos judeus só poderia ser feita por meio dos casamentos mistos.” (Em alemão, procurar pelo parágrafo que começa com “Die Assimilirung, worunter…)

Resta perguntar, então, o porquê. Será o judaísmo considerado uma raça também por Herzl? Uma raça associada a um modo interno de sentir? A biologia molda o nosso sentido interno, de modo que acabar com o judaísmo só seria possível por meio de uma mudança biológica? Outra vez, isso lembra o cartaz dos racialistas na Avenida Paulista: “Miscigenação é genocídio.” E os tribunais de heteroidentificação racial também exigem uma conformação psicológica (que nada mais é que a adesão ao movimento) para reconhecer alguém como negro.

Seja como for, uma coisa relevante que transparece em Herzl é que as comunidades de origem judaica àquela altura mantinham o hábito de casar entre si, de modo que a “raça” permaneceria sem muita mestiçagem. (O exemplo que ele dá é o de um "casamento misto" reconhecido pela Hungria no qual uma judia se casava com um "judeu batizado".) A relevância do caráter racial para o debate sionista não pode ser diminuída, e o melhor exemplo disso é a politização que a questão da remotíssima miscigenação com os cazares (lá na antiguidade…) causou entre judeus e não-judeus no século XX, com a publicação do livro de Arthur Koestler, um judeu asquenazita que queria provar que não tinha nada a ver com semitas.

Mas bom, a maior diferença entre os negros e os judeus, no que concerne a essa questão, é que podemos sem pestanejar dizer o que é um negro: um negro é alguém de pele negra. 
Não há nada de cultural envolvido nessa questão; negros podem ser judeus, muçulmanos, ateus, brasileiros, congoleses, etíopes... 
Não faz sentido perguntar se um negro é assimilado; faz menos sentido ainda um negro dizer que “se descobriu” negro. Por outro lado, as discussões sobre assimilação eram habituais na Europa de Herzl; e é possível alguém se descobrir judeu após analisar o próprio histórico familiar. 
Afinal, o que é um judeu? Herzl não dá uma definição, nem toca nos critérios pelos quais alguém é reconhecido ou se reconhece como judeu.

Respondamos, então. Considerando a biologia algo apenas acidental, podemos com facilidade apontar o critério primário segundo o qual alguém é apontado como judeu: ter nascido de um ventre judaico. Ou seja, o judeu é o filho da judia (e não necessariamente do judeu). Judeu nasce judeu, não se torna. E como a própria judia pode ser ateia ou convertida a outra religião, resulta que esse critério cultural acaba redundando na matrilinearidade pura e simples. Assim, das três religiões abraâmicas, só uma tem porta de saída: se no islamismo podem te matar caso você queira sair, no judaísmo você continua sendo considerado judeu mesmo que nunca tenha sido nem sequer circuncidado.

O leitor deve saber da “conversão” ao judaísmo de figuras ilustres, tais como a filha de Trump, que se casou com um judeu e hoje é considerada judia. A mãe da israelense Shani Louk é uma alemã de origem católica que fez o mesmo trajeto da Ivanka Trump: casou com um judeu e foi aceita como judia. Não posso apontar fontes, porque meu conhecimento do assunto é oral e o judaísmo não tem Papa, de modo que não é fácil apontar uma doutrina oficial. De todo modo, explico o que eu aprendi oralmente: não é possível se tornar judeu; o que é possível é a autoridade religiosa reconhecer que você é uma alma judaica que foi, digamos assim, extraviada para um útero não-judaico.

Sei disso porque um familiar mestiço, judeu segundo critérios étnicos, resolveu virar judeu religioso e quis que o lado gentio da família aderisse à religião judaica junto com ele. De minha parte, achei a religião mais parecida com um transtorno obsessivo compulsivo generalizado, e não poderia haver proposta menos tentadora. E por aí eu entendi também por que tem tanto judeu ateu: dá trabalho demais ser religioso e é muito aflitivo, pois envolve passar o dia inteiro pensando nisso. A religião inclui até agradecimento a Hashem quando se vai ao banheiro. E Hashem é o modo de se referir a Deus, cujo nome não deve ser pronunciado ou escrito à toa.

Em seu opúsculo, Herzl menciona a acusação de que ele fortaleceria o antissemitismo justamente quando o processo de assimilação estaria quase concluído. 
 De fato, muitos europeus de origem judaica (como se costumava dizer então) haviam se convertido a diversas religiões cristas, ou haviam até nascido num lar cristão novo. 
Karl Popper, austro-húngaro, nasceu num lar cristão novo luterano; 
Edith Stein se converteu ao catolicismo, virou freira e foi canonizada; Jacques Maritain, filósofo católico francês, casou-se com uma judia que se converteu ao catolicismo junto com a irmã; 
Karl Polanyi, austro-húngaro, nasceu num lar cristão novo calvinista; 
Aurel Kolnai, austro-húngaro, converteu-se ao catolicismo… 
Que eu saiba, não existia isso de ser reconhecida como alma judaica para se casar com um judeu; ou, se havia, não havia interesse. A tendência parecia ser a de o grosso da tribo judaica se dissolver na cristandade (como as tribos europeias fizeram antes), sobrando só os ortodoxos, cuja identidade estaria fundada na observância à religião judaica… Até aparecer o sionismo. Aí ficamos fazendo cálculos de matrilinearidade, ou recorrendo a tribunais de heteroidentificação de alma, para decidir quem é judeu.

Porém, uma fé que concorria com as confissões cristãs era a fé laica na ciência, o cientificismo que tanto atraíra o jovem Herzl à engenharia. E o que vemos no seu esboço de como deveria ser o Estado Judeu é a manifestação da fé na Ciência. Que fica para o próximo texto.

sábado, 13 de abril de 2019

Rumo ao segundo Israel? Netanyahu rompe com o consenso sionista que se estendia da esquerda à direita


A reeleição de um líder político deve, normalmente, ser examinada sob o registro da continuidade. A regra não se aplica ao triunfo de Binyamin Netanyahu nas eleições gerais israelenses. Na campanha, o primeiro-ministro prometeu anexar as colônias israelenses na Cisjordânia e declarou que "Israel não é um Estado de todos os seus cidadãos". À luz do "Deus de Trump" (apud Ernesto Araújo), Netanyahu avançou os sinais vermelhos sempre respeitados pela corrente principal do sionismo. Nesse passo, ameaça levantar a âncora que prende Israel à rocha da democracia.

A maior vitória militar de Israel trouxe com ela um desafio de natureza existencial. Depois da Guerra dos Seis Dias (1967), o Estado judeu converteu-se em potência ocupante dos territórios palestinos (Jerusalém Oriental, Cisjordânia, faixa de Gaza). O rápido crescimento demográfico palestino descortinou a perspectiva de configuração de uma maioria populacional árabe no conjunto geopolítico Israel/Palestina. O exercício da soberania sobre uma maioria destituída de direitos políticos terminaria por corroer os fundamentos democráticos de Israel. O Estado judeu teria que escolher entre a democracia e a ocupação.

Os Acordos de Oslo (1993) surgiram como solução para o dilema. A paz pela partilha da Terra Santa em dois Estados não só atenderia à demanda nacional palestina como protegeria o caráter judeu e democrático de Israel. O fracasso dos acordos de paz recolocou o dilema. Netanyahu oferece, agora, sua própria solução: a ocupação permanente, a renúncia à democracia, a refundação de Israel como Estado baseado na discriminação étnica oficial. A falência dos Acordos de Oslo foi obra conjunta dos fundamentalistas palestinos do Hamas e da direita israelense polarizada pelo Likud. Mas Ariel Sharon, o "falcão" do Likud, conservou a porta aberta para a solução dos dois Estados ao promover a retirada israelense da faixa de Gaza (2005).

Sharon reconhecia, por meio do desengajamento, que só um Estado, uma nacionalidade e uma cidadania para os palestinos assegurariam a sobrevivência do Israel democrático fundado em 1948. Netanyahu rompe, hoje, com o consenso sionista que se estendia da esquerda à direita. Depois de anos de sabotagem tácita da retomada de negociações de paz, a prometida anexação de extensas áreas da Cisjordânia equivale a uma sentença de morte para a solução dos dois Estados. Sob o amparo de Trump, que acaba de reconhecer a soberania israelense sobre o território sírio das colinas de Golã, o chefe de governo de Israel ameaça inviabilizar um futuro Estado palestino.

Israel não é um, mas dois. Historicamente, é o Estado-nação do povo judeu. Legalmente, é um Estado de todos os seus cidadãos. A alma histórica expressa-se na Lei do Retorno: a concessão de cidadania a qualquer judeu que imigrar para Israel. A alma legal exprime-se na Corte Suprema, que não distingue os direitos de cidadãos judeus dos direitos de cidadãos não judeus. As duas almas convivem em perene tensão, formando as faces paradoxais do Estado judeu. Netanyahu almeja eliminar a tensão pela supressão do princípio da igualdade perante a lei.

O conceito de que "Israel não é um Estado de todos os seus cidadãos" abre a fresta por onde podem passar iniciativas já em curso legislativo como a remoção da cidadania de não judeus "desleais" ao Estado. No limite, a ruptura do princípio da igualdade legal propiciaria a retirada em massa da cidadania dos árabes israelenses, uma violação flagrante dos direitos humanos. A ideia escandalosa circula entre correntes supremacistas judaicas, como o Otzma Yehudit (Poder Judaico), que transitam dos subterrâneos para as cercanias do governo israelense.

Netanyahu é um refundador pós-sionista. O Israel que ele pretende reinventar renega os valores básicos do Estado proclamado por Ben Gurion em 1948.

Por: Demétrio Magnoli, sociólogo, autor de diversas obras e doutor pela USP - Folha de S. Paulo

sexta-feira, 24 de abril de 2015

Investigado por terrorismo em Brasília já trabalhou na Casa Civil



Polícia Federal apreendeu documentos na casa do advogado Marcelo Bulhões dos Santos, suspeito de manter ligações com grupos extremistas
O advogado de Brasília que entrou no radar da Justiça por suspeita de cumplicidade com terroristas é um brasileiro que se converteu ao islamismo e já trabalhou na Casa Civil da Presidência da República durante a gestão de Dilma Rousseff. Ele também foi funcionário da própria Polícia Federal, órgão que ele viria a acusar de ser conivente com interferência internacional na CPI da Espionagem. Marcelo Bulhões dos Santos pertence à corrente sunita e frequenta com regularidade a mesquita da capital federal.

Marcelo Bulhões dos Santos, no canto esquerdo da foto (de barba): ele trabalhou por 3 anos e 9 meses na Casa Civil(Reprodução / Facebook/VEJA)

Os policiais federais que estiveram no prédio de Bulhões nesta sexta-feira apreenderam documentos e materiais eletrônicos, por ordem da Justiça Federal. Os indícios dão conta da ligação dele com extremistas estrangeiros. Como não há crime de terrorismo no país, a Justiça colhe elementos para julgá-lo por crimes acessórios, como estelionato e falsificação de documento.

Bulhões já era conhecido pela PF. Ele é ex-servidor de nível médio da corporação, onde trabalhou entre 2004 e 2007. Como fala árabe, espanhol, italiano e inglês foi lotado na Coordenação-Geral de Polícia Criminal Internacional, braço da Interpol na PF, antes de ser cedido à Presidência da República. Exercia atividades burocráticas na troca de informações e comunicados com outros escritórios centrais nacionais da Interpol. Anos depois, ele diria que havia interferência de serviços de inteligência dos Estados Unidos da PF.

Bulhões formou-se em 2009 em uma universidade particular de Brasília. Ele trabalhou por quase quatro anos como assessor da Casa Civil, durante a gestão da então ministra Dilma Rousseff. Foi nomeado por ela para um cargo de confiança: supervisor de legislação pessoal. Bulhões diz ter se desligado em 2010 por vontade própria, para se dedicar à atividades de consultoria jurídica. Hoje, atua no próprio escritório, que funciona no apartamento onde também mora sua mulher e o filho do casal. Há dois meses, passou a assessorar a embaixada de Omã na capital federal.

Espionagem - O alvo da PF também denunciou supostas atividades de contraterrorismo dos Estados Unidos no Brasil. Em setembro de 2013, Bulhões encaminhou à senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), então presidente da CPI da Espionagem, um documento que reunia relatórios sobre atividades de terroristas na América do Sul. Disse que agia por "senso de responsabilidade cívica". Alguns dos documentos eram da Embaixada Americana no Brasil, vazados pelo WikiLeaks, e parte do acervo da biblioteca do Congresso dos Estados Unidos. Outros, datados de 1995 a 2011, pertenciam ao arquivo do Itamaraty e, segundo ele, "sugeriam atividades de espionagem norte-americana em desfavor do governo brasileiro".

O relatório americano sobre atividades criminosas e terroristas na tríplice fronteira, encaminhado por Bulhões à CPI da Espionagem, cita entre outros alvos o doleiro Alberto Youssef, delator do escândalo do petrolão. Youssef é descrito como um dos "maiores operadores de lavagem de dinheiro do país, tendo trabalhado para o traficante Fernandinho Beira-Mar".  "Há fortes indícios de que cidadãos brasileiros de origem árabe e/ou de confissão islâmica tenham sido objeto de investigação por parte de órgãos de inteligência nacionais e estrangeiros , sendo que nem sempre havia motivo plausível para tal", justificou Bulhões. "Nesse sentido, houve, inclusive, diversas ocasiões em que o ora signatário [ele mesmo] presenciou a interferência de serviços estrangeiros na atuação de órgãos do governo federal, dentre os quais é possível destacar o Departamento de Polícia Federal, do qual o subscritor é ex-servidor."

Em postagens no Facebook, Bulhões também justifica a ação do grupo terrorista Hamas, que costuma lançar mísseis sobre o território israelense. "Sem a ocupação dos sionistas de uma terra alheia nem sequer existiria o Hamas, muito menos os mísseis", disse ele em julho de 2014. O advogado prosseguiu: "Os apoiadores de Israel chamam o Hamas de 'terrorista', mas esquecem de estudar sobre o modo que se deu a formação do pseudo-estado judeu".​ Bulhões formou-se bacharel com uma monografia intitulada "O princípio da igualdade no Direito islâmico" e estudou no prestigiado Colégio Militar do Rio de Janeiro.  

Fonte: Época

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Doutrina Obama = maldita queda livre



Decifrando a Doutrina Obama
James Jeffrey, ex-embaixador extraordinário e plenipotenciário de Barack Obama no Iraque, diz o seguinte sobre o atual desempenho da administração no Oriente Médio: "estamos em uma maldita queda livre".

Veja os equívocos: ajudar a derrubar Muamar Kadafi na Líbia, resultando em anarquia e guerra-civil. pressionar Hosni Mubarak do Egito a renunciar, depois apoiar a Irmandade Muçulmana, fazendo com que o atual presidente Sisi se volte para Moscou,  alienar o mais leal e resoluto aliado de Washington na região, o Governo de Israel,  desprezar o Estado Islâmico do Iraque e da Síria (EIIS) como uma "equipe desportiva do terceiro ano do ensino médio" pouco antes dele capturar cidades importantes,  fazer apologias ao Iêmen como um sucesso do contraterrorismo, pouco antes de seu governo ser derrubado,  alarmar as autoridades sauditas ao ponto delas formarem uma aliança militar contra o Irã,  mimar Recep Tayyip Erdoğan da Turquia, estimulando suas tendências ditatoriais,  sair prematuramente do Iraque e do Afeganistão, arruinando o gigantesco investimento americano nesses dois países.

E acima de tudo: fazer acordos equivocados além de perigosos com os mulás do Irã, ambiciosos para obterem armas nucleares. Trata-se de uma série de ou será que há uma erros aleatórios de uma liderança incompetente intenção grandiosa, mal concebida por detrás desse hábito? Até certo ponto é incompetência, como quando Obama se curvou ao rei saudita, ameaçou o governo da Síria na questão das armas químicas antes de mudar de ideia e agora envia ajuda militar a Teerã no Iraque e enfrenta o Irã no Iêmen.

Mas também há uma hipótese de uma ideia grandiosa que necessita de explicação
Como alguém de esquerda, Obama vê os Estados Unidos como tendo, historicamente, exercido uma influência maligna pelo mundo afora. Corporações gananciosas, um complexo industrial-militar  excessivamente poderoso, um nacionalismo grosseiro, racismo enraizado e imperialismo cultural combinados para desenhar os Estados Unidos, no cômputo geral, como uma força para o mal.

Sendo um estudante do organizador de comunidade Saul Alinsky, Obama não proclamou abertamente essa forma de pensar se passando como patriota, embora ele (e sua encantadora esposa) tenham dado a entender, de passagem, suas concepções radicais sobre "transformar, de maneira fundamental, os Estados Unidos". Ao chegar à presidência, Obama trabalhou vagarosamente, sem disseminar alarme, objetivando ser reeleito. Agora contudo, depois de seis anos completos, tendo apenas seu legado com que se preocupar, o Obama em sua plenitude está emergindo.

A Doutrina Obama é simples e universal: calorosas relações com adversários, acomodando-os com amigos.

Diversas suposições sustentam essa abordagem:
- moralmente o governo dos EUA tem a obrigação de efetuar compensações pelos seus erros passados,

- sorrir para países hostis irá influenciá-los a sorrirem de volta,
- o uso da força ao invés de resolver problemas, cria mais problemas,  aliados históricos dos EUA, parceiros e assistentes são acessórios moralmente inferiores. No Oriente Médio, isso se traduz em aproximação com revisionistas (Erdoğan, Irmandade Muçulmana, República Islâmica do Irã) e afastamento de governos cooperadores como (Egito, Israel, Arábia Saudita).

Desses atores dois se sobressaem: Irã e Israel. Ao que tudo indica, estabelecer boas relações com Teerã é a preocupação maior de Obama. Conforme mostra Michael Doran do Hudson Institute, Obama, durante toda sua presidência tem trabalhado para apresentar o Irã, o que ele chama de "uma próspera potência regional, que respeita as normas internacionais e as leis internacionais". Contrariamente, suas amizades pré-presidenciais com antissemitas truculentos como Ali Abunimah, Rashid Khalidi e Edward Said apontam para a intensidade da sua hostilidade frente ao estado judeu.

A Doutrina Obama desmistifica o impenetrável. Por exemplo, ela explica porque o governo dos EUA despreocupadamente ignorou o ultrajante latido "Morte aos Estados Unidos" do líder supremo do Irã em março, desprezando-o como mera manipulação para consumo interno, ainda que Obama tenha se prendido ao comentário de campanha eleitoral do primeiro-ministro israelense, quase que simultaneamente, rejeitando a solução de dois estados com os palestinos enquanto durasse seu mandato dizendo: "nós o pegamos pela palavra". [Obama sempre se omitiu diante da matança de civis palestinos, desarmados e indefesos na Faixa de Gaza, efetuada pelo exército de Israel.]

Por: Daniel Pipes