Bolsonaro e Lula se ocuparam do tema Petrobras nesta semana. Sobraram equívocos, alguns curiosamente idênticos. Os dois, por exemplo, acham que a estatal só trabalha para ela mesma e para os acionistas do mercado privado.
A diferença é que, para Lula, a Petrobras do PT era uma grande empresa de tecnologia, que apoiava o desenvolvimento nacional.
Por que não é mais?
Segundo Lula, porque inventaram a “narrativa” da corrupção, envolvendo não apenas a empresa, mas também seus funcionários. As mentiras foram tantas, diz o ex-presidente, que empregados da Petrobras não podiam entrar em restaurantes “porque eram chamados de ladrões”. E se, na visão de Lula, não houve corrupção, mas uma narrativa de roubalheira, cabe ao PT responder com outra narrativa, que explique isso ao povo.
Mesmo com toda a lábia de Lula, vai ser difícil. Não há uma narrativa, mas toda uma documentação, em tribunais brasileiros e internacionais, mostrando o sistema de corrupção implantado em torno da Petrobras.
Os competentes funcionários da estatal não foram acusados. Foram denunciados e punidos diretores e gerentes nomeados por indicação de partidos políticos e que se associaram a grandes empresas para arrecadar dinheiro para campanhas e, depois, para os bolsos próprios.
A segunda versão, alimentada por familiares de Celso Daniel, dizia que o então prefeito havia descoberto um esquema de corrupção com as empresas de ônibus e por isso teria sido apagado. Não é o caso de discutir aqui qual versão deve prevalecer. Mas o documentário deixa claro que havia um esquema de arrecadação de dinheiro das empresas de ônibus.
Quem conta isso, no documentário, é um ilustre procer do PT, Gilberto Carvalho, que trabalhava com Celso Daniel.
No capítulo 3, ele conta que foi acalmar os familiares do Celso Daniel, nervosos com a história de corrupção. E disse assim, conforme se ouve a partir do segundo minuto: “Olha, qualquer grupo político, para fazer campanha eleitoral, precisa arrecadar. Essa arrecadação pode ser feita legalmente ou à margem da lei, no caixa dois e tal. No caso de Santo André, as campanhas eram feitas, o Sérgio era o encarregado. Possivelmente você tinha prática de caixa dois, sim”.
Na mesma conversa, Gilberto Carvalho apressa-se a tranquilizar os irmãos de Celso Daniel. Repete que houve caixa dois, mas afirma: “o irmão de vocês nunca se meteu em corrupção no sentido de ter proveito próprio”. Ou seja, roubar para o partido pode.
No julgamento do mensalão os advogados de Delúbio Soares, então tesoureiro do PT, admitiram que havia esquema de caixa dois, apelidado de recursos não contabilizados, e tentaram classificar essa prática como mera infração eleitoral – coisa pequena.
Essa tese era normalmente aceita nos tribunais. No julgamento do mensalão, Joaquim Barbosa à frente, foi classificada como é de fato: roubo, assalto à população. Se as empresas de ônibus precisavam pagar caixinha ao PT, de onde tiravam esse dinheiro? Das passagens que, por isso, tinham que ser mais caras.
A Lava Jato apanhou isso.
Há, por exemplo, boa recompensa para quem indicar onde está dinheiro de propinas pagas pela Odebrecht e Braskem – esta uma associação entre Petrobras e Odebrecht.
Carlos Alberto Sardenberg, jornalista
Coluna publicada em O Globo - Economia 2 de abril de 2022