Há uma
possibilidade razoável de que o julgamento do recurso de Lula, logo
mais, pela 8ª Turma do TRF-4 decida não decidir hoje. Uma leitura
razoável das possibilidades aponta — e não estou dizendo que será assim,
mas que pode ser assim — para uma confirmação da condenação com aumento
de pena (voto do relator, João Pedro Gebran Neto), para uma segunda
condenação com redução de pena (voto do revisor, Leandro Paulsen) e para
um pedido de vista: seria de iniciativa do desembargador Victor Luís dos
Santos Laus. Deixo claro: ninguém me disse nada nem fiquei sabendo de
coisas que eles teriam confidenciado a pessoas de seu círculo íntimo.
Trata-se apenas de uma aposta com base em votos anteriores e alguns
indícios colhidos aqui e ali. Se isso acontecer, não há data para
entregar o voto à vista. Muita gente que saber quais são os próximos
passos. Depende do resultado de logo mais.
Pedido de vista
Caso haja o pedido de vista nas condições acima especificadas,
não cumpre falar em datas até que se entregue o voto-vista. O
procedimento teria a sua utilidade para baixar a tensão. Não se
resolveria um caso que assumiu tal magnitude em meio dia. Cumpre lembrar
que, com certeza, Paulsen, porque revisor, conhece o voto de Gebran, e a
inversa deve ser verdadeira. Em tese ao menos, mesmo na era eletrônica,
Laus desconhece o voto dos outros dois. Se pedir mais tempo, não se
estará diante de nenhum absurdo.
Três a zero contra
Mas e se Lula colher um três a zero contra si e em favor da
sentença de Sérgio Moro? Endossada a dita-cuja na íntegra, incluindo a
dosimetria (pena de nove anos e meio de cadeia), restara à defesa entrar
com os chamados “embargos de declaração”. Têm de ser apresentados dois
dias depois da publicação do acórdão — da decisão do colegiado. Servem
para esclarecer eventuais aspectos ambíguos ou obscuros da decisão dos
juízes. Raramente mudam a sentença, embora isso seja possível caso se
constate algum erro formal. Nesse caso, restará à defesa de Lula
recorrer ao STJ e, a depender do resultado e da leitura que de faça, ao
STF.
Três a zero a favor e a Súmula 7
Digamos que aconteça o improvável, que é
um três a zero a favor de Lula; valer dizer: os desembargadores decidem
absolver Lula. Ninguém, dentro e fora do PT, aposta nisso. Mas digamos
que acontecesse. Será que o MPF pode recorrer ao Superior Tribunal de
Justiça para condenar o petista? A resposta é “não”. Por quê? O máximo
que o MPF poderia fazer seria entrar com um Recurso Especial no STJ.
Para tanto, teria de ficar evidente que a decisão do tribunal
desrespeitou flagrantemente alguma lei federal ou lhe deu uma
interpretação distinta da consagrada por outros tribunais. Atenção! Para
que o STJ pudesse reverter uma absolvição decidida na instância
inferior, seria preciso promover uma revisão das provas, e sua Súmula 7
proíbe explicitamente tal procedimento. Lá está escrito: “A pretensão de
simples reexame de prova não enseja Recurso Especial.”
Querem
um precedente? O Superior Tribunal de Justiça manteve a absolvição, com
acórdão publicado no dia 12 de junho do ano passado, dos três réus
denunciados pelo crime de “atentado contra a segurança de transporte
aéreo” na modalidade culposa, após acidente aéreo com avião da TAM, um
Airbus A320, no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, em julho de 2007.
Morreram 199 pessoas. O MPF não recorreu e disse por quê: “não se
vislumbra possibilidade de discurso, tendo em vista que a Súmula nº 7 do
STJ impede qualquer rediscussão probatória em sede de recurso
especial”. Vale dizer: o Recurso Especial não se presta a uma
contestação de mérito da sentença.
Dois a um a favor de Lula.
É a mesma situação do três a zero. E não! A acusação não pode
recorrer a embargos infringentes — já falo deles — porque se trata de um
recurso da defesa.
Dois a um contra Lula
Digamos que Lula tenha dois votos pela condenação e um pela
absolvição. Nesse caso, cabem, além dos embargos de declaração, na forma
conhecida, os embargos infringentes. A defesa pedirá uma nova votação
para que a sentença final seja aquela que foi mais favorável ao réu. Se o
relator, Gebran Neto, aceitar o recurso, um colegiado ampliado, com
seis desembargadores, vai votar: os três de agora, da Oitava Turma, e
outra trinca, da Sétima. Essa meia-dúzia forma a chamada 4ª Seção. Nesse
caso, se Lula conseguir mais duas absolvições (três votos), absolvido
estará. Mas e se Gebran Neto negar o pedido? Aí a defesa recorre e será a
4ª Seção a decidir, não Gebran.
Divergência na dosimetria
E se divergência se der na dosimetria apenas, não na
condenação, havendo ao menos um dos três votos que defenda a redução da
pena imposta por Moro, embora todos venham a condenar Lula? Nesse caso,
os embargos infringentes se ocuparão apenas dessa questão. Não se vai
reexaminar culpa ou inocência. Não é irrelevante para Lula, não! Com
condenação de nove anos e meio, esgotados os recursos e caso o STF
mantenha a jurisprudência atual, o TRF-4 pode lhe impor cumprimento da
pena em regime inicialmente fechado — pode, mas não é obrigado. Uma
condenação abaixo de oito anos dificilmente rende regime fechado.
[exceto se o condenado for Paulo Salim Maluf - além de ter sido condenado a sete anos e nove meses (portanto, ministro Fachin, inferior a oito anos) ter 86 anos, ser cardíaco, ter câncer de próstata, doença degenerativa irreversível na coluna lombar, usar fraldas geriátrica, se encontra preso em regime fechado na Penitenciária da Papuda em Brasília.] Embargos infringentes têm de ser protocolados até 10 dias depois da
publicação do acórdão.
Cumpre
notar, no arremate, que o MPF também não está contente com a sentença de
Moro. Na denúncia, o MPF afirma que o tal tríplex de Guarujá deriva de
três contratos com a Petrobras de consórcios integrados pela OAS. Moro
ignorou a questão e chegou a dizer, em resposta a embargos de
declaração: “Este Juízo jamais afirmou, na sentença ou em lugar algum,
que os valores obtidos pela construtora OAS nos contratos com a
Petrobrás foram utilizados para pagamento da vantagem indevida para o
ex-presidente”.
O MPF insiste na questão dos contratos e pede que a pena do ex-presidente seja elevada a 21 anos e seis meses.
E a elegibilidade de Lula? Bem, aí já é matéria, igualmente complexa, mas para outro post.
Blog do Reinaldo Azevedo