Febre e pneumonia nunca é bom, muito menos para presidente recém-empossado
Elogiável o presidente Jair Bolsonaro manter a sociedade informada
sobre o seu quadro clínico, com boletins e entrevistas do porta-voz,
Otávio Rêgo Barros. Dito isso, não é possível achar que a situação está
absolutamente sob controle, após dez dias no hospital Albert Einstein.
Não é tão tranquila e reconhecer isso não é
“sensacionalismo”, como
advertiu Bolsonaro pelo Twitter, mas sim trabalhar com a realidade. Normalmente,
fechar uma colostomia é um procedimento rápido, de baixo
risco, sem complicações.
Não é o que vem ocorrendo no caso do
presidente, esfaqueado grave e covardemente num comício em que era
carregado pela multidão.
A bolsa seria retirada em dezembro, mas adiaram para janeiro.
A
cirurgia era estimada em três horas, mas durou sete. Ele sairia do
hospital na quarta-feira passada, mas os médicos adiaram a alta, sem
nova previsão.
Primeiro, enjoo e vômitos. Depois, febre. Em seguida,
volta ao semi-intensivo. E, ontem, a notícia de que, apesar dos
antibióticos, os exames de tórax detectaram pneumonia. Bom não é.Do ponto de vista do governo, o impacto é quase imperceptível, já que
Bolsonaro vem recebendo todas as informações no hospital, os dois
ministros-chave, Paulo Guedes e Sérgio Moro, estão a mil por hora e o
Planalto e o próprio governo estão sob o controle do ministro Augusto
Heleno, do GSI.
Guedes cumpre uma agenda cheia, com governadores, presidentes da
Câmara, do Senado e do Supremo, assuntando, sentindo o ambiente
político, vendendo a reforma da Previdência.
E Moro repete o script,
estreando inclusive numa seara que não costuma ser muito fácil para
neófitos em política: o corpo a corpo com parlamentares, para ouvir mais
do que falar e garantir viabilidade ao seu pacote – que, na verdade,
são dois em um,
contra a corrupção e contra o crime organizado.
Assim, o que incomoda na internação de Bolsonaro, mais longa do que o
previsto e mais difícil do que o desejável, é que ele continua sendo
coadjuvante no seu governo, assim como na sua campanha à Presidência.
Após a facada, a campanha andou sozinha e Bolsonaro se limitava a posts
pelas redes sociais e a entrevistas pontuais à mídia mais camarada. Com a
terceira cirurgia, ele está comandando o País a partir do hospital e do
Twitter e o governo também anda sozinho.
Na campanha, o resultado foi a forte entrada em cena de seus trs ilhos mais velhos, Flávio, agora senador, Eduardo, o deputado metido em
política externa, e Carlos, o responsável pela imagem do pai. No
governo, o resultado é um constrangimento: a desenvoltura do vice
Hamilton Mourão
. General de quatro estrelas, bem preparado, com opiniões fortes sobre
tudo e sem papas na língua, Mourão deu de ombros à ordem de Bolsonaro
para todos calarem a boca durante as eleições e também dá de ombros à
sugestão
(em falta de uma palavra melhor) de Augusto Heleno, seu colega
de farda e de Alto-Comando do Exército, no mesmo sentido. Não calou a
boca na campanha, não cala agora no governo.
Bolsonaro e seu entorno providenciaram um
“gabinete de emergência” no
hospital, mas as visitas estão vetadas, as videoconferências não
deslancharam e eles não estão conseguindo evitar o protagonismo do
vice-presidente.
Se mudança houve, foi no tom de Mourão. Na eleição, conservador e
polêmico. No governo, equilibrado e até surpreendente. Já falou com
naturalidade sobre aborto, embaixada em Israel e ameaças contra o
ex-deputado Jean Wyllys. E, ontem, recebeu a CUT, nada mais nada menos.
Mourão politicamente correto?
Homem saudável e razoavelmente jovem, Jair Bolsonaro deve estar louco
para ter alta logo e assumir, de fato, a Presidência. Bons votos!