Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador italiano. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador italiano. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

Avião no ar

A porção mais destrutiva da sociedade brasileira não admite que a população quer um novo país, pois é óbvio que se encheu definitivamente do velho


O Brasil da primeira classe continua brincando de democracia americana todas as vezes que o seu submundo jurídico se agita aquela usina processadora de lixo onde são fabricadas, embaladas e distribuídas as leis neste país. Você sabe do que se trata. É a combinação mortal de Câmara dos Deputados com Senado Federal, mais o STF, as outras “cortes superiores” e as 500 diferentes modalidades de Ministério Público que se encontra a cada esquina – tantas que nem os próprios procuradores saberiam dizer quais são. Há ainda os 18.000 juízes. Há a OAB. Há os advogados de porta de condomínio de luxo. Há a elite civilizada, liberal e movida a direitos, que defende qualquer aberração carimbada como ”letra da lei” e se a letra da lei nega a aplicação da justiça mais elementar, dane-se a justiça mais elementar. Há os “garantistas”. Há de tudo, até quem acha uma conquista da humanidade soltar milhares de criminosos durante o período das festas, mesmo que tenham matado pai e mãe a pauladas. É um milagre, pensando bem, que o Brasil ainda exista. Deve ser a simpatia, o poder do algo mais e da alegria.

O novo presidente Jair Bolsonaro já está despachando desde 1 de janeiro no Palácio do Planalto, aclamado por mais de 100 mil pessoas na festa de posse, seus ministros começam a tomar providências práticas e nenhum dos cataclismos que deveriam destruir o Brasil com a sua vitória, segundo nos garantem há meses, aconteceu até agora. Mas a porção mais destrutiva da sociedade brasileira, essa que sobrevive traficando com leis e construindo um novo estado de direito a cada quinze dias, não dá nenhum sinal de que tenha percebido alguma mudança no Brasil – não admite que a população quer um novo país, pois é óbvio que se encheu definitivamente do velho. O resumo da ópera, segundo os espíritos de primeiro mundo que querem pensar por você, é o seguinte: esse governo que está aí não vale. Em consequência, tudo o que fizer estará errado e será provavelmente ilegal. A ordem é: já que o “outro lado” teve mais votos, então que se impeça o governo de governar, através da produção contínua de baderna legal. É essa a “resistência” de que se ouve falar. O avião já fechou as portas e decolou; é um mau negócio, para todos, ficar torcendo para o piloto se dar mal. Mas eis aí: o que interessa para os “resistentes” é fazer o avião cair com todo mundo dentro. Depois se vê. Pelo menos, dizem eles, salvamos a democracia no Brasil.

A produção de desordem jurídica se faz por muitos lados, é claro já há gente de terno e gravata falando em impeachment de Bolsonaro, por exemplo, ou indagando se não foi sua família que matou a vereadora Marielle. Mas o foco principal da torcida organizada está no STF, onde a sabotagem contra a ordem legal continua sob o disfarce de ação civilizatória em favor dos direitos universais do homem quer dizer, em favor de soltar Lula da cadeia. “O STF é hoje o mais nefasto fator de instabilidade legal no Brasil”, disse recentemente o jurista Modesto Carvalhosa. Alguém sabe de outro? Na última brincadeira feita ali para virar a mesa, o ministro Marco Aurélio, por conta própria, mandou que Lula fosse solto. Pura palhaçada. Dali a pouco o atual presidente, Antonio Dias Toffoli, anulou a ordem e virou o “Anjo Bom da Direita” – ou, talvez, um personagem daqueles programas de auditório tipo “Rainha Por Um Dia”. Está cheio de gente assim, por lá. O ministro Luiz Fux, há pouco, mandou prender o terrorista e quádruplo homicida italiano Cesare Battisti isso depois de ficar garantido que o sujeito tinha fugido, sob a benção de um habeas corpus dado em 2017 pelo mesmíssimo Fux. Há aquele Fachin, que um dia manda o Brasil obedecer “a ONU” e permitir a candidatura de Lula, no outro segura na cadeia a ladroada da Lava Jato.

A próxima exibição de circo que mostrará como “estão funcionando” as nossas “instituições” está prevista para abril – quando se fará a centésima tentativa de tirar Lula da cadeia, agora com o julgamento final pelo STF da questão da condenação em segunda instância. O cidadão deve ser preso depois de condenado em duas instâncias, como ocorreu com Lula, ou só pode ir para a cadeia se for condenado três vezes seguidas, como querem os campeões do “direito de defesa”? Apareceu um problema, aí: para soltar Lula descobriu-se que será preciso soltar dezenas de milhares de assassinos, estupradores e até feminicidas, imaginem só, hoje trancados nas penitenciárias. Como é que faz? É a entrada no mundo da insânia. Talvez seja melhor parar logo com isso.



[FEMINICIDAS = os assassinos de 'mulheres sapiens - segundo o glossário da escarrada Dilma
HOMICIDAS = os assassinos de 'homo sapiens' - segundo o antigo glossário.]  

 

sábado, 15 de dezembro de 2018

Reflexões para um Bolsonaro sereníssimo

Quem assistiu, atentamente, ao vídeo da cerimônia de lançamento ao mar do submarino Riachuelo constatou o quão maquiavélico é o Presidente Michel Temer. Chamou atenção o modo carinhoso, quase bajulador, com o qual ele tratou o Presidente eleito Jair Bolsonaro – que parecia uma pessoa tímida diante do salamaleque temerário. O ex-vice que derrubou a Dilma apenas comprovou que sabe jogar o jogo. O estilo Temer, cativante e super educado nas aparições públicas, combinado com alta capacidade de articulação política nos bastidores, teve seu ápice, mais tarde, quando ele assinou a extradição do assassino italiano Cesare Battisti – por enquanto um ilustre foragido da Polícia Federal. Temer poderia ter deixado a decisão para Bolsonaro, que a tomaria com o máximo prazer. No entanto, preferiu dar a prova pública de que é um estrategista que consegue ganhar força no fim do curto mandato que foi menos pior que o da Dilma.

Bolsonaro participou do Lançamento do Submarino Riachuelo.
Armado com torpedos e mísseis, o submarino poderá espalhar minas navais nas rotas de outras embarcações. O primeiro de uma frota de quatro novos submarinos de ataque da Marinha do Brasil. O lançamento do S-40 Riachuelo teve a presença do presidente Michel Temer, Jair Bolsonaro e 23 autoridades dos três poderes além dos convidados.
 
Temer criou todas as facilidades na transição para Bolsonaro. Discretamente, conseguiu até emplacar muita gente que atuou em seu governo para continuar jogando na equipe de Bolsonaro. Uma dúvida já está lançada no ar: Será que Bolsonaro vai arrumar algum lugarzinho com foro privilegiado para Temer ficar protegido da “perseguição” do Ministério Público Federal – que o acusa de crimes ligados à corrupção? O Presidente eleito já declarou, tempos atrás, que teria nada a ver com isso... Será que ele continua pensando do mesmo jeito, depois da camaradagem tática de Temer durante a transição arrumadinha?   

É importante avaliar se a tática temerária na transição vai seduzir – ou não – o futuro Presidente Jair Bolsonaro. Ainda mais porque os inimigos dele já agem com a máxima competência para plantar futuras armadilhas de desgaste político. Sem entrar no mérito do certo ou errado, está clara que a orquestração midiática para atingir o deputado estadual e futuro senador Flávio Bolsonaro tem como alvo real o pai dele. Com tanta insistência, as mancadas cometidas na Assembléia Legislativa do RJ podem, no médio e longo prazos, gerar embaraços para a família Bolsonaro. Por isso, uma eventual futura “ingratidão” contra o “civilizado” Michel Temer pode não ser recomendável a Bolsonaro. O estilo “doa a quem doer” é muito bonito e honrado na retórica. Porém, quando e se a água podre ultrapassa a altura do pescoço, pouco ou nada adianta o discurso moralista. Bolsonaro, que hoje ainda é franco atirador, a partir de 1º de janeiro se torna uma vidraça que o  Mecanismo promete atingir não se sabe com que eficácia, eficiência e efetividade.

Uma coisa Bolsonaro deveria aprender com Michel Temer. A sobrevivência política só é possível no Brasil se o Presidente tiver o máximo de jogo de cintura e articulação, nos bastidores políticos, econômicos, legislativos e judiciários. O jogo requer muita frieza, racionalidade e cálculo estratégico. Arroubos emocionais e conflitos inúteis (com inimigos reais e aliados próximos) podem custar a cabeça do titular do Palácio do Planalto. Resumindo: a única saída é um Bolsonaro sereníssimo e, preferencialmente, superaliado ao seu vice Antônio Mourão, que demonstra ter um imenso jogo de cintura político, além da competência técnica para lidar com as armadilhas da burocracia federal. Bolsonaro e Mourão têm a vantagem de serem pessoas verdadeiras, diretas, humildes e sem frescuras no trato interpessoal.

Por isso, é inaceitável que qualquer um dos dois caiam no joguinho burro das intrigas em torno do ilusório poder palaciano. Neste cenário de conflitos inúteis, é concreto o risco de isolamento político e pessoal. Os diferentes núcleos de poder em torno de Bolsonaro precisam acionar o módulo “pacificação”, apertando, imediatamente, o botão “tolerância”. O momento é acionar outro botão: “Cautela”. Fechar a boca, principalmente evitando fofoquinhas via imprensa, é básico para conter um clima autodestrutivo de cizânia. Resumindo, de novo: Se não parar com a viadagem interna, o novo governo nascerá com prazo de validade vencido. Isto é tudo que a esquerda e os bandidos esperam que aconteça... Eles são péssimos de governo, porém craques na oposição...

Jorge Serrão - Alerta Total

 

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Uma sucessão de facadas

Se as promessas não forem cumpridas, vão todos para o espaço, como foram PT e PSDB. Não existe fidelidade eterna


Quando se comemorava uma renovação pelo processo eleitoral, o passado voltou com dois fortes golpes. Um deles, o mais importante, foi o aumento de 16% concedido aos ministros do STF.  Não creiam que parlamentares votam esses aumentos pelos belos olhos dos ministros. Eles estão pensando em si próprios, pois nesse movimento aumentam também o teto do funcionalismo. Um teto para abrigá-los adiante.

Um dos temas da campanha foi o tamanho do Estado. Ele é um gigante anêmico que não tem o sangue para investir. As manifestações de 2013 denunciaram sua ineficácia; as de 2015, o processo de corrupção que o dominava.  Por que não esperar a reforma da Previdência, o enxugamento da máquina, para reajustar salários no primeiro semestre? Só aí perdemos R$ 6 bilhões. No dia seguinte, os incentivos à indústria automobilística levaram mais R$ 2 bilhões. Nesse caso, para quê? Incentivos para melhorar o motor de combustão que já está pra lá de Marrakech: não tem futuro.

Bolsonaro reagiu de uma forma discreta. Temo que não tenha percebido a extensão do golpe. Aliás, temo mais ainda, que ele não tenha ainda compreendido o caráter parasitário e atrasado da grande máquina estatal.  Não tenho condições de questionar a mudança dos outros, porque também mudo. Mas afirmar que não contingencia o orçamento das Forças Armadas é prematuro. Isso só se faz com a noção bem clara do conjunto. E se houver um gargalo na saúde?

Esses momentos de transição podem ser usados para tentar entender a fase em que entramos. É que na transição acontece pouca coisa, além do anúncio da escolha de ministros e da reorganização administrativa. Às vezes, equipes que entram revelam dados importantes, pois querem mostrar o tamanho do buraco. Suponho que a nova fase vai se basear na luta contra a corrupção, com a presença de Moro, e um pouco mais de segurança. Mas o enxugamento da máquina é essencial.  Há temores de que o processo possa conduzir a uma rejeição futura às ideias liberais. Não creio. Tanto os liberais como os estatizantes não escrevem numa página em branco. Mesmo com a correlação de forças a seu favor, as ideias liberais devem sofrer alguns reparos, adaptações que resultam do próprio debate.

O que me preocupa é que as coisas estão acontecendo no Brasil com um tipo de lógica que me desconcerta. Quando vi aquele exame do Enem que apresentou um dicionário dos travestis, pensei que havia infiltração da direita para confirmar suas teses. Por que não alguma coisa em guarani, em italiano, idiomas falados no país e que envolvem muita mais gente? Parecia uma provocação. Da mesma forma, quando ouço o ministro Paulo Guedes falar numa possível futura fusão do Banco do Brasil com o Bank of America, temo que um esquerdista infiltrado tenha soprado essa sugestão. Por que dizer isso agora, sem que nenhum estudo, nenhuma negociação preliminar tenha sido feita?
Tanto Bolsonaro como Guedes têm afirmado que o fracasso do seu governo poderia trazer o PT de volta. Dependendo do fracasso e das circunstâncias, pode surgir algo mais radical ainda.

Nada começou ainda. Mas nesses momentos de transição, creio que o presidente deveria brigar mais contra essas benesses de fim de mandato.  O general Heleno disse que o aumento dos juízes era uma preocupação. O governo pode ter sentido assim. Mas as pessoas comuns ficaram indignadas.  O novo governador de Minas venceu com 72% dos votos. Isso é inédito na História. Os eleitores rejeitaram o PT e o PSDB por uma promessa de reforma do Estado.

As forças políticas que sobem agora ao poder o fazem com um apoio de uma frente que amalgama expectativas políticas e ideológicas. Será uma ingenuidade supor que o cimento ideológico possa manter o edifício em pé com mudanças apenas cosméticas na vida real. Se as promessas não forem cumpridas, vão todos para o espaço, como foram PT e PSDB. Não existe fidelidade eterna.  Cada momento tem de ser vivido com a gravidade que merece. Não pretendo antecipar críticas, muito menos torcer contra. Não me surpreende pauta-bomba em fim de mandato. Sempre foi assim. O que me surpreendeu foi como os novos atores foram polidos e discretos diante desse tipo de facada.

O Globo

sexta-feira, 9 de novembro de 2018

O novo contra o velho

 Na política, o velho resiste a morrer


O cientista político Antonio Gramsci, fundador do Partido Comunista Italiano, cunhou uma frase que pode bem definir o momento que estamos vivendo: “O velho resiste em morrer, e o novo não consegue nascer”. Gramsci se referia a outros tempos, mas os que estamos vivendo aqui no Brasil hoje tem as mesmas características. Pode ser que o novo que apareceu não seja a melhor solução, mas é o que temos no momento.  O povo, através do voto, fez uma limpa quase geral na classe politica tradicional, e sobreviveram apenas uns poucos caciques, que manobravam o cenário político nos últimos 25 anos em benefício próprio e dos seus próximos. Mas parece que não entenderam o recado das urnas.

Um dos que não sobreviveram foi o ainda presidente do Senado, Eunício de Oliveira, que aproveitou para ir à forra, com o dinheiro público. Botou para votar, do nada, o aumento do Judiciário que estava congelado depois de aprovado na Câmara, por questões de economia.  Não há dúvida de que os juízes merecem ganhar bem, assim como toda carreira do sistema judicial tem que ser bem remunerada. Mas, como disse o presidente eleito, não era o momento. Um Senado já superado pelas urnas, com a maioria de votos de senadores não reeleitos pelo povo, resolveu fazer uma benesse ao Supremo Tribunal Federal, que tem efeito cascata.

O presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, agradeceu a decisão do Senado, cujos ocupantes receberam telefonemas de ministros e juízes para aprovarem o aumento, um lobby legítimo mas temerário no momento em que diversos senadores têm processos correndo na última instância do Judiciário.  O argumento dos ministros é correto, pois os salários estão defasados mesmo. E argumentam que o auxilio moradia será extinto, compensando o choque do aumento no orçamento. Bom argumento, mas seria mais republicano, digamos assim, que o Conselho Nacional de Justiça acabasse primeiro com as distorções desse auxílio, que na maior parte das vezes é usado como uma compensação salarial justamente para repor a defasagem.

Se dessem o exemplo, cortando vantagens que são estranhas ao cidadão comum, não poderiam ser acusados de pensarem apenas em seus interesses. Também os senadores usaram o caso para mandar um recado ao presidente eleito Jair Bolsonaro, que fez um apelo para que o aumento não fosse dado nesse momento.  Quando o superministro da Economia Paulo Guedes disse que o Congresso precisaria de “ uma prensa” para aprovar as reformas, inclusive a da Previdência, ainda no governo Temer, o ainda presidente do Senado deu uma risada e comentou: “Ele não sabe como a coisa funciona”. E tratou de demonstrar, na prática, como a banda toca.

É uma banda antiquada, que já saiu de moda, mas ainda tem o controle da programação e insiste em não sair do palco, mesmo com os convidados não gostando, não dançando, e vaiando. Outras surpresas virão devido a uma incongruência de nosso calendário eleitoral.  O novo Congresso só toma posse em fevereiro, e os que foram, na maioria, cassados pelo voto popular, continuam com a caneta na mão até janeiro. O futuro presidente governará quase um mês com um Congresso com prazo de validade prestes a expirar, e com o orçamento feito por um governo que está de saída.

Há maneiras de amenizar a situação, mas a falta de coerência é evidente. Vários projetos, que não tiveram o apoio da sociedade, voltam à pauta nos derradeiros instantes, para pagar dívidas ou, sobretudo, para tentar salvar a pele dos que perderam o foro privilegiado com o fim do mandato.  Há de tudo um pouco: proposta para reduzir os efeitos das delações premiadas, para acabar com a prisão em segunda instância, para reduzir o poder de fogo dos que hoje combatem a corrupção com formidável êxito. E amanhã estarão mais que nunca no poder, com a chegada do Juiz Sergio Moro como também superministro da Justiça e Segurança Pública.

Não será fácil para o novo governo aprovar reformas que são impopulares, ou reforçar a legislação de combate ao crime organizado e à corrupção. Mas não será também com “prensas” ou “tratoramento” que os congressistas se curvarão.  Sempre será preciso negociar com o Congresso e com as corporações. Tentar pressionar com milícias digitais se tornará uma maneira antidemocrática de persuasão. Pode até ser que o novo que tenta nascer não seja tão novo assim, e repita os velhos hábitos. Mas é preciso virar a página e recomeçar em novas bases esse jogo político.  O cidadão já deu seu recado. Se os políticos fizerem ouvidos moucos, teremos crise em cima de crise e só aprofundaremos nossos problemas.

Merval Pereira - O Globo



terça-feira, 4 de setembro de 2018

Donos do Brasil

Quais são as corporações do funcionalismo que mantêm privilégios, recebem salários superiores aos do setor privado e escapam do alvo dos presidenciáveis


Os auditores fiscais da Receita Federal acabam de encerrar uma greve que se arrastava desde novembro do ano passado, com curtos períodos de interrupção. Em vez da paralisação, adotaram o sistema chamado de “meta zero” e “operação padrão”, o que significa trabalhar em ritmo mais lento do que o habitual. Eles reivindicam a regulamentação de um bônus variável por eficiência no cumprimento de metas. Ou seja: querem ser premiados pela função para a qual já são remunerados com um polpudo salário, cujo valor inicial é de 19 200 reais, sem contar um bônus mensal fixo de 3 000 reais. 

Apesar da paralisação, não perderam o emprego e receberam em dia até que uma decisão do STF autorizasse o desconto em folha dos grevistas.

O episódio ilustra de maneira exemplar o abismo do Brasil um abismo entre a esmagadora maioria da população, sujeita ao risco de desemprego e a salários mais baixos, e a minoria que desfruta a estabilidade e os privilégios do setor público. 

Dentro desse país de minoria, existe um grupo mais abastado: é o Brasil das grandes corporações do funcionalismo, cujos salários e benefícios estão muito acima da média dos recebidos pela população e que possuem voz destacada para fazer valer seus interesses, manter regalias e interditar o debate sempre que questionados.

Juízes, procuradores, deputados, senadores e auditores fiscais, entre outros, fazem parte dessa elite dentro do Estado. São os donos do poder público, num país em que a desigualdade é crescente e no qual o Estado enfrenta grave crise fiscal e está perdendo sua capacidade de cumprir suas atribuições mais primordiais, como garantir saúde, educação e segurança. O reajuste de 16,38% concedido pelos ministros do Supremo Tribunal Federal aos próprios salários, que vai elevar o teto de rendimentos do funcionalismo, é outro exemplo recente desse Brasil desconectado da realidade.

Confortável - Auditores, em greve desde novembro para que tenham direito a bônus: os pagamentos continuam em dia (Sindifisco/Divulgação)

A defesa que juízes e procuradores fazem do direito ao auxílio-moradia, mesmo quando possuem imóvel na cidade onde trabalham, também é um símbolo de privilégio. A legalidade e a moralidade do benefício são questionadas num momento em que o Estado brasileiro está quebrado. A Associação dos Juízes Federais do Brasil divulgou nota em que relaciona a tentativa de acabar com o benefício a uma suposta “perseguição de poderosos” por causa da Lava-Jato. O benefício foi estendido a todos os juízes do país em decisão liminar — e, portanto, unilateral — do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, em 2014. [cuja filha, desembargadora Mariana Fux, recebe o benefício, mesmo exercendo  suas funções no TJ-RJ  e possui dois apartamentos no Leblon.]

O Congresso brasileiro também integra o grupo de privilegiados: cada deputado dispõe de 107 000 reais mensais em verba de gabinete para montar uma equipe de até 25 assessores com salário que chega a 15 000 reais. A soma do salário e das verbas é equivalente a 68 vezes o PIB per capita brasileiro; nos Estados Unidos, um deputado tem a seu dispor um dinheiro que representa 32 vezes o PIB per capita.

Conta pesada - O ministro Fux, do STF, estendeu o auxílio-moradia a todos os juízes (Tony Oliveira/Trilux/Estadão Conteúdo)

A questão é que no Brasil, em média, os salários dos servidores públicos são muito mais altos do que os praticados no mercado. O campeão da remuneração é o Poder Judiciário, que paga em média 236 000 reais por ano a seus funcionários (cerca de 19 700 reais mensais). Em seguida, estão os vencimentos de quem trabalha no Legislativo e no Ministério Público, de 216 000 reais ao ano (18 000 reais mensais) e de 205 000 reais (17 100 reais), respectivamente.

No setor privado, a média é de 26 000 reais anuais, ou pouco menos de 2 200 reais por mês. Essa discrepância salarial coloca o funcionário público na elite brasileira: em cada 100 servidores federais, 94 se enquadram na faixa da população dos 40% mais ricos do país. Isso significa que a política de remuneração do Estado transfere renda para a parcela mais rica da população, o que aprofunda a desigualdade. Os dados constam de um estudo do Banco Mundial que faz uma análise detalhada das carreiras no setor público.

O governo brasileiro costuma oferecer o dobro do valor dos salários do setor privado a trabalhadores com o mesmo nível de experiência, enquanto essa diferença fica em 30% na média internacional. Há fundamento para o fato de o serviço público pagar salários maiores, uma vez que precisa atrair profissionais mais bem qualificados. É uma lógica que se aplica às empresas privadas. Mas, além dos salários mais elevados, a esfera pública federal oferece benefícios significativos, como a estabilidade e um regime generoso de previdência. [pela enésima vez, este Blog se propõe a demonstrar, comprovando, as razões das diferenças salariais e previdenciárias (que muitos chamam de privilégios) entre servidores públicos e trabalhadores em empresas privadas  - é só clicar. Também se desejarem, escrevam questionando e responderemos com prazer e precisão.] Um economista recém-formado, por exemplo, tem um salário médio de 7 000 reais por mês no mercado financeiro, enquanto um analista do Banco Central pode receber inicialmente uma renda mensal de 16 000 reais. [importante lembrar: nada impede que o economista recém formado preste concurso para o serviço público - incluindo o Banco Central - o que atrapalha é que poucos passam.]  O salário de um advogado com experiência média (oito anos) costuma ser 7 000 reais por mês num escritório de advocacia. A Procuradoria do Ministério da Fazenda paga salário de 16 000 reais. Essa diferença é chamada de prêmio salarial. O Brasil paga o maior prêmio entre os 53 países analisados pelo Banco Mundial.

“O alarmante no Brasil não é a quantidade de cargos no setor público, mas a remuneração dos servidores”, afirma o economista-chefe do banco para o Brasil, o italiano Antonio Nucifora. De fato, na contramão do que prega o senso comum, o número de servidores públicos no Brasil é baixo se confrontado com a média dos 37 países integrantes da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Em 2015, o equivalente a 5,6% da população brasileira estava empregado no serviço público em todo o país, enquanto a média entre os membros da OCDE é de 10%. Mas, de forma injustificada, a conta é pesada demais para o Brasil: os gastos com o pagamento de funcionários totalizaram 284 bilhões de reais no ano passado, uma fatia que representou pouco mais de 20% de todas as despesas do governo federal.

Segundo o Banco Mundial, a massa salarial dos servidores públicos brasileiros gira em torno de 13% do PIB, quase o dobro do porcentual despendido por outros países de renda média. A origem da distorção é a Constituição de 1988, que concedeu ao Judiciário e ao Ministério Público autonomia para propor ao Congresso o próprio orçamento. Outro efeito negativo da Carta foi a indexação de salários de magistrados aos dos ministros do STF e do Superior Tribunal de Justiça.

O ano eleitoral deveria servir como rara oportunidade para o debate sobre o papel e o tamanho do Estado e o combate a privilégios. A situação fiscal também deveria estar em discussão: desde 2014, a União encerra o ano com gastos acima das receitas. Com o teto para os gastos, a margem de manobra para o governo será cada vez menor e obrigará a novos cortes nos investimentos e em áreas fundamentais. Mas o tema tem recebido tratamento genérico nos discursos e nos planos dos candidatos à Presidência. Pior para os brasileiros que não fazem parte da elite do funcionalismo.

Publicado em VEJA de 5 de setembro de 2018, edição nº 2598


quarta-feira, 15 de agosto de 2018

A chegada de Lula à lua



O título parece de folheto de cordel. Mas faz sentido. 

Corre em Brasília a informação, que de tão estapafúrdia se confunde com fake news, de que hoje o PT vai registrar no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a candidatura do ex-presidente Lula à presidência da República apresentando uma certidão de antecedentes criminais de São Bernardo do Campo, que atesta que Lula não tem condenação nem em primeira nem em segunda instâncias. Seus advogados estariam dispostos a tentar a manobra para driblar a Lei de Ficha Limpa, pois a legislação eleitoral exige certidões criminais emitidas pela Justiça Federal de primeira e segunda instâncias, onde o candidato “tenha o seu domicílio eleitoral”.


Como a condenação de Lula ocorreu, na primeira instância em Curitiba e em segunda instância no TRF-4 de Porto Alegre, ele não estaria obrigado a apresentar as certidões daquelas cidades.   Trata-se da mais clara chicana, apresentação de um argumento baseado em detalhe ou ponto irrelevante da legislação. A tramóia, se realizada, não deve prosperar, pois a eleição presidencial tem caráter nacional.   A própria defesa de Lula apresentou mais de 70 recursos ao Tribunal Regional Federal (TRF -4), ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a condenação em segunda instância, que é um fato “público e notório” que independe de prova de acordo com o novo Código de Processo Civil (CPC).

 Seu artigo 374 determina que não dependem de provas os fatos: 
I - notórios;
II - afirmados por uma parte e confessados pela parte contrária;
III - admitidos no processo como incontroversos;
IV - em cujo favor milita presunção legal de existência ou de veracidade. A idéia é racionalizar para que os processos tenham uma decisão em prazo mais rápido.

Fatos notórios são os de conhecimento público, de veracidade indiscutível. No entanto, especialistas exemplificam como um fato “público e notório” pode ser submetido a uma interpretação subjetiva: apesar de todas as evidências, há quem ainda garanta que o homem não foi à Lua. Portanto, argumentar que Lula é ficha limpa seria equivalente a defender a tese de que a ida do homem à Lula é uma fake news. Mas tudo é possível para tentar colocar o ex-presidente na disputa presidencial de outubro. Caberá ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) dirimir essa dúvida, isto é, garantir que o homem realmente chegou à Lua.

Já há na Praça dos Três Poderes, nas imediações do prédio do Supremo, manifestações de todos os tipos, além da greve de fome de militantes do Movimento dos Sem Terra (MST). Uma marcha a Brasília comandada pelo MST pretende pressionar os ministros tanto do TSE quanto os do STF.  A ministra Rosa Weber, que assumiu ontem a presidência do TSE no momento mais delicado politicamente dos últimos tempos, se deparará hoje mesmo com esse desafio a seu temperamento equilibrado e austero.

Interpretações
Um dia depois que o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega virou réu em Curitiba, ao Juiz Sérgio Moro aceitar denúncia do Ministério Público Federal (MPF) com base na delação premiada, corroborada por documentos, de que Mantega recebeu propina da para editar medidas provisórias, a Segunda Turma do Supremo  tirou da jurisdição de Sérgio Moro trechos da delação da Odebrecht referentes ao ex-ministro.

A maioria formada pelos ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski aceitou o argumento dos advogados de Mantega de que os trechos não têm relação com o esquema da Petrobras. A Segunda Turma, sob os mesmos argumentos, retirou também trechos referentes ao ex-presidente Lula.  Em Curitiba,vê-se conexão entre as denúncias e a Petrobras. No caso da conta geral de propinas entre PT e Odebrecht, os procuradores entendem que o pior a fazer é separar cada pagamento e acerto, pulverizando os processos por todo o território nacional.

Além do mais, o primeiro caso da conta geral de propina foi julgado lá, e acabou condenando o ex-ministro Antonio Palocci, envolvido na mesma planilha “Italiano”.

 
 

quinta-feira, 26 de abril de 2018

Ações contra Lula têm mais provas além das delações da Odebrecht



Notas fiscais, registros de presença e mensagens também embasam processos

Nas ações penais que têm como objeto o pagamento de vantagens indevidas ao ex-presidente Lula por meio de reformas em um sítio de Atibaia (SP) e na compra de dois imóveis em São Paulo, o Ministério Público Federal (MPF) apresentou elementos de prova independentes dos anexos da delação da Odebrecht, que deverão ser encaminhados à Justiça em São Paulo. 

No caso do sítio de Atibaia, foram reunidas como provas de uso do imóvel por Lula o fato de terem sido encontrados bens de sua família no local; o registro de 270 viagens de seus seguranças ao sítio, entre 2011 e 2016; a instalação de câmeras de segurança por funcionários do ex-presidente; as notas fiscais de bens que ficavam no sitio apreendidas no apartamento de Lula em São Bernardo; e a existência de mensagens eletrônicas sobre as reformas endereçadas ao Instituto Lula, entre outros elementos.

A compra de um prédio para abrigar o instituto ocorreu por meio da DAG, fornecedora de confiança da Odebrecht usada para omitir a verdadeira origem dos recursos utilizados para adquirir o imóvel. A compra do prédio também foi citada pelo ex-ministro Antonio Palocci, que admitiu ter administrado a conta de propina do PT na empreiteira. 

PALOCCI RESUMIU ESQUEMA
Segundo as investigações, os recursos usados para custear as vantagens ao ex-presidente eram administrados pelo setor de Operações Estruturadas da empreiteira, que administrava um bilionário caixa paralelo destinado a pagar vantagens indevidas a agentes públicos que agiam de acordo com os interesses da empreiteira. No caso da Odebrecht, o MPF apresentou indícios de favorecimentos à empreiteira baiana em diversos contratos da Petrobras e que resultaram em prejuízo para a estatal.

Mesmo com a decisão da 2ª Turma do STF de envio da colaboração da Odebrecht para a Justiça em São Paulo, depoimentos já prestados por réus do processo também reforçam a tese da acusação. Perguntado sobre a compra de um prédio para o Instituto Lula, o ex-diretor de relações institucionais da empreiteira Alexandrino Alencar tratou o negócio como uma “contrapartida”: — Entendo que em retribuição, em contrapartida ao que o próprio presidente Lula fez no passado, em função da importância dele no então governo (Dilma) e, também, no futuro político do próprio ex-presidente Lula — disse ele.

Palocci não só reconheceu administrar a conta propina do PT, assumindo ser o “italiano” identificado em uma planilha de gastos com o partido, como a relacionou a vantagens obtidas na Petrobras:  — É assim: a empresa trabalha com a Petrobras, a Petrobras dá vantagens para a empresa, com essas vantagens a empresa cria uma conta para destinar aos políticos que a apoiaram. O presidente mantém lá diretores que apoiam a empresa para dar a ela contratos, esses contratos geram dinheiro, ela faz seus gastos, compra seus presentes, remunera os seus diretores, paga seus funcionários e reserva um dinheiro. Algumas criam operações estruturadas, outras criam caixa 2, outras criam doleiros, e com esse dinheiro pagam propina aos políticos.

Emílio Odebrecht disse ter pedido a Lula que não reestatizasse o setor petroquímico, onde a empresa viria a se tornar monopolista durante o governo petista, com a criação da Braskem. O empresário disse que Lula “sempre teve boa vontade para ouvir" os pleitos da Odebrecht. 

O Globo