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sábado, 16 de setembro de 2023

A ditadura equivocada na China - Carlos Alberto Sardenberg

O governo da China enfrenta sérias dificuldades naquilo que parecia ser sua especialidade: botar o país para crescer. Há problemas econômicos específicos — como o endividamento das administrações regionais e o esgotamento de grandes projetos de infraestrutura —, mas a questão básica é mais profunda. Trata-se da perda de eficiência do sistema político, aquele que se poderia chamar de ditadura esclarecida. 
 
Ditadura, pelo óbvio. A sociedade vigiada e controlada pelo Partido Comunista.  
Na economia, ampla abertura para o investidor privado nacional e estrangeiro. 
Por trás disso, o comando de uma burocracia formada nas melhores universidades ocidentais e treinada em grandes companhias. 
 
Um pequeno exemplo: a política monetária é aplicada pelo Banco do Povo da China. O povo não manda nada. 
Mandam economistas que trabalham exatamente como os mais eficientes banqueiros centrais do mundo. 
 
Há uma ideologia por trás disso. Sustenta que a democracia política, estilo ocidental, não funciona e, pior, atrapalha o crescimento econômico. 
Muito debate, parlamentos atrasando a aplicação dos programas, imprensa incomodando, sociedade reclamando e resistindo a medidas do governo — não há como ter eficiência, diz essa doutrina. 
Mas, para que isso seja verdade, é preciso admitir que a tecnocracia é eficiente e sabe claramente os interesses atuais e futuros dos cidadãos e do país. Logo, não erra. 
 
Pois o governo do presidente Xi Jinping vem cometendo erros sucessivos. O mais desastroso foi o programa Covid Zero. A ideia era bloquear a transmissão do vírus. 
Um teste positivo numa fábrica e se fechava toda a fábrica, trabalhadores e funcionários lá dentro, por quantos dias fosse necessário para testar todo mundo e isolar os doentes. 
Um caso num bairro, e todos os moradores eram simplesmente trancados em suas casas, com barricadas à frente dos prédios. 
Se o vírus escapava do bairro mesmo assim, regiões inteiras eram isoladas. 
Um caso num porto, e se fechavam todas as operações ali.
 
Sendo essa a política, o governo se descuidou da vacinação — e deu tudo errado. A Covid Zero paralisou seguidamente a economia e não impediu a transmissão. 
Quando, finalmente, se abandonou a política, a economia estava desorganizada, a sociedade cansada e não vacinada. 
Depois o governo se equivocou em várias tentativas de recuperação, e o resultado aí está: a China crescendo muito pouco, os ganhos de renda bloqueados.

Como se chegou a esse ponto? Pela natureza do regime. Sem democracia, sem livre debate, os médicos e cientistas que alertavam sobre os erros da Covid Zero eram simplesmente presos ou trancados em casa. Incipientes debates em alguma imprensa regional, reportando reclamações de moradores, foram rapidamente abafados.

O mesmo acontece nas decisões de política econômica. Quando o presidente e a administração central erram, a burocracia mantém esse erro, insiste, até que as próprias instâncias superiores, o presidente e a cúpula do partido percebam a besteira. De novo, como não há debate sobre a falência de certas políticas, não há base para a procura das mais corretas. Erro atrai erro.

E quer saber? É bom que isso esteja acontecendo. O povo chinês paga um preço e também muitos países cujas economias se ligaram mais fortemente à China. Mas era preciso desmistificar o sistema e derrubar a ideia de que a democracia atrapalha. É notável também a perda de prestígio da China como parceiro econômico e geopolítico. Se o governo lá muda suas políticas sem consultar seu próprio povo, por que consultaria outros governos?

Assim é que os países ocidentais no sentido amplo, democráticos e desenvolvidos — incluindo Japão, Austrália e Coreia do Sul —, buscam parceiros confiáveis.  
Países emergentes democráticos são candidatos. Alguns pularam na frente. 
O México ultrapassou a China como maior fornecedor dos Estados Unidos. Canadá também. A União Europeia, outro exemplo, procura fontes de energia fora da Rússia.

Enquanto isso, o Brasil de Lula, antiamericano, se alinha com China e Rússia.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista - Coluna em O Globo - 16 setembro 2023


sexta-feira, 26 de maio de 2023

A Câmara age bem e se antecipa ao STF no marco temporal das terras indígenas - Alexandre Garcia

 Gazeta do Povo - VOZES

Plenário da Câmara aprovou o regime de urgência para projeto sobre demarcação de terras indígenas.| Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados

Os deputados aprovaram ontem, e é muito importante essa aprovação, de urgência, para um projeto de lei que pretende se antecipar ao Supremo, pois o Supremo pode mexer numa data que está na Constituição. 
Trata-se de uma discussão sobre terra indígena. 
O Supremo vai examinar um caso de Santa Catarina, em que as pessoas que estão nessa terra já avisaram que morrem, mas não saem de lá. É uma área que é reivindicada por indígenas.

O artigo 231 da Constituição diz que são indígenas as terras que tradicionalmente ocupam - ocupam é presente do indicativo
Significa ocupam no dia 5 de outubro de 1988, que é o dia em que a Constituição entrou em vigor, que foi promulgada. 
E o Supremo pode mudar o tempo desse verbo, né?  
O Supremo pode tudo, pode botar "que vierem a ocupar depois", ou "que tenham ocupado antes". [só no Brasil, em que a INsegurança Jurídica domina, uma norma redigida de forma tão clara, enseja a interferência da Suprema Corte.]
 
 Então, para evitar esse "que tenham ocupado antes", há um projeto de lei, agora de urgência, para chegar na frente do Supremo, projeto de lei de 2007. Só agora que despertaram. Esse projeto de lei destaca que não vale se os indígenas deixaram de ocupar, e voltarem a ocupar depois da promulgação da Constituição. 
 Está valendo é no dia, a menos que sejam terras que estivessem ou estavam em litígio naquele dia, na justiça. 
Aí, o litígio é outra coisa, tem que deslindar o litígio. É isso o que diz. Então significa votação imediata, provavelmente na semana que vem já vão votar isso e evitar uma decisão do Supremo que todo mundo acha que pode inventar outro verbo para o artigo 231 da Constituição.
 
CPMI comprometida
 Decepção, pelo menos pra mim, foi a escolha do presidente e da relatora da CPMI do 8 de janeiro.  
A senadora Eliziane Gama, que outro dia mostrou uma foto abraçada com Flavio Dino. A relatora e o presidente estiveram no mesmo partido, o PPS, que foi o nome que deram para substituir o Partido Comunista Brasileiro. 
O Partido Comunista ficou meio que com vergonha do nome e mudou para PPS. A Eliziane hoje é do PSD, do Maranhão. 
E o presidente é o Arthur Maia, que é do União Brasil, da Bahia, mas foi do PPS. Interessante que ele saiu do PPS, de um extremo, para outro extremo, para o DEM. Mas também já passou pela Solidariedade, pelo PSDB, pelo MDB. 
Muito cheio de convicções doutrinárias pelo jeito, né? Ele é advogado. 
E o  governo evitou que estivesse nessa comissão o Renan Calheiros, o Azis, pra não parecer que era de novo aquela CPI do circo, mas pelo jeito vai ser, sabe por que? 
A relatora, depois de escolhida, disse o seguinte: "foi uma tentativa de golpe o que aconteceu em 8 de janeiro, que não se concretizou"
Ou seja, ela já deu a conclusão, acabou. Nasceu e morreu. Acabou, a relatora já tem a conclusão.

Quando a CPI iria investigar quem foi que quebrou, se foi uma coisa comandada por outro lado, quais foram as causas, por que as pessoas fizeram isso, quem são os personagens de tudo realmente. 
É aquela velhinha que estava lá cozinhando no acampamento, que está presa hoje ou está com tornozeleira? 
Por que que o general estava lá? 
Por que o coronel fez isso ou aquilo, por que as portas se abriram?  
 Tudo isso a gente pensava que ia ser investigado, mas a relatora já tirou conclusão, então é triste.
 
Carro barato?
E por fim, só pra registrar, o governo está anunciando que carro de menos de R$ 120 mil pode ter abatimento nos impostos federais e ficar mais barato e dá para comprar até direto da montadora
Quer dizer, deixar a concessionária na mão, no meio do caminho.
O pessoal da Fenabrave estava lá, dos distribuidores de automóveis, e da ANFAVEA também estava lá com Lula, antes que o vice Alckmin, como ministro da Indústria e Comércio, fizesse esse anúncio para aliviar as montadoras e baratear o preço dos carros. Vamos ver o que vai acontecer.

Conteúdo editado por: Jônatas Dias Lima

Alexandre Garcia, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


sábado, 4 de junho de 2022

Brasil no lugar da China? - Carlos Alberto Sardenberg

Brasil poderia ocupar o lugar da China?

Aqui vai só um exemplo de que como foi uma tortura o tipo de confinamento imposto aos moradores de Xangai. Ou, de como a política de covid zero faz com que muita gente grande reveja a disposição de investir na China.

História contada de fonte segura: numa fábrica de mais de 5 mil funcionários aparece um caso de Covid. No mesmo dia, todos os empregados são convocados a comparecer na empresa. E todos ficam ali confinados por sete dias. Isso mesmo, todo mundo na fábrica, de chefões a operários. Passados os sete dias, e não se verificando nenhum outro caso de Covid, todos são dispensados, mas com a ordem de permanecer em casa por sete semanas.

O lockdown de sete semanas foi imposto a toda a população de Xangai. Imposto não é modo de expressão. 
Repararam nas imagens, da semana passada, de moradores festejando a suspensão do confinamento? 
Viram como se animavam no trabalho de levantar as barricadas?

Isso mesmo – para obrigar as pessoas a permanecer em casa, foram erguidas barricadas em boa parte da cidade, bloqueando residências e prédios comerciais. Mesmo quem se dispusesse a enfrentar os policiais, não conseguiria sair. A política de Covid zero tem sido debatida em um duplo viés. De um lado, trata-se de saber sua eficiência em combater a transmissão do vírus. Na maioria dos outros países, o lockdown, mais ou menos restrito, foi uma prática auxiliar. Funcionou como um modo de ganhar tempo na busca de medicamentos e vacinas. Encontradas as vacinas, o lockdown foi relaxado na medida em que se avançava na imunização.

Isso deu certo. Tanto que agora, com o surgimento de novas variantes, menos graves, não foi necessário impor confinamentos. As populações estão vacinadas – em boa parte.

Daí, pergunta-se: e por que a China continua fazendo lockdown tão rigoroso? Caiu em Xangai, mas partes dessa cidade e outras menores continuam sob restrição. Em Xangai, essa medida se aplica em áreas residenciais ainda sob “médio ou alto risco” de contaminação.

A China criou vacinas, mas não parece que a maioria da população esteja imunizada. E dizemos “não parece” porque os dados do governo não são confiáveis. É certo, de todo modo, que milhões de idosos não foram vacinados.  
É certo também que a China não recorreu às vacinas “ocidentais”, mais modernas, e que poderiam oferecer uma eficiente combinação de imunização.

O que leva ao segundo ponto: essa política só é possível numa baita ditadura. E, de fato, o presidente Xi Jin Ping comanda pessoalmente o combate ao que ele chama de “vírus do diabo”. Para um materialista oficial colocar a culpa no demônio – é curioso.

Xi Jin Ping está no seu segundo mandato de cinco anos e se preparando para, neste ano, emplacar o terceiro. Isso rompe com a tradição de limitar a presidência a dois mandatos. Ele conseguirá fazer isso? É quase certo, pois o líder assumiu o comando do Partido Comunista e das Forças Armadas, e promoveu um expurgo nos quadros políticos e administrativos.

Manda e desmanda. Muito mais que os últimos presidentes. E manda também na economia que, convém registrar, é movida a capitais privados, nacionais e estrangeiros. Fazia tempo que as empresas, locais e internacionais, não sofriam tantas restrições como as aplicadas por Xi Jin Ping.

Resultado da falta de segurança, um exemplo de peso: a Apple está se preparando para retirar da China boa parte de sua produção. Pode levar iPad para o Vietnã e iPhones para a India.

É um sinal de que pouco a pouco a China vai perdendo sua condição de fábrica do mundo, paraíso das multinacionais. E para onde podem ir esses investimentos? Não para a Rússia, que era outro mercado emergente muito atraente, [será que para o capitalismo uma operação militar visando recuperar territórios é uma inconveniência??? desde que garanta a provisoriedade privada.] até a invasão da Ucrânia. Com a facilidade, agora perdida, de estar na Europa.

Os investidores precisam de um país grande, de economia medianamente desenvolvida, com organização administrativa e política. De preferência, uma democracia à ocidental, com regras seguras, garantidas em lei.

Pensaram no Brasil? Pois é. Pode, pode ser. Depende só daqui. [em nossa opinião um dos complicadores é a leniência da legislação brasileira, que não garante direitos nem Segurança Jurídica, por permitir interferências indevidas, especialmente do Poder Judiciário - certas situações surgidas na China e que estão espantando investidores, podem ocorrer no Brasil, bastando para tanto uma decisão monocrática de um ministro do Supremo. 
Outra agravante é que as condenações no Brasil, ainda que confirmadas em três instâncias e por vários juízes podem ser revistas em decisões monocráticas - quem garante ao investidor estrangeiro que um individuo condenado a uma pena severa, não pode, transcorrido alguns  alguns meses,  ser candidato ao cargo mais elevado do Brasil? 
Como bem diz o Sardenberg, depende só do Brasil - o que entendemos mudar sua legislação e propiciando SEGURANÇA JURÍDICA.]

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista  

 

 Coluna publicada em O Globo - Economia 4 de junho de 2022

segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

A surpreendente advertência de Putin - Fernão Lara Mesquita

Citado em artigo de Jordan Peterson,  que remete a tradução de discurso recente do ex-chefe da policia política soviética (NKVD) e presidente eterno da Rússia publicado no site http://MEMRI.org
“Os advogados do auto-proclamado ‘progresso social’ acreditam que estão empurrando a humanidade para um nível de conscientização novo e melhor. Benza Deus, hasteiem-se as bandeiras, toda a força à frente. A única coisa que eu quero lembrar é que não há nada de novo nisso. Pode ser surpresa para muita gente, mas a Rússia já esteve lá. 
Depois da revolução de 1917 os bolchevistas, confiando nos dogmas de Marx e Engels, também diziam que iam mudar todos os comportamentos e costumes, e não apenas os políticos e econômicos; queriam mudar a própria noção de moralidade e os fundamentos de uma sociedade saudável. 
A destruição de valores solidamente estabelecidos e das relações entre as pessoas até o limite da completa destruição da família (que nós também tivemos), o encorajamento para que as pessoas denunciassem seus entes queridos, tudo isso foi saudado como progresso e, por sinal, foi amplamente festejado pelo mundo afora; estava tão na moda quanto está hoje. 
E os bolchevistas, nunca é demais lembrar, também eram radicalmente intolerantes com quaisquer opiniões que não fossem as suas próprias.
Tudo isso deveria vir à nossa mente diante do que estamos vendo hoje. Olhando o que está acontecendo em tantos países do Ocidente fico embasbacado de ver de volta as práticas que eu espero que nós tenhamos abandonado para sempre num passado distante. A luta pela igualdade e contra a discriminação transformou-se numa forma agressiva de dogmatismo que beira o absurdo, quando as obras dos grandes autores do passado, como Shakespeare não podem mais ser ensinadas nas escolas e universidades porque suas ideias passaram a ser condenadas como atrasadas. Os clássicos agora são acusados de atraso e ignorância da importância do gênero ou da raça. 
Hollywood distribui panfletos decretando qual a forma correta de contar uma história e quantos personagens de cada raça e gênero deve haver em cada filme. 
Tudo isso vai muito mais longe do que foi, lá atras, o Departamento de Agitprop do Comitê Central do Partido Comunista da União Soviética”.

Fernão Lara Mesquita - O Vespeiro 

Transcrito por: Blog Prontidão Total


quinta-feira, 29 de outubro de 2020

Um poder intrometido - Percival Puggina

Eu não queria acreditar quando me contaram que sete partidos já recorreram ao STF para que a Corte determine ao presidente da República como deve agir em relação à CoronaVac. Parece uma questão tipicamente judicializável, não? 
Os ministros devem saber tudo sobre esse assunto, instruídos em algum curso pós doc... [Caro Percival, pois é, pois é, ... procede o que te informaram. Partidecos sem votos e sem programa  -  cumprindo uma dos mandamentos da turma do mecanismo + os adeptos do quanto pior, melhor = "não temos votos, mas temos o caminho de recorrer à  Justiça",  - estão judicializando a matéria.

E com boa receptividade da parte do STF. Já tem ministro do STF palpitando sobre o assunto, em  entrevista 'reservada'; , um ou outro com a faca nos dentes, o próprio presidente do STF deu uma entrevista lembrando que a vacinação obrigatória - "com a vacina que não existe" -  seria judicializada.

O cômico - ridículo, bizarro, aberrante, talvez classifiquem de forma mais adequada - é que 'tivemos' a conhecida batalha de Itararé, agora teremos a BATALHA PELA  VACINAÇÃO OBRIGATÓRIA COM A VACINA QUE NÃO EXISTE.

É o Brasil. Nosso Brasil que precisa de alguns BILHÕES DE REAIS - para evitar que milhões de famintos sofram fome e privações em intensidade  muito superior ao limite que já padecem - e ao mesmo tempo repassa a mais, para governadores estaduais gastarem livremente,  a bagatela de 31 BILHÕES DE REAIS.]

Em nome do convívio independente e harmônico entre os poderes de Estado, as manifestações do STF em questões do Executivo e do Legislativo deveriam ser raras e muito bem justificadas. É fácil entender que pequenos partidos, ou o bloco minoritário da oposição, sem votos suficientes para impor suas opiniões, recorram ao STF, num claro abuso do direito de peticionar. Mas é difícil entender que os “supremos” se prestem para a instrumentalização do poder que têm. [e, quase sempre em decisões monocráticas; agora mesmo, a 'suprema' ministra Rosa Weber acaba de revogar a revogação,  por um desembargador federal, que revogava decisão de juiz federal de 1º grau que revogava portaria do CONAMA reduzindo a proteção a mangues, etc.] 

Malgré tout, nosso STF é o próprio poder xereta, dando causa a desnecessárias tensões políticas. A maioria dos senhores ministros vê o presidente da República com as lentes do partido ao qual devem suas nomeações para o posto que ocupam. Sob essas lentes, Bolsonaro é um tirano que precisa ser contido e, para contê-lo, foi instituída uma informal ditadura do judiciário. Um caso típico de projeção: 
- projetam em Bolsonaro o que, na prática, eles mesmos se comprazem com ser. 
Puxe pela memória, leitor, e me diga quando, nas últimas décadas, vivemos período de tanta intromissão do Supremo e de seus ministros na vida nacional?

PT, PCdoB, PSOL PSB e Cidadania querem que o STF impeça o governo de se contrapor a qualquer providência referente a vacinas e vacinações; a Rede quer que o governo apresente um plano de vacinação; o PDT quer que o Supremo reconheça a competência dos estados e municípios para tornar compulsória ou não a vacinação, e o PTB pede que essa possibilidade seja declarada inconstitucional.

A questão de fundo aqui é a seguinte: por que esse surto de judicializações, que não dá sinais de esmorecer, esvaziando o debate político, descaracterizando as funções do parlamento e comprometendo as ações do governo? São três as respostas a essa indagação. Elas interferem cumulativamente para darem causa a esse surto.

Resposta 1 – o único intuito da oposição é atrapalhar o governo;
• Resposta 2 – o plenário do STF é, hoje, o mais ativo partido político brasileiro;

• Resposta 3 – há notória sintonia entre a oposição e a maioria do STF.
[marcar as três é a única opção correta; 
cabe ressaltar que atrapalhar o governo não é o único intuito da oposição, por ser o mais importante e   apoiado. Querem que tudo fique pior do que já está = 'quanto pior, melhor'.] 

De todos esses pleitos, o único que tem jeito de matéria constitucional é exatamente aquele em que se confrontam os pedidos de PDT e PTB: é legítimo tornar a vacinação obrigatória? [um supremo ministro já se manifestou sobre o assunto, sendo favorável a que o STF torne opcional a vacinação, mas puna quem exercer a opção pela não vacinação.

Esqueceu que se alguém que optou por não se vacinar = exercendo a opção generosamente conferida pelo Pretório excelso = contaminar alguém, o fato é que o contaminado foi infectado por não ter se vacinado = exercendo sem punição o mesmo direito exercido pelo contaminador - este, no entendimento do  ministro declarante deve ser punido e aquele não.] Parece bem nítida, aqui, no pedido do PDT, a afronta a liberdade individual, mormente quando, a cada dia, aumentam as incertezas sobre a segurança dessas vacinas. [faltam APENAS que as vacinas em desenvolvimento comprovem a SEGURANÇA NO USO e a EFICÁCINA na imunização. Detalhes menores, coisa de alguns meses e que são desconsiderados pelo Doria - adido comercial extraordinário da República Popular da China.] Sem esquecer, por fim, que a CoronaVac é mercadoria que o Partido Comunista da China põe à venda dizendo que vai imunizar a população contra o vírus que veio de lá.

 Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras e Cidadão de Porto Alegre, é arquiteto, empresário, escritor e titular do site Conservadores e Liberais (Puggina.org); colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil pelos maus brasileiros. Membro da ADCE. Integrante do grupo Pensar+.


segunda-feira, 26 de outubro de 2020

Vacina chinesa, não! Percival Puggina

Discute-se se o Brasil deve, efetivamente, comprar milhões de doses da vacina chinesa. Sem a menor intenção de magoar a sensibilidade do governador João Doria, que tem revelado particular afeição pelos interesses chineses no Brasil, quero proclamar minha completa aversão a esse negócio. Aplica-se a ele a regra segundo a qual jamais compre mercadoria que venha empacotado por algum partido comunista.

Ao que se sabe, há duas hipóteses para a origem do coronavírus. Ou ele em suposta teoria da conspiração - é produto de algum laboratório chinês, ou ele surgiu daqueles hábitos alimentares em que seres humanos acabam metabolizando insetos e animais silvestres com constante risco de trazer à humanidade doenças para as quais não temos imunidade.

A origem desses péssimos costumes é conhecida. Eles foram adquiridos nos tétricos episódios de fome impostos pelo Partido Comunista da China ao povo chinês. Ainda que seja motivo de pesar, é imperdoável que, sabido o alto risco que eles representam, nada tenha sido feito para extingui-los. Num mundo globalizado, não há limites para a expansão de novas pandemias. Portanto, a responsabilidade do PCC é indiscutível, como indiscutível é sua condição de soberano senhor do povo de seu país. Pode-se discutir a maior ou menor responsabilidade moral do Partido numa e noutra hipótese. Mas não se pode pôr em dúvida a responsabilidade.

As suspeitas se foram tornando mais incisivas quando a revista Exame, em matéria do dia 1 de setembro (1), constatou que dezenas de economias nacionais estavam acusando quedas drásticas do PIB. Entre elas, Índia, Brasil, Estados Unidos, Japão e praticamente toda a Zona do Euro. Enquanto isso acontecia no mundo das vítimas, a China, “por haver controlado rapidamente a epidemia”, logo voltou a crescer. Em abril, o jornal El País (2), sobre cuja posição política não pairam incertezas, publicou matéria listando reações de governos europeus, notadamente França e Reino Unido, cobrando responsabilidades do governo chinês:

“Esperamos que a China nos respeite, como ela deseja ser respeitada”, declarou na segunda-feira o ministro francês de Relações Exteriores, Jean-Yves Le Drian. “Nada pode voltar a ser como antes” enquanto a China não esclarecer de forma cabal tudo o que está relacionado com o vírus, observou na semana passada seu homólogo britânico, Dominic Raab.

A interessante matéria destaca, ainda, uma guerra de narrativas, com a qual, propagandisticamente, a China exibe suas remessas de material médico e de enfermagem ao Ocidente, enquanto silencia o fato de haver o Ocidente feito o mesmo quando o problema se manifestou em Wuhan. A BBC, em 28 de julho, divulgou matéria em que médico chinês afirma haver, em 12 de janeiro, informado as autoridades chinesas sobre a transmissão humana do vírus. O alerta, contudo, só foi levado ao público em 19 de janeiro (3).

Por isso, penso que o PCC, soberano senhor do povo chinês, repito, deveria oferecer sua vacina de graça à humanidade. E a humanidade deveria devolver a mercadoria. Alias, gostaria que o presidente da República enviasse uma dose dela para os jornalistas que o recriminam por sua atitude de resistência. Quantos realmente iriam usá-la?
Enfim, a China deveria indenizar a humanidade pelo estrago que fez, deveria usar seu aparelho tecnológico para extinguir os riscos que provenientes dos maus hábitos alimentares de alguns de seus cidadãos, ou dos ensaios empreendidos por eventuais “doutores Nirvana” de seus laboratórios. Jamais, jamais, ganhar dinheiro vendendo vacina às vítimas do vírus que veio de lá.


Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras e Cidadão de Porto Alegre, é arquiteto, empresário, escritor e titular do site Conservadores e Liberais (Puggina.org); colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil pelos maus brasileiros. Membro da ADCE. Integrante do grupo Pensar+.


sexta-feira, 9 de novembro de 2018

O novo contra o velho

 Na política, o velho resiste a morrer


O cientista político Antonio Gramsci, fundador do Partido Comunista Italiano, cunhou uma frase que pode bem definir o momento que estamos vivendo: “O velho resiste em morrer, e o novo não consegue nascer”. Gramsci se referia a outros tempos, mas os que estamos vivendo aqui no Brasil hoje tem as mesmas características. Pode ser que o novo que apareceu não seja a melhor solução, mas é o que temos no momento.  O povo, através do voto, fez uma limpa quase geral na classe politica tradicional, e sobreviveram apenas uns poucos caciques, que manobravam o cenário político nos últimos 25 anos em benefício próprio e dos seus próximos. Mas parece que não entenderam o recado das urnas.

Um dos que não sobreviveram foi o ainda presidente do Senado, Eunício de Oliveira, que aproveitou para ir à forra, com o dinheiro público. Botou para votar, do nada, o aumento do Judiciário que estava congelado depois de aprovado na Câmara, por questões de economia.  Não há dúvida de que os juízes merecem ganhar bem, assim como toda carreira do sistema judicial tem que ser bem remunerada. Mas, como disse o presidente eleito, não era o momento. Um Senado já superado pelas urnas, com a maioria de votos de senadores não reeleitos pelo povo, resolveu fazer uma benesse ao Supremo Tribunal Federal, que tem efeito cascata.

O presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, agradeceu a decisão do Senado, cujos ocupantes receberam telefonemas de ministros e juízes para aprovarem o aumento, um lobby legítimo mas temerário no momento em que diversos senadores têm processos correndo na última instância do Judiciário.  O argumento dos ministros é correto, pois os salários estão defasados mesmo. E argumentam que o auxilio moradia será extinto, compensando o choque do aumento no orçamento. Bom argumento, mas seria mais republicano, digamos assim, que o Conselho Nacional de Justiça acabasse primeiro com as distorções desse auxílio, que na maior parte das vezes é usado como uma compensação salarial justamente para repor a defasagem.

Se dessem o exemplo, cortando vantagens que são estranhas ao cidadão comum, não poderiam ser acusados de pensarem apenas em seus interesses. Também os senadores usaram o caso para mandar um recado ao presidente eleito Jair Bolsonaro, que fez um apelo para que o aumento não fosse dado nesse momento.  Quando o superministro da Economia Paulo Guedes disse que o Congresso precisaria de “ uma prensa” para aprovar as reformas, inclusive a da Previdência, ainda no governo Temer, o ainda presidente do Senado deu uma risada e comentou: “Ele não sabe como a coisa funciona”. E tratou de demonstrar, na prática, como a banda toca.

É uma banda antiquada, que já saiu de moda, mas ainda tem o controle da programação e insiste em não sair do palco, mesmo com os convidados não gostando, não dançando, e vaiando. Outras surpresas virão devido a uma incongruência de nosso calendário eleitoral.  O novo Congresso só toma posse em fevereiro, e os que foram, na maioria, cassados pelo voto popular, continuam com a caneta na mão até janeiro. O futuro presidente governará quase um mês com um Congresso com prazo de validade prestes a expirar, e com o orçamento feito por um governo que está de saída.

Há maneiras de amenizar a situação, mas a falta de coerência é evidente. Vários projetos, que não tiveram o apoio da sociedade, voltam à pauta nos derradeiros instantes, para pagar dívidas ou, sobretudo, para tentar salvar a pele dos que perderam o foro privilegiado com o fim do mandato.  Há de tudo um pouco: proposta para reduzir os efeitos das delações premiadas, para acabar com a prisão em segunda instância, para reduzir o poder de fogo dos que hoje combatem a corrupção com formidável êxito. E amanhã estarão mais que nunca no poder, com a chegada do Juiz Sergio Moro como também superministro da Justiça e Segurança Pública.

Não será fácil para o novo governo aprovar reformas que são impopulares, ou reforçar a legislação de combate ao crime organizado e à corrupção. Mas não será também com “prensas” ou “tratoramento” que os congressistas se curvarão.  Sempre será preciso negociar com o Congresso e com as corporações. Tentar pressionar com milícias digitais se tornará uma maneira antidemocrática de persuasão. Pode até ser que o novo que tenta nascer não seja tão novo assim, e repita os velhos hábitos. Mas é preciso virar a página e recomeçar em novas bases esse jogo político.  O cidadão já deu seu recado. Se os políticos fizerem ouvidos moucos, teremos crise em cima de crise e só aprofundaremos nossos problemas.

Merval Pereira - O Globo