Assim não, juiz Sérgio Moro! Assim, o senhor ainda
acaba ganhando uma estrelinha do PT! Ou:
Nem um homem probo tem o direito de agredir o estado de direito
Alguns
leitores têm de pôr um troço na cabeça: eu
escrevo o que quero, não o que querem que eu escreva. Construí a liberdade
de dizer tudo o que penso; não a ganhei de ninguém. E, por óbvio, ela está
ancorada na Constituição. Critiquei,
sim, ontem, o juiz Sérgio Moro, que, até onde sei, é um homem correto. A
exemplo dele, quero os ladrões da Petrobras na cadeia. Mas isso não me impede
de apontar seus erros. Quem não gostar que não leia.
Só para refrescar a
memória: o
juiz negou habeas corpus aos diretores presos da OAS, a menos que a empreiteira rompesse todos os seus contratos com órgãos
públicos nas três esferas de administração. O
juiz pode ser um valente, mas precisa tomar cuidado com a paixão pelos
holofotes. Ele
negue o que quiser, e a Justiça decida. Mas não lhe compete antecipar uma
pena — antes da condenação — e fazer
uma exigência, ainda que oblíqua, que prejudicaria não apenas os donos da OAS,
mas milhares de pessoas. Por que a
empreiteira romperia até contratos que não estão sob investigação? Isso é
prática que demoniza o setor privado. E
a Petrobras, o antro da roubalheira? Não tem de romper nada? Tenham paciência!
Agora leio no Estadão que o juiz reclamou
da lista de testemunhas de defesa do empresário Ricardo Pessoa, dono da UTC,
apontado como uma espécie de coordenador do que foi chamado “Clube das Empreiteiras”. Entre os nomes arrolados por ele estão o
ministro Jaques Wagner, da Defesa, ex-governador da Bahia; o ex-ministro das
Comunicações Paulo Bernardo; Arlindo Chinaglia, candidato do PT à Presidência
da Câmara, e José
Di Fillipi Jr., ex-tesoureiro das
campanhas de Lula e Dilma e atual secretário da Saúde de São Paulo. Há ainda 18 outros
nomes, de vários partidos. Mas é evidente que são estes os que chamaram a
atenção.
E chamam a atenção,
muito especialmente, porque Pessoa é autor de um manuscrito em que deixa claro que o PT era o coordenador da
festança. Vai
além e diz que o dinheiro que passou pela diretoria de Paulo Roberto Costa era “fichinha” perto do que realmente
aconteceu. Mais: assegura que todas as
empreiteiras colaboraram com a campanha de Dilma e que Edinho Silva, tesoureiro
em 2014, devia estar “muito preocupado”.
Em tom irônico, indaga se as
contribuições ao PT têm ou não a ver com obras da Petrobras.
Muito bem. Leio agora no Estadão que o juiz Sérgio Moro não gostou
da lista de testemunhas de Pessoa. É
mesmo? Ele quer saber por que aqueles nomes estão lá. Escreve: “Há a possibilidade de que tais testemunhas
tenham sido arroladas apenas com propósitos meramente abonatórios, o que não
seria justificável, pois testemunha é quem sabe fatos relevantes para o
julgamento, ou seja, deve ter conhecimento sobre fatos que são objeto da
imputação”. Vai além: “A oitiva de
agentes públicos como ministros, deputados e secretários é sempre demorada e
difícil em vista do procedimento do artigo 221 do Código de Processo Penal. (…)
Além disso, tais agentes públicos servem a comunidade e não se afigura correto
dispender o seu tempo, além do desse Juízo, ouvindo-os sem que haja real
necessidade”.
Epa! Aí não! Nunca vi isso. O juiz pretende agora criar um departamento
prévio de censura de testemunhas, definindo quais podem e quais não podem
ser arroladas? Vetaria
os nomes indicados com base em que lei? Estabelecer esse limite seria cercear o direito de defesa, é
evidente. De resto, parece-me óbvio que um réu arrole testemunhas com “propósitos abonatórios”. Ele queria o quê? Que o empresário chamasse
pessoas para atacá-lo em juízo?
Vamos ficar atentos! Não estou gostando do rumo que vêm tomando certas coisas. Queira o
juiz ou não — não estou aqui a
avaliar intenções porque não conheço o fundo das consciências —, ao criticar as indicações feitas por Pessoa
— que remetem ao núcleo duro do PT
—, Moro, na prática, tenta conduzir a investigação,
afastando-a, curiosamente, do partido que está no poder. Então uma empreiteira
baiana não pode chamar o baiano Jaques Wagner, que conhece a empresa de perto,
para ser testemunha? Por que não? “Ah, mas pode ser uma forma de chantagem e de recado…” É? Eis, então, algo a ser investigado. Por que chamar o ex-tesoureiro das
campanhas de Lula e Dilma? Pois é… Talvez Fillipi Jr. e o próprio Pessoa
conheçam os motivos.
Qual é o problema,
doutor Moro? Será desagradável ver, sei lá, Jaques Wagner cobrir o réu de elogios? Wagner que, diga-se, vem do setor petroleiro e deu emprego a José
Sérgio Gabrielli quando este foi chutado da Petrobras.
Assim não, doutor Moro! O senhor tem o direito de ter a sua tese.
Mas é preciso tomar cuidado para que convicções mais profundas — como a eventual aversão ao setor privado —
não turvem o seu juízo. A roubalheira na Petrobras tinha um centro nervoso,
sim: era político! Caso se insista em
que se tratava apenas de um bando de empresários tentando roubar a estatal, os bandidos estrelados acabarão sendo, uma vez
mais, beneficiados, como
já foram no caso do mensalão.
Fonte:
Blog do Reinaldo Azevedo
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