Assim como a bronca que a presidente Dilma deu no operador do
teleprompter revelou aos mais desavisados que
aquela fala coloquial na reunião ministerial nada tinha de espontânea, estava
toda escrita por ghost writer com viés de marqueteiro, também a revelação do balanço incompleto da Petrobras
demonstrou o que provavelmente a maioria já suspeitava: a situação da maior estatal brasileira é caótica, e ninguém sabe
qual é o número verdadeiro do rombo que o petrolão causou.
A própria Graça Foster, presidente da empresa, admitiu
por escrito "ser
impraticável" a
quantificação destes valores "indevidamente reconhecidos" (uma variação
do famoso "dinheiro não contabilizado" eternizado pelo tesoureiro do
PT Delúbio Soares no mensalão). Sem uma avaliação de auditores independentes, que se recusaram a endossar os números, o
balanço do 3º trimestre fez virar pó
toda a propaganda lida por Dilma sobre a Petrobras que, segundo ela, "já vinha passando por um rigoroso
processo de aprimoramento de gestão" antes do escândalo, e no entanto
não foi capaz de dimensionar o verdadeiro buraco nas contas da empresa.
Há informações de que na reunião do Conselho de
Administração que aprovou o balanço divulgado, houve pressão de ministros da antiga administração que se opuseram
à adoção de critérios para definir as perdas, por considerarem que nem tudo nos
31 projetos que tiveram redução no valor do ativo estava relacionado com perdas por
corrupção, mas havia também outros fatores como ineficiência dos projetos ou até atrasos por causa de problemas climáticos.
Como se vê, está longe o dia em que a Petrobras terá,
como prometeu a presidente Dilma em seu discurso na reunião ministerial, "a mais eficiente estrutura de
governança e controle que uma empresa estatal, ou privada já teve no
Brasil". O que impressiona é que o balanço da Petrobras tenha sido
divulgado na mesma noite em que a presidente fez seu discurso na reunião
ministerial.
Não
apenas por que a divulgação foi à noite, quase às escondidas,
mas principalmente por que revela um desencontro
inacreditável entre o que a presidente disse e o que a estatal mostrou no seu
balanço. Um mínimo de coordenação no governo impediria que a Petrobras desmentisse a presidente tão diretamente. A presidente Dilma também saiu da realidade
quando disse que a Petrobras, "a
mais estratégica para o Brasil e a que mais contrata e investe no país", teria
que continuar a apostar no modelo de partilha para o pré-sal, e dar
continuidade à vitoriosa política de conteúdo local.
O problema é que, horas depois, o balanço da empresa,
mesmo feito de maneira incorreta, mostrou que a Petrobras terminou o trimestre com um
endividamento líquido de R$ 261,4 bilhões, um aumento de 18% (ou R$ 40
bilhões) em relação ao fechamento de 2013, a maior parte dessa dívida em
dólar.
Do investimento total, apenas R$ 62 bilhões foram próprios, o restante veio de
investidores externos. Isso demonstra que a aposta no sistema de partilha, que obriga a
Petrobras a bancar pelo menos 30% de todos os investimentos no pré-sal, é
simplesmente inviável, além do fato de que a política de conteúdo
nacional nada tem de vitoriosa.
Ela
obriga a estatal a comprar equipamentos muito mais caros,
além de bancar a ineficiência de empresas criadas para
fabricar equipamentos de conteúdo nacional, como a Sete Brasil criada
em 2011 para a contratação de sondas marítimas. A Petrobras indicou o comando
executivo da empresa, e Pedro Barusco, o executivo que se comprometeu a
devolver U$ 100 milhões na Operação
Lava-Jato, foi colocado lá.
Agora, a empresa, uma união da Petrobras com bancos como o Pactual BTG e fundos
de pensão, está quebrada e teve que ser socorrida pelo BNDES. O desencontro entre as promessas presidenciais
e a realidade está cada vez maior, e isso é
preocupante.
Fonte:
Merval
Pereira – O Globo
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