Agraciado pela revista IstoÉ com o prêmio Brasileiro do Ano, Sergio
Moro dividiu o palco com Michel Temer e outros personagens em litígio
com a lei. O juiz da Lava Jato tinha duas alternativas: ou encarava o
inusitado com um sentido de absurdo ou enxergava tudo sob a ótica do
deboche. Preferiu encarar a situação como uma piada. Ao discursar, o
juiz da Lava Jato revelou-se um humorista insuspeitado.
Moro
falou sobre providências que precisam ser adotadas ou evitadas para
combater a “corrupção sistêmica” que assola o país. Reiterou, por
exemplo, a defesa da regra que abriu as portas das celas para os
condenados na segunda instância. Injetou uma certa ponderabilidade
cômica na cena ao pedir ajuda a Temer. Com duas denúncias criminais no freezer,
Temer terá de acertar contas com a Justiça depois que deixar a
Presidência. Num instante em que seus aliados tramam aprovar um
mecanismo qualquer que mantenha ex-presidentes a salvo de ordens de
prisão de juízes como Moro, o comediante sugeriu a Temer que se enrole
na bandeira da prisão em segundo grau: ''Mais do que uma questão
de justiça, é questão de política de Estado”, disse Moro. Ele pediu a
Temer que “utilize o seu poder” para influenciar o Supremo Tribunal
Federal, de modo a desestimular a mudança da regra. “O governo federal
tem um grande poder e grande influência. E pode utilizar isso. Se houver
mudança, será um grave retrocesso.”
Um detalhe potencializou o
teor humorístico do pedido que Moro dirigiu a Temer: o ministro Gilmar
Mendes, amigo e conselheiro do presidente, é o maior defensor da
política de celas vazias no Supremo. Gilmar compôs a maioria de 6 a
5 que autorizou o encarceramento de condenados depois do veredicto de
tribunais de segundo grau. Mas já deixou claro que pretende mudar o seu
voto quando a questão retornar ao plenário da Suprema Corte. Foi como se
Moro sugerisse a Temer gritar para Gilmar: “Tem que manter isso, viu?”
Um espetáculo de stand-up comedy só
é bom de verdade quando o humorista extrai parte de suas anedotas da
própria plateia. Ferino, Moro defendeu o fim do foro privilegiado diante
de Moreira Franco, o amigo a quem Temer fez questão de presentear com o
escudo. Concedeu-lhe o título de ministro e o consequente direito de
ser julgado no Supremo depois que o companheiro virou o “Gato Angorá”
das planilhas do Departamento de Propinas da Odebrecht. O foro
concede ''privilégios às pessoas mais poderosas'', declarou Moro,
arrancando efusivos aplausos da audiência. ''Seria relevante eliminar
completamente o foro ou trazer uma restrição ao foro.'' Como juiz, Moro
também dispõe de foro especial. ''Não quero esse privilégio para mim'',
refugou, sob aclamação.
Temer e Moreira abstiveram-se de aplaudir
Moro. Outros acompanhantes do presidente também sonegaram ao juiz a
concessão de uma salva de palmas. Entre eles o presidente do Senado,
Eunício Oliveira, o “Índio” da planilhas da Odebrecht. Como que
decidido a borrifar graça na atmosfera, Moro sugeriu ao ministro da
Fazenda, também presente à premiação, que seja mais generoso com a
Polícia Federal: “Pedindo vênia ao ministro Henrique Meirelles, que faz
um magnifico trabalho na economia, me parece que alguns investimentos
são necessários para o refortalecimento da Polícia Federal. O
investimento na atuação do Estado contra a traz seus frutos.”
Temer
discursou depois de Moro. Mas não disse palavra sobre Lava Jato ou o
combate à corrupção. Limitou-se aos autoelogios. E bateu bumbo pela
reforma da Previdência.
Destoando do resto dos presentes, o
presidente da República e seus acompanhantes não ficaram em pé quando
Moro subiu ao palco para receber o seu prêmio. [o protocolo não permite que membros de um Poder aplaudam, de pé, em eventos sociais, membros de outro Poder.] Durante o discurso do
juiz, exibiam cenhos crispados. Tratadas como reformadoras morais, as
piadas não acharam graça de si mesmas. Por sorte, o humor compreende
também o mau humor. O mau humor é que não compreende coisa nenhuma. [bom lembrar que o considerado pelo ilustre Josias como humorismo do juiz Sérgio Moro e que na análise de muitos está em excesso de tagarelice, deve ser por influência de alguns membros do MPF que atuam na Lava Jato e desconhecem a noção de que o silêncio é de ouro - o magistrado convive muito com procuradores da Lava Jato e deve ter se contaminado pelo vírus do falar demais.]
Blog do Josias de Souza
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