Quando se veem os dados, sem ideologias, fica
evidente que todo o sistema corre risco crescente
A
retomada da tramitação do projeto de reforma da Previdência no Congresso
reinicia todo aquele debate em que se misturam mistificações estatísticas, puro
desconhecimento dos números e resistência de fundo apenas ideológico, que fazem
políticos virarem as costas à aritmética. Consideremos que, diante do óbvio,
esteja descartada a miopia de considerar que não existe déficit da Previdência.
Isso não passa de alquimias contábeis, em que são usadas receitas indevidas
para melhorar o balanço do sistema. Nem se devem levar a sério centenas de
milhões creditados a dívidas de contribuintes do INSS. Bastaria cobrar-se esses
calotes, e as contas voltariam ao equilíbrio.
Infelizmente
não é assim tão simples. Uma consulta superficial à lista de devedores da
Previdência encontra massas falidas, cujos débitos são irrecuperáveis. E mesmo
que fossem resgatados, a tendência estrutural do sistema a déficits persistiria.
A demora em se ajustar um sistema sem exigência de idade mínima para
aposentadoria à realidade demográfica de uma população cuja idade média está em
alta — pela saudável extensão da expectativa de vida — causa desequilíbrios
crescentes. Um dos poucos países do mundo que ainda não estabelece parâmetro de
idade para o pedido do benefício, o Brasil ostenta a preocupante característica
de que, em média, o brasileiro do regime geral de previdência (INSS) se
aposenta aos 58 anos. Como ele, também em média, vive até além dos 80 anos, a
pressão sobre o caixa do sistema é enorme. Daí o déficit, estimado em R$ 177
bilhões para este ano, poderá ultrapassar R$ 200 bilhões, em 2018.
À medida
que o tempo passa, as contas públicas ficam mais desequilibradas, e, por isso,
qualquer mudança na economia mundial pode enevoar o relativo céu azul interno.
Logo, esta discussão precisa ser mais séria, sustentada em números. Se é uma
aberração a idade média de 58 anos de quem pede aposentadoria no INSS, não
resta dúvida de que a fixação das idades mínimas de 65 anos para homens e 62
para mulheres, estabelecida no pacote revisto da reforma, precisa ser aprovada.
Com as devidas regras de transição. Este já era um dos corações da reforma;
agora, na sua versão reduzida, tornou-se mais ainda seu pilar. O Brasil já
gasta com a Previdência cerca de 10% do PIB, tanto quanto países com populações
de idade média mais avançada: Polônia, Alemanha, Japão. Assim, a tendência de
envelhecimento do brasileiro elevará ainda mais este índice, inviabilizando
outras despesas.
A questão
do funcionalismo está clara: há nele castas de aposentados cujo peso o Tesouro
não pode continuar a sustentar, além de ser um fator de injustiça social, de
concentração de renda. É suficiente conhecer algumas estatísticas: um milhão de
servidores federais aposentados geram um déficit de R$ 78,1 bilhões, enquanto
30 milhões de aposentados no setor privado (INSS), 30 vezes mais pessoas,
produzem um déficit de R$ 188,8 bilhões, apenas duas vezes e meia mais que o
resultado negativo no funcionalismo. A lógica da reforma é sólida, para
proteger todos os aposentados. A continuar a assim, todo o sistema quebrará.
Saiba mais sobre o déficit da Previdência - só as fraudes atingem R$ 115 BILHÕES = quase que a metade do DÉFICIT total da Previdência.
A apropriação indébita - por parte dos empregadores que cobram dos trabalhadores e não repassam à Previdência - alcança R$ 125 BILHÕES.
Editorial - O Globo
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