Roberto Godoy e Marcelo Godoy
Atual Chefe do Estado-Maior do Exército foi convidado para ser o novo ministro da Casa Civil
Um comunicado de poucas linhas da Casa Civil informava que “por motivos
de caráter estritamente pessoal, em grande parte de foro íntimo”, o
então ministro Golbery do Couto e Silva pedia demissão do cargo. Era 8
de agosto de 1981. Golbery foi o último general a ocupar o cargo que
deve ser de Walter Braga Netto, atual chefe do Estado-Maior do Exército
(EME).
General é o primeiro chefe do Estado-Maior a ocupar o cargo desde 1981
A distância que separa os dois generais não é meramente temporal.
Golbery representava um projeto político para o País, identificado com a
Escola Superior de Guerra (ESG), que condicionava à segurança nacional o
êxito de seu desenvolvimento. Via nos objetivos nacionais permanentes a
razão de ser do Estado, que ampliaria, segundo Golbery, “cada vez mais a
esfera e o rigor de seu controle sobre uma sociedade já cansada e
desiludida do liberalismo”. Nas palavras do cientista social Oliveiros
Ferreira, o general era então “um dos últimos discípulos de Thomas
Hobbes, mesmo a contragosto”. “Por isso, para ele, a Liberdade – da
mesma forma que a Propriedade– era instrumental.”
Quando Braga Netto era tenente-coronel e gerenciava nos anos 1990 no
Palácio do Planalto o projeto Sivam-Sipam (o sistema de proteção e
vigilância da Amazônia), o general Golbery se havia transformado em tema
para livros de história. O Exército deixava a visão estatista do
governo Geisel (1974-1979) e a ideologia esguiana para trás e começara a
mandar seus oficiais fazer cursos nas Fundações Dom Cabral e Getúlio
Vargas. A Força descobrira a gestão, a qualidade total e, por meio dela,
o novo liberalismo.
O domínio da gestão estratégica e de seus métodos passaram a ser um
atributo tão ou mais importante do que saltar de paraquedas, conhecer as
direções táticas de atuação de grande unidades ou os requisitos
operacionais básicos de um material bélico. É por isso que, ao ser
nomeado interventor federal na Segurança do Rio, Braga Netto deixou o
dia a dia da polícia – inclusive a investigação da morte da vereadora
Marielle Franco – para seus subordinados e montou, no Comando Militar do
Leste (CML), um gabinete para gerir compras e licitações, tentando pôr
em ordem a frota de veículos, o arsenal e a manutenção dos materiais da
polícia, da pericia e dos bombeiros.
Nas poucas entrevistas que concedeu, Braga Netto sublinhou que o grande
legado da intervenção no Rio era o da gestão, da coordenação e do
planejamento – e foi isso que o fez bater de frente com a decisão do
governador Wilson Witzel (PSC) de dividir a Segurança Pública em duas
pastas, uma da Polícia Civil e outra da Militar. “Ele é o Onix do Pujol
(Edson Pujol, comandante do Exército)”, disse um general, comparando a
função do EME com a da Casa Civil. “Será o chefe do Estado-Maior do
Planalto”, completou seu colega de turma na Academia das Agulhas Negras –
Braga Netto saiu aspirante em 1978 e passará para a reserva em julho.
A nova missão do general deve ser coordenar os ministérios – a
articulação política permanecerá com Luiz Eduardo Ramos (turma de 1979
da Aman e ex-comandante do Sudeste), da Secretaria de Governo. Será algo
inédito na República: dois generais da ativa e do Alto-Comando ocupando
os mais importantes postos civis do Planalto. O tempo deixou para trás Golbery. Em seu lugar, o Exército vai ao
Planalto com homens da tropa. São esses gestores que querem consertar o
País. A Força mudou, mas o salvacionismo não foi esquecido.
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