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sexta-feira, 9 de setembro de 2022

Lojinhas de porcentagens - As pesquisas naufragam nas ruas - Revista Oeste

Augusto Nunes

O recado das multidões às lojinhas de porcentagens

Multidão observa Nilo Peçanha durante a campanha Reação Republicana <i>(à esq.)</i>; manifestantes pró-governo em ato na Esplanada dos Ministérios, em Brasília <i>(à dir.)</i> | Foto: Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil/Reprodução
Multidão observa Nilo Peçanha durante a campanha Reação Republicana (à esq.); manifestantes pró-governo em ato na Esplanada dos Ministérios, em Brasília (à dir.) | Foto: Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil/Reprodução

Tinha 9 anos de idade quando soube que o tamanho dos comícios permitia adivinhar quem seria prefeito da cidade onde nasci. Divididas entre janistas e ademaristas, as famílias da classe média não escondiam preferências políticas, e bastava a contagem dos portadores de um mesmo sobrenome para constatar-se que, de novo, o embate estava empatado no centro urbano. O desfecho do duelo, portanto, dependeria dos eleitores pobres. Quem quisesse descobrir o nome do vitorioso deveria avaliar com precisão o aglomerado humano sitiando palanques montados nas vilas e nos distritos. Deveria, sobretudo, medir com olhos de comerciante sovina a plateia reunida por cada candidato no comício de encerramento.

Em 1959, por exemplo, a comparação do público informou que, no último dia do confronto, meu pai discursara para o dobro de gente. A apuração confirmou que Adail Nunes da Silva fora eleito com o dobro de votos. Em outras ocasiões, ele se valeu desse critério para compreender que a direção dos ventos lhe era desfavorável. “Quando o adversário promove um grande comício, a única resposta convincente é realizar um ainda maior”, dizia. “Se não conseguir, convém preparar-se para cumprimentá-lo pela vitória assim que a apuração terminar.” Ao recenseamento das plateias somavam-se outros instrumentos de medição. Só haveria chances de salvação, por exemplo, para candidatos que fossem imediatamente cercados por no mínimo cinco eleitores ao entrarem num bar.

Essa metodologia tão singela quanto eficaz começou a ser aposentada nos anos 1980 pela pesquisa de intenção de voto. As lojinhas de porcentagens viraram praga na virada do século e, apesar do imenso acervo de erros desmoralizantes, hoje exibem proporções pandêmicas. Colisões frontais entre os índices atribuídos aos candidatos e a paisagem das ruas são menosprezadas pelos gerentes, todos agarrados ao mesmo bordão: “Pesquisa é retrato do momento”. Erros medonhos são justificados com o palavrório de sempre: houve uma mudança brusca às vésperas do pleito, brasileiro decide em quem votar ao entrar na cabine eleitoral, a tendência foi detectada nas horas finais e outras vigarices.

Jornalistas de botequim se preparam para enfrentar o golpe de Estado previsto desde a chegada de Bolsonaro ao Planalto

Neste 7 de Setembro, o descompasso entre os índices produzidos em escala industrial e as formidáveis manifestações populares registradas em São Paulo, em Brasília e no Rio ampliaram a procissão de interrogações sem respostas.  
Como é possível que pesquisas realizadas num mesmo momento apresentem diferenças de até 15 pontos percentuais (sempre com Lula na liderança)? 
Se em 2018 o Datafolha naufragou ao prever que Jair Bolsonaro seria derrotado no segundo turno por qualquer adversário, por que estaria certa a profecia reprisada neste 2022? 
Por que o favorito Lula não traduz a suposta vantagem em manifestações ainda mais impressionantes? 
Por que permanece em casa enquanto o segundo colocado atrai multidões quase diariamente, e em todos os pontos do país? 

À falta de álibis convincentes, as sumidades da estatística deram início à dança dos números. Os manifestantes ainda voltavam para casa quando levantamentos saídos do forno reduziram dramaticamente a distância entre Lula e Bolsonaro ou se refugiaram em empates técnicos. 
A seita que tem num presidiário seu único deus ficou atarantada com o coro dos pacíficos indignados
Em São Paulo, confrontado com a Avenida Paulista atulhada de gente, Lula desandou na comparação amalucada:O 7 de Setembro parecia a Ku Klux Klan”, balbuciou. Há poucos dias, o ministro Luís Roberto Barroso enxergou uma única utilidade no espetáculo do povo nas ruas: “Saberemos quantos fascistas existem no Brasil”. 
Mesmo que tenha deixado fora dos cálculos as crianças de colo, as que chegaram de mãos dadas com os pais e os idosos em cadeiras de rodas, descobriu que são milhões. 
Mais difícil será admitir que os manifestantes são apenas democratas dispostos a enquadrar o autoritarismo criminoso do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral, as mentiras fabricadas pela imprensa velha e o cinismo dos bandidos que tentam voltar à cena do crime.
 
Jornalistas de botequim se preparam para enfrentar o golpe de Estado previsto desde a chegada de Bolsonaro ao Planalto
Toparam com brasileiros que respeitam a Constituição e louvam a democracia. Bestificados, capricharam na Ópera dos Cretinos
Um jornalista da GloboNews acusou o presidente de glorificar o próprio pênis. [teve  uma jornalista que escreveu um verdadeiro tratado sobre o tema.]
 
Uma comentarista, ao afirmar que o presidente machista insultara as três palavras inscritas na bandeira nacional, trocou Ordem e Progresso por Independência ou Morte.  
Um colunista da Folha reduziu o mar de gente na Paulista a pouco mais de 30 mil gatos-pingados. 
E os partidos assustados com os ecos da voz do povo recorreram aos aliados de toga: querem que a candidatura de Bolsonaro seja impugnada “por uso da máquina pública”.

Se tentarem a revanche nas ruas, Lula e seus devotos estarão expostos à derrota definitiva. Como nunca aprenderão a cumprimentar adversários vitoriosos nas urnas, resta-lhes dobrar-se à imagem de Nelson Rodrigues, sentar no meio fio e chorar lágrimas de esguicho.

Leia também “Faltou alguém no debate”

Augusto Nunes, colunista - Revista Oeste


domingo, 21 de agosto de 2022

Espiral de silêncio - Revista Oeste

Rodrigo Constantino

O intuito é intimidar quem quer que ouse apoiar Bolsonaro em particular ou a direita em geral 

Um grupo fechado de WhatsApp, com alguns grandes empresários, teve suas conversas vazadas e publicadas pelo site Metrópoles.  
Nessas conversas informais, esses empresários se mostravam muito preocupados com a situação institucional no Brasil, com o risco da volta de Lula e sua quadrilha por meio de malabarismos supremos, e, em alguns momentos de maior revolta ou desabafo, um ou outro chegou a falar que uma intervenção militar seria uma alternativa menos pior.

Foto: Shutterstock
Foto: Shutterstock

Faço parte do grupo, e sempre entendi, dentro do contexto, que o ponto essencial é o desespero com o verdadeiro golpismo em curso em nosso país. Mas o “jornalista” tirou tudo do contexto, para pintar um quadro de conspiração golpista e antidemocrática por parte desses empresários. Imediatamente após a publicação, já tínhamos figuras como o senador Randolfe Rodrigues e o candidato Ciro Gomes pedindo até a prisão desses empresários!

A esquerda não brinca em serviço. E o jogo é bruto, companheiro. O intuito aqui é claro: intimidar qualquer empresário ou indivíduo que ousarem apoiar Bolsonaro. Se nem mesmo grandes nomes, alguns bilionários, em conversas privadas num clube fechado, estão protegidos desse tipo de achaque, então todos podem ter vidas destruídas se resolverem se manifestar de forma mais veemente numa conversa de botequim.

O grupo não tem qualquer estrutura ou organização hierárquica, nenhuma ação prática derivada das conversas, nada parecido com uma célula terrorista, como um MST, MTST ou os black blocs. São apenas empresários debatendo sobre política, e alguns mais ativos destilando sua revolta com o quadro atual do país, que é mesmo revoltante pelo grau de ativismo político do Poder Judiciário, em particular do STF. Conversas privadas, reforçando. Transformaram isso num bloco golpista que atenta contra a democracia, nas narrativas midiáticas.

Enquanto isso, a revista Piauí, de Moreira Salles, publicou “reportagens” atacando a Jovem Pan, tradicional rádio que virou emissora de TV neste ano e já ocupa o segundo lugar em audiência. A Jovem Pan tem sido alvo de inúmeros ataques, pois é o único grande veículo de comunicação, além da Gazeta do Povo na parte do jornalismo, que preserva um debate efetivamente plural. Isso não pode ser tolerado por quem morre de saudades dos tempos de hegemonia esquerdista na velha imprensa.

Há mais petista na Jovem Pan do que conservador em todas as demais emissoras somadas!

A denúncia é que a Jovem Pan se “vendeu” para o governo Bolsonaro. Caio Coppolla esclareceu o absurdo e engoliu a velha imprensa, porém, ao citar como exemplo a Folha de S.Paulo, parceira editorial da revista Piauí. O grupo Folha recebeu quase R$ 1 bilhão de verbas da Secom durante os governos petistas, e a grita é diretamente proporcional ao fechamento das torneiras. Já a Jovem Pan recebeu mais recursos anuais durante os anos petistas do que no governo Bolsonaro.

No mais, se a Jovem Pan fosse mesmo paga para “defender o bolsonarismo”, seria importante explicar a presença de tantos esquerdistas antibolsonaristas na emissora. Afinal, há mais petista na Jovem Pan do que conservador em todas as demais emissoras somadas! É um fenômeno parecido com o observado nos Estados Unidos, onde todas as emissoras são extensões do departamento de marketing do Partido Democrata, e se unem para demonizar a única emissora mais equilibrada, a Fox News, chamada de “republicana” mesmo tendo mais comentaristas democratas do que há de conservadores em todas as demais juntas. Quem é plural?

Mesmo esta jovem Revista Oeste já foi alvo da tentativa de assassinato de reputação. No caso, por uma “agência de checagem”, essa aberração da era moderna, uma espécie de extensão da velha imprensa com uma aura de Ministério da Verdade, ainda que tocado por estagiários idiotas. Oeste meteu processo e venceu: a agência que acusou a revista de espalhar fake news é quem tinha disseminado mentira. Oeste incomoda justamente porque dá espaço para colunistas que ousam pensar fora da cartilha esquerdista.

Há, ainda, as milícias digitais, os grupos fascistoides, como o Sleeping Giants, que são usados para pressionar empresas que se recusam a pagar pedágio ao politicamente correto, que se negam a abandonar o foco em seu negócio para transformar suas empresas em instrumentos de lacração esquerdista. São chacais e hienas dispostos a partir para o ataque ao menor sinal de comando de seus chefinhos.

O modus operandi é conhecido: os tucanopetistas, que tinham hegemonia na velha imprensa, se infiltram em grupos fechados de WhatsApp e usam seus veículos de comunicação para rotular, difamar e detonar todo conservador. O intuito é intimidar quem quer que ouse apoiar Bolsonaro em particular ou a direita em geral.  
O recado é bem claro: se você for por esse caminho independente, colocaremos todo o aparato poderoso contra você, para destruir sua vida, assassinar sua reputação. Muitos cedem, infelizmente.

O propósito da esquerda é criar uma espiral de silêncio para abafar a voz da direita. A esquerda, afinal, não sobrevive muito bem em ambiente livre e plural, onde os conservadores podem apontar para todas as suas falácias e contradições. A esquerda precisa da censura e do autoritarismo, ainda que velado. Mas tudo isso em nome da diversidade e da pluralidade, claro…

Leia também “O poeta Fachin”

Rodrigo Constantino, colunista - Revista Oeste

 

domingo, 20 de março de 2022

O surreal baile de máscaras - Revista Oeste

Augusto Nunes - Paula Leal

Recado do Brasil sensato aos governantes assustados com a pandemia agonizante: basta de covardia

Foto: Shutterstock
Foto: Shutterstock

Confrontados neste março com evidências robustas de que a pandemia agoniza, governadores e prefeitos promovidos pelo Supremo Tribunal Federal a condutores do combate à covid-19 vêm confirmando que só lhes sobram autoconfiança e insolência quando ordenam outra retirada. Durante dois anos, enquanto debitavam na conta do “presidente genocida” mortes provocadas pelo vírus chinês, esses guerreiros de araque recorreram a sucessivos recuos, disfarçados de isolamentos verticais e horizontais, quarentenas, lockdowns, pontapés na Constituição e restrições autoritárias. 
A estratégia que mistura intolerância e pusilanimidade contou com a orientação e o endosso de sumidades de botequim que fingem ser capazes de, simultaneamente, ouvir a voz da Ciência, enxergar a luz da Verdade e enfrentar a morte em defesa da Vida dos outros. Além de Jair Bolsonaro, só negacionistas sem cura se atreviam a discordar dessa tribo de iluminados.

A farsa acabou. Exemplarmente harmoniosa durante a temporada de fugas, a imensidão de generais e coronéis engajados na guerra sanitária vem espancando a partitura desde que pressentiu a chegada da hora da contraofensiva. O persistente declínio da curva de óbitos, a estabilidade do número de novas contaminações e a notável expansão da população vacinada dispensam consultas a sábios de jaleco. Em pânico, jornalistas reduzidos a porta-vozes de necrotério fizeram o diabo para anabolizar a Ômicron e transformar em inimigo medonho uma variante que, pela diminuta taxa de letalidade, apenas reafirmava o ocaso da covid-19. A imprensa terrorista segue assombrando crédulos vocacionais. Mas só vigaristas de nascença e estrábicos por opção ignoram que a pandemia está a um passo do fim. Mais alguns dias e terá virado endemia. Mais uma.

Se homens públicos valentes não fossem uma espécie em extinção, a imediata abolição de restrições com prazo de validade vencido já teria elevado extraordinariamente a taxa nacional de otimismo. O problema é que se move no palco um elenco de canastrões implorando pelo socorro da mãe. Governantes bestificados começaram a bater cabeça, dispersaram-se na encruzilhada e agora espantam o país com o show de cientificismo esquizofrênico que acaba de parir o mais surreal baile de máscaras. Evoluem na congestionada pista de dança, por exemplo, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, e o governador paulista João Doria. Empenhadas em lucrar eleitoralmente com a manipulação de um valioso fetiche da seita do Fique em Casa, a dupla se meteu numa corrida que só avalizou a obviedade negada por ambos: não existe a Ciência Exatíssima. Nenhuma afirmação científica é infalível e incontestável. Se fosse assim, um deles teria cometido — por pressa ou lentidão — um erro grosseiro. E deveria ser punido pelo crime de negacionismo.

João Doria, governador de São Paulo, ao lado de Eduardo Paes, prefeito do Rio de Janeiro -  Foto: Divulgação

Em outubro de 2021, com as bênçãos dos doutores em vírus desconhecido, Paes dispensou do uso de máscara quem circulasse pelo Rio ao ar livre. Essa decisão foi encampada por Doria só neste 8 de março. Pior: os efeitos positivos da notícia foram reduzidos pela agilidade do prefeito carioca, que anunciara na véspera a revogação da obrigatoriedade da máscara também em locais fechados. O governador tropeçou de novo na tibieza ao esperar até 17 de março para seguir o exemplo de Paes. A hesitação impediu por mais nove dias que os habitantes de São Paulo respirassem normalmente em espaços abertos ou fechados. E prolongou um ritual que merecia ser cumprido ao som da lira do delírio.

Como em outros quatro Estados cujos administradores dispensaram o uso da máscara apenas em lugares abertos, um ser humano governado por Doria só fez o que lhe deu na telha no apartamento onde reside.  
Se decidiu jantar fora, cobriu o rosto no interior do elevador. Esperou um táxi de cara limpa. Recolocou a máscara ao alojar-se no carro. Tirou-a de novo ao deslocar-se do táxi para a porta do restaurante. Tornou a cobrir a face entre a porta e a mesa. Voltou a descobri-la depois de sentado. Repôs a máscara na ida ao banheiro. 
Talvez se tenha consolado com a dura vida dos garçons. Incumbidos de atender a casta que Oeste qualificou de “a nova aristocracia da covid-19”, zanzaram o tempo todo com a respiração reprimida. Ao decretar o banimento das máscaras em espaços livres, por sinal, Doria caprichou na frase de efeito: “Temos a possibilidade de, finalmente, neste primeiro grande passo, retirar as nossas máscaras e trazer o sorriso de volta”. Num gesto que pretendia ser teatral, arrancou do rosto e enfiou num bolso a máscara negra. Mas não sorriu. Tampouco sorriram os garçons que acompanharam a cena pela TV. Mesmo quando circulam pelos jardins de um restaurante, continuam proibidos de mostrar a cara.
 
A extensão da medida a espaços fechados incorporou São Paulo ao grupo de sete Estados que já haviam universalizado a abolição da máscara. Cinco unidades da federação só aplicam a restrição em lugares fechados. Outros quatro suspenderam a exigência em locais abertos e condicionaram a liberação de espaços fechados ao alcance de um índice de vacinação fixado pelos municípios. A vanguarda do atraso, que continua exigindo o uso de máscaras até em praias e parques, agrupa dez Estados: Bahia, Pernambuco, Ceará, Sergipe, Paraíba, Piauí, Pará, Tocantins, Roraima e Amapá. Alguns pretendem reexaminar o assunto com urgência. Outros parecem esperar que a última esquadrilha de vírus chineses voe de volta para o país natal. Visto em seu conjunto, o mapa do Brasil redesenhado pela pandemia impõe uma boa pergunta: onde fica exatamente a linha divisória em que a cautela acaba e começa a covardia? Esteja onde estiver, está claro que faltam altivez e bravura no universo dos governadores e prefeitos. Desapareceram os intimoratos condutores de multidões. A coragem sumiu.

O medo não seleciona alvos por faixas etárias, categorias socioeconômicas e níveis de escolaridade. E é também altamente contagioso

Na semana passada, o alagoano Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados, adiou por tempo indeterminado a ressurreição integral das sessões presenciais. “É preciso preservar a saúde não só dos parlamentares, mas também dos servidores e dos colaboradores”, alega Lira. Em todo o Brasil, numerosas universidades e escolas públicas ou particulares tratam aulas presenciais como coisa do passado. Faz dois anos que o ensino tem ficado para depois. Nesta quinta-feira, o Supremo Tribunal Federal reiterou a preferência por sessões virtuais. 

O Distrito Federal deixou há meses de exigir o uso de máscaras em qualquer lugar de Brasília. Mas a Câmara dos Deputados não é um lugar qualquer. Muito menos o Pretório Excelso. 
Se até chefes dos Poder Judiciário e do Poder Legislativo preferem ficar em casa (de máscaras), é compreensível a presença nas ruas de multidões de brasileiros com o rosto coberto. Como o coronavírus, o medo não seleciona alvos por faixas etárias, categorias socioeconômicas e níveis de escolaridade. E é também altamente contagioso.

A eficácia da máscara sempre dividiu opiniões. Uma reportagem publicada na Edição 97 da revista Oeste lembrou que, no início da crise sanitária, a Organização Mundial da Saúde desaconselhou o uso dessa proteção por pessoas saudáveis. Em fevereiro deste ano, Leana Wen, especializada em saúde pública e analista médica da CNN norte-americana, afirmou que “o uso dessa proteção facial deve ser uma escolha individual”. Uma pesquisa recente constatou que a eficácia da máscara de pano oscila entre 2,5% e 10%.

Para o médico Roberto Zeballos, clínico geral e doutor em imunologia, o uso de máscaras ajudou a evitar infecções decorrentes de aglomerações. “Mas novos estudos mostraram que a eficácia da máscara é baixa”, pondera. “E a pandemia está claramente em queda no Brasil”. Para o médico, é provável que o elevado número de infecções provocadas pela variante Ômicron nos últimos meses tenha contribuído para que o Brasil alcançasse a imunidade de rebanho. “Todo paciente que vence a doença se imuniza”, garante Zeballos. “Quanto mais pessoas imunizadas, maiores as chances de alcançar a imunidade coletiva”. [imunidade de rebanho, condição defendida pelo presidente Bolsonaro, desde o inicio da pandemia.]

O ainda numeroso bloco dos mascarados será progressivamente despovoado pelo ritmo intenso da vacinação e pelo enfraquecimento da covid-19. Perderá inteiramente o sentido quando a OMS, que fingiu por dois meses enxergar uma endemia onde havia uma pandemia assassina, agora reluta em conferir o status de endemia a uma pandemia em estágio terminal. Corretamente, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, já avisou que o justo rebaixamento será oficializado pelo Brasil. A pedra no caminho é um Supremo Tribunal Federal transformado em partido de oposição. O presidente da República foi proibido de dar palpites em questões ligadas à covid-19. E o papel que caberia a Bolsonaro foi confiscado por superjuízes que se metem em tudo, de preferência em assuntos que desconhecem. Vírus chinês, por exemplo.

Se o STF permanecer em quarentena, será mais rápida a volta à normalidade.  

O Brasil sensato cansou-se da montanha-russa que enfileira um passaporte sanitário injustificável, indecorosas exumações da censura, surtos autoritários, CPIs cafajestes, imposições alfandegárias e outras brasileirices prepotentes. Muitos países europeus já entenderam que, se um vacinado pode infectar e ser infectado, quem rejeita a imunização não representa um risco para a humanidade. A intolerância insolente, amparada num duvidoso “rigor científico”, está na origem dos absurdos castigos impostos ao sérvio Novak Djokovic. 
O esplêndido campeão foi preso por autoridades australianas, execrado publicamente e deportado por não ter sido vacinado contra o coronavírus. Passados dois meses, a França poupou Djokovic da apresentação de comprovantes inócuos e liberou-o para a disputa do mítico torneio de Roland Garros, no fim de maio. O Brasil saíra ganhando se seguir o exemplo da França.

A pandemia vai morrendo de exaustão. Os brasileiros estão fartos de exigências sem sentido. É hora de aprender a conviver com outra doença endêmica. Chega de rendições. Basta de covardia.

Leia também “A elite desmascarada”

Augusto Nunes - Paula Leal - colunistas Revista Oeste


quarta-feira, 23 de outubro de 2019

O Supremo encalacrou-se - Elio Gaspari

Folha de S. Paulo - O Globo

Egos inflados e idiossincrasias contribuem para colapso da colegialidade do tribunal


No caso da prisão depois da segunda instância, o STF está dividido à maneira dos jogos de futebol, com um time ganhando e outro perdendo

Quem pode pagar advogado fica solto,quem não pode, rala [esta será  a JUSTIÇA BRASILEIRA - resultado da suprema INSEGURANÇA JURÍDICA, provocada pela suprema INDECISÃO do STF, se mudar o que decidiu em 2016 e soltar os condenados numa segunda instância.]

Pelo andar da carruagem o Supremo Tribunal Federal derrubará a prisão dos condenados numa segunda instância. Tradução: quem tem dinheiro para pagar advogados fica solto, quem não tem, rala. 

Uma banda do debate diz que deve ser assim porque isso é o que diz a Constituição. Não é. Se fosse, o mesmo Tribunal não teria decidido duas vezes que o condenado na segunda instância deve ficar preso

Acima da divergência entre os ministros está a perda da colegialidade dos onze escorpiões que vivem na garrafa da Corte. Quem chamou os juízes da Suprema Corte Americana de escorpiões engarrafados foi o grande Oliver Wendell Holmes, mas lá eles se cumprimentam com aperto de mão antes e depois de cada sessão. Aqui, em alguns casos, nem isso. 

O ministro Gilmar Mendes tem horror a comparações com o funcionamento da Corte Suprema, mas lá os nove ministros procuram harmonizar suas divergências. Quando um de seus juízes escreve o voto da maioria, ou a dissidência da minoria, circula seu texto entre os colegas e discute emendas ou supressões. Tudo isso é feito em sigilo, num trabalho que exige paciência e tolerância. Em raros casos, quando a Corte percebe que tomará uma decisão crucial, o presidente (cuja função é vitalícia) costura uma possível unanimidade. Às vezes consegue. 

No caso da prisão depois da segunda instância o Supremo está dividido à maneira dos jogos de futebol, com um time ganhando e outro perdendo. No balcão da lanchonete entende-se esse critério, o que não se entende é que o time derrotado em fevereiro e outubro de 2016 por 7x4 e 6x5 possa mudar o resultado num replay. Afinal, futebol é coisa séria. 

Apesar dos esforços de alguns ministros, tudo indica que se caminha para um choque de absolutos. Numa discussão de botequim ou numa reunião de condomínio surgiria uma voz moderadora propondo uma válvula. Por exemplo: o condenado na segunda instância poderia recorrer ao Superior Tribunal de Justiça, que deveria julgar o caso em até 120 dias. Esse mecanismo daria uma folga à turma que tem dinheiro para pagar advogado, mas anularia a fé exclusiva nas manobras procrastinatórias. Até agora, nada feito. 

A rejeição da válvula indica um colapso da colegialidade do tribunal. Para isso contribuíram, entre outros fatores, egos inflados, idiossincrasias e concepções. Há cortes cujos juízes têm carros e motoristas pagos pela Viúva, mas não se sabe de outra na qual seus veículos usem três chapas, uma de bronze (“sabe com quem está chegando”) outra com fundo branco (indicativa do serviço público) e a terceira, igual à dos contribuintes, sugerindo que os ilustres passageiros são pessoas comuns, ou impedindo que se saiba que não o são. 

A Operação Lava-Jato perdeu a túnica de vestal que cobria o juiz Sergio Moro e o trabalho de seus procuradores, mas sua essência persiste: ela botou na cadeia gente que praticava crimes na certeza da impunidade. Revogada a segunda instância, restabelece-se o sistema que, há dez anos, num passe de mágica, esfarelou a Operação Castelo de Areia.
À época, o STJ blindou a empreiteira Camargo Correa e o Supremo ratificou a decisão. Passou o tempo, mudaram os modos e a Camargo foi a primeira vaca sagrada a colaborar com o governo. Hoje ela trabalha com outro compasso.


 
 
 

domingo, 11 de agosto de 2019

A voz das ruas também cura supremos delírios - Blog do Augusto Nunes

Veja

Os gilmares, toffolis, lewandowskis e derivados estão confundindo a toga com a capa do Superman


Meia dúzia de bacharéis em Direito que viraram ministros do Supremo Tribunal Federal depois de escolhidos pelo presidente da República (e aprovados pelo Senado ao fim de uma sabatina com cara de chá de senhoras) imaginam que, embora os três Poderes sejam independentes, o Judiciário é mais independente que os outros. Na cabeça desses doutores em tudo especializados em nada, o Executivo e o Legislativo dependem do que dá na telha do único poder que não depende de nenhum e não obedece a ninguém.

Intercalando interpretações amalucadas de normas constitucionais, frases em Latim e citações impenetráveis de autores que leram na diagonal, os pedantes de toga fazem o diabo. A semana de trabalho tem três dias, o ano é obscenamente encurtado por recessos e feriadões, são cada vez mais frequentes as viagens internacionais (na primeira classe, ao lado da patroa e por conta dos pagadores de impostos), mas a turma encontra tempo para decidir o que é certo e o que é errado qualquer que seja o tema, principalmente se o desconhecem.

Os superjuízes liderados por Gilmar Mendes nunca negam fogo. Como lidar com homofobia, demarcação de terras indígenas, feminicídio? Eles sabem o que pode e o que não pode. Operações da Polícia Federal, atribuições do Ministério Público, desempenho de magistrados e policiais federais, pronunciamentos do chefe do Executivo, prisão em segunda instância  — perguntas sobre esses ou quaisquer outros assuntos encontrarão a resposta na ponta da língua do time que finge tudo saber o tempo todo.

Não faz tanto tempo assim que os ministros do Supremo eram escolhidos entre os melhores e mais brilhantes do mundo jurídico brasileiro. Também assolado pela Era da Mediocridade, anunciada pelo resultado das eleições de 2002, o STF foi ficando parecido com os vizinhos de praça. O estrago foi agravado pela consolidação do único critério que orientou o preenchimento de vagas na corte durante os governos de Lula e Dilma Rousseff: o escolhido deveria mostrar em seus votos que seria eternamente grato a quem o havia escolhido.  A virtual revogação das duas exigências impostas pela Constituição — um juiz do Supremo deve ter notável saber jurídico e reputação ilibada — escancarou a porta de entrada a figuras que falam demais, em linguagem muito estranha, e falam tanto que não sobra tempo para pensar. No momento, os semideuses de botequim se concentram numa irracional ofensiva destinada a emparedar os procuradores da força-tarefa da Lava Jato, começando por Deltan Dallagnol, acuar o ministro Sergio Moro, livrar da insônia os bandidos de estimação e, supremo sonho do bando, tirar Lula da cadeia.

Por ignorar que a paciência da plateia acabou no momento em que aprendeu com a Lava Jato que todos são iguais perante a lei, a tropa de choque parece seguir acreditando que ninguém pode com o Supremo — que pode tudo, até  inocentar culpados e culpar inocentes sem que nada aconteça. Dias Toffoli, por exemplo, abriu um inquérito que tudo permite e transformou Alexandre de Morais no primeiro relator-detetive da história. Gilmar Mendes qualificou de “organização criminosa” o comando da Lava Jato e concedeu um habeas corpus perpétuo ao receptador de mensagens roubadas Glenn Greenwald. Para essa gente, não há limites para o absurdo.

“Japona não é toga”, lembrou em outubro de 1964 o então presidente do Senado, Auro Moura Andrade, a chefes militares decididos a atropelar a Constituição. Com quatro palavras, Auro ensinou que não cabia às Forças Armadas usurpar funções privativas do STF. Um general no papel de juiz é tão absurdo quanto um magistrado no comando de uma divisão de infantaria. [creiam: a composição do Supremo de hoje, torna mais seguro e confiável  um general no papel de juiz, do que um juiz comandando tropas.
Inclusive por não ser exigido dos ministros do STF que sequer sejam bacharéis em Direito.]  Pois chegou a hora de  inverter a ordem dos substantivos para adaptar a frase aos tempos modernos e obstruir o avanço dos oniscientes de araque.

Antes que ousem proclamar a Ditadura do Latinório, os doutores em nada precisam aprender que toga não é japona. A lição será assimilada em poucos segundos se for berrada em manifestações que a imensidão de descontentes está devendo a si mesma. Além de uma japona, os gilmares, toffolis, lewandowskis e similares andam enxergando na toga  a capa do Superman. Como para tantos outros, a cura para esses supremos delírios também está na voz das ruas.

terça-feira, 7 de junho de 2016

Greve quase geral



“A primeira decisão, que dá continuidade à nossa participação na luta contra o golpe do vice usurpador, conclama a militância a empenhar-se para a grande mobilização nacional do dia 10 de junho. Nesse sentido, orienta os (as) petistas, sobretudo os que atuam diretamente no movimento sindical a ajudarem na preparação para uma greve geral contra o golpe, pelo fora Temer e por nenhum direito a menos”. (Rui Falcão, presidente do PT, em artigo publicado no site da sigla nesta segunda-feira, ameaçando parar o país com uma tremenda greve que só autorizaria a abertura do bar ao lado do Instituto Lula e do botequim na esquina da rua em São Bernardo onde mora o ex-presidente)

Fonte: Coluna do Augusto Nunes