Ao anular todos os processos contra Lula numa tentativa (frustrada) de proteger Moro, o ministro do STF implode a Lava-Jato e atira o país em incertezas
A decisão de Fachin, mais que surpreender, chocou por se apresentar como uma manobra jurídica para proteger a reputação de Sergio Moro. Por mais nobres que sejam os objetivos, não é o papel que cabe a um magistrado. A operação tabajara começou a se materializar no fim de semana. Desconfiado de que o pedido de suspeição entraria em pauta na terça-feira 9, o ministro disparou uma bateria de mensagens de texto para o presidente do Supremo, Luiz Fux, defendendo a necessidade de proteger o legado da Lava-Jato, mas não deu pistas do que pretendia fazer. Uma das hipóteses era agendar o julgamento de algum figurão apanhado na investigação. Não houve tempo para levar o plano à frente.
O ministro Gilmar Mendes, porém, ignorou a decisão do colega e pautou o julgamento da suspeição de Moro, que recomeçou na terça-feira, mas foi interrompido por um pedido de vista do ministro Kassio Nunes Marques, a quem caberá o voto de minerva. O placar está empatado por 2 a 2. Mendes, aliás, já estava com sua decisão pronta havia algumas semanas, mas, como ainda tinha dúvidas sobre o voto de Nunes Marques, segurou sua apresentação. A atabalhoada decisão de Fachin acabou acelerando o processo. Ou seja: a intenção de salvar Moro não surtiu efeito, colocou de todo modo o ex-juiz no banco dos réus e ainda provocou diversos efeitos paralelos. Entre eles, a implosão da Lava-Jato e o recrudescimento da polarização entre esquerda e direita no país. “Ainda que eu tenha restado vencido na maioria dos casos em que se reduziu a competência da vara, apliquei a agora orientação majoritária do colegiado”, disse Edson Fachin a VEJA.
Embora as chances de vitória sejam remotas, o procurador-geral da República, Augusto Aras, anunciou que vai recorrer ao plenário do STF para tentar reverter a decisão do ministro de anular os processos contra o ex-presidente. Por enquanto, ela está valendo apenas para Lula, mas isso, de acordo com juristas, é questão de tempo. “Réus e delatores que fecharam acordos em Curitiba e eventualmente não estão satisfeitos com os benefícios podem argumentar que seus crimes nada tiveram a ver com a Petrobras”, adverte a desembargadora aposentada Cecília Mello. O ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha, condenado a 55 anos de prisão, e o doleiro Alberto Youssef, um dos primeiros colaboradores a descrever em detalhes o esquema de corrupção que operava na estatal, já acionaram seus advogados para avaliar todas as possibilidades. Para proteger Sergio Moro, o ministro Edson Fachin reforçou a percepção de que o rigor da lei é um princípio de ocasião que não vale para todos.
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Com reportagem de Gabriel Mascarenhas
Publicado em VEJA, edição nº 2729 de 17 de março de 2021