Augusto Nunes - Silvio Navarro
A bandidagem punida pela Lava Jato quer de volta o dinheiro que entregou para escapar da cadeia
Para escaparem da cadeia, quadrilheiros toparam escancarar caixas pretas, contar tudo o que sabiam e, para espanto das vítimas da quadrilha, devolver à Petrobras ao menos parte do produto do roubo. Passados 500 dias, a Lava Jato havia recuperado R$ 870 milhões. Pedro Barusco, ex-gerente de Serviços da estatal, nem esperou por cobranças: em fevereiro de 2015, avisou que entregaria aos integrantes da Lava Jato pouco menos de US$ 100 milhões.
Em 28 de janeiro de 2015, a presidente da Petrobras, Graça Foster, informou que o saque somara R$ 88,6 bilhões. Tal façanha resultou da mobilização de um elenco de filme épico italiano. O Petrolão juntou gatunos em ação no comando da estatal, empreiteiros de grosso calibre, ministros de Estado, senadores, deputados e donos de distintos partidos, doleiros lavadores de dinheiro, empresários com livre acesso ao Planalto, vigaristas tarimbados (como José Dirceu e Antonio Palocci), sumidades ainda pouco valorizadas (como Sérgio Cabral), um presidente da Câmara, o marqueteiro do rei, três tesoureiros do PT e, fora o resto, um ex-presidente da República. Mas havia topado com adversários bons de briga, bem equipados e extraordinariamente eficazes, que já no início do embate venceram a disputa pelo apoio da torcida brasileira.
Entre o início de 2014 e o fim de 2018, a grande maioria dos brasileiros festejou a ampliação diária do acervo de provas, evidências e indícios de que, se é verdade que chegou com as primeiras caravelas, a corrupção havia alcançado proporções pandêmicas com a Era PT. Para os poderosos patifes, 6 da manhã tornou-se a mais cruel das horas: era nesse momento que soavam as pressagas batidas na porta. Em março de 2016, conversas grampeadas atestaram a onda de angústia que invadira o Congresso. Era preciso estancar a sangria, implorou o senador Romero Jucá aos parceiros Renan Calheiros e José Sarney. A publicação da súplica custou a Jucá a antipatia nacional, a suspensão de viagens em aviões de carreira e a derrota na tentativa de reeleger-se.
Em contrapartida, foram promovidos a heróis nacionais os participantes da ofensiva que, por ter desmontado o maior esquema corrupto de todos os tempos, tornou-se a mais eficiente operação anticorrupção da história. Nos desfiles de 7 de Setembro, a passagem das viaturas da Polícia Federal foi aclamada pela multidão.
“O Brasil se tornou um país de corruptores sem corruptos”
Desde que assumiu o posto vago pela morte de Teori Zavascki, Fachin vinha julgando com a placidez de monge tibetano os recursos fabricados pelos advogados de Lula. Só ao deliberar sobre a derradeira manobra o malabarista togado decidiu que o réu deveria ser julgado em Brasília, não em Curitiba.
Graças ao roteirista espertalhão, neste outono de 2022 Lula disputa a Presidência caprichando na pose de inocente, aciona judicialmente o procurador federal Deltan Dallagnol por “danos morais”, exige a condenação de Moro por ter perseguido a alma viva mais pura da nação e afirma que o Petrolão nunca existiu.
“É simplesmente imoral pretender a devolução do dinheiro saqueado por ímprobos administradores”, ensina o jurista Ives Gandra Martins, que também contesta as críticas à operação que enquadrou os saqueadores da Petrobras. “Não houve qualquer cerceamento de defesa e as decisões foram baseadas em provas materiais de corrupção, concussão, desvio de verbas públicas, favores inadmissíveis e retorno da parte do assalto às finanças estatais”, resume Gandra. “Não creio que tenha sido esta a intenção da Corte, mas o STF desmontou a Operação Lava Jato. O Brasil se tornou um país de corruptores sem corruptos.”
O jurista Adilson Dallari endossa os pareceres de Gandra. “Tentou-se mostrar que havia um conluio entre o Ministério Público e o juiz. Juízes, promotores e advogados conversam, sim, fora dos autos, mas isso não compromete o curso do processo, nem anula a decisão. Basta ler o texto das sentenças, muito bem elaboradas e confirmadas nas instâncias superiores.” Dallari vê as coisas como as coisas são. “Não há ex-condenados, mas descondenados. O STF buscou e encontrou um subterfúgio para livrar o Lula. Outros réus pegaram carona na ação entre amigos que beneficiou o ex-presidente.” Para o jurista, denúncias e ações contra procuradores e juízes têm vida curta: “Depois das eleições serão todas arquivadas, pois são totalmente despropositadas e infundadas”.
Na História Nacional da Infâmia, a sinopse do mais torpe faroeste à brasileira caberá em uma única frase: “Quando as investigações se aproximaram perigosamente de alguns ministros do Supremo e seus amigos, os ameaçados resolveram estancar a sangria”.
Com reportagem de Artur Piva e Cristyan Costa
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Augusto Nunes - Silvio Navarro, colunistas - Revista Oeste