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domingo, 1 de novembro de 2020

A rede de intrigas dentro do Palácio do Planalto

Fofocas, dossiês e supostos grampos: a rede de intrigas no Palácio do Planalto

Disputa entre dois grupos por mais espaço no governo envolve ministros em fofocas, dossiês-fantasmas e até denúncias de supostos grampos contra Bolsonaro

Em outubro de 2018, o general Luiz Eduardo Ramos, então comandante militar do Sudeste, acompanhava ansioso a apuração dos votos da eleição presidencial. Confirmada a vitória de Jair Bolsonaro, ele se ajoelhou, fez uma oração e chorou copiosamente ao lado da esposa. Ele e o presidente eram amigos de longa data. Oito meses depois, o general foi convidado para assumir a Secretaria de Governo, um posto cuja principal e mais sensível atribuição é cuidar da articulação política. Na época, o presidente dava de ombros para o Congresso, relativizava a importância de acordos, desautorizava negociações e alimentava um ambiente conturbado que, em certo momento, chegou a ameaçar a continuidade de seu mandato. Ex-­asses­sor parlamentar do Exército, Ramos, com seu jeito afável, aceitou a missão de construir pontes com o Parlamento. Pragmático, convidou os partidos de centro para participarem do governo. Deu a eles cargos e verbas em troca de apoio político — uma parceria, em princípio, legítima, bem-sucedida, mas que, agora, está na raiz de uma barulhenta disputa de poder entre dois grupos.

No dia 21 de outubro passado, um importante assessor do presidente da República confidenciou a um amigo que Luiz Ramos estava com os dias contados no governo. O general, segundo esse assessor, guardava arquivos de áudios de conversas reservadas entre ele e Bolsonaro. O ministro teria feito isso com o intuito de registrar que suas ações, principalmente as que envolviam indicações políticas para cargos públicos, eram todas de conhecimento do presidente. Os arquivos em seu poder provariam isso.

Visto por outro ângulo, as gravações, se existissem mesmo, também trariam à tona um monumental escândalo e, sem sombra de dúvida, fulminariam a carreira do general. O fato é que esse enredo, narrado precisamente dessa maneira, chegou ao conhecimento da chamada ala ideológica do governo, grupo radical que disputa espaços nos ministérios, se opõe a acordos políticos com determinados partidos, prega o fechamento do Supremo Tribunal Federal e considera os militares como adversários.

Jair Bolsonaro já deu mostras de como reage a supostas conspiratas em seu governo. O antecessor de Ramos na Secretaria de Governo, general Santos Cruz, foi demitido sumariamente depois de ter sido acusado de criticar o presidente e um de seus filhos. A prova do crime era a reprodução de uma tela de telefone em que aparecia uma mensagem de Whats­App na qual ele tecia comentários desairosos sobre os dois. Santos Cruz negou, em vão, ser o autor do texto. Tempos depois, a Polícia Federal descobriu que a mensagem era uma montagem grosseira. O ex-­ministro não tem dúvida de que foi vítima de uma armação patrocinada pela ala radical do governo. A acusação contra Ramos segue o mesmo roteiro. O grupo chegou a discutir uma estratégia para levar a denúncia ao presidente. O problema é que, desta vez, não apareceu uma mísera evidência de que o grampo de fato existiu.

Em 22 de outubro, um dia depois de circular a informação sobre as gravações, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, um dos membros da ala ideológica, não gostou de uma notícia publicada pelo jornal O Globo segundo a qual ele estaria “esticando a corda” com a ala militar supostamente depois de ter recebido uma espécie de salvo-conduto do presidente da República. O ministro viu nela uma tentativa de intrigá-lo com Bolsonaro, responsabilizou Ramos pela informação e o chamou de “Maria Fofoca” em mensagem publicada numa rede social. A indelicadeza provocou uma daquelas crises que só servem para desviar a atenção das questões que importam e provocar desgastes ao próprio governo. Salles ganhou logo o apoio nas redes sociais do filósofo Olavo de Carvalho, guru dos bolsonaristas, e de Eduardo Bolsonaro, filho do presidente. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, disse que Salles “resolveu destruir o próprio governo”. Ramos foi aconselhado a não reagir.

No fim de semana, por ordem do presidente, combinou-se um armistício. O ministro do Meio Ambiente ligou para Luiz Ramos, pediu desculpas pela grosseria e disse que se deixou levar por muitas coisas que ouviu nos últimos dias. Depois, publicou no Twitter uma retratação da briga. O chefe da Secretaria de Governo postou uma mensagem dizendo que uma “boa conversa apazigua as diferenças”. Mais tarde, divulgou uma foto dele lado do presidente no Palácio da Alvorada, antes de um passeio de moto. Nos bastidores, porém, as intrigas continuaram. Na noite da terça-feira 27, foi a vez de um militar procurar Ramos para avisá-lo de que “havia gente do governo” fazendo circular a informação de que um assessor do general estaria preparando um dossiê com denúncias graves contra ele. Intrigado com toda essa situação, o ministro levou o caso ao presidente da República, que manteve o tom apaziguador e disse que confia no trabalho do seu amigo de longa data. O tal dossiê também não apareceu.

Os termos usados por Salles para se dirigir a Ramos deixaram a ala militar bastante irritada. Um dos mais indignados é o vice-presidente, general Hamilton Mourão, que disputa com o ministro do Meio Ambiente o protagonismo da política ambiental. A Amazônia está sob o decreto da Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e, portanto, aos cuidados do Ministério da Defesa, que disponibiliza uma tropa de mais de 3 000 soldados para conter a devastação. Enquanto isso, dizem os militares, Salles dedica-se a negar os problemas, a digladiar-se com as ONGs e até a comprar briga com celebridades, como aconteceu com o ator Leonardo DiCaprio. Outro personagem que demonstrou insatisfação com a postura de Salles foi o general Braga Netto, ministro-­chefe da Casa Civil, que assumiu o cargo com a missão de coordenar as ações e os principais programas do governo. A ala radical viu nisso uma perda de espaço e de poder. Em julho, a coluna Radar, de VEJA, revelou que a filha do general foi indicada para ocupar um cargo na Agência Nacional de Saúde Suplementar, com salário de 13 000 reais. A nomeação acabou cancelada. O general atribuiu o vazamento e a amplitude que a história ganhou à ação do grupo ideológico. Braga Netto também foi convidado pelo presidente para o passeio dominical de moto, o que foi visto como um sinal de prestígio da ala militar.

Desde o início do governo, Carlos Bolsonaro, o filho Zero Dois, acirra esse embate entre os dois grupos. Sem cargo ou delegação oficial, o vereador do Rio de Janeiro participa de reuniões de trabalho no Planalto, dá palpites e consegue até interferir em projetos. Uma dessas reuniões ocorreu durante as discussões sobre os decretos que flexibilizavam a posse e o porte de armas no país. O Exército, responsável pela fiscalização dos armamentos, defendia a criação de uma norma para rastrear armas e munições. Carlos, que participava do encontro, se pôs veementemente contra a medida, mas os militares não cederam. A contragosto do filho, a portaria foi editada, mas valeu apenas por um mês. 

(.........)

Em  VEJA, MATÉRIA na ÍNTEGRA

Publicado em VEJA, edição nº 2711,  de 4 de novembro de 2020


domingo, 5 de julho de 2020

Nem heróis nem vilões - Eliane Cantanhêde

O Estado de S.Paulo

Na demolição da Lava Jato, o PT ajuda a PGR e a PGR reforça a vitimização de Lula

O PT e os lulistas em geral esfregam as mãos e comemoram os ataques contra a Lava Jato iniciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR), mas deveriam parar, pensar e lembrar da máxima do ex-deputado José Genoino, um dos petistas mais lúcidos, depois abatido, talvez exageradamente, pelo mensalão: “Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa”.

Uma coisa é a PGR e ícones da área jurídica detectarem “excessos” na Lava Jato e ameaçarem até punir os líderes da força-tarefa, o que reforça o discurso de vitimização do ex-presidente Lula. Outra coisa é isso favorecer objetivamente Lula
Muda algo na Justiça e no STF? 
A PGR, com um escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro fora da lista tríplice, tem alguma simpatia pelo petista? 
[Nada muda; 
As notícias de críticas à Lava-Jato se referem a comportamentos ocorrido bem antes da atual direção superior da PGR sequer pensar em assumir.
Lua acabou politicamente - além das duas sentenças,  com penas privativas de liberdade, confirmadas em segunda instância, o petista foi condenado pelo povo a  pena máxima para um político: ESQUECIMENTO TOTAL E ABSOLUTO.
Digam ou pensem o que quiserem o ex-juiz Sérgio Moro e a Lava-Jato liquidaram, politicamente com o multicondenado petista - ao qual desejamos vida longa e saúde para que cumpra, puxando cadeia, as penas pelos crimes que cometeu.]

No limite, os que atacam a Lava Jato na PGR até admitem que houve “algum excesso” no caso do triplex do Guarujá, pelo qual Lula foi condenado em primeira e segunda instância e passou 580 dias preso. Mas, automaticamente, defendem que ele deve ser preso, sim, é pelo sítio de Atibaia, recheado de provas robustas.

Logo, a adesão do PT à demolição da Lava Jato pela PGR é para insistir em Lula vítima, mas principalmente é contra o ex-juiz e ex-ministro Sérgio Moro e a força-tarefa. Uma vingança, com forte efeito colateral: uma aliança entre opostos. Ao demonizarem a Lava Jato, quanto o PT ajuda o bolsonarismo na PGR e quanto a PGR bolsonarista reforça a vitimização de Lula?

Ao dar o primeiro tiro em Curitiba, a PGR atraiu a artilharia do PT, OAB, TCU, da Corregedoria do MP e de condenados ou processados (do Centrão, MDB e PSDB?) que pretendem transformar os “heróis” da Lava Jato em “vilões”. Eles, porém, não são heróis, muito menos vilões e, como Moro alertou em Live do Estadão, em 3/7, a Lava Jato foi um benigno “divisor de águas” contra a eterna impunidade. “Não entendo, sinceramente, aonde quem ataca a Lava Jato quer chegar”, provocou.

Há versões opostas para o marco zero da guerra, a ida da procuradora Lindôra Araújo a Curitiba. Considerada a maior bolsonarista da PGR, ela reclamou que foi maltratada ao pedir os arquivos das operações e levar um técnico para uma varredura nos equipamentos. Concluiu que estavam “com medo”. Já o pessoal de Curitiba diz que Lindôra chegou “com tom intimidatório, de interrogatório”, mas eles se dispuseram a liberar arquivos e só ressalvaram que, no caso de dados sigilosos, o acesso depende de procedimentos e justificativas formais, para “não gerar nulidades”. A batalha virou guerra.

A PGR acusa os procuradores de ter gravadores/interceptadores usados para “grampos”. Eles negam com as notas fiscais. Também diz que os procuradores dissimulavam investigações contra políticos com foro privilegiado, registrando só partes dos seus nomes. E eles negam dizendo que esses nomes surgiram inadvertidamente, em investigações que eram contra terceiros. Tudo isso está na Corregedoria, onde Lindôra tem portas abertas.

Na versão dos procuradores, ela chegou em pé de guerra e eles tentaram amenizar o clima e cooperar. E justificam: não dá para confrontar a PGR, é uma guerra perdida. Mas quem perde a guerra? A corrupção e o crime organizado? Ou quem combate a corrupção e o crime organizado?

Não é má ideia atualizar o modelo, corrigir excessos, integrar a PGR nas operações, compartilhar as informações e evitar as críticas recorrentes de que “os fins não justificam os meios”. Mas isso deveria surgir de discussões sérias e da busca de consensos. 
Aparentemente, a intenção não é essa, é demolir a Lava Jato e demonizar seus líderes. Quem entra nessa? 
O PT? 
O PSDB com o senador José Serra (SP) na rede? É melhor definir bem o inimigo antes de entrar em guerra alheia.

Eliane Cantanhêde, colunista - O Estado de S. Paulo


domingo, 28 de julho de 2019

A questão do conteúdo dos grampos persiste - Elio Gaspari



O Globo - Folha de S. Paulo

A negligência com o conteúdo dos grampos 

A ideia de Moro de destruir as mensagens era primitiva e cheirou mal

Os procuradores blindaram-se na recusa a comentar o que apareceu. Muitos deles, como Sergio Moro, dizem que já apagaram os arquivos. Se o serviço da PF foi de primeira, essa blindagem é de quinta

A Polícia Federal fez um serviço de primeira localizando e prendendo a quadrilha que invadiu os celulares de centenas de autoridades, inclusive do presidente da República, do ministro Sergio Moro e de procuradores da Lava-Jato. Um deles tinha antecedentes criminais e confessou ter sido o remetente dos grampos para o site The Intercept Brasil. Como isso foi feito e se era gratuito, como ele diz, só a investigação poderá esclarecer. Resta saber se Glenn Greenwald e Manuela D’Ávila conheciam a extensão do crime de sua fonte. Essa é uma perna da questão. 
A outra perna está no conteúdo das mensagens já divulgadas e ela continua no mesmo lugar. Os procuradores blindaram-se na recusa a comentar o que apareceu nos grampos. Muitos deles, como Sergio Moro, dizem que já apagaram os arquivos. [saber mais.]Se o serviço da PF foi de primeira, essa blindagem é de quinta. A ideia de Moro de destruir as mensagens era primitiva e cheirou mal. Na forma, o crime cometido pelo invasores dos celulares foi peculiar.Eles atacaram dados de centenas de pessoas e seus antecedentes afastam a ideia de que houvesse interesse público na operação. A questão do conteúdo é outra.

Não passa pela cabeça de ninguém querer apagar da memória dos americanos as revelações contidas nos famosos “Papéis do Pentágono” que expuseram documentos relacionados com a Guerra do Vietnã. Eles foram furtados por um consultor do Departamento de Defesa. Indo-se mais longe, também, não passa pela cabeça dos americanos passar a esponja em cima dos documentos furtados por oito ativistas católicos que invadiram um escritório do FBI na Pensilvânia numa noite de março de 1971. Eles levaram perto de mil documentos. No meio estavam as provas de que o FBI espionava militantes pacifistas, artistas e negros, difamava pessoas e manipulava jornalistas.

Cópias de documentos foram mandados para o “New York Times”, o “Los Angeles Times” e o “Washington Post”. O governo tentou impedir a publicação e divulgou uma nota advertindo que eles comprometiam a segurança nacional. Ben Bradlee, o editor do “Washington Post”, e Katharine Graham, sua proprietária, decidiram publicar parte do material. Aberta a comporta, o conteúdo dos documentos mudou para melhor a história do FBI. O FBI pôs 200 agentes atrás dos ladrões e a investigação somou 33 mil páginas, para nada. O mistério só foi desvendado 40 anos depois, quando a repórter Betty Medsger, que recebeu a papelada em 1971, identificou e entrevistou sete dos oito invasores. Dois deles viviam longe da política e um tornara-se sincero admirador de Ronald Reagan.

Armstrong pisou na lua e errou de hospital
Neil Armstrong levou oito dias para ir à Lua e voltar. Anos depois, fez uma cirurgia do coração e 19 dias depois estava morto. No voo, deu tudo certo. No hospital, as coisas deram errado, mas a verdade ficou escondida por sete anos, até que o “New York Times” a revelou. O chanceler Ernesto Araújo acha que os diplomatas não devem ler esse jornal, mas para o bem de sua saúde seria bom que o fizesse.

Em 2012, aos 82 anos, Armstrong estava com um desconforto gástrico, foi ao hospital Merciful Faith, de sua cidade, e fez um teste de esforço. Mandaram-no para uma angiografia e acabou com quatro pontes no coração. Algo como cinco dias depois puseram-lhe um marca-passo temporário e, passadas algumas horas, uma enfermeira tirou-lhe os fios. Teve um sangramento e 27 minutos depois levaram-no para o centro de cateterismo. Melhorou, mas voltou a sangrar, com queda de pressão e falha dos rins. Em 20 minutos estava no centro cirúrgico. Daí em diante não se sabe o que aconteceu, mas ele ficou 97 minutos com perda de oxigênio no cérebro. Estava entubado há uns cinco dias quando retiraram o aparelho. Armstrong não conseguia respirar e voltaram a entubá-lo. Dez dias depois estava morto.


Desde 2014 o hospital sabia que médicos independentes haviam estudado o prontuário e observaram que ele poderia ser operado mais tarde, os fios do marca-passo não deveriam ter sido retirados por uma enfermeira sem supervisão e, acima de de tudo, deveria ter ido logo para o centro cirúrgico e não para o centro de cateterismo. Finalmente, não deveriam tê-lo extubado tão cedo. Existem testes rotineiros capazes de medir a resistência de um paciente à extubação. O homem que simbolizou o avanço da tecnologia, morreu por causa de barbeiragens. A pior, foi a sua ida para o centro de cateterismo.

Havia mais: durante dois anos o hospital se fez de bobo, até que a mulher de um dos filhos de Armstrong, advogada, foi-lhe na jugular. Ou pagavam sete milhões de dólares ou seriam denunciados. Pagaram seis milhões, com uma cláusula de segredo que durou cinco anos.

Nisso tudo, houve um cavalheiro, o professor James Hansen, autor da biografia autorizada de Armstrong (“O Primeiro Homem”), publicada nos Estados Unidos em 2005. Nesse tipo de livro o autor aceita omitir fatos a pedido do biografado ou de sua família. Ele sabia de tudo, mas limitou-se a escrever uma frase críptica: “Fora do pequeno círculo de sua família, dos amigos e da equipe médica que cuidou dele, talvez nunca se venha a saber exatamente o que aconteceu com Neil no hospital ao longo das duas semanas que culminaram com sua morte.”
Na semana passada Hansen saudou a revelação do “Times”, para que o que aconteceu a Armstrong não volte a acontecer.

(...)

Conselho precioso
Quando estava aberta a janela para repatriação de depósitos que estavam no exterior, um magano procurou um advogado para se aconselhar.
— Quanto o senhor tem no Brasil?
— Dez milhões de reais, disse o magano.
— E na Suíça?
— Cem milhões de dólares.
Então embarque para a Suíça e fique por lá.
Ele embarcou. Foi o conselho mais curto e valioso saído de uma banca de advocacia.



Elio Gaspari, jornalista - Folha de S. Paulo - O Globo



sexta-feira, 26 de julho de 2019

República de hackeados - O Estado de S. Paulo

Eliane Cantanhêde

Vale tudo: com Brasília em polvorosa, vem aí uma guerra de acusações e versões

É uma grosseria ultrapassada tentar ainda hoje atingir o Brasil com o carimbo de “Republiqueta de Bananas”, mas parece bem atual considerar o País uma “República de Hackeados”. Nem o presidente da República foi respeitado, imagine-se o resto. E, assim, Brasília está em verdadeira polvorosa.  A referência mais direta a algo parecido foi quando se descobriu que a NSA, uma agência norte-americana, tinha a audácia de grampear a então presidente do Brasil, Dilma Rousseff, e os telefones da principal empresa nacional, a Petrobrás.

Naquela época, a motivação parecia econômica, comercial, diplomática. Hoje, os “grampos” evoluíram para “hackeamentos” e a invasão de celulares até do presidente Jair Bolsonaro tem um outro viés. A motivação pode ser pura ganância, mas o uso não tem nada a ver com negócios. Logo, pode ter sido político. Ou não. É como a gente diz, a cada surpresa, a cada espanto: a realidade supera a ficção. Estamos vivendo numa sessão ininterrupta de cinema, intercalando filmes policiais, dramas e comédias pastelão, enquanto milhões de desempregados estão na rua da amargura e há uma guerrinha ideológica insana, quase infantil, entre uma esquerda acuada, deslocada da realidade, e uma direita simplória, mas ousada, cheia de si.

Quando hackers têm a audácia de violar os celulares e as conversas do presidente da República, dos presidentes da Câmara e do Senado, da procuradora-geral da República, de ministros do Supremo e do STJ, dos ministros da Justiça e da Fazenda, da líder do governo no Congresso... A gente começa a pensar que tudo é possível. No início das investigações, a PF tinha certeza de que o alvo era a força-tarefa da Lava Jato. Como se vê, vai muito além.  A biografia dos quatro criminosos presos não é animadora. Não se trata de gênios da informática que atuam no ambiente internacional, nem de uma quadrilha sofisticada a serviço de governos ou grandes corporações. Ao contrário, os chefes de Poderes, as instituições, talvez as posições estratégicas e até questões sigilosas de Estado, podem, em tese, ter ficado à mercê de uma gangue cibernética de fundo de quintal. Vulnerabilidade inadmissível.

Walter Delgatti, o “Vermelho”, que parece ser o chefe e mentor das operações criminosas, é um bandidinho com ficha policial manjada: roubo, estelionato, falsidade de documentos. [fica evidente pelo perfil. do 'vermelho' que jamais ele iria doar o produto da invasão aos celulares para o 'verdevaldo'; certamente vendeu.] Os demais movimentam volumes de dinheiro incompatíveis com suas rendas oficiais. Todos são uns simplórios, mas capazes de atacar o centro do poder federal e deixar muitas dúvidas.

Que uso Delgatti e seus comparsas poderiam fazer desse material, que era colhido e em seguida publicado em parte? Nem econômico, nem comercial, nem diplomático. O único objetivo, portanto, era vender o material todo a quem interessar pudesse. Quem?  É exatamente nesse ponto que se misturam e se confundem perigosamente as versões, inclusive tentando aproveitar a confusão e o medo para adicionar o ingrediente político-partidário e jogar o PT no meio da fogueira. Cuidado com isso! É cedo para conclusões.[vocês lembram dos aloprados? classificação dada pelo presidiário petista de Curitiba, quando imbecis petistas, sob a batuta de um dos segurança do ladrão Lula da Silva, tentaram realizar uma operação de compra de votos às vésperas das eleições e foram flagrados.


Ser aloprado e possuidor de toda a incompetência dos que merecem tal denominação é inerente à condição de petista.]

É fato que os quatro presos são peixes muito miúdos para serem os únicos ou mesmo os maiores responsáveis por um ataque com esse grau de gravidade, atingindo os três Poderes. Mas, por enquanto, não dá para concluir se agiram por conta própria para depois vender ou repassar para interessados, ou se, muito diferentemente, receberam uma encomenda de grupos dispostos a botar fogo no circo, implodir as instituições, gerar uma crise. Meus caros e caras, Brasília está de pernas para o ar e, até a conclusão das investigações, preparem-se para um festival de versões e acusações mútuas. Estamos em plena República dos hackeados. Vale tudo.


Eliane Cantanhêde - O Estado de S. Paulo
 

quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Os riscos em torno da decisão do STF sobre escutas

A pauta do Supremo, na volta do recesso, inclui recurso sobre a duração de grampos cujo veredicto pode permitir o bloqueio de operações como a Lava-Jato

Por contingências da evolução da vida pública brasileira, o Supremo Tribunal tem sido levado a tomar decisões na fronteira do universo da política. Há quem chame isso de “judicialização”, de forma pejorativa, embora registre-se que a Corte não age por conta própria, apenas quando é acionada. É o que tem acontecido, sem que isso impeça a politização de veredictos. Nada a fazer.

Como também houve uma “criminalização” da política, mesmo quando o Judiciário trata de temas técnicos na área criminal pode, mesmo que não queira e nem seja sua função, afetar interesses de partidos e políticos.  O ano do Judiciário terminou agitado, devido à liminar concedida pelo ministro Marco Aurélio Mello afastando do cargo o presidente do Senado, Renan Calheiros, por não ser possível réu estar na linha de substituição do presidente da República. O clima ficou ainda mais tenso com o desrespeito da decisão pelo político alagoano, em parte apoiado pelo Pleno da Corte — Renan ficou fora da linha sucessória, mas se manteve na principal cadeira da Mesa do Senado. Tempos estranhos.

A volta do recesso, em fevereiro, deve também ser acompanhada por outro tema pesado na agenda do STF: o julgamento de um processo, nas mãos do ministro Gilmar Mendes, que decidirá, com repercussão geral — o veredicto terá de ser seguido por todos os tribunais —, se escutas podem ser realizadas por mais de 30 dias. Há enorme controvérsia sobre o assunto, com decisões favoráveis e contrárias no Judiciário. Está mesmo na hora de uma definição. Mas as implicações de uma posição final favorável ao prazo fixo, burocrático, de 30 dias pulverizarão incontáveis operações de combate à corrupção, a começar pela Lava-Jato.

O próprio Marco Aurélio, atendendo a pedido de réu, suspendeu julgamento que seria realizado em novembro, na segunda instância da Justiça federal fluminense, de um grupo de conhecidos bicheiros do estado, atuantes no ramo mafioso dos caça-níqueis, à espera do que decidirá Gilmar Mendes sobre a duração de grampos.


A origem desse processo, cuja relatoria está com Gilmar Mendes, é uma operação de investigação de crimes de colarinho branco cometidos no grupo empresarial Sundown, em que atuaram, entre outros, o promotor Deltan Dallagnol e o juiz Sérgio Moro. Irônica coincidência. A operação terminou suspensa pela Justiça. Há interpretações conflitantes no Conselho Nacional de Justiça, no Superior Tribunal de Justiça e no Supremo. No centro deste emaranhado estão a Lei de Interceptação Telefônica (9.296/96) e a Lei do Crime Organizado.

O bom senso aconselha que sejam realizados tantos grampos quanto necessários para o combate vitorioso ao crime, todos devidamente autorizados pelo juiz. Até mesmo em nome da defesa do respeito da sociedade ao Poder Judiciário.

Fonte: Editorial - O Globo
 
 

domingo, 17 de abril de 2016

As denúncias que levarão Dilma ao abismo

Conheça o conteúdo das denúncias que podem custar o mandato de Dilma


A acusação formal contra a presidente Dilma se restringe às pedaladas fiscais e a abertura de créditos neste ano. Os escândalos de corrupção e delações não fazem parte da denúncia

Manobras contábeis feitas no orçamento são a dor de cabeça do governo e que, hoje, motivam o processo de Denúncia por Crime de Responsabilidade (DCR) contra Dilma Rousseff, com poder de cassar seu mandato. Apesar das inúmeras denúncias de corrupção contra o governo e o Partido dos Trabalhadores, nenhuma delas faz parte do que, ao menos em tese, deverá ser analisado pelos 513 deputados para dizer se deve ou não continuar o processo de impeachment.

A acusação foi apresentada no ano passado pelos juristas Hélio Bicudo, fundador do PT; Miguel Reale e Janaína Paschoal. Eles listam acusações mais genéricas de corrupção e manobras contábeis de 2014 e 2015. No entanto, em 2 de dezembro, o presidente da Câmara aceitou apenas a parte da denúncia que trata das chamadas “pedaladas fiscais” e abertura de créditos ilegais em 2015, pois se referem ao atual mandato.

À época, grande parte das suspeitas de corrupção não existia, a exemplo da delação premiada do ex-líder do governo no Senado Delcídio Amaral (ex-PT-MS). E uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) ordenou que os parlamentares considerassem apenas as pedaladas fiscais e a abertura de créditos suplementares de 2015.

De acordo com o trio de juristas, Dilma cometeu crime de responsabilidade, previsto na Lei nº 1.079 de 1950, e feriu a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Constituição. As chamadas pedaladas fiscais são ações que, na prática, significaram tomada de empréstimos pelo governo em bancos públicos. Em 2015, isso envolveu o Banco do Brasil e produtores rurais. A instituição opera um programa de crédito rural que contém uma espécie de subsídio bancado pelo Tesouro para reduzir as taxas de juros. Com esse dinheiro, o percentual de juros é “equalizado”, para níveis considerados mais competitivos para os agricultores.

Numa situação normal, o governo passa o dinheiro para o BB, que empresta o dinheiro mais barato para os produtores. Porém, devido à crise financeira e à falta de caixa, o governo deixou de repassar o dinheiro para o banco, que, mesmo assim, fez os pagamentos aos produtores. Na prática, isso significou uma operação de crédito, de acordo com o Reale, Bicudo e Janaína Paschoal. A dívida do governo com o BB somava R$ 12,7 bilhões em março de 2015 e só foi paga após a divulgação do caso. Para os juristas, ao fazer isso, Dilma cometeu crime de responsabilidade, por tomar empréstimo sem autorização e fora das permissões legais.

A outra acusação se refere aos créditos suplementares. Em 27 de julho do ano passado, Dilma assinou quatro decretos suplementares sem autorização do Congresso Nacional. Em 20 de agosto, baixou mais dois. O objetivo dos créditos eram garantir o cumprimento da meta de superavit primário, a economia que o governo faz ao fim do ano para pagar juros da dívida. Os juristas dizem que a presidente sabia que a meta não poderia ser cumprida e, por isso, abriu créditos incompatíveis e com fontes de receita irreais.

Os decretos resultaram em obter R$ 95,9 bilhões no orçamento, embora R$ 93,4 bilhões viriam de anulação de outros gastos já previstos. Seriam obtidos ainda R$ 1,6 bilhão a partir de superavit e mais R$ 863 milhões com excesso de arrecadação. Para o trio de juristas, essa medida também feriu a lei orçamentária e é crime de responsabilidade, além de atentar contra a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Constituição.

Acusações formais:

Pedaladas fiscais
» O governo fez operações que, na prática, significaram empréstimos tomados no Banco do Brasil para pagar uma espécie de subsídio em juros para produtores rurais e uma taxa de safra agrícola. Numa situação normal, o governo passa o dinheiro para o BB, que repassa isso aos beneficiários dos dois programas. Porém, o governo deixou de repassar o dinheiro para o banco, que, mesmo assim, fez os pagamentos do subsídio e da taxa de safra. Na prática, isso significou uma operação de crédito, na avaliação do trio de juristas Miguel Reale, Hélio Bicudo e Janaína Paschoal. A dívida no BB somava R$ 12,7 bilhões em março de 2015 e só foi paga após a divulgação do caso. Para os juristas, ao fazer isso, Dilma cometeu crime de responsabilidade, por tomar empréstimo sem autorização e fora das permissões legais.

Créditos suplementares
» Em 27 de julho e em 20 de agosto de 2015, Dilma assinou seis decretos suplementares sem autorização do Congresso Nacional. Para a acusação, o motivo seria porque a presidente já sabia que as metas para só gastar aquilo que se arrecada não poderiam ser cumpridas — o chamado superavit primário. Os decretos resultaram em obter R$ 95,9 bilhões, embora R$ 93,4 bilhões viriam de anulação de outros gastos. Seriam obtidos R$ 1,6 bilhão a partir de superavit e mais R$ 863 milhões com excesso de arrecadação. Mas, segundo a denúncia, as fontes de financiamento eram “incompatíveis”. Para o trio de juristas, ferir a lei orçamentária é crime de responsabilidade e ainda atenta contra a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e a Constituição.

Acusações que não estão em discussão, após decisão do STF

Pedaladas e créditos de 2014
» A abertura de créditos entre novembro e dezembro de 2014, sem autorização do Congresso e incompatíveis com a meta de superavit primário, ficaram de fora porque esses fatos aconteceram no outro mandato de Dilma. Pela mesma razão, foram excluídas as pedaladas ocorridas em 2014, que envolvem a Caixa Econômica Federal, o BNDES e o Fundo de Garantia, para quitar o Bolsa Família, o seguro-desemprego, o abono salarial, o Minha Casa, Minha Vida e o Programa de Sustentação do Investimento (PSI).

Delação de Delcídio
» O senador e ex-líder do governo Dilma Delcídio Amaral (ex-PT-MS) disse que a presidenta se reuniu com ele em julho de 2015 no Palácio da Alvorada e, enquanto caminhavam pelo jardim, pediu que o congressista questionasse um candidato a uma vaga no STJ se ele estava ciente de seu “compromisso”. O tal compromisso do hoje ministro Maurício Navarro seria soltar empreiteiros presos na Lava-Jato. Escolhido, Navarro tentou soltar dois executivos, mas os demais ministros não aceitaram.

Conteúdo de grampos
» Uma ligação telefônica interceptada pela Justiça e dois comunicados do Palácio do Planalto mostram que Dilma enviou, antecipadamente, o termo de posse como ministro da Casa Civil para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que está investigado e é alvo de um pedido de prisão sob acusações de corrupção, lavagem de dinheiro, falsidade ideológica e obstrução da Justiça.

Delação da UTC
» O empreiteiro Ricardo Pessoa, da UTC Engenharia, disse que fez doações à campanha de Dilma em 2014, com dinheiro desviado da Petrobras. Afirmou ainda que o tesoureiro e ministro Edinho Silva insinuou que, se ele quisesse manter seus contratos na petroleira, deveria fazer mais contribuições. O presidente da Andrade Gutierrez também afirmou que parte de suas doações eleitorais em 2014 para Dilma vieram do caixa de propinas que teria de pagar por contratos com o governo.  

Fonte: Correio Braziliense