“O peronista Alberto Fernández obteve ampla vantagem
sobre o liberal Macri nas primárias para a Presidência, apesar do apoio
de Bolsonaro à reeleição do presidente argentino”
A derrota do presidente liberal Maurício Macri nas eleições primárias
da Argentina pôs em xeque o acordo do Mercosul com a União Europeia, do
qual o presidente argentino foi o principal artífice, e
estressou as
relações do Brasil com a Argentina, em razão da forte reação contrária
do presidente Jair Bolsonaro ao resultado. Em solenidade em Pelotas,
o
presidente da República disse que os gaúchos deveriam se preparar para
ser uma nova Roraima, numa alusão à fuga em massa de venezuelanos em
razão da crise do regime de Nicolás Maduro. [é lamentável, mas, a declaração de Bolsonaro é profética - basta que o novo governo argentino dure mais que um ano;
para evitar danos ao acordo União Europeia x Mercosul, se em um ano o povo argentino não corrigir o erro que cometeram ao eleger a chapa Kirchner, a solução é expulsar os 'hermanos' do Mercosul.]
O peronista de centro-esquerda Alberto Fernández obteve ampla
vantagem sobre Macri nas eleiçõesprimárias para a Presidência do país.
Com 99,37% das urnas apuradas, com Cristina Kirchner como vice, teve
47,66% dos votos, e Macri, 32,08%. Roberto Lavagna aparece em 3º lugar,
com 8,23% dos votos
. O resultado também provocou pânico no mercado
financeiro da Argentina: o peso argentino fechou em queda de 15,27%,
cotado a 53,5 por dólar — no pior momento do dia, chegou a valer 65 por
dólar.
A bolsa de valores recuou 37,01%.
Alberto Fernández conseguiu capturar os votos da classe média
insatisfeita com a recessão argentina e, com
Cristina Kirchner na vice,
manter o apoio dos sindicatos argentinos. Porém,
sua candidatura não é
comprometida com os ajustes econômicos necessários para equilibrar a
economia, pelo contrário,
é vista como a volta do projeto populista de
esquerda.
Macri tenta fazer do limão uma limonada, usando a queda da bolsa e a
desvalorização do peso para culpar o adversário: “Precisamos entender
que o maior problema é que a alternativa kirchnerista não tem
credibilidade no mundo, não gera confiança para que as pessoas venham
investir. Eles deveriam fazer uma autocrítica”, disse, ao comentar a
repercussão do resultado das prévias na economia. Criadas em 2009, as
prévias de domingo foram estabelecidas para escolha dos candidatos de
cada chapa, mas, como não houve disputa interna nos partidos, refletiu a
atual correlação de forças entre governo e oposição, tendo em vista as
eleições marcadas para 27 de outubro.
A situação da economia da Argentina é complicada. O país está em
recessão e teve de recorrer ao Fundo Monetário Internacional (FMI), com
uma inflação de mais de 55% depois de três anos de políticas de Macri.
Mesmo assim, os investidores ainda preferem a reeleição do atual
presidente à volta do peronismo. Cristina Kirchner governou entre 2007 e
2015 e adotou um modelo econômico que praticamente afundou a economia,
provocando a recessão em que a Argentina ainda se encontra. Nacionalizou
empresas, manipulou dados oficiais e causou repulsa aos investidores.
Sua estratégia era um meio-termo entre a
“nova matriz econômica” da
ex-presidente Dilma Rousseff, sua amiga, e o bolivarianismo de Hugo
Chávez, que resultou na crise do regime venezuelano de Nicolás Maduro.
Aliança tóxica
Após o resultado das prévias, Macri admitiu que existe uma bronca dos
argentinos com sua política econômica, em razão do empobrecimento das
famílias. Segundo ele, seu programa de reformas precisa de mais tempo
para dar certo. O presidente argentino ainda acredita que poderá
convencer os eleitores a apoiá-lo. Entretanto, o apoio do presidente
Jair Bolsonaro, que foi muito desejado por Macri, virou uma aliança
tóxica, em razão das declarações polêmicas do chefe do Executivo
brasileiro. Como a imagem de Bolsonaro no exterior não é boa, os
peronistas passaram a associar todo o noticiário negativo do Brasil à
imagem de Macri.
Os argentinos são orgulhosos e têm uma velha rivalidade com o Brasil,
que estava confinada aos estádios de futebol, mas pode recrudescer em
função da eventual interferência do governo brasileiro nas eleições. Um
dos temas mais sensíveis, por exemplo, é o caso da tortura. A ditadura
argentina foi das mais sanguinárias da América Latina e seus órgãos de
segurança mantiveram estreita ligação com seus similares brasileiros
durante o nosso regime militar. Cerca de 30 mil pessoas, num período de
sete anos, foram sequestradas e mortas, ou seja, um em cada mil
argentinos, a maioria jovens, foi assassinado pelos militares. Quatro
juntas militares, a partir do último dos seis golpes militares, em 1976,
fizeram desaparecer não somente os adversários, mas também seus filhos
de até quatro anos, que eram adotados por familiares de militares.
Mães de desaparecidos que começaram a se reunir em 1977 na Praça de
Maio para cobrar do governo notícias de seus filhos organizaram uma rede
de informações que lhes permitiu localizar mais de uma centena de
crianças sequestradas pela ditadura.
As Mães da Praça de Maio se
tornaram Avós da Praça de Maio. A ditadura acabou em 1983, com a
economia do país em frangalhos, depois de uma desastrosa guerra contra o
Reino Unido pela posse das Ilhas Malvinas. Com a democratização do
país, todos os generais integrantes das juntas militares foram julgados e
condenados por tortura, assassinato e morte dos milhares de argentinos.
Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - CB