O Globo
Bolsonaro provoca mais uma crise interna, agora nas Forças Armadas
A
tentativa do presidente Bolsonaro - um tenente sindicalista que acabou saindo
do Exército por questões disciplinares, promovido a capitão - de politizar sua
relação com as Forças Armadas gerou uma nova crise interna. Ele reduziu,
através de decreto, o critério para a promoção do último posto das Armas -
coronéis do Exército e da Aeronáutica, e Capitães de Mar e Guerra. Em vez de
promoção também no Quadro de Acesso por antiguidade (QAA), as promoções
passariam a ser apenas por merecimento (QAM - Quadro de Acesso por
Merecimento).
Houve
reações internas, pois a promoção apenas por merecimento poderia ensejar uma
decisão política do presidente da República, que é quem dá a última palavra.
Três dias depois o decreto foi cancelado, voltando tudo ao que era antes. O
presidente Bolsonaro cultiva desde sempre o relacionamento com os militares,
primeiro para ganhar votos especialmente das patentes inferiores, pois defendia
os interesses da classe no Congresso, o que lhe garantiu sete mandatos de
deputado federal seguidos.
Na
presidência da República, aparelhou seu ministério e os demais órgãos do
governo com militares de diversas patentes, da ativa e da reserva. Boa parte
sem qualificação para os cargos que ocupam, como o ministro da Saúde, General
da ativa. E passou a prestigiar qualquer cerimônia militar, especialmente nas
escolas de formação de oficiais.
[três atualizações se tornam indispensáveis:
- o então capitão JAIR BOLSONARO, foi absolvido pelo Superior Tribunal Militar - instância máxima da Justiça Militar da União - de TODAS acusações apresentadas contra ele;
- a opção do presidente Bolsonaro pela carreira política propiciou que exercesse a defesa intransigente dos direitos dos militares - tão vilipendiados em governos anteriores - e das próprias FF AA, como bem mostra o ilustre colunista no penúltimo parágrafo deste Post (não fosse o hoje presidente Bolsonaro, o decreto ofensivo à independência das Forças Armadas não teria sido revogado);
- houve uma certa precipitação em considerar crise um decreto, logo revogado, que alterava regras de assuntos específicos das Forças Singulares. O decreto revogado, tanto quanto o que o substitui, certamente contam com a assinatura do presidente Bolsonaro e do ministro da Defesa. Onde está a crise?]
No tempo em que acalentava abertamente ideias golpistas, vivia repetindo
que contava com o apoio das Forças Armadas. Recentemente, houve um atrito
diante das repetidas tentativas de politizar a questão militar. O comandante do
Exército, General Pujol, aproveitou uma solenidade para deixar clara sua
posição: “Nosso assunto é militar, preparo e emprego. As questões políticas?
Não nos metemos em áreas que não nos dizem respeito. Não queremos fazer parte
da política governamental ou do Congresso Nacional e muito menos queremos que a
política entre em nossos quartéis.”
O
incômodo foi tão grande, com Bolsonaro fazendo questão de repisar que era o
Comandante em Chefe das Forças Armadas, [o mandamento está na Constituição o que torna desnecessário sua menção excessiva, juraram cumprir.] que o ministro da Defesa, General
Fernando Azevedo e Silva viu-se obrigado a soltar uma nota oficial afirmando
que o presidente Jair Bolsonaro tem demonstrado "apreço pelas Forças
Armadas" e que esse sentimento "tem sido correspondido".
Curiosamente,
essa tentativa de interferir na estrutura interna das Forças Armadas para tirar
proveito político, pois Bolsonaro teria condições de nomear oficiais-generais
das três Armas mais alinhados à sua visão política, foi feita também pelo PT no
governo Dilma.
Um
decreto assinado por ela transferia para o Ministério da Defesa poderes dos
comandantes militares, entre esses a promoção aos postos de oficiais
superiores; designação e dispensa de militares para missão de caráter eventual
ou transitória no exterior; nomeação e exoneração de militares, exceto
oficiais-generais, para cargos e comissões no exterior criados por ato do
presidente da República; poder de transferir para reserva remunerada oficiais
superiores, intermediários e subalternos, bem como a reforma de oficiais da
ativa e da reserva e de oficial- general da ativa, após sua exoneração ou
dispensa de cargo ou comissão pelo presidente da República.
Na
ocasião, o então deputado federal Jair Bolsonaro denunciou da tribuna que o
objetivo real do decreto era interferir na formação dos oficiais das três
Armas. Isso porque o art. 4 º do texto revogava o decreto n º 62.104, de 11 de
janeiro de 1968, que delegava “competência aos ministros de Estado da Marinha,
do Exército e da Aeronáutica para aprovar, em caráter final, os regulamentos
das escolas e centros de formação e aperfeiçoamento respectivamente da Marinha
de Guerra, do Exército e da Aeronáutica militar”.
Ao
revogar o decreto de 1968, essa função passaria automaticamente para o
Ministério da Defesa, que teria em suas mãos um poder de controle sobre a
formação e a promoção de oficiais-generais. Como agora, o decreto foi cancelado
por outro. Mas,
um documento oficial do PT [única coisa oficial no perda total= pt = é a corrupção deslavada.] após a vitória de Bolsonaro para a presidência da
República afirmava abertamente que um dos erros do partido quando esteve no
poder foi não interferir no currículo das escolas de formação dos militares.
Merval Pereira, jornalista - O Globo