Matar
é matar. Homem, mulher, gay, bi, transexual. É hediondo por natureza. Não se
pode fazer diferença entre matar um ou outro por gênero
Ainda pendente
da sanção de Dilma Rousseff, que, possivelmente a fará com pompa e
circunstância para comemorar o Dia Internacional da Mulher, a lei que torna hediondo o feminicídio foi aprovada. Isso quer
dizer: penas mais duras para quem matar mulher pelo fato de ela ser mulher.
Mais do
que uma bobagem populista para agradar
ao público feminino perto do dia 8 de março, a
proposta é discriminatória, ilegal e, claro, inconstitucional. Matar
é matar. Homem, mulher, gay, bi, transexual. É hediondo por natureza. Não se pode fazer diferença entre matar
um ou outro por gênero. É uma violação
grosseira ao Artigo 5º da Constituição, aquele que assegura que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”,
e todos os seus incisos. Uma afronta tão absurda que deveria – essa
sim - ser considerada hedionda. Além de ferir a Constituição, a lei para
fazer bonito para as mulheres atenta contra a lógica.
Até leigos sabem que punições maiores não inibem o crime, muito menos
os homicídios. Há vários estudos que comprovam isso, incluindo os sobre a
pena capital, que corroboraram para a redução desse tipo de punição nos Estados
Unidos e para que vários países do mundo, a exemplo da Inglaterra e França,
extirpassem a pena de morte de suas leis. Pior:
em um país em que os homicídios crescem assustadoramente, a lei do feminicídio
é, para dizer o mínimo, tergiversar sobre a violência.
Ainda que as mulheres sejam vítimas – e a lei Maria da Penha é importante para estimular a denúncia sobre a violência contra a mulher –, são os jovens do sexo masculino que engrossam as estatísticas dos homicídios: 74 por 100 mil quando se fala de garotos de 21 anos. Um escândalo. Ninguém pensou em qualificar esses assassinatos como hediondos ou tipificá-los na categoria de jovencídio.
O problema é que aqui se esbarra em temas mais profundos que tanto o Senado quanto a Câmara insistem em adiar: a maioridade penal e o poder de polícia. Nunca se matou tanto jovem, mas também nunca tanto jovem matou tanta gente. Nunca se prendeu tanto e nunca tão pouco bandido continuou preso.
Ao contrário da quase unanimidade do feminicídio, que em nada mudará o aterrador quadro de violência do país, são temas complexos, populares por um lado, impopulares por outro. Ficam, então, para as calendas. Sem coragem para pelo menos tentar soluções para reduzir o número indecente de assassinatos, o Brasil cria seus monstrengos. A partir da sanção da lei, mulheres que matam homens terão penas menores do que os homens que matam mulheres. Enquanto isso, homicídios de todos os gêneros se multiplicam em ritmo endêmico.
Por: Mary Zaidan É jornalista. E-mail: zaidanmary@gmail.com Twitter: @maryzaidan
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