O Estado de S.Paulo
A nova batalha política será como flexibilizar as restrições a gastos públicos
O governo Bolsonaro está sendo obrigado a pensar em gastar – além dos
limites legais, obviamente. A equipe econômica acredita, acompanhada por
importantes segmentos da economia, que a agenda de concessões,
desburocratização, melhoria do ambiente de negócios e desregulamentação
trará crescimento num horizonte de médio prazo. O problema é o que fazer até lá, pois economia andando devagar, renda
familiar comprimida e desemprego persistente nunca trouxeram dividendos
políticos a governo algum.
Esse é o pano de fundo das conversas já em tom alto de voz para levar ao
Legislativo propostas que flexibilizem de alguma forma as restrições
impostas pelo teto dos gastos públicos, aprovado sob Temer. “Pela
primeira vez estou escutando com insistência amigos dizendo que a PEC do
teto dos gastos é muito dura, está inviabilizando o setor público”,
admitiu o competente secretário do Tesouro, Mansueto Almeida. E fuzilou:
“A realidade dos fatos é que a gente tem um país que tributa muito,
gasta muito, não tem capacidade de investimento e ainda tem ajuste
fiscal a ser feito”.
O muro com o qual Paulo Guedes e sua equipe se chocaram é formidável e
impõe consequências políticas. Por causa da limitação do teto, os gastos
obrigatórios (saúde, educação, aposentadorias) corrigidos pela inflação
aumentam todo ano, enquanto os discricionários (“livres”) diminuem todo
ano. É a tal da “matemática” à qual se referiu o presidente.
Ministérios já estão parando, sufocados por contingenciamento de verbas,
o mesmo acontecendo com programas que vão do Minha Casa Minha Vida ao
combate a queimadas na Amazônia.
Esse é o pano de fundo também da insistente conversa sobre um novo pacto
federativo, que Guedes tem oferecido aos governadores nos seguintes
termos (simplificados): vocês nos ajudam a desindexar no Legislativo
despesas e a desengessar o Orçamento, nós ajudamos vocês a melhorar a
situação fiscal já no curto prazo com divisão mais favorável da
arrecadação obtida com leilões do pré-sal, além de repasses diversos
como fundos para educação, entre outros. A aprovação da cessão onerosa
no Senado (com a qual o governo espera arrecadar mais de R$ 100 bilhões,
dos quais R$ 21 bilhões vão para Estados e municípios) foi parte
relevante dessa negociação.
O tal “pacto” tem sido visto por algumas agências de classificação de
risco e por economistas com certo ceticismo. Por um motivo principal: o
tamanho da bomba fiscal que paira sobre os Estados e, por consequência,
sobre a própria União. De fato, os governadores não poderão gastar o
dinheiro do megaleilão do pré-sal com itens como pagamento de pessoal ou
custeio da máquina administrativa. Mas eles têm recebido poucos
“incentivos” para proceder os ajustes fiscais.
Ao tal “novo pacto federativo” está ligada a reforma tributária, à qual
alguns governadores associaram a falsa esperança de melhoria de
arrecadação (enquanto o público em geral está confundindo simplificação
tributária com redução de carga tributária, perigoso engano). Ao
contrário, vai piorar para alguns, e não dá para reduzir impostos diante
do tamanho dos gastos sociais no País – simples assim.
O STF não está ajudando, ao bloquear a redução de carga horária e
salários para servidores públicos, cuja folha já consome em 14 Estados
mais que o teto de 60% fixado pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
Contingências políticas (como perda de popularidade) e também econômicas
(dar um impulso na economia) provavelmente levarão a algum tipo de
entendimento para flexibilização do teto de gastos. Pode ser
simplesmente a não criminalização de quem não cumpri-lo, por exemplo. Os
puristas dirão que mexer no teto de gastos é abrir a boca do inferno.
Os cínicos observarão que dali sai até algum calorzinho, fora o fato de
estar cheio de conhecidos.
William Waack - O Estado de S. Paulo
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