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domingo, 30 de julho de 2023

O histórico de abusos de corpos negros - O Globo

Dorrit Harazim

Igreja onde Emmett Till foi velado Scott Olson/Getty Images/AFP
 
Na terça-feira, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, anunciou a criação de um Monumento Nacional em memória do menino negro Emmett Till e de sua mãe, Mamie Till-Mobley. Na verdade, serão três os monumentos que evocarão o assassinato de Emmett, com requintes de selvageria, por supremacistas brancos nos idos de 1955. 
O primeiro será erguido na igreja de Chicago onde o garoto fora velado; o segundo, na ravina do Rio Tallahatchie, no Mississippi, onde encontraram seu corpo brutalizado; e um terceiro, certamente o mais significativo, na entrada do tribunal onde os matadores confessos, dois irmãos graúdos, foram rapidamente absolvidos por um júri branco.

À época, a mãe-coragem de Emmett obrigara o país a encarar o que restara do filho: uma massa disforme e desumanizada exposta em caixão aberto, sem retoques. Como já relatado neste espaço, a atrocidade serviu de catalisador para o Movimento pelos Direitos Civis que galvanizaria o país na década seguinte.

Passaram-se quase 70 anos. Desde então, 12 presidentes ocuparam a Casa Branca. Ainda assim, Biden achou necessário explicar ao país o motivo de um memorial nacional para os dois corpos negros.— Vivemos tempos em que se tenta banir livros, enterrar a História — disse o presidente. — Por isso queremos deixar bem claro e cristalino: embora a treva e o negacionismo possam esconder muita coisa, não conseguem apagar nada. Não devemos aprender somente aquilo que queremos saber. Devemos poder aprender o que é preciso saber.

Reparações históricas e desculpas oficiais costumam vir na rabeira da própria História. E com frequência nada reparam. Ainda assim, acabam compondo um retrato das feridas de cada nação. No caso atual, a iniciativa de Biden não deve ser descartada como mero artifício eleitoreiro visando ao pleito de 2024. Há também uma real preocupação com um surto de apagamento histórico em curso na América profunda e retrógrada. Quando governadores extremados como Ron DeSantis, da Flórida, ou Greg Abbott, do Texas, ordenam escolas e bibliotecas públicas a varrer das estantes clássicos da literatura negra e LGBTQIA+, um monumento nacional à coragem de Mamie Till chega em boa hora.[o que mais evidencia o caráter eleitoreiro da iniciativa do democrata cujo governo prima pela INcompetência e desacertos.]

Para a população negra dos Estados Unidos, existe uma ferida coletiva que nenhuma reparação ainda conseguiu cicatrizar. Ela tem nome extenso: Estudo Tuskegee de Sífilis Não Tratada no Homem Negro. Trata-se do mais longo experimento não terapêutico em seres humanos da História da medicina. Ele durou de 1932 até 1972 e teve como propósito estudar os efeitos da sífilis em corpos negros. 
Por meio de concorridos convites divulgados em igrejas e plantações de algodão, o Instituto de Saúde Pública da época selecionou 600 homens, todos filhos ou netos de escravizados. 
A grande maioria nunca tinha se consultado com médico. 
No grupo, 399 estavam contaminados pela doença, e 201 eram sadios. Aos contaminados foi informado apenas serem portadores de “sangue ruim”. Como o estudo visava à observação da doença até o “ponto final” — a autópsia —, os doentes foram ficando cegos, dementes e morreram sem conhecer a penicilina, que a partir dos anos 1940 se tornou o tratamento de referência para sifilíticos. 
A família dos que morriam recebia US$ 50 para cobrir o enterro. 
A pesquisa só foi interrompida em 1972, quando o jornalismo da Associated Press revelou a história, levando o governo americano a pagar US$ 10 milhões em acordo coletivo com os sobreviventes.

Oito deles, já quase nonagenários, estavam no Salão Leste da Casa Branca em maio de 1997 quando o então presidente Bill Clinton pediu desculpas públicas pelo horror cometido. Em discurso marcante, falou em nome do povo americano: — O que foi feito não pode ser desfeito. Mas podemos acabar com o silêncio, parar de desviar do assunto. Podemos olhá-los de frente para finalmente dizer que o que o governo dos Estados Unidos fez foi uma ignomínia, e eu peço desculpas.

Ainda assim, passado menos de um ano, nova barbárie experimental veio à luz, desta vez com cem meninos negros e hispânicos de Nova York arrebanhados por três instituições de renome científico. 
Todos eram irmãos caçulas de delinquentes juvenis e tinham idade entre 6 e 11 anos. 
O estudo pretendia demonstrar a correlação entre determinados marcadores biológicos e o comportamento violento em humanos. Para isso, aplicaram nas crianças injeções intravenosas de fenfluramina, substância posteriormente associada a danos à válvula mitral. Às mães que os levavam ao local do experimento foi oferecida uma recompensada de US$ 125 .

Tudo isso e muito mais faz parte do pesado histórico de abuso de corpos negros, até mesmo em nome da ciência. Não espanta, portanto, a rejeição quase atávica à obrigatoriedade de vacinação contra a Covid-19 manifestada pela população negra em tempos recentes. A retirada de circulação ou dificuldade de acesso a livros que narram essas vivências deveriam ser impensáveis em 2023. É sinal de uma sociedade adoecida pelo medo de livros.

Dorrit Harazim, colunista - O Globo


domingo, 21 de agosto de 2022

‘Funesto acontecimento’ - O Estado de S. Paulo

 J. R. Guzzo

Moraes fez o pior discurso possível – falou ao público como um delegado de polícia 

É difícil achar neste país alguém que possa falar doTribunal Superior Eleitoralcom mais autoridade do que o ex-ministro Marco Aurélio Mello. É natural, levando-se em conta que ele passou 31 anos dentro do STF, a casa-matriz desse TSE do qual se fala sem parar nos dias de hoje, e sabe mais ou menos tudo a respeito de um e de outro. 
 
Mais difícil ainda seria encontrar uma definição tão admirável como a que ele deu para a cerimônia de posse do seu ex-colega Alexandre de Moraes na presidência desse Frankenstein burocrático que governa as eleições brasileiras. “Funesto acontecimento”, resumiu ele. 
Foi, de fato, uma dessas calamidades que só as nossas atuais Cortes Superiores conseguem produzir. 
A maior contribuição que Moraes poderia dar às eleições seria não abrir a boca sobre o assunto. Mas, uma vez que resolveu fazer discurso, fez o pior discurso possível – falou ao público como um delegado de polícia. Prometeu reprimir, punir e proibir; em vez de celebrar o voto livre e os direitos políticos do cidadão, fez ameaças. Anunciou que vai ser “implacável”. No momento em que a autoridade eleitoral mais deveria tranquilizar as pessoas, garantir a liberdade de manifestação e mostrar-se imparcial, ele soltou um grito de guerra.
 
 O ministro deixou claro em seu discurso de posse, mais uma vez, que o importante para ele, para o STF e para o consórcio esquerdoso que o transformou em herói das “lutas” contra o governo, não são as eleições populares – são as urnas eletrônicas do TSE. (Também não deixou nenhuma dúvida sobre com quem, na vida real, ele promete ser “implacável” durante a campanha – o presidente e candidato à reeleição. Há toda uma encenação para fingir que não é assim; mas até uma criança com dez anos de idade sabe que é exatamente assim.)  
Moraes, no que se tornou uma ideia fixa no STF e nas forças que querem derrotar o governo, louvou o sistema eleitoral brasileiro como a maior contribuição já feita à humanidade desde a descoberta da penicilina. É uma piada. Só dois países, Butão e Bangladesh, usam as mesmas urnas eletrônicas de primeira geração iguais às do Brasil; 
como alguém pode se orgulhar de uma coisa que só é utilizada no Butão e em Bangladesh? Não tem nada a ver com democracia. Tem tudo a ver com a lógica. Mas o ministro promete ser “implacável” com quem disser isso.
 
O discurso de Moraes é uma explosão de rancor contra a ideia geral da liberdade; tudo o que lhe ocorre dizer a respeito do assunto é que a liberdade é algo que deve ser controlado, limitado e punido, quando o STF não aprovar o uso que for feito dela. “Funesto acontecimento”, como diz o ex-ministro Marco Aurélio.
 
J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S. Paulo 

quarta-feira, 2 de junho de 2021

“Tratamento precoce”: o próximo tabu a cair após a origem laboratorial? - Gazeta do Povo

Rodrigo Constantino

Covid-19

Por Eli Vieira*, especial para a Gazeta do Povo

A mudança de tom sobre a plausibilidade de o SARS2, vírus causador da pandemia, ter se originado em laboratório foi uma das maiores reviravoltas na cobertura de opiniões de especialistas na imprensa nas últimas décadas. Ao ponto de a revista eletrônica Vox ter sido pega editando silenciosamente um artigo do ano passado para amenizar o tom de certeza que tinha dado para a origem natural do vírus — o jornal Washington Post fez a mesma coisa. O Facebook parou de censurar artigos que defendessem a origem laboratorial — mas continuará insistindo em não dar liberdade de expressão aos usuários, apesar do fiasco (de fato, mal escrevi as linhas acima, fui censurado lá por esse motivo). Até o governo Biden andou se movimentando para exigir uma investigação melhor das origens do vírus, já que a da OMS não serviu.

 Carta à Science quebra “mordaça” da narrativa sobre a origem da Covid


 Caixa com ivermectina, um dos medicamentos usados no chamado tratamento precoce da covid-19 - Copyright © 2021, Gazeta do Povo. Todos os direitos reservados.

Assim como se revelaram apressadas a afirmações peremptórias contra a origem laboratorial do vírus, é bem possível que aconteça uma outra virada e uma outra reedição de afirmações contra todo e qualquer tratamento precoce da doença que ele causa, a Covid-19. Não faltam exemplos, entre influenciadores da mídia tradicional e da nova mídia, de quem decretou que as soluções quase improvisadas dos médicos para tratamento precoce seriam indignas de confiança, talvez pseudocientíficas, certamente “negacionistas” — o adjetivo lamentável da moda que foi cunhado originalmente para malucos que duvidam do Holocausto dos judeus.

Há uma grande intersecção entre o grupo que descartou cedo demais a origem laboratorial e o grupo que ainda afirma a ineficácia de todo e qualquer tratamento precoce. Merecem uma segunda chance? É o que analisaremos aqui. Primeiro, deixemos claro do que estamos falando: tratamentos precoces são intervenções pré-hospitalares (os italianos dizem “tratamento domiciliar”), com a intenção de que aliviar os sintomas da Covid-19, e, de preferência, impedir que esses sintomas se agravem e o paciente seja hospitalizado. Há um segundo significado relevante para “precoce”, aqui: que esses tratamentos devem ser aplicados assim que os sintomas começam, pois os efeitos podem ser sensíveis ao tempo.

O tratamento precoce não foi proposto como cura originalmente, mas como esperança. Havia um senso de urgência. Como disseram pesquisadores italianos numa revisão de tratamento domiciliar de meados de 2020, mencionando pedidos de conselho vindo de médicos da América Latina: “Você só pode contar com evidências muito escassas na literatura e com seu próprio conhecimento para administrar os sintomas dos seus pacientes, e com a experiência” dos autores.

Uma resposta definitiva na ciência demora muito, e, quando chega aos livros-textos, já é tarde demais para uma primeira resposta a uma nova doença. Não só a busca de alternativas é prerrogativa médica, é bem possível que seja uma obrigação médica nessas situações. Essa investigação clínica antecede a aplicação da pesquisa científica na medicina. A primeira pode ser tão bem feita quanto a última, a qual pode vir para confirmar o que foi originalmente descoberto na prática clínica.

Como julgar os estudos

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HCQ: onde a evidência é mais frágil, mas ainda existente

A primeira droga de tratamento precoce a se tornar notória foi a hidroxicloroquina (HCQ), por causa dos resultados de sua aplicação junto ao antibiótico azitromicina pelo médico Didier Raoult. Agora sabemos que os resultados de Raoult eram bons demais para serem verdade. Mais do que isso, os estudos de HCQ conduzidos em pacientes graves o suficiente para serem hospitalizados — os que entraram na chamada “fase inflamatória” — indicam que a droga não é eficaz numa etapa mais adiantada. Mas isso não significa que a eficácia da HCQ no contexto precoce foi totalmente descartada.

O que aconteceu com a HCQ foi que os estudos repetidamente chegaram perto do limiar estatístico convencionalmente aceito para afirmar a eficácia, sem ultrapassá-lo. O fato de os estudos terem se aproximado do limiar repetidamente é sugestivo: pode ser que haja um efeito, porém não muito forte, ou que é mascarado por variáveis como estágio da doença ou pelo tamanho insuficiente da amostra.  Esse limiar é definido através do “valor p”, uma medida estatística que corresponde grosseiramente à probabilidade de o resultado ter sido atingido por “pura sorte”, sem haver realmente eficácia. A convenção metodológica nas últimas décadas, especialmente nessa área, tem sido que não se tolera que esse valor p ultrapasse 5%.

Porém, ao se afirmar a ineficácia da HCQ com base no valor p acima de 5% — às vezes apenas ligeiramente acima — está havendo uma amnésia coletiva dos comentaristas científicos: há poucos anos, em 2019, muitos cientistas propuseram o abandono dessa convenção, ou ao menos de uma interpretação comum dela que é a que vemos em quem afirma ineficácia total da HCQ com base nela. Valentin Amrhein e mais de 800 signatários disseram à Nature que a interpretação dicotômica do valor p deve ser abandonada. De fato, os estatísticos profissionais sempre souberam que, se o p for maior que 5%, isso não significa que a hipótese da eficácia foi descartada, ou que a hipótese da ineficácia deve ser aceita.

Entre as drogas propostas para o tratamento precoce, é verdade que a HCQ não é a estrela, embora haja no conjunto agregado dos estudos do seu uso precoce uma redução de cerca de 25% na taxa de hospitalização, comparando o grupo experimental com o grupo consolidado de placebo. As estrelas são outras.

As estrelas do tratamento precoce

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Por que tanta resistência contra todo tratamento precoce?

  • Política. O que acontece com propostas que são politizadas é que, para sinalizar membresia à tribo política associada a elas, algumas pessoas se engajam no autoengano propagandista de prometer o que não foi prometido originalmente. E, reativamente, tribos políticas rivais passam a exagerar para o outro lado, declarando-se detentoras de provas definitivas de que essas propostas não funcionam e até que são imorais. A verdade não está necessariamente no meio, assim como a razão não costuma ser a média entre duas loucuras. Mas a verdade é alcançável pela mente paciente e menos atada por compromissos tribais, e os estudos são um auxílio para escapar dessa arapuca, embora alguns possam ser influenciados por ela. Um ingrediente constante da politização é a hipérbole: um lado acusa o outro de homicídio por propor solução ineficiente, e o outro devolve a acusação dizendo que ignorar soluções possíveis é aumentar o número dos que sofrem hospitalizados e mortos.
  • Falsa dicotomia entre tratamento precoce e vacinas. Quem contrai Covid-19 entre uma dose e outra da vacina, ou antes de ter a oportunidade de ser vacinado, poderia ser beneficiado com o alívio dos sintomas e o efeito protetivo do tratamento precoce. E quem se tratou precocemente com sucesso adquiriu uma imunidade que pode desafogar a fila da vacina, sendo posto na baixa prioridade.
  • Má interpretação estatística dos estudos. Este motivo mais técnico explica a resistência de alguns especialistas. É preciso lembrar que a maioria dos pesquisadores não é especializada em estatística, e a usa como uma ferramenta, às vezes em programas de computador cujo funcionamento não entendem completamente. Aderem a interpretações míopes do valor p sem perícia estatística.
  • Captura de órgãos regulatórios e de aconselhamento médico pelas razões acima, e adesão acrítica a eles. Esses órgãos, como a OMS, a FDA e o NIH, podem ser presa fácil das más interpretações de estatística. Os bons observadores viram, especialmente no começo da pandemia, o quanto esses órgãos podem ser falhos. A OMS chegou a desencorajar as máscaras.
  • Conflito de interesses. A Merck, fabricante da ivermectina, lançou uma nota alegando que a droga não tem eficácia para a Covid-19. A ivermectina é barata e dá pouco lucro, especialmente depois de a Merck ter distribuído bilhões de doses em 49 países antes da pandemia. É mais interessante economicamente para a Merck promover uma nova droga (como Monulpiravir) que está lançando contra a doença. Aqui, não se deve ver necessariamente esse conflito como consistindo em malícia e planejamento vilanesco. As pessoas são perfeitamente capazes de defender seus interesses inconscientemente, com o autoengano. Não que farmacêuticas sejam famosas por errar por boas intenções... especialmente considerando que a Merck já foi acusada de fazer campanha de assassinato de reputação contra médicos.
  • Alegações de riscos das drogas. Aqui, recomenda-se olhar avaliações de riscos das drogas que antecedem a politização do tratamento precoce para a Covid-19. A ivermectina é usada há décadas sem grandes pânicos, e nos estudos de Covid-19 não foram observadas grandes complicações. Não é difícil exagerar riscos para qualquer droga: até o paracetamol pode matar em doses altas. Além disso, as bulas de remédios não são documentos científicos, mas documentos que conscientemente erram do lado da cautela: incluem todo tipo de complicação que os pacientes passam na fase de testes, mesmo sem evidências de que essas complicações vieram do medicamento. É por isso que as bulas são tão medonhas.
Conclusão
Seria de se esperar que pessoas interessadas em ajudar os pobres teriam como uma das primeiras reações a uma pandemia a procura por algum tratamento já disponível, barato e seguro. Não às cegas, pois existem milhares de tratamentos e drogas e o tempo é premente, mas com base em plausibilidade bioquímica e espectro de ação. Infelizmente, essa expectativa encontrou os empecilhos acima.
A medicina está cheia de acidentes faustos em que uma droga que havia sido pesquisada para um propósito se revela útil para outro. 
O sedativo brometo de potássio foi proposto no século 19 como uma droga antimasturbatória. 
O carbolítio (carbonato de lítio) foi proposto para bipolares porque há semelhanças de alterações de humor deles com quem sofre de gota, que advém de muito ácido úrico no sangue, que o carbolítio cortaria. 
 
Mas bipolaridade nada tem a ver com ácido úrico: outras formas de cortar o ácido úrico no sangue dos bipolares não surtiam efeito. O carbolítio de fato modula o humor, mas o mecanismo de ação proposto (a “comprovação”) era falso. O primeiro ansiolítico era um aditivo conservante para a penicilina.  
O famosíssimo Diazepam era só uma tintura para observar amostras de tecido biológico em microscópio. 
E, outro caso famoso, o Viagra foi estudado inicialmente como tratamento para hipertensão e angina. Não seria uma surpresa muito grande, nem um caso singular, se alguma droga já aprovada para outras doenças pudesse ter algum efeito para tratar Covid-19.

Portanto, a busca de tratamento precoce via reutilização de remédios deveria ser um dos primeiros passos no curso de ação rápida quando uma nova doença aparece. As “evidências anedóticas” dos médicos na prática clínica podem ter valor, e muitos medicamentos eficazes hoje vieram exatamente delas, sem falar em medicamentos que começaram como chás populares.

Os médicos são mais capazes de fazer essas decisões quando estão em dia com o conhecimento científico relevante. Porém não deve ser exigido deles que apliquem o rigor máximo científico onde ele não é nem necessário nem há tempo hábil para ele. Existe rigor clínico, rigor da experiência, que merecem respeito assim como o conhecimento científico, e seu valor foi provado em milênios de prática médica. O que os médicos observam leva a análises mais rigorosas que podem confirmar as suas conclusões, como discutido aqui.

De acordo com as evidências atuais, é possível afirmar que houve um tabu midiático e de profissionais, instituições e empresas com conflito de interesses para suprimir, impedir e silenciar o uso de tratamento precoce para Covid-19, assim como houve a respeito da hipótese de o vírus ter vazado de um laboratório na China. O custo em bem-estar e até em vidas é incalculável. Uma segunda revisão de posturas públicas está por vir.

*Eli Vieira é biólogo geneticista com pós-graduação pela UFRGS e pela Universidade de Cambridge, Reino Unido.

Ideias - Gazeta do Povo


segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

Qual ano? - Denis Lerrer Rosenfield

O Estado de S. Paulo

Há um sincero desejo de que as coisas melhorem, deixando infortúnios para trás. Que assim seja

Um ano foi encerrado e outro se inicia sem que tenhamos ao certo uma linha divisória entre um e outro. Talvez por décadas seja esta uma experiência única, pois a sensação do não acabou ainda ou a pergunta de quando esse ano de 2020 vai terminar persistem. A humanidade foi severamente atingida por uma pandemia que segue ceifando vidas, as pessoas, acossadas, não sabem mais como responder. Algumas adotam a atitude de estar cansadas e decidem pela imprudência e pela doença, quiçá a morte, enquanto outras procuram se proteger. Vida e morte se entrelaçam de outra maneira, com esta última avançando.

Sinais de vida são fortalecidos mediante uma frenética e, parece agora, bem-sucedida busca por vacinas. Num esforço global gigantesco, 12 meses foram suficientes para que novas formas de combate à covid-19 fossem descobertas. [é isto que assusta; as vacinas contra a covid-19 são desenvolvidas quase que no improviso - medicamentos maravilhosos foram desenvolvidos muitas vezes por consequência do acaso, as vezes até de um erro - a penicilina, um dos melhores antibióticos, foi descoberta em função do surgimento de um 'mofo',  que não era previsto, nem buscado.
Mas, não podemos olvidar que um tempo inferior a um semestre, pode ser muito pouco para descobrir uma contra indicação, efeitos colaterais negativos  e ainda não se sabe qual o período de eficácia dos imunizantes e por aí vai. 
Aqui no Prontidão Total a maior parte - somos na maioria, antigos - colhemos beneficios fantásticos das vacinas,mas uma de desenvolvimento mais rápido, a do sarampo, levou quatro anos... . Nos tempos atuais tudo é rápido, só que a natureza tem seu tempo, que não se destaca pela pressa.]    Sinais de morte também encontraram o seu caminho, com governantes irresponsáveis menosprezando a doença, deixando as pessoas morrerem aos milhares. A irresponsabilidade do governo Bolsonaro é gritante, com 200 mil pessoas nos abandonando definitivamente. Nem numa guerra morrem tantas pessoas e, contudo, nem combatentes temos. [de 1º janeiro 2020 a 15 de outubro, morreram no Brasil vitimas de problemas cardiovasculares pouco mais de 350.000 brasileiros. Em período equivalente de 2019 morreram mais 175.000 brasileiros e brasileiras de doenças respiratórias - tuberculose, enfermagem, a gripe tradicional.
O câncer, doenças do aparelho digestivo e muitas outras continuam e continuarão matando implacavelmente.
Infelizmente, muito provavelmente um castigo divino - para mostrar ao mundo,  que determinada prática ser permitida pela Constituição de um país,  autorizada por um colegiado de 'supremos' de outra nação, ter o aval de uma ONU ou similar, continua sendo pecado perante as leis de DEUS - o SUPREMO, o ABSOLUTO, o INFINITO, o TODO, o ETERNO.]

Zeram-se os impostos para importação de armas como se se tratasse de uma prioridade nacional, suponha-se, então, para dar uns tiros no coronavírus. Este, porém, não se deixa abater pelos discursos demagógicos. Quanto mais se atira nele dessa maneira, mais se espraia. No seu íntimo, deve estar rindo de nossos governantes. Os verdadeiros tiros, que seriam uma política responsável de combate à pandemia, encontram-se estranhamente ausentes.

O espetáculo nacional é deprimente! Cenas pelo mundo mostram pessoas sendo vacinadas, enquanto as estatísticas da morte em nosso país só aumentam. Um mínimo de bom senso ensejaria a pergunta: por que pessoas são lá vacinadas, enquanto aqui vivemos de uma verborragia de quinta categoria?

Lá fora, em países minimamente responsáveis, quase em outro planeta, e já se contam às dezenas, as campanhas de vacinação começaram. Não importa que seus governantes sejam de direita ou de esquerda, o que deve ser levado a sério é a vacina e as medidas de precaução no combate à doença. Dizendo uma obviedade: as pessoas lutam pela vida, não fazem encenações macabras, como se morrer por descaso fosse normal.

O presidente Bolsonaro, em seus dois anos de mandato, alinhou-se ao presidente Trump e ao primeiro-ministro Netanyahu. Ora, o que fizeram esses governantes? Lançaram grandes campanhas de vacinação, deram prioridade à vida, tudo fazendo para que as pessoas possam proteger sua saúde. Não lhes importou a origem das vacinas, contanto que deem resultados. Pessoas sendo vacinadas, governantes dando o exemplo, nenhum negacionismo! Será que o nosso presidente não poderia alinhar-se a essas políticas, seguindo-as?

Se continuarmos nesse diapasão, a única imunidade que vamos adquirir será a de rebanho, o que levaria pelo menos mais 12 meses. Será que é isso que merecemos, ser tratados como rebanho? Se isso persistir, talvez nos reste procurar uma sociedade de proteção dos animais!

A situação chega às raias do absurdo. O presidente Bolsonaro e o governador Doria polemizam sobre a eficácia de vacinas pelos meios de comunicação. A luta pela vacina tornou-se uma guerra publicitária, não de saúde! Nem um nem outro seguem os protocolos científicos. Para que se comprove a eficácia de uma vacina, há etapas a serem cumpridas, dentre as quais, ressalte-se, a divulgação do relatório de pesquisa com a conclusão de sua fase 3, a publicação dos resultados por uma revista cientificamente reconhecida, submetida a pares independentes, e a submissão de todos esses documentos a uma agência reguladora.

Foi o feito pela Pfizer/BioNTech e pela Moderna, a partir do que, com segurança, começaram as aplicações. Aqui, no Brasil, a vacina da Sinovac/Butantan não cumpriu ainda esses procedimentos, no entanto, o começo de uma campanha de vacinação já foi anunciado! Na verdade, só tivemos anúncios sendo sistematicamente postergados. [nenhum dos procedimentos para glamorizar a vacina chinesa, Sinovac/Butantan, foi promovido ou apoiado pelo Governo Federal. A campanha de vacinação a ser iniciada contará com vacinas a cargo, prioritariamente, da Fiocruz. Os inimigos do Brasil dizem que o Programa Nacional de Imunização não possui seringas nem agulhas, já estão disponíveis mais de 15.000.000 de tais insumos, mas do que suficientes para iniciar com folga o processo de vacinação.]  Melhor não fazer campanha publicitária nenhuma, pois essa já é suficientemente contraproducente! A AstraZeneca/Fiocruz, embora divulgue com maior rigor os seus resultados, apenas agora conseguiu a sua aprovação na agência inglesa, abrindo caminho para a sua aplicação, após erros metodológicos em sua terceira fase. [erros que foram percebidos e sanados e ser aprovada pela agência inglesa a coloca em patamar idêntico ao da Pfizer,Moderna - com facilidades derivadas de uma logística mais fácil.]  A Anvisa, até agora, não recebeu a documentação completa dessas respectivas pesquisas. Logo, evidentemente, não pode ser responsabilizada por nenhum atraso. O resto é campanha publicitária e luta política.

Em mudanças de ano, habitualmente desejamos um feliz ano novo, expressando com isto um sentimento de amor e de fraternidade.  
Uma esperança sempre se faz presente, mesmo em modos aparentemente formais. 
Há um sincero desejo de que as coisas melhorem, deixando eventuais infortúnios para trás. 
Que assim seja, e oremos, talvez sem muita confiança, para que nossos governantes tomem juízo! Está difícil...

Denis Lerrer Rosenfield, Professor de filosofia - O Estado de S. Paulo

 

sexta-feira, 13 de março de 2020

Ilustre passageiro - Nas entrelinhas

“”A reação dos países à epidemia é proporcional à envergadura de seu sistema de saúde, esclarecimento da população e escala de medidas de contenção por parte dos governos” 

Um dos mais famosos “cases” da propagada brasileira é um anúncio de bondes: “Veja, ilustre passageiro, o belo tipo faceiro que o senhor tem ao seu lado. E, no entanto, acredite, quase morreu de bronquite, salvou-o o Rum Creosotado”. O poeta Bastos Tigres levou a fama, mas a autoria seria do farmacêutico Ernesto de Souza (1864-1928), criador da fórmula, que até hoje serve de exemplo nas escolas de comunicação, por causa da simplicidade de seus versos. De acordo com o anúncio publicado no jornal Correio da Manhã, de 8 de agosto de 1920, a fórmula do Rum Creosotado, produzido pela centenária Drogaria Granado, era mesmo aquela que aparece na propaganda, com “fartos elementos para a hygiene dos pulmões”: iodo, hypophosphito de sódio (NaH2PO2), e de cálcio [Ca(H2PO2)2]. Naquela época, como grande público tinha baixa escolaridade, os versos e a ilustração facilitavam a propagação do anúncio boca a boca.

Seu principal concorrente era o Biotônico Fontoura, criado em 1910 pelo médico Cândido Fontoura para sua esposa. Seu amigo Monteiro Lobato, que tomava o produto para combater o cansaço, batizou a fórmula exaltando suas propriedades e o nome do criador. O Biotônico ganhou muita fama por causa da Lei Seca dos Estados Unidos (1920-1933), para onde foi exportado e fez muito sucesso como remédio que podia ser comprado nas farmácias, mas que servia para aliviar a abstinência dos beberrões, por causa do teor de 9,5% de álcool. No Brasil, era usado como abridor de apetite das crianças, misturado com leite condensado e ovos de pata, um coquetel antianêmico. Em 2001, a Anvisa proibiu que produtos destinados às crianças tivessem qualquer quantidade de álcool em sua composição, razão pela qual o produto foi modificado, ganhando os sabores morango e uva, sem álcool, para as crianças. Rico em ferro, é vendido até hoje, por R$ 26.

A propósito do tipo faceiro, ilustre passageiro ao lado, era o caso do secretário de Comunicação da Presidência da República, Fábio Wajngarten, que viajou aos Estados Unidos com o presidente Jair Bolsonaro e seus familiares e está com coronavírus. Toda a comitiva presidencial — parentes, ministros, assessores civis e militares, parlamentares — fez exames ontem para saber se alguém mais foi contaminado. Fábio está em isolamento, depois de fazer novo exame em São Paulo; o resultado da contraprova confirmou a infecção. Bolsonaro, a primeira-dama Michelle e o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente da República, fizeram o teste no Palácio da Alvorada, residência oficial da Presidência da República, e não apresentam sintomas da doença.

Desdenhar do coronavírus é a mesma coisa que acreditar que o Rum Creosodato resolveria o problema dos pulmões, numa época em que a penicilina não havia sido descoberta e, por isso mesmo, não existiam antibióticos capazes de curar a tuberculose, e a pneumonia era quase fatal. Essa suposição é alimentada pela baixa letalidade da epidemia (entre 0,5% e 3,5% dos infectados), que atinge grupos de risco (cardiopatas, diabéticos e idosos). O problema é a velocidade da propagação da epidemia, que aumenta sua letalidade por causa da incapacidade de o sistema de saúde atender o crescimento exponencial de casos graves, que exigem entubação dos pacientes em leitos de UTIs.  Até a volta dos Estados Unidos, Bolsonaro tratava o assunto de forma até leviana, comparando o coronavírus a uma simples gripe e culpando a imprensa — sempre ela — pelo justificado temor que se disseminou na população, o que é muito diferente de pânico.

Escolhas
Trata-se de uma escolha de Sofia
(decisão difícil sob pressão e enorme sacrifício pessoal, como a vista no filme homônimo de 1982, que valeu a Meryl Streep o Oscar de melhor atriz), entre a redução das atividades da sociedade, principalmente as aglomerações e circulação das pessoas, com consequente redução da atividade econômica, ou o colapso do sistema de saúde, sem leitos, máscaras, tomógrafos, respiradores e outros equipamentos para quem precisa, provocando o aumento do número de mortos. A capacidade de reação dos países à epidemia é mais ou menos proporcional à envergadura de seu sistema de saúde, nível de esclarecimento da população e escala de medidas de contenção da epidemia por parte dos governos.


O caso da China proporcionou aos especialistas da Organização Mundial de Saúde (OMS) um estudo do comportamento da doença em diversas regiões do país, que está servindo de paradigma para o enfrentamento da epidemia, sobretudo depois do colapso do sistema de saúde da Itália, que é um dos melhores do mundo. As ruas desertas das cidades italianas escondem o drama terrível dos hospitais lotados, onde não se morre só de coronavírus, mas de câncer, ataque cardíaco, traumatismo craniano, pneumonia e até gripes comuns, por falta de leitos de UTIs.

O Brasil vai contratar 5 mil médicos pelo Programa Mais Médico e direcionar 2 mil leitos de UTI para o tratamento de pacientes com Covid-19 pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O secretário executivo do Ministério da Saúde, João Gabbardo, em entrevista coletiva, revelou que o nível de preocupação com leitos aumentou após registros dos casos na Itália. Ontem, em Florianópolis (SC), prefeitos das capitais e das principais cidades do país, se reuniram para discutir medidas de combate ao coronavírus. Ninguém se iluda, o sucesso no combate ao coronavírus precisa de medidas governamentais corajosas, dos prefeitos e dos governadores, para reduzir a velocidade de propagação da epidemia e contê-la, poupando vidas.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - Correio Braziliense


quarta-feira, 30 de março de 2016

Falta penicilina, sobra sífilis



A pequena bactéria Treponema pallidum é uma espiroqueta, de forma alongada, espiralada como a de um saca-rolhas, e move-se por ondulações. Ela é responsável pela sífilis, cuja incidência está aumentando no Brasil, ao contrário do mundo desenvolvido. Pode ser transmitida durante o sexo sem proteção, por transfusão de sangue ou da mãe para o bebê e é um grave problema de saúde.

No caso da gestante, o tratamento dela e do parceiro deve ser feito com a penicilina benzatina, o único medicamento capaz de tratar mãe e feto com eficácia e rapidez. No Brasil, de 2005 a 2013, o número de gestantes com sífilis passou de 1,8 mil para 21 mil.

Em 2016 deverão ser 22 mil casos. Os casos de sífilis congênita ‒ passados de mãe para bebê ‒ duplicaram em incidência, e a taxa de mortalidade quadriplicou em comparação a 2009. A contaminação da gestante pode levar à contaminação do feto, e, assim, a aborto espontâneo, parto prematuro, feto com crescimento retardado ou natimorto ou bebê com danos cerebrais e deformações diversas.

O diagnóstico materno é simples, basta os exames do pré-natal realizados de forma e frequência adequadas. O tratamento em geral são apenas duas doses de penicilina benzatina, a um custo de menos de 22 reais, ou pelo ecologicamente questionável Big Mac Index de dois sanduíches. Um medicamento barato e eficaz.

A penicilina é ainda usada para tratar a febre reumática aguda, doença bacteriana que afeta coração, cérebro e articulações. Mas temos enorme dificuldade para encontrá-la. Segundo um documento interno do Ministério da Saúde, inexistia penicilina em 60% dos estados no fim de janeiro.

A Sociedade Brasileira de Infectologia há anos alerta o Ministério da Saúde para o problema; omisso, ele aceita passivamente a justificativa dos laboratórios farmacêuticos privados de que o produto não é produzido pela falta de matéria prima e pelo seu baixo atrativo econômico. Já os nossos laboratórios públicos, como o Farmanguinhos, de qualidade internacional, não recebem o apoio que precisam para fabricar esse fármaco descoberto em 1938. O instigante livro “A verdade sobre os laboratórios farmacêuticos” http://www.scielo.br/pdf/csp/v24n6/29.pdf  explica como somos enganados.

O que esperar de um ministério imóvel? Por exemplo, diante do caso da fosfoetolamina, poderia ter evitado o enorme imbróglio jurídico que se seguiu, se tivesse uma política de pesquisa ágil, na qual nossos pesquisadores, biólogos, epidemiologistas e médicos pudessem agir sobre as demandas constantes. A recente aprovação pela Câmara Federal de projeto-de-lei para permitir sua fabricação e uso independente de qualquer pesquisa realmente científica será mais uma atitude contra a saúde da nação. Abrirá um precedente amoral.

Espero que este texto se torne “viral”, não uma “espiroqueta”, e dessa forma contribua para reverter o excesso de sífilis e a falta de penicilina.

Por: Alfredo Guarischi Alfredo Guarischi, médico, cirurgião geral e oncológico, especialista em Fator Humano, Organizador do SAFETYMED e do GERHUS alfredoguarischi@yahoo.com.br