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sábado, 15 de maio de 2021

Vacina parada? - Alon Feuerwerker

A Comissão Parlamentar de Inquérito da Covid-19 recebeu de presente por estes dias um novo filão para explorar: a interrupção do fornecimento, pela China, do insumo para a preparação da CoronaVac, do Instituto Butantan. O instituto já repassou ao Ministério da Saúde cerca de metade das 100 milhões de doses contratadas, mas agora cresce uma sombra a respeito da outra metade.

[as dificuldades atribuídas a um hipotético boicote das autoridades chinesas ao Brasil no fornecimento do IFA, motivadas por comentários feitos pelo presidente Bolsonaro, não encontram apoio nas versões oficiais do Itamaraty e na conduta dos chineses = o pensamento, assim como o desejo, dos membros da CPI tem valor ZERO.
Quem deveria ir para o tronco, seja Bolsonarista ou do grupo inimigos do Brasil  é quem comprou vacina de apenas dois fornecedores - Sinovac e Astra Zeneca - buscando depender apenas de um cesto de ovos, esqueceu = no mínimo, foi desidioso = de que os fornecedores são diferentes mas ambos fabricam o IFA em território chinês, e nossos amigos chineses são mestres na arte da burocracia. Ou seja, deixou o Brasil sujeito aos caprichos das autoridades da China.
Apenas um registro para esfriar a cabeça dos apressados na busca de culpados - informações de fácil comprovação "Como era absolutamente previsível, com cinco a seis bilhões de pessoas por vacinar e com os cinco países dos grandes laboratórios consumindo mais de 60% da produção em suas próprias populações, o imunizante é um bem escasso, não disponibilizado em ritmo adequado. Ainda assim, o Brasil consegue disputar o quarto lugar em número de doses adquiridas e aplicadas. Não é apenas de postos de trabalho, bens de consumo e matérias-primas que a pandemia gerou escassez.  
Vacinas também entram nesse cenário, mas o discernimento exigido para percebê-lo excede a capacidade de muitos militantes nas atuais corregedorias da opinião pública e entre os comissários da verdade." (Percival Puggina)

Há algum barulho sobre o dito tratamento precoce e sobre a cloroquina, mas é um terreno movediço para a oposição, visto haver largos segmentos da comunidade médica e importantes entidades profissionais que adotam e apoiam essa linha, ainda que sob a capa da autonomia do médico para receitar. E a história da tentativa de alterar a bula da cloroquina pode cair no vazio, porque não chegou a se concretizar. [só os idiotas acreditam que tal alteração seria possível; até o 'drácula' , senador integrante da Covidão, sabe que alteração de bula só pela Anvisa, mediante solicitação do fabricante do fármaco.] 

Já a vacina oferece um chão mais sólido a quem deseja arrastar o governo para o relatório final da CPI. O depoimento do executivo da Pfizer não deixou a administração bem, pois no mínimo ficou a impressão de ter faltado senso de urgência, de prioridade, em toda a tramitação. E agora, se a interrupção do fornecimento de insumo para a CoronaVac durar mais do que seria aceitável, abrir-se-á uma nova frente.

E qualquer pesquisa, ou mesmo a simples observação e o simples convívio com as pessoas, revela claramente a adesão popular e social às vacinas como meio de não pegar a doença e esperança de a vida voltar ao normal. E há um fator negativo adicional. Em vários locais Brasil afora as autoridades acabaram aplicando como primeira dose um imunizante reservado para a segunda. Por isso, pessoas que deveriam estar recebendo a segunda dose para completar o processo de vacinação ficarão a ver navios. Quem pagará o pato político? Em parte, as autoridades locais. [o povo  pode até ter o dedo podre na hora de escolher deputados e senadores, mas é sábio o bastante para perceber saber que QUEM PRIORIZA a distribuição das vacinas, as prioridades, são as autoridades locais, suprema decisão assim impôs. E, será mais um problema para a Covidão = não pode apertar muito as 'autoridades locais', elas são fáceis de abrir o bico.] Mas uma parcela da conta certamente irá para o governo federal e sua política exterior.

Alon Feuerwerker, jornalista e analista político


sexta-feira, 25 de dezembro de 2020

O país das carteiradas - Folha de S. Paulo

Hélio Schwartsman

Uma das explicações para o fracasso do Brasil é que ele é atávica e renitentemente corporativista

 Uma das explicações para o fracasso do Brasil é que ele é atávica e renitentemente corporativista. Em vez de as pessoas se pensarem como cidadãs de uma República de iguais, veem-se (e agem) como membros de corporações que se julgam detentoras de direitos especiais.

Tanto o STF como o STJ enviaram à Fiocruz ofícios em que pediam a "reserva" de alguns milhares de doses de vacinas contra a Covid-19 para aplicação em seus servidores. Mais espertos do que o grupo de promotores paulistas que tentara uma despudorada carteirada para a categoria furar a fila da imunização, os responsáveis pelos tribunais evitaram o uso de termos como "prioridade" e "preferência". Escreveram os ofícios de um jeito que ficava parecendo que receber as vacinas era uma espécie de sacrifício que as cortes fariam em prol da coletividade.

Felizmente, a Fiocruz, num raro exemplo de espírito republicano, rejeitou ambos os pedidos, enfatizando que toda a produção de vacinas será destinada ao Ministério da Saúde e que a fundação não estava reservando doses nem para seus próprios funcionários.

Como já escrevi aqui, não há um critério único para organizar filas éticas. Pode-se dar a prioridade aos mais vulneráveis ou aos mais expostos ou ainda proceder a diferentes combinações dessas duas lógicas. Só o que não faz sentido, em termos éticos, é dar preferência a grupos específicos pelo fato de eles terem mais prestígio ou mais poder de influenciar. As duas mais altas cortes do país deveriam saber disso e dar o exemplo. Lamentavelmente, preferiram a carteirada envergonhada.

A crer nas ideias de economistas como Daron Acemoglu e James Robinson, o que distingue nações que fracassam das que dão certo é o desenho de suas instituições. Quando elas servem primordialmente a elites extrativistas, o país naufraga; quando são inclusivas, o desenvolvimento chega. O corporativismo está matando o Brasil.

Hélio Schwartsman, jornalista - Folha de S.Paulo


domingo, 5 de abril de 2020

Não é porque o governo mandou - Alon Feuerwerker

Análise Política

A economia não é o conjunto das “coisas”. É preciso acrescentar as pessoas. Não é a reunião apenas das máquinas, matérias-primas, mercadorias e do dinheiro, nas suas variadas formas. É a reunião disso e, mais importante, dos seres humanos que estabelecem relações materiais de produção e troca no mercado.

Impor uma contradição definitiva entre “a saúde” e “a economia” tem utilidade para fins propagandísticos, é útil para criar mistificações políticas, mas traz um problema: supõe que a segunda pode ser analisada abstraindo aspectos subjetivos e até objetivos da força de trabalho.  Não à toa as modernas abordagens econômicas levam cada vez mais em conta os vetores subjetivos, que pedem equações mais complexas.

Qual será então o melhor caminho para evitar que a retração econômica trazida aqui, como em todo lugar, pela chegada da pandemia da Covid-19 vire um “L”, sem retomada vigorosa visível? 
O ideal seria o “V”, mas até um “U” vai ser aceitável. 

É melhor dar prioridade ao combate da pandemia ou deixar ela cobrar maior custo em vidas em troca de menos queda na atividade?

Quem defende esta segunda visão poderá argumentar que se toda a população britânica tivesse passado a Segunda Guerra Mundial escondida em bunkers era certo que teriam tido grande dificuldade para prevalecer contra o inimigo ao final. E o outro lado poderá contrapor que se todos tivessem morrido, também. Onde estará o ponto ótimo de equilíbrio na Covid-19?
Parece variar em cada país.

É bom observar o que acontece em Wuhan, o epicentro da epidemia na China. Aprender com os erros e acertos alheios é sinal de inteligência. Ali, após hesitações iniciais, as autoridades impuseram medidas duríssimas de isolamento social para conter o avanço da doença. Mas não esperaram a completa eliminação da circulação do vírus para tentar voltar a alguma normalidade.

Se é que algum dia se poderá, lá como aqui, falar ainda em “normalidade”.

O mais importante? A economia só reagirá mesmo quando as pessoas se sentirem novamente algo confiantes para retomar o papel de produtores e consumidores. Na Itália, fábricas que tentaram voltar prematuramente enfrentaram greves. E adianta pouco reabrir o comércio e os shoppings se a confiança do consumidor continua no chão.Ele simplesmente não comparecerá, ou não comprará.

Fica uma dica: as pessoas não estão em casa principalmente porque algum governo mandou. Estão em casa porque têm medo. A volta da confiança será função direta de acreditar que as autoridades reduziram bem os riscos à saúde, e são capazes de dar conta das tarefas que restam. Por isso, o maior entrave à retomada da nossa economia são a irracionalidade e a continuidade da guerra política. Que já deu o que tinha de dar.

Só observar: os danos à saúde e à economia provocados pela Covid-19 em cada país são função direta da desorganização política interna.
Deveria ser um alerta para nós.

Alan Feuerwerker, jornalista e analista político - Análise Política



segunda-feira, 27 de maio de 2019

Ministério da Justiça prepara compra de 106 mil pistolas a R$ 444 milhões


Armas serão usadas pela Força Nacional de Segurança Pública e pelas polícias civil e militar dos estados e do Distrito Federal


O Ministério da Justiça e Segurança Pública está preparando uma licitação para a compra de 106 mil pistolas calibre 9 mm para uso da Força Nacional de Segurança Pública e das polícias civil e militar dos estados e do Distrito Federal.

O valor total previsto para a compra é de 444,7 milhões de reais. De acordo com a pasta, o custo unitário de um conjunto contendo a arma com quatro carregadores, uma maleta e um kit de limpeza é de 4.165,67 reais, incluindo impostos.

O modelo preliminar do edital de licitação foi apresentado aos representantes de empresas do setor em uma audiência pública no último dia 9 de maio pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), órgão subordinado ao ministério.
Entretanto, o texto final do edital ainda não está concluído. O documento preliminar para a compra das armas foi revelado pelo jornal O Globo e confirmado pela reportagem de VEJA.

Os lotes serão divididos por região: 15.414 pistolas para o Norte, 29.117 para o Nordeste, 34.965 para o Centro-Oeste, 4.560 para o Sudeste e 22.480 para o Sul. Parte das armas será bancada pelo governo federal e outra adquirida pelas secretarias de segurança estaduais.

Como justificativa, o edital preliminar diz que a demanda foi observada a partir de uma pesquisa feita em 2018. A pistola foi classificada como o segundo item de maior prioridade na avaliação geral das instituições de segurança — tais como polícias militares, polícias civis, corpos de bombeiros e institutos de perícia.

Veja




sexta-feira, 1 de setembro de 2017

Ex-ministro Barbosa não quer ser esquecido

'Temer deveria ter tido a honradez de deixar Presidência', diz Barbosa

Ao Valor, ex-ministro afirmou que Brasil foi 'sequestrado' por 'políticos inescrupulosos' 

O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa, que nega ser candidato em 2018, afirmou que o presidente Michel Temer deveria ter tido a "honradez" de sair da Presidência, após virem à tona as gravações entre ele e o empresário Joesley Batista, um dos donos da JBS. Em entrevista ao Valor publicada nesta sexta-feira, Barbosa afirmou que não é possível comparar a gravidade dos fatos atuais com aqueles vividos pela ex-presidente Dilma Rousseff, alvo de processo de impeachment. — Eles (políticos) instauraram no Brasil a ordem jurídica deles, e não a das nossas instituições. O Brasil teve um processo de impeachment controverso e patético e o mundo inteiro assistiu. A sequência daquele impeachment é a que estamos vendo hoje. Não há parâmetro de comparação entre a gravidade dos fatos. Michel Temer deveria ter tido a honradez de deixar a Presidência — disse o ex-ministro.

De acordo com Barbosa, o país foi "sequestrado" por um grupo de políticos sem escrúpulos. Ainda segundo ele, em nenhum outro país do mundo o chefe de governo continuaria no cargo como Temer ficou após denúncias "tão graves" quanto as que foram feitas contra o presidente brasileiro.[denúncias não provadas - o próprio procurador-geral afirmou não ter provas.]


Nosso país foi sequestrado por um bando de políticos inescrupulosos que reduziram nossas instituições a frangalhos. Em nenhum país do mundo um chefe de governo permaneceria um dia sequer no cargo depois de acusações tão graves quanto aquelas que foram feitas contra Temer. O Brasil entrou numa fase de instabilidade crônica, da qual talvez só saia em 2018 — analisou.


CANDIDATO À PRESIDÊNCIA?
"Não, não sou."

BEM COTADO NAS PESQUISAS
"Não sei como são feitas essas pesquisas em que colocam meu nome, mas não sou hipócrita. Ando nas ruas, nos aeroportos e por onde vou as pessoas me abordam. Percebo que há esse potencial, mas não incentivo nem tomo qualquer iniciativa para alimentar isso."[não podemos esquecer que as pessoas ouvidas nas pesquisas são as mesmas que votaram em Lula e Dilma, portanto, são pessoas que quando usam  'titulo eleitoral' causam prejuízos ao Brasil.]

LULA CANDIDATO
"Acho que ele não deveria ser candidato. Vai rachar o país ainda mais. Já está em idade de usufruir da vida e do dinheiro que ganhou com suas palestras. Só que o estão empurrando para ser candidato, com essa cruzada que o coloca contra a parede. É um ódio irracional esse que apareceu no país."

MOTIVAÇÕES DE POLÍTICOS
"A principal causa é a corrupção, é a motivação número um para as vocações políticas no Brasil. O que motiva boa parte dos líderes é o acesso ao dinheiro. Por isso estão sedentos para reinstituir o financiamento privado."

PARLAMENTARISMO
"Essa gente é tão sem escrúpulo que vai tentar impor o parlamentarismo para angariar a perpetuação no poder e se proteger das investigações. Esse é o plano. Seria mais um golpe brutal nas instituições."

REFORMAS TRABALHISTA E DA PREVIDÊNCIA
"São reformas importantes, talvez não com essa visão ultraliberal que se quer implantar, que mexem no cerne do pacto social, mas é muito grave que estejam sendo conduzidas por um governo que não foi respaldado pelo voto." [não pode ser olvidado que os dois governos que levaram o Brasil para a crise atual, foram respaldados pelo voto, já que foram Lula e Dilma.]


REFORMA TRABALHISTA
"Tem muita velharia na CLT, mas há um certo desequilíbrio na ordem gerada, A democracia está baseada na ideia, sugerida por (Jean-Jacques) Rousseau de pacto entre as forças do trabalho e do capital. Esses dois polos têm suas instituições representativas. Não pode acabar com uma só."

FRAGILIDADE INTERNACIONAL
"O Brasil passa por um retrocesso institucional que se reflete em sua imagem externa. É um país incontornável, mas que está impedido de exercer seu papel internacional pela força da conjuntura triste pela qual passamos. É triste ver os grandes líderes mundiais evitarem o Brasil."

FALTA FÔLEGO AOS PROTESTOS ATUAIS
"Acho que os brasileiros estão cansados de tudo isso, da instabilidade e dessas manipulações indecentes que são feitas. As pessoas estão na luta pela sobrevivência. Afinal de contas, são 13 milhões de desempregados. A prioridade é sobreviver."

Fonte: O Globo

 

terça-feira, 21 de março de 2017

Isto, sim, é golpe! Contra o eleitor

O voto em lista fechada para deputados e vereadores é o sistema pelo qual o eleitor vota no partido, não mais no candidato

Dá-se por enterrada no Congresso a proposta de anistia para os políticos que usaram caixa dois. O que agora importa, e une os comandos da maioria dos partidos, é aprovar a ferro e a fogo o voto em lista fechada. E aumentar o volume de dinheiro público destinado a financiar campanhas.

O voto em lista fechada para deputados e vereadores é o sistema pelo qual o eleitor vota no partido, não mais no candidato. Caberá à direção de cada partido elaborar uma lista de candidatos em ordem de prioridade. Partidos com mais votos terão direito ao maior número de vagas.

Candidatos que encabecem as listas terão mais chances de ser eleitos. Assim, políticos em apuros com a Justiça poderão encabeçar as listas na tentativa de garantir o foro privilegiado, o que lhes garantirá o direito de só ser processados e julgados nos tribunais superiores.

Entenderam a jogada? Trata-se de um drible na Lava Jato que investiga centenas deles. Há pouco tempo, a maioria dos políticos suspeitos de cometer falcatruas defendia o foro privilegiado. Achava mais vantajoso ser julgados na primeira instância. A vida deles, ali, seria mais fácil.

Mas com a Lava Jato, com o risco de ser remetidos aos cuidados do juiz Sérgio Moro, mudaram de opinião. É justamente por isso que admitem com a maior desfaçatez que o voto em lista fechada poderá ter prazo de validade. Só seria aplicado às eleições de 2018 e à seguinte. O que se quer com o voto em lista fechada, dada às circunstâncias do país, é dar um golpe no eleitor.

 Fonte: Ricardo Noblat - Blog do Noblat - O Globo

sábado, 21 de janeiro de 2017

A prioridade é defender a Lava-Jato

Somadas, todas as manobras e mesmo medidas legais contra a Lava-Jato não resultam no impacto e no risco potencial para a operação decorrentes da morte do ministro do Supremo Teori Zavascki, em acidente aéreo ontem em Paraty.  Relator da Lava-Jato na Corte, destinatário de todas as acusações envolvendo pessoas com foro especial, Teori, para agravar o quadro, morre no momento em que entrava na fase final de análise dos cerca de 800 depoimentos prestados por 77 executivos da Odebrecht, inclusive Marcelo Odebrecht, preso em Curitiba, no maior e mais importante acordo de delação premiada feito na operação.

Por ser a maior empreiteira envolvida no esquema de corrupção, com ramificações no exterior, esses testemunhos são vitais para esclarecer o esquema e sua vinculação com petistas e peemedebistas, principalmente, e também com possíveis estilhaços sobre o oposicionista PSDB, o PP e outros partidos. O caso interessa inclusive a países latino-americanos em que a Odebrecht recebeu ajuda de Lula para ganhar concorrências, também lubrificadas por propinas.

Acusações de corrupção contra Lula devem ganhar forma com essas delações. O mesmo ocorre na questão do financiamento ilegal das campanhas políticas de Dilma Rousseff. É por tudo isso — e mais o que se perde sem a capacidade do ministro de tomar decisões sempre sustentadas em cortantes argumentos técnicos, num processo de profundas implicações político-eleitorais como este — que a Lava-Jato se torna a grande perdedora com a morte de Teori Zavascki.

É prioritário, portanto, na substituição de Teori na relatoria do caso, que a mesma linha de trabalho do ministro seja preservada. Por isso, de imediato, precisa ser afastada pela presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, e seus pares a possibilidade de o novo relator ser escolhido por sorteio. Não se pode jogar na roleta da sorte ou do azar assunto tão importante, com sérias implicações para o país. [o que pega é que um relator escolhido sempre carregará alguma suspeição.
Exemplo:
- dar a relatoria  ao sucessor do ministro traz alguns inconvenientes, entre eles de  que Temer,  citado na Lava-Jato em vários depoimentos,  poderia efetuar a indicação de alguém que concordasse  em 'esquecer' as citações; 
Quanto a escolher um novo ministro, entre os atuais, para relator, deixaria o autor da escolha e o próprio escolhido sob suspeitas.
Deixar por conta do sorteio é a maneira mais isenta de escolha.]

Fonte: Editorial - O Globo


terça-feira, 7 de junho de 2016

Salvar vidas é prioridade inegociável

Num quadro trágico, em que no país, em cinco anos, quase mil órgãos para transplantes foram perdidos, a FAB dá demonstrações de insensibilidade, priorizando voos para autoridades

No limite do que se pode definir como humanamente aceitável, mesmo que se chegue ao extremo de considerar que tudo é transigível, nessa construção, de resto exagerada, não entra o compromisso do ser humano com a vida — a própria e a do próximo. É um direito de todos os homens não passível de gradação, que se reveste de valor absoluto, inalienável, e que impõe a todos o dever de respeitá-lo em quaisquer circunstâncias. Ações que o firam ou omissões que o comprometam são condenáveis sob todos os aspectos.

Sob esse princípio, esforços da medicina para salvar vidas precisam ser valorizados e respeitados. Tal empenho, no entanto, faltou em não poucas oportunidades à FAB, quando solicitada a fornecer aviões para transportar órgãos que seriam usados em transplantes, procedimento médico que, em geral, demarca o limite entre a vida e a morte de pacientes que dele necessitam. 

O descaso tem números: em três anos, 153 corações, fígados, rins, pâncreas, pulmões e ossos foram perdidos devido a recusas da Força Aérea a ceder aeronaves para fazê-los chegar em tempo hábil à mesa de cirurgia. Analisados apenas pelo seu aspecto absoluto, estes dados se enquadram num painel em que a perda de órgãos é uma trágica realidade no país: de 2011 a 2015, a falta de transportes (em geral, e não apenas da FAB) para equipes médicas e órgãos já captados fez o sistema nacional de transplantes deixar de aproveitar 982 ofertas uma recusa de órgão a cada dois dias, devido a entraves logísticos.

É uma realidade cruel. Cada um desses órgãos representava a esperança de vida, de cura de alguma doença, de uma pessoa. Mas, no caso das recusas da FAB, há um aspecto que as torna ainda mais pungentes: nos mesmos dias em que deixaram em solo as ofertas salvadoras, aviões da Força Aérea fizeram 716 viagens de transporte de autoridades. Não há, no período, registro no sistema da Aeronáutica de recusas a pedidos de voos de membros da cúpula dos três Poderes, ao passo que, no caso das solicitações de ordem médica, as negativas aumentaram entre 2013 e 2015, de 52,7% a 77,5% dos pedidos feitos, revelou O GLOBO. À diferença do transporte de autoridades, não há legislação específica que obrigue a FAB a providenciar voos para conduzir órgãos. Também é preciso levar em conta dificuldades orçamentárias da Força, decorrentes da crise econômica do país, argumento da Aeronáutica para justificar as recusas. Mas, com vidas em jogo, manter-se inflexível leva a demonstrações de insensibilidade que poderiam — e deveriam — ser contornadas.

Menos mal que ontem, diante da repercussão da reportagem, o presidente interino, Michel Temer, anunciou que, por meio de decreto, a Aeronáutica ficará obrigada a manter um avião à disposição para equipes médicas e transporte de órgão. É uma iniciativa louvável, ainda que pontual. O país tem um sistema eficiente de transplantes, mas é preciso livrá-lo dos embaraços logísticos. O decreto precisa ser cumprido para valer.


Fonte: O Globo - Editorial