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segunda-feira, 17 de outubro de 2022

O PT coloca em prática o plano de amordaçar a imprensa - Revista Oeste

Paula Leal

A tentativa de censurar Oeste é mais um capítulo do projeto de poder do partido que não aceita qualquer tipo de crítica à legenda ou a suas lideranças 

Revista Oeste, censurada pelo TSE/STF | Foto: Montagem Revista Oeste 

Revista Oeste, censurada pelo TSE/STF | Foto: Montagem Revista Oeste  

Na semana passada, o PT e outros partidos siameses pediram a censura de 34 perfis no Twitter, entre eles o da Revista Oeste
A bomba foi anunciada por um veículo de comunicação, que fez questão de aplaudir a tentativa de amordaçar parte da imprensa, jornalistas e formadores de opinião
Sem ter acesso ao conteúdo da representação, Oeste buscou amparo jurídico para exercer seu direito de defesa. 
 A prática de não dar acesso integral ao processo, aliás, tem se tornado recorrente no Judiciário brasileiro
O maior exemplo é o inquérito das fake news, em que as partes não sabem nem por qual crime estão sendo acusadas.
 
O cerco contra a liberdade de expressão promovido pelo PT, contudo, não surpreendeu. Há muito o Partido dos Trabalhadores age com um modus operandi próprio:  
- a cúpula trabalha para provocar uma avalanche de ações judiciais e tentar estrangular o trabalho da mídia crítica à esquerda.  
Para ter uma ideia, por dia, o jurídico da campanha de Lula entra com uma média de cinco representações contra supostas fake news no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). “Toda a narrativa desse último pedido do PT pode ser resumida num argumento: o de que os perfis denunciados são relevantes e criticam a esquerda, razão pela qual deveriam ser calados”, diz o jurista Fabricio Rebelo.
 
Em campanha, Lula não se cansa de dizer que apoia a regulação da mídia eletrônica e da internet, que, para ele, se tornou uma “fábrica de fake news”. Mas o flerte com a repressão à imprensa não é novo
Entre 2009 e 2010, Lula tentou empurrar para os brasileiros um pacote autoritário de supressão de direitos. 
O petista lançou, por meio de decreto, o Plano Nacional de Direitos Humanos
Entre vários pontos polêmicos, o documento previa a regulação dos meios de comunicação, com a aplicação de multas e outras penalidades, como a suspensão da programação em casos de supostos abusos. 
Felizmente, meses depois, o então presidente teve de retirar ou amenizar questões controversas do decreto, em razão da forte resistência de setores da sociedade.

Inimigos do regime
A menos de 20 dias do segundo turno das eleições, o TSE já mandou remover ao menos cinco conteúdos divulgados por veículos jornalísticos desde 1º de outubro, um dia antes do primeiro turno das eleições. Como observa o jornalista J.R. Guzzo em recente artigo publicado em Oeste,STF e TSE fazem hoje o que bem entendem com o cidadão brasileiro, sem controle de ninguém — e isso inclui acima de tudo, neste momento, colocar Lula de novo na Presidência da República.
 
A lista do material censurado inclui uma entrevista à Jovem Pan, uma reportagem do portal R7 e outra de O Antagonista — reproduzida pela Jovem Pan num post também censurado — e uma publicação no perfil da Gazeta do Povo no Twitter
Em comum, todas as reportagens mencionam o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), associando o petista ao caso Celso Daniel, à ditadura da Nicarágua, à facção criminosa PCC e ao satanismo
A principal alegação do TSE é que os conteúdos repercutem fatos inverídicos. No caso da exclusão do post da Gazeta do Povo, que publicou notícias sobre a expulsão da rede CNN da Nicarágua, a Associação Nacional de Jornais tratou o fato como “censura”, e a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo manifestou preocupação com a medida, por colocar “o Judiciário na posição de decidir sobre o que um veículo jornalístico pode ou não publicar”. Nesta semana, pela segunda vez, o partido de Lula entrou com uma ação contra a reportagem da Gazeta do Povo Relacionamento entre Lula e ditador da Nicarágua está bem documentado. 
Além de tirar o texto do ar, o PT quer impedir o veículo de publicar novas informações sobre Lula e o ditador da Nicarágua, Daniel Ortega —, o que configura um claro pedido de censura prévia da imprensa.

As big techs têm hoje, com alianças estabelecidas com as agências de checagem, o poder de decidir o que é verdade e o que é mentira na imprensa mundial

No rastro da censura, ainda ontem ministros do TSE determinaram a retirada do ar de vídeos da produtora Brasil Paralelo que vinculam o ex-presidente Lula a esquemas de corrupção, quando governou o país. Os ministros entenderam, pasmem, que o conteúdo não é uma notícia falsa, mas, sim, trata-se de um caso de “desordem informacional”, que une argumentos verdadeiros para gerar uma “conclusão falsa”, seja lá o que isso signifique. “É a manipulação de algumas premissas verdadeiras, em que se juntam várias informações verdadeiras, que ocorreram, e que traz uma conclusão falsa, uma manipulação de premissas”, afirmou o ministro do STF Alexandre de Moraes, presidente do TSE, que deu o voto de desempate. Ou seja, é tudo verdade, mas se parte da premissa de que o brasileiro é ignorante, incapaz de entender a mensagem e precisa ser privado do conteúdo. Em nota, a Brasil Paralelo classificou o episódio como “inacreditável”. “O devido processo legal e a liberdade de expressão parecem ter sido abandonados neste caso”, informou a produtora.

Na tentativa de censura envolvendo Oeste, a Coligação Brasil da Esperança, liderada pelo PT, pede que o TSE acione o Twitter para “remover tuítes que veiculem notícias sabidamente inverídicas (fake news)”. No entanto, o documento não indica qual matéria ou publicação na plataforma de Oeste propagou conteúdo supostamente falso
Ou seja, não há como se defender sem saber exatamente qual acusação recai sobre o veículo. Para Alexandre Fidalgo, advogado de Oeste, o pedido viola diversos artigos da Constituição Federal, como a livre manifestação do pensamento, o direito de resposta e o exercício da liberdade de imprensa sem restrições.

Oeste nunca foi alvo de decisão do TSE sobre fake news”, argumenta Fidalgo. “Uma empresa jornalística devidamente registrada e séria não pode ser acusada da prática da chamada fake news.” O advogado destaca que, ao adotar tal postura, os petistas assumem estar cerceando a liberdade de imprensa. “Na verdade, o que lamentavelmente se assiste nas eleições de 2022 é a volta retumbante da censura”, afirmou. “No momento eleitoral, em que deveria ser mais valorizado o princípio fundamental da liberdade de imprensa, a atividade jornalística está sendo tolhida de todas as formas. A crítica e a revelação de fatos compõem o mister jornalístico e, ainda que desagradem a alguém, constituem direito fundamental em qualquer Estado Democrático de Direito.”

A petição assinada por Cristiano Zanin Martins e outros advogados usa o termo “rede de propagação de fake news” para listar os 34 perfis, como se todos estivessem reunidos de maneira organizada para tramar contra o PT. “A tática fica ainda mais poderosa tratando perfis como se fossem um bloco homogêneo: seria uma única ‘rede’ com um único cérebro”, diz Flavio Morgenstern, escritor e analista político. “Dá-se a impressão de ser uma quadrilha — ou ‘milícia’, como gostam.” De acordo com Morgenstern, o título da notícia publicada pelo portal G1 na sexta-feira 7 mostra que o portal tomou conhecimento do caso antes mesmo de todos os 34 citados na petição: PT identifica rede articulada de fake news com 34 perfis e vai o TSE cobrar ação no Twitter. “Na verdade, estão apenas acusando sem provas jornais e perfis que denunciam os desmandos do partido”, observa.

Entre os perfis listados consta o do advogado Emerson Grigollette. Ele advoga para vários nomes incluídos no documento e se diz preocupado com o caso. “O fato de eu ser advogado de vários investigados no inquérito das fake news quer dizer que estou cometendo crime?”, pergunta. “O advogado não pode atuar para mais ninguém da direita? Vejo como uma clara forma de intimidação.” Grigollette também se sente no escuro, como Josef K., protagonista o livro O Processo, de Franz Kafka, sem saber direito qual é o crime ou a irregularidade supostamente cometidos. “Já é jurisprudência pacificada no Superior Tribunal de Justiça que só é possível remover postagens específicas da suposta ofensa. No meu caso não indicaram nenhuma postagem”, explica. O advogado ainda destaca que a petição acusa, de forma genérica, o grupo de praticar fake news. “Mas fake news não é crime. Não existe essa tipificação no ordenamento jurídico. Não temos clareza em relação a essas alegações, a petição é muito subjetiva.”

Os policiais da informação
Para além das eleições, a sanha persecutória contra quem publica fatos na contramão da mídia tradicional não é de hoje. Oeste já foi alvo de agências de checagemfamosas por exercer o controle social da mídia e “checar” se a notícia está de acordo com seu próprio viés ideológico (ver reportagem “A polícia da informação”).  
Durante a pandemia, Oeste colocou em pauta e discutiu temas considerados tabus pela maior parte dos veículos de comunicação: o fracasso do lockdown, os remédios para combater a covid-19, o desenvolvimento de vacinas em poucos meses, os efeitos colaterais dos imunizantes. Sem critérios claros, os ditos checadores rotulam conteúdos que muitas vezes escancaram verdades incômodas e descortinam as falácias do universo “progressista”.

No ano passado, a Revista Oeste foi o primeiro veículo de comunicação a propor uma ação contra agências de checagem. Por enquanto, venceu todas as batalhas judiciais. “Tem todo direito o jornalista de informar fatos distintos de outro veículo jornalístico, e de discordar, debater ou contradizer o conteúdo de determinada matéria já publicada”, escreveu o juiz responsável pelo caso, em decisão que determinou que a agência de checagem Aos Fatos excluísse os textos em que classificava de fake news duas reportagens de Oeste. “Isso é absolutamente próprio de qualquer regime democrático.”

Curiosamente, big techs, como o Google e o Facebook, financiam parte do trabalho dessas empresas. As agências de checagem Aos Fatos e Lupa são associadas ao Facebook e abastecidas com verba do programa de apoio ao jornalismo da big tech
No ano passado, a agência Lupa anunciou ter sido o único site brasileiro selecionado pelo Google para receber parte dos US$ 3 milhões do fundo criado pela companhia em defesa da vacina contra a covid-19.
 
No pedido de censura encabeçado pelo PT contra os 34 perfis, os advogados reforçam que o Twitter, assim como o Google e o Facebook, firmaram um termo de cooperação com o TSE para conter “casos e práticas de desinformação”. E que por isso devem honrar o compromisso de remover conteúdos considerados “inverídicos”. 
 Os gigantes do mercado de tecnologia já são tradicionalmente conhecidos por financiar projetos ligados à pauta dita progressista. Olhando para o cenário da comunicação midiática, essas empresas têm hoje, com alianças estabelecidas com as agências de checagem, o poder de decidir o que é verdade e o que é mentira na imprensa mundial. O que é preocupante. “O que está em curso não é natural para uma campanha democrática, pois o propósito é calar as vozes críticas à esquerda, simplesmente por conta de sua divergência político-ideológica”, pondera o jurista Fabricio Rebelo.
 
Até o fechamento desta reportagem, o TSE ainda não havia se manifestado a respeito do pedido de censura do PT. Não se sabe qual será o desfecho do caso. 
Considerando as últimas decisões em desfavor de veículos de imprensa, o cenário não é animador. 
Mas Oeste seguirá firme no seu caminho jornalístico e independente de mostrar os fatos como os fatos são. O pacto honrado com nossos leitores permanece: ficar, sempre, do lado da realidade.

Leia também “Ditadura em construção”

Paula Leal, jornalista -  Revista Oeste

 

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

Quem é Alexander Dugin, o pensador que inspira Vladimir Putin - Gazeta do Povo

Tiago Cordeiro

Influência no Kremlin

Há duas décadas, o filósofo russo Alexander Dugin defende publicamente que a Rússia invada a Ucrânia. Por isso mesmo, desde 2006, sua entrada no país é proibida. Durante os conflitos de 2014, quando ativistas pró-Rússia lideraram protestos ao leste e ao sul do território vizinho, enquanto Moscou anexava a Crimeia, Dugin pediu a erradicação completa da identidade nacional ucraniana. Na época, ele se declarou desapontado com o fato de o presidente russo Vladimir Putin não ter aproveitado a oportunidade para realizar uma invasão completa.

Em 2022, enquanto a possibilidade real de um ataque militar frontal volta à pauta e Putin parece disposto a seguir, finalmente, a recomendação insistente de Dugin, o pensador russo mostra novamente o tamanho de sua influência sobre o Kremlin.

Nos discursos e nas atitudes do presidente, que governa a Rússia com mãos de ferro desde 1999, parece clara a disposição para cumprir o “destino manifesto” do país, na visão do pensador: formar um novo império, composto pelo Leste Europeu e pela Ásia, capaz de se contrapor, política, militar, econômica e culturalmente, à zona de influência dos Estados Unidos.

Esse plano se traduziria em uma espécie de nova União Soviética, não comunista, mas não necessariamente democrática, e aliada próxima da China. Para ele, os Estado Unidos representam e defendem uma série de valores que ele não considera naturais à humanidade, mas sim invenções do Ocidente, como o individualismo e os direitos humanos.

Frequentemente citado como o Grigori Rasputin de Putin, em referência ao místico que influenciou fortemente a família real russa no início do século 20, Alexander Dugin seguiu uma trajetória inconstante até se firmar como referência intelectual a partir da década de 90. Desde então, inspirou até mesmo a criação de um grupo de seguidores no Brasil, e protagonizou um famoso debate público com o filósofo Olavo de Carvalho.

Influência do nazismo
Nascido em Moscou, a 7 de janeiro de 1962, Aleksandr Gelyevich Dugin era filho de um militar e de uma médica. Com seis anos, foi batizado na Igreja Ortodoxa Russa – posteriormente, se tornou membro de um grupo que pratica a religião seguindo as regras anteriores a uma série de reformas realizadas nos ritos, entre 1652 e 1666.

Aos 19 anos, Aleksandr matriculou-se Instituto de Aviação de Moscou, mas não concluiu o curso. Acabaria realizando graduação e mestrado em filosofia, com dois PhDs, um em sociologia e um em ciências políticas. Aprendeu também, de forma autodidata, a falar italiano, francês, inglês, alemão e espanhol.

Na década de 80, participou de um grupo de ocultistas, os Yuzhinsky, que flertava com o satanismo. Começou a estudar religiões pagãs, especialmente as do Leste Europeu e da Ásia. Também adotou provisoriamente o pseudônimo de Hans Siever, em homenagem a Wolfram Sievers, ex-diretor da organização nazista Ahnenerbe, que nos anos 30 realizou pesquisas arqueológicas a fim de confirmar a suposta superioridade da raça ariana.

Siever também participou de experimentos com prisioneiros de campos de concentração e foi condenado à morte durante os Julgamentos de Nuremberg. Na época, Dugin dizia que era possível adotar do nazismo e do fascismo práticas válidas para resgatar a antiga grandeza do império russo.

Em 1992, já no cenário de desmonte da União Soviética, o filósofo atuou de forma decisiva na formação da Frente Nacional Bolchevique, cujo símbolo eram uma foice e um martelo dentro de um círculo branco rodeado por uma bandeira vermelha – o resultado, visualmente, era bastante semelhante à bandeira nazista.

O grupo ficaria conhecido por realizar protestos violentos em que os integrantes, muitas vezes munidos com granadas, propunham boicotes a produtos de origem ocidental. O filósofo continua, até hoje, a defender o uso da violência: para ele, o atirador norueguês, Anders Behring Breivik, que matou 77 pessoas em 2011, é um exemplo a ser seguido, porque representa um sintoma da decadência da civilização ocidental. “O fim está chegando para a Europa. Deixemos todo o multiculturalismo, a maçonaria e orgulho gay. Deixemos toda a sujeira da Europa acabar com ela. Quanto mais Breiviks, melhor”.

Após romper com o grupo em 1998, em 2001 Dugin participou da criação do Partido pela Eurásia. Em 2005, assumiu a frente da criação de um braço do partido para jovens – há anos ele advoga pela importância de formar lideranças desde a juventude. Em 2009, lançou o mais influente de seus muitos livros: A Quarta Teoria Política, que propõe a superação do liberalismo, do comunismo e do fascismo, pela ordem.

Ainda que Dugin e Putin não sejam vistos juntos, e o presidente russo sequer mencione nominalmente o filósofo, sua influência é clara sobre as ações do governo. Seu livro Fundações da Geopolítica é leitura obrigatória na Academia Militar do Estado-Maior Geral da Rússia. Ainda assim, a abordagem agressiva rende a Dugin algumas restrições em suas atividades. Depois de pedir o genocídio dos ucranianos em 2014, ele chegou a ser afastado de seu posto na Universidade Estadual de Moscou.

Relação com o Brasil
No Brasil, existe um grupo, fundado em 2015 no Rio de Janeiro, seguidor do pensamento de Dugin. Trata-se da Nova Resistência, que se define como “uma organização política de orientação nacional-revolucionária, composta por trabalhistas, distributistas, tradicionalistas, nacionalistas de diversas vertentes e adeptos da Quarta Teoria Política que defende uma resistência ampla e em vários níveis às políticas econômicas neoliberais, ao imperialismo atlantista, à agenda globalista e ao lobby sionista nas mídias e nos governos”.

A Nova Resistência é um reduto antiliberal e anticapitalista, afirma a entidade em sua página oficial. “Aceitamos uma certa diversidade de posicionamentos políticos, desde que estejam pautados em um antiliberalismo/anticapitalismo, político e econômico, que seja profundo e consistente”. Para o Brasil, a organização propõe “um Estado forte, economicamente soberano e politicamente independente, centralizado em relação a todas as questões estratégicas e de segurança nacional e descentralizado nas bases, em relação a maioria das outras questões”.

Constantemente comparado ao americano Steve Bannon e ao brasileiro Olavo de Carvalho, o filósofo russo chegou a protagonizar um debate com Olavo – que chegou a postar vídeos em que lê suas respostas ao colega. O brasileiro não concordava com as críticas de Dugin à civilização ocidental. A troca de réplicas e tréplicas, intensa, foi reunida num livro, Os Estados Unidos e a Nova Ordem Mundial. Quando Olavo faleceu, Dugin utilizou sua conta do Facebook para publicar uma foto de Olavo e Bannon.

Tiago Cordeiro - Ideias - Gazeta do Povo 

 

sábado, 30 de janeiro de 2021

Demônio para quem precisa - Revista Oeste

Guilherme Fiuza 

É ininterrupto o satanismo de 'vídeo game' contra o monstro do Planalto

Sem querer estragar o video game de satanismo contra o Lúcifer do Planalto, vamos dar uma olhada nas circunstâncias reais. Até porque Bolsonaro vai passar, como passaram Lula, FHC e outros (e se ficam por aí como almas penadas fazendo lobby pendurados em mordomias de ex-presidentes é outra conversa). É até compreensível que você precise de um Lúcifer cenográfico para vender a sua fantasia de resistência e dar substância ao seu placebo moral. Mas, sem querer cortar a onda, vamos falar um pouco da realidade que teima em subsistir por trás da sua  exuberante cenografia de revolução infantojuvenil.

Um presidente não é nada. No máximo é um símbolo. O que interessa para os que não têm tempo para indignação de video game são as ações de um presidente. Portanto, o seu governo. Não é fácil analisar um governo — nem mesmo os próprios presidentes são capazes de fazê-lo com a devida abrangência. Mas há os sinais principais de uma gestão, e aí se pode ter, desde que não se troque honestidade por panfletagem, uma boa pista sobre o que representa um presidente para o país.

Muitos achavam o candidato Bolsonaro um político caricato, aparentemente representando um segmento restrito e gerador de polêmicas. Normal. A maioria da população viu nele outra coisa — uma boa possibilidade de representação — e o elegeu presidente. Ponto. Ou melhor, vírgula. Era preciso então ver que tipo de representação seria essa. Olhar para o novo governo com honestidade. É o que muita gente continua se recusando a fazer, preferindo estacionar na caricatura pregressa do presidente. Vamos dar uma olhada na gestão do governo federal 2019-2020, falando baixo para não atrapalhar o fetiche sadomasô.

Problemas não faltam. No momento em que o Supremo Tribunal Federal age ostensivamente de forma política, sempre forçando o ambiente na direção das pautas demagógicas do petismo e congêneres (a maioria da Corte foi indicada por Lula e Dilma), Bolsonaro indica um ministro aparentemente afinado com essas diretrizes. É cedo para uma avaliação consistente, mas não é cedo para desconfiar de que foi uma má escolha.

O mesmo acontece em relação ao procurador-geral da República — aí ressalvando-se que o presidente tinha opções limitadas. Ainda assim, o procurador-geral por ele indicado investiu tão rápida e acintosamente contra a Operação Lava Jato, ao menos no discurso e nas ações iniciais, que se tornou absolutamente legítimo esperar más consequências dessa escolha.

Os líderes do governo no Congresso também foram escolhas duvidosas. Um quer porque quer parar tudo no meio do caos pandêmico para fazer uma Constituição nova. 
Outra saiu e aderiu ao satanismo de video game contra o monstro do Planalto. 
Mas nada é significativo nessa avaliação sem olhar para resultados. E o principal resultado na relação do governo com o Congresso é a aprovação em menos de um ano da reforma da Previdência — aquela que dez entre dez especialistas sérios diziam ser o passo essencial para o país reabrir seu futuro. E que uma vez aprovada passou a ser considerada por nove entre dez especialistas mais ou menos sérios como uma coisa trivial, caída do céu.

A reforma da Previdência não caiu do céu. Foi formulada e proposta pela equipe comandada pelo ministro Paulo Guedes (que também não caiu do céu), depois de ampla campanha de esclarecimento no Brasil e no exterior — ação geradora do apoio político fundamental para o prosseguimento de um projeto complexo e dependente de sacrifícios. Aí a reforma passou a ser negociada ponto a ponto com o Parlamento — o que realmente é de estranhar, em se tratando de um governo fascista diabólico. A resistência de video game ouviu falar de democracia, mas não ligou o nome à pessoa.

A relação com a maior parte da imprensa é péssima e o presidente faz questão de ser hostil a vários dos veículos de comunicação tradicionais. Também é fato que os referidos veículos enviesaram seu noticiário para descredenciar o presidente, chegando a insistir em teses bizarras como a da eleição fraudada por manipulação de WhatsApp. Ainda assim a liberdade de imprensa esteve em plena vigência nesses dois primeiros anos e o governo não exerceu nem incitou a embargos ou censuras. Sempre que apareceu de algum gueto referência a cerceamento de instituições — em alusões a medidas autoritárias como o famigerado AI-5 — o presidente desautorizou imediatamente, sem nenhuma brecha para interpretações indiretas. “Quem fala em AI-5 está sonhando”, disse Bolsonaro.

O governo teve o seu poder de comandar o enfrentamento da pandemia cassado pelo STF — que decidiu ser dos Estados da federação a autoridade pela política de segurança sanitária. Houve todo tipo de abuso, como o desvio de verbas emergenciais — o chamado Covidão, que acarretou o afastamento do governador do Rio de Janeiro e a prisão da secretária de Saúde do Amazonas. Claro que quando o colapso se consumou em Manaus a resistência cenográfica acordou para o problema e correu para o seu video game satânico contra o culpado por todos os males da nação.

Já o cronograma do programa de vacinação conduzido pelo Ministério da Saúde é bastante questionável, considerando que as vacinas disponíveis se encontram em fase experimental, sem ter por exemplo estudos suficientes com idosos (ver Anvisa) — justamente os mais vulneráveis e que justificariam uma campanha de imunização emergencial. O governo cedeu às pressões políticas em favor de vacinas incipientes.

Foram dois anos sem escândalos de corrupção envolvendo o governo federal. Como termo de comparação, só no primeiro ano de Dilma Rousseff foram seis — acarretando a queda do número equivalente de ministros. A grande imprensa fez um bom trabalho denunciando as negociatas, mas não transformou Dilma em alvo permanente. Um dos principais escândalos de 2011 envolveu o Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), atualmente recebendo um choque de gestão e transparência comandado pelo ministro Tarcísio Gomes de Freitas — uma das várias escolhas técnicas de Bolsonaro para o primeiro escalão.

Há incertezas sobre o programa de desestatizações — e o andamento da pauta de privatização da Eletrobras vai mostrar se o governo está firme nessa agenda (depois de mais de R$ 150 bilhões em ativos desestatizados) ou se está sendo travado pela máquina, o que seria uma derrota importante. É continuar observando o melhor possível, para apontar os erros e os acertos.

Não é um vídeo game. E, se você estiver em busca de estética, vá ver uma série e pare de sofrer.

Guilherme Fiuza, jornalista - Revista Oeste 

 

sexta-feira, 19 de junho de 2020

Mourão no radar - Eliane Cantanhêde

O Estado de S.Paulo

Queda de Weintraub não ‘baixa a bola’, pois as pontas contra Bolsonaro se juntam rapidamente

A pergunta não é mais onde está o Queiroz, mas onde está Jair Bolsonaro.

[Repetindo o mostrado no anterior: 
a torcida de alguns contra o presidente Bolsonaro é grande - só que maior era a contra a Alemanha, na Copa Fifa 2014, e os 7 a 1, ainda hoje causam dor.

Tem pessoas que sempre torcem pelos perdedores.
No caso torcer pelo general Mourão não há dúvidas que será ótimo para o Brasil - já que o presidente e o vice buscam o melhor para o Brasil, em termos da busca do Brasil forte, vencedor, assim,  será seis por meia dúzia.
Mas, para os inimigos do Brasil, os que agora combatem o presidente Bolsonaro, o general Mourão será um osso impossível de roer. Mais resistente às provocações - defeito do capitão que favorece aos que querem se livrar dele.
Continua valendo:  BRASIL Acima de todos! DEUS Acima de tudo!
Com Fabrício Queiroz preso, Frederick Wassef desmascarado, a pressão de STF, TSE, TCU, Congresso, Justiça do Rio e movimentos pró-democracia, a situação do presidente da República vai se tornando insustentável. Cresce o alívio em setores governistas que se decepcionaram com Bolsonaro e agora trabalham pela ascensão do vice Hamilton Mourão. Neste caso, estão militares da ativa e da reserva.[Collor sofreu pressão idêntica - menor da parte do Supremo,  cujos ministros naquela época evitavam falar fora dos autos, caiu. Bolsonaro não vai cair. Falta aos seus inimigos encontrar,  por não existir, o "Fiat Elba", que foi essencial para derrubar Collor, sustentando vínculos com a corrupção - embora tenha, tempos depois,  sido inocentado das acusações pelo STF.

Bolsonaro tem contra ele as 'acusações' sustentadas em ilações com outras também não provadas em relação aos acusados, ou seja NADA há contra o Presidente JAIR BOLSONARO. 
O que complica, temporariamente, a situação do presidente é seu temperamento explosivo, fala para pensar no dia seguinte e com isso fornece munição aos inimigos do Brasil.
E a catástrofe de todas as catástrofes está realmente na PANDEMIA. Mas esta vai passar e as mortes serão cobradas dos responsáveis pelas ações de combate ao coronavírus.]  O temor desses setores era de que o torniquete fosse do TSE e estrangulasse a chapa Bolsonaro-Mourão, mas o cerco contra Bolsonaro, filhos, advogado e apoiadores mais radicais se fecha não no TSE, que pode cassar a chapa, mas no Supremo, onde as investigações envolvendo bolsonaristas de todos os tipos levam diretamente ao presidente e não há nada contra o vice.Sem esquecer que as circunstâncias e a opinião pública começam a pressionar o Congresso, onde o alvo de um impeachment seria Bolsonaro, não a chapa, não o vice. Com as várias frentes que desembocam no presidente, não há Centrão capaz de segurar uma onda que vem de fora e pode chegar incontrolável ao Congresso – como nos casos de Collor e Dilma.

As pontas se juntam rapidamente: milícia, rachadinha, gabinete do ódio no Planalto, parlamentares, empresários e manifestantes golpistas, o tal Wassef... Sem currículo, sem casos expressivos, vira advogado e faz-tudo do presidente, esconde o Queiroz em casa e indica para ele o mesmo advogado de quem? Do capitão Adriano, o miliciano morto pela polícia numa operação, suspeita-se, de queima de arquivo.Tudo em torno de Bolsonaro é estranho. Tudo e todos. Como um cidadão como Wassef se aproxima, vira amigo da família, participa de posses e desfruta da intimidade dos palácios? Ligações com satanismo, ex-mulher processada por uma montanha de crimes, faixa pró AI-5 ao lado de bonecos do Scarface, poderoso chefão hollywoodiano. Pensem nos empresários, pastores, líderes partidários e gurus que integram esse círculo. Cada vez é mais difícil participar disso. Sérgio Moro que o diga.

Se a demissão de Abraham Weintraub do MEC é para restabelecer pontes do governo com o Supremo – ou “baixar a bola”, como dizia Mourão –, é tarde demais. Até porque a bola não está mais só no STF. O pedido para quebrar o sigilo bancário de parte da bancada bolsonarista foi da PGR. A decisão de prender Queiroz foi da Justiça do Rio.
Militares da ativa e da reserva, juristas renomados e personagens importantes de governos anteriores tentavam articular com ministros do Supremo uma espécie de trégua, encampando uma crítica recorrente de Bolsonaro: “Estão abusando”. Seria então a hora de dar um “refresco”, “um pouco de ar” para Bolsonaro.

Isso não seria exatamente a favor dele – considerado caso perdido –, mas para dar uma satisfação aos militares que estão no bloco dos cansados com o presidente, mas ao mesmo tempo convencidos de que o Supremo e a mídia extrapolam e há uma perseguição contra Bolsonaro. Os fatos, no entanto, se acumulam e mostram que nem há exagero nem perseguição, mas a constatação de que a eleição dele foi um erro. O País está à deriva em meio a uma pandemia devastadora.
Alerta o ex-presidente do STF Ayres Britto: “Numa democracia consolidada, não se pode impedir a imprensa de falar primeiro nem o Judiciário de falar por último”. O presidente e seus apoiadores, arrependidos ou não, precisam entender que não há “abusos” do Supremo. Há decisões com base na Constituição, a defesa implacável da democracia. E não há como dar um “respiro” nem “baixar a bola”, inclusive porque o Supremo é a parte mais visível, mas integra uma sólida resistência a um presidente que nunca assumiu de fato. Mourão está no radar

Eliane Cantanhêde, jornalista - O Estado de S. Paulo


domingo, 19 de janeiro de 2020

Goebbels na era digital - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Alvim sai, mas Bolsonaro fica e Goebbels, Bannon e Olavo continuam pairando no ar

[aceitem,  que dói menos: 

- com as bençãos de DEUS, Bolsonaro fica e em 2022 será reeleito, tendo como vice o ministro Sérgio Moro;

é o inevitável, aceitem, se unam à Cruzada em prol do crescimento do Brasil e ao retorno, engrandecidos, de valores hoje esquecidos, vilipendiados, desvalorizados e que são tão caros ao BRASILEIROS DE BEM.]

Poderia ter sido apenas uma papagaiada chocante, mas o que o secretário nacional de Cultura Roberto Alvim fez foi muito pior: uma performance bem construída e ensaiada. Ator e diretor de teatro, ele encarnou o gênio do mal Joseph Goebbels, plagiando seus textos e usando o mesmo cabelo, o mesmo olhar, o tom solene e, como fundo musical, a ópera preferida de Hitler. [atenção apreciadores de Wagner e óperas: a esquerda estúpida (existe outra?)tenta censurar os grandes mestres e suas épicas produções, mas,não vão conseguir.
O que tem que ser proibido, urgentemente é a 'foice e martelo' - símbolos do comunismo, que assassinou mais de 100.000.000 de pessoas.] censura imposta pela derrotada esquerda não

Poderia também ter sido um surto individual, um fato isolado, um ponto fora da curva, mas o arroubo nazista foi num habitat onde, vire e mexe, um protagonista acena com a volta do tenebroso AI-5 e o presidente Jair Bolsonaro se delicia fazendo loas aos ditadores sanguinários Pinochet e Stroessner. A própria trajetória de Roberto Alvim no governo já diz tudo. Ele foi premiado com o principal cargo da Cultura nacional por ter atacado Fernanda Montenegro como “sórdida” e “mesquinha”, convocado artistas para uma “máquina de guerra cultural” e planejado ceder espaços culturais para teatros evangélicos. Nomeado com carta branca numa secretaria de cultura jogada como estorvo no Ministério do Turismo, ele teve passagem tão rápida quanto devastadora. Na Fundação Palmares, um negro racista. Na Funarte, um terraplanista que identifica rock com drogas e satanismo. [os que discordarem ou tiverem dúvidas, dispam-se das ideias preconcebidas, dos preconceitos e escutem alguns clássicos do rock.] Na Casa de Rui Barbosa, alguém muito distante de ser personalidade e alheio aos meios acadêmicos. Na Biblioteca Nacional, um monarquista. Verdadeiro strike.

Pelos elogios feitos ao secretário, o presidente da República parecia bem satisfeito com esse desmonte macabro da Cultura, que é a alma de uma nação e um dos mais calorosos orgulhos brasileiros, mas acaba de atrair o Brasil para mais uma onda de manchetes vexaminosas pelo mundo afora. O culto ao nazismo foi parar nos principais jornais dos Estados Unidos, da Europa, da América Latina, aprofundando a deterioração da imagem do País no exterior às vésperas de mais um Fórum Econômico Mundial em Davos. Eu não queria estar na pele do ministro Paulo Guedes e dos integrantes da delegação brasileira. Vão ouvir poucas e boas. E o que responder? [acabaram com os que admiram o nazismo nos Estados Unidos? e os neonazistas da Europa, foram eliminados?
o problema no Brasil é que a maior parte dos formadores de opinião entendem que arte é ofender JESUS CRISTO, é espezinhar VALORES CRISTÃOS, desvalorizar a FAMÍLIA, incitar a DESORDEM, cultuar a concessão de direitos SEM  a contrapartida de DEVERES.]

A performance nazista de Roberto Alvim compõe bem um todo em que pululam noções muito particulares (ou falta de noção?) sobre meio ambiente, educação, política externa, direitos humanos e mídia, em que prevalece o culto às armas e o governador de um dos principais Estados defende um peculiar combate à criminalidade: “mirar a cabecinha do bandido e pou!”. [não estamos julgando a conduta do governador do Rio, apenas lembramos que ele e o Presidente Bolsonaro estão rompidos politicamente.] O resultado é que as cabecinhas na mira são outras, dentro de casa, na escola, no parquinho ou passeando com a avó nesse mesmo Estado: as das crianças. Todas negras e pobres.

No caso de Alvim, Bolsonaro, pelo menos, foi rápido no gatilho. Antes das 11h ele já havia decidido a demissão, sob pressão dos presidentes da Câmara, do Senado e do Supremo, de amplo arco político da esquerda à direita, de toda a opinião pública e até da embaixada da Alemanha. Mas o xeque-mate foi da comunidade judaica. Tal como Donald Trump, ele é daqueles: “Mexeu com Israel, mexeu comigo”. [Bolsonaro esqueceu que quem escolhe e nomeia ministros (é o que consta da Constituição Federal, condição inclusive já reconhecida pelo plenário do Supremo) é o Presidente da República.
Por óbvio,  quem tem competência constitucional para escolher o titular de um ministério, tem para escolher titulares de órgãos subordinados àquele Ministério.
Deveria tomar a decisão pela demissão - mesmo não havendo obrigação legal, o componente político tornava a exoneração aconselhável - mas, recusar e divulgar a recusa, opinião dos presidentes das Casas do Poder Legislativo e de nações estrangeiras.] 

A partir daí, começou outra tortura nacional: quem seria o sucessor ou sucessora? Veio o medo. Alvim sai, mas Goebbels, assim como Steve Bannon e Olavo de Carvalho, continua pairando sobre o governo Bolsonaro. E não apenas na Cultura, mas na área mais eficaz do nazismo: a propaganda. Nem “a guerra ao marxismo cultural” nem máxima de que “uma mentira repetida mil vezes vira verdade” foram demitidos. Continuam vivos, fortes, entranhados na alma do governo. Aliás, desde a campanha, quando o “gênios do mal” modernos conseguiram massificar como verdade a mentira de que só Bolsonaro derrotaria Lula e o PT. [até que provem o contrário, só JAIR BOLSONARO derrotou os citados;
no século passado, o condenado petista, perdeu também para Collor e FHC.]   Uma mentira repetida não mil, mas milhões de vezes. Goebbels reencarna na era digital.
Eliane Cantanhêde, colunista - O Estado de S.Paulo 


segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

Em discurso, presidente da Funarte exalta "fé no senhor Jesus" - O Globo

EXTREMISMO NA CULTURA

Bernardo Mello Franco

[O Estado é laico; 
mas,nada impede que uma autoridade em um discurso demonstre sua fé.
Ou apenas os aztistas podem pregar seu ateísmo vazio?
Cogitei de usar o termos autista, mas,iria ofender aos que são autistas por doença e não por incompetência.]


Reprodução


Os delírios do maestro
Numa fauna repleta de lunáticos e teóricos da conspiração, Dante Mantovani tem conseguido se destacar pelo exotismo. Não é pouca coisa. Antes de pousar no governo Bolsonaro, o novo presidente da Funarte fez questão de registrar seus delírios em vídeo. Num deles, associou o rock ao satanismo e ao aborto.
“O rock ativa a droga, que ativa o sexo, que ativa a indústria do aborto. A indústria do aborto, por sua vez, alimenta uma coisa muito mais pesada, que é o satanismo. O próprio John Lennon disse abertamente, mais de uma vez, que ele fez um pacto com o diabo”, divagou.
[cabem dois reparos às manifestações do maestro:
- se equivocou quando disse que a Terra é plana;
- esqueceu de incluir nas doutrinas satânicas o funk.]

Em outra gravação, o maestro disse que agentes soviéticos infiltrados na CIA distribuíram ácido para os hippies em Woodstock. Num terceiro vídeo, ele garantiu que a Terra é plana. Devia ser convocado para uma acareação com o ministro da Ciência e Tecnologia, que já foi ao espaço e viu o planeta de cima.  Até outro dia, as parvoíces de Mantovani eram problema dele e de quem o seguia na internet. Agora viraram problema do país, porque o olavista vai comandar políticas públicas e pilotar um orçamento de R$ 123 milhões anuais.

O maestro fez seu primeiro discurso na quinta-feira, em solenidade no Paço Imperial. Quem passou por lá relatou um clima de constrangimento e incredulidade.
“Estou responsável pela arte no governo federal”, começou Mantovani. Em tom pastoral, ele disse que o Brasil foi “abençoado por Deus desde o princípio”. Depois informou que o país teria sido “civilizado”, e não colonizado por Portugal.
“Devemos a nossa cultura, sim, a Portugal. E Portugal saiu para desbravar os mares, para levar a fé no nosso senhor Jesus Cristo. Precisamos lembrar que nós vivemos num país que tem origem cristã”, emendou.
No fim do discurso, o maestro disse que sua gestão ajudará a “elevar a moral e a autoestima, de modo que o nosso povo alcance voos cada vez maiores” (sic). 

Pareceu se referir à autoestima do povo, não à dele próprio. Criada em 1975, a Funarte chegou a ser extinta no início do governo Collor, em outro momento de perseguição às artes e à cultura. Agora se vê rebaixada à condição de playground de extremistas.Os desvarios de Mantovani preocupam servidores e ex-dirigentes do órgão. “O pessoal está bastante assustado”, conta o ator Stepan Nercessian, que presidiu a Funarte durante o governo Temer. “Aquilo pode virar uma coisa de louco. Vão ter que montar um departamento de efeitos especiais lá dentro”, ironiza.

O maestro terraplanista integra um time da pesada. Nos últimos dias, o governo entregou a Biblioteca Nacional, a Secretaria do Audiovisual e a Fundação Palmares a outros bolsonaristas de carteirinha. Todos recrutados pelo teatrólogo Roberto Alvim, que anunciou o plano de montar uma “máquina de guerra cultural” com verbas públicas. Na primeira chance, ele tentou contratar a mulher sem licitação.
“O problema não é ser reacionário. É uma questão de lucidez mesmo”, diz Nercessian sobre os novos gestores. “É uma coisa inacreditável. Não sabia que o ódio que eles sentem pelos artistas era tão grande”.

Bernardo Mello Franco, jornalista - O Globo


segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

'Rock leva ao aborto e ao satanismo', diz presidente da Funarte e União perde 24 mil servidores com freio nos concursos e aposentadoria recorde

O Globo

'Rock leva ao aborto e ao satanismo', diz presidente da Funarte

No YouTube, Dante Mantovani defende outras teorias da conspiração, como a de que soviéticos infiltrados na CIA distribuíram LSD em Woodstock

Maestro e agora presidente da Funarte, Dante Mantovani também é youtuber. No canal Dante Mantovani, com mais de 6 mil inscritos, o novo integrante do governo costuma tirar dúvidas sobre música erudita, mas  aproveita para praticar um dos esportes favoritos do YouTube: compartilhar teorias da conspiração . O canal continua no ar, ao contrário dos perfis de Mantovani em outras redes sociais, que foram excluídos na semana passada, diante do anúncio de que ele assumiria a Funarte.
Em um vídeo, por exemplo, o maestro, aluno do ideólogo de direita Olavo de Carvalho , endossa teorias de que agentes comunistas infiltrados na CIA foram responsáveis por distribuir LSD para jovens em Woodstock. O objetivo final, diz ele, seria destruir a família, vista como "base" do capitalismo. 

 Guinada ideológica : Conheça os novos secretários da pasta de Cultura de Roberto Alvim
 
"Existe toda uma infiltração de serviços de inteligência dentro da indústria fonográfica norte-americana que se não levarmos em conta, não vamos entender nada. A União Soviética mandou agentes infiltrados para os Estados Unidos para realizar experimentos com certos discos realizados para crianças. Esses agentes iam, se infiltravam e iam mudando, inserindo certos elementos para fazer engenharia social com crianças. Daí passaram para música para adolescentes", afirma ele, ao citar como exemplo o surgimento de Elvis Presley na década de 1950. 

Na sequência, Mantovani menciona Woodstock e diz que os Beatles "colocaram em prática as ideias da Escola de Frankfurt" , que segundo ele, queria destruir a cultura ocidental.

"Woodstock foi aquele festival da década de 60 que juntou um monte de gente, os hippies fazendo uso de drogas, LSD, inclusive existem certos indícios de que a distribuição em larga escala de LSD foi feita pela CIA. Mas como pela CIA? Tinha infiltrados do serviço soviético lá", diz o maestro, para em seguida concluir:"O rock ativa a droga que ativa o sexo que ativa a indústria do aborto. A indústria do aborto por sua vez alimenta uma coisa muito mais pesada que é o satanismo. O próprio John Lennon disse que fez um pacto com o diabo.”
Dante Mantovani
Presidente da Funarte
 
"O rock ativa a droga que ativa o sexo que ativa a indústria do aborto. A indústria do aborto por sua vez alimenta uma coisa muito mais pesada que é o satanismo. O próprio John Lennon disse que fez um pacto com o diabo."


Apesar da crença de que o rock leva ao satanismo, em vídeo de fevereiro de 2018 o youtuber disse acompanhar duas bandas do gênero: Metallica e Angra.
"Era uma banda brasileira que tinha grande preocupação com aspectos melódicos, tanto vocais quanto instrumentais, embora o ritmo fosse bastante frenético", avalia ele sobre o Angra.
Em outro vídeo, de dezembro de 2016, Mantovani critica o repertório musical da abertura das Olimpíadas do Rio e defende que "a verdadeira cultura" do Brasil é a música clássica de Heitor Villa-Lobos.
"Como apresentam numa abertura de Olimpiada aquelas aberrações sonoras que eu não tenho nem coragem de chamar de música!", reclama.
(...)
Procurado pelo GLOBO, Mantovani afirmou que estava indo para Brasília e que não poderia falar com a imprensa até quarta-feira, por recomendação do Secretário Especial de Cultura, Roberto Alvim. 

A nomeação do maestro para a Funarte saiu junto com a de Rafael Nogueira para a Biblioteca Nacional, conforme havia antecipado O GLOBO . Mantovani aparece em fotos nas redes sociais com Nogueira durante o 3º Simpósio Nacional Conservador de Ribeirão Preto, realizado em outubro, e é igualmente fã de Olavo de Carvalho.

Ele também faz parte da organização da Cúpula Conservadora das Américas — assim como Katiane de Fátima Gouvêa, nomeada na quarta-feira secretária do Audiovisual. Ainda é próximo de Camilo Calandreli, novo secretário de Fomento e Incentivo à Cultura , a quem já se referiu como "amigo-irmão". 

Ele se mostrou alinhado com seu futuro chefe, ao compartilhar, no último domingo, uma notícia sobre uma discussão da qual o secretário participou. "Este é o tom com o qual se deve falar com esquerdistas e comuno-globalistas; aprendam a lição com o mestre Roberto Alvim!", escreveu.

Globo Cultura

União perde 24 mil servidores com freio nos concursos e aposentadoria recorde

Estimativa é que o Executivo federal feche o ano com 613 mil funcionários com menor contratação desde 2001

 O governo fechará 2019 com o menor número de contratações de servidores em quase duas décadas. Até outubro, 9.784 funcionários haviam entrado no Executivo federal por meio de concurso público, segundo o levantamento mais recente do Ministério da Economia. Nesse ritmo, o total de ingressos este ano deve ser o mais baixo desde 2001. 

O número de servidores na ativa encolheu bem mais por causa do recorde no número de aposentadorias às vésperas da reforma da Previdência, promulgada no mês passado. Só nos primeiros dez meses do ano, foram 33.848. Assim, o saldo entre entradas e saídas de funcionários no Executivo federal está negativo em cerca de 24 mil trabalhadores este ano.


Em dezembro de 2018, havia 630 mil. A estimativa do governo é que o quadro de servidores ativos feche o ano em no máximo 613 mil com o menor ritmo de convocação de concursados de seleções já realizadas ainda válidas. Os dados compilados pelo GLOBO revelam o resultado da política de enxugamento do serviço público capitaneada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. Para especialistas, a baixa reposição é importante para racionalizar gastos com pessoal. Entidades ligadas aos servidores alertam, no entanto, para o risco de comprometimento dos serviços prestados à população.


Em 2018, a União nomeou 13.360 novos servidores. Para alcançar esse patamar este ano, precisaria contratar mais de 3.500 funcionários até dezembro. Isso significaria quase dobrar o volume mensal de ingressos registrado até agora. Não é o que o governo pretende.

Segundo o secretário de Gestão e Desempenho de Pessoal do Ministério da Economia, Wagner Lenhart, o plano é apostar em digitalização de serviços, remanejamentos, reformulação de carreiras e terceirização, com a contratação de mais funcionários temporários, para conter o peso da folha nas contas públicas:
— É um trabalho de ganho de eficiência e produtividade, uma mudança de perfil de profissional e também, como é de conhecimento de todos, consequência de uma restrição orçamentária que faz com que a gente tenha um cuidado ainda maior na hora de fazer contratações ou nomeações. 

Queda de 50% até 2030
O freio na contratação é uma das ações recomendadas por especialistas para reequilibrar o Orçamento. Há duas semanas, a Instituição Fiscal Independente (IFI), ligada ao Senado, projetou que o governo pode reduzir pela metade o total de servidores ativos, para 383 mil, se não repuser nenhum aposentado até 2030.


O órgão que mais perdeu gente em 2019 foi o INSS, que concede aposentadorias e outros benefícios a trabalhadores do setor privado. Até a última quinta-feira, 6.006 funcionários do órgão haviam se aposentado e só três haviam sido contratados. As saídas no instituto respondem por quase 20% de todas as baixas no funcionalismo federal neste ano. Com a debandada, o quadro de servidores na autarquia caiu de 29 mil para 23 mil.

Para evitar um apagão, o INSS recorreu à digitalização de serviços e remanejamento de pessoal dentro do próprio órgão. Hoje, dos 96 serviços prestados pelo órgão, 90 podem ser feitos pela internet ou pelo telefone.O número de funcionários dedicados apenas aos processos de pedido de benefício saltou de 2.751 para 6.686, mesmo com a redução no quadro geral.

Isso foi possível com a redução do pessoal em áreas menos essenciais, como a administrativa. Não faltam queixas dos usuários, mas Renato Vieira, presidente do INSS, diz que essa transformação está aumentando a produtividade do órgão. Em outubro, foram decididos 977 mil pedidos de benefício, 49% a mais que os 655 mil processados em janeiro. — Ninguém pode imaginar que, com menos servidores, a qualidade do serviço permaneça igual se nenhuma medida for tomada — diz Vieira.

Sindicatos criticam
A falta de contratações em outras áreas preocupa sindicatos ligados ao funcionalismo federal. Segundo Kléber Cabral, presidente do Sindifisco, que representa auditores da Receita Federal, o último concurso público para o órgão foi realizado em 2014.
— Em 2007, éramos 12 mil auditores fiscais. Hoje, pouco mais de 8 mil. A Receita está fechando unidades, delegacias e agências, não apenas por questões de restrição orçamentária, mas também por falta de pessoal. A galinha dos ovos de ouro vai acabar morrendo de fome — critica.

Maurício Porto, presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Federais Agropecuários (Anffa), reclama da dificuldade de convocação dos concursados aprovados em 2017. A seleção habilitou 547 candidatos, dos quais 247 foram para um cadastro de reservas. No último dia 21 de novembro, o Ministério da Agricultura recebeu autorização para nomear 100 desses aprovados, mas a categoria considera a reposição insuficiente.

Tramitação: Maia diz que, se tiver aval de juristas, Câmara vai enviar proposta para mudar regras do funcionalismo
— Hoje temos 2,5 mil fiscais em atuação, e o ideal seria 4 mil. É uma situação bastante crítica e um limitante para o crescimento do agronegócio e das exportações brasileiras — argumenta Porto.

Procurada, a Receita informou que a decisão sobre concursos cabe ao Ministério da Economia. A pasta disse que novos concursos estão suspensos e que a prestação de serviços à população não será prejudicada.
O Ministério da Agricultura, por sua vez, reconhece que há déficit de pessoal e informou que vem buscando reposição de 545 auditores fiscais agropecuários que se aposentaram entre 2017 e outubro deste ano.
"O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento vem buscando reposição de pessoal junto ao Ministério da Economia. Das solicitações realizadas, foi autorizado concurso público para 300 vagas de Auditores Fiscais Médicos Veterinários em meados de 2017, com posse dos concursados em julho de 2018. E agora o Governo liberou a nomeação de mais 100 Auditores Fiscais Médicos Veterinários deste concurso. Esses candidatos deverão ser nomeados ainda este ano", disse a pasta em nota. 

O Ministério informou ainda que também investe em digitalização com acoes como a solicitação online Certificado Veterinário Internacional (em parceria com o antigo Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão), a simplificação do processo de exportação de bebidas e do Cadastro Geral de Classificação de Produtos Vegetais e o registro automático de produtos de origem animal, de bebidas e de fertilizantes.

Na avaliação do economista Raul Velloso, especialista em contas públicas, há espaço para cortes no funcionalismo e redução de gastos. O impacto fiscal de aposentados é baixo, porque eles continuam na folha de pagamento como inativos, mas a redução dos concursos tem efeito no longo prazo.— Existe um trabalho para reduzir (o quadro) sem perder eficiência. A sensação é de que tem muita gente sobrando — diz Velloso.

Uma portaria editada pelo governo em julho do ano passado flexibilizou as regras para transferências de funcionários entre órgãos e estatais, liberando os deslocamentos sem a necessidade do aval do órgão de origem do funcionário. Para Lenhart, da secretaria de Gestão, todas as medidas de contenção da folha têm como objetivo reforçar uma mudança de cultura no funcionalismo: — Havia uma cultura de olhar para a trás e não para a frente quando vai fazer concurso público. Se tinha uma carreira com 600 vagas e 200 saem, a tradição era pedir mais 200. Só que isso não significa que você vai conseguir atender aos desafios do futuro. 

Impacto nos 'concurseiros'
A política do governo de reduzir a folha de pessoal deve causar incerteza para quem está no chamado cadastro de reserva dos concursos. A contratação desses candidatos está sujeita a regras mais duras desde março deste ano, quando um decreto limitou os poderes dos órgãos de convocar. Os concursos têm validade de dois anos, prorrogáveis por mais dois. Os editais determinam o número de vagas a serem preenchidas. Aprovados num concurso de 200 vagas, por exemplo, vão para a reserva a partir da posição 201.

Até março, o Ministério da Economia podia autorizar que órgãos convocassem até 50% mais que o previsto no edital. Agora, só 25%. Mas, segundo o secretário de Gestão, Wagner Lenhart, o plano do governo é não ir além das vagas previstas nos editais, contemplando apenas os que têm direito adquirido. O governo não tem estimativa de quantos estão nas duas situações. Cada órgão tem sua estatística.
A queda no número de contratações já colocou em alerta o mercado voltado para os chamados “concurseiros”. O advogado Marcos Kolbe, sócio de um escritório especializado, diz que a demanda por nomeações na Justiça aumentou: — O escritório este ano voou. O problema é que existem vagas, mas estão precarizadas com temporários. Hoje, 70% dos processos são sobre isso.

O quadro forçou uma readaptação nos cursinhos. Segundo Arthur Lima, sócio do Direção Concursos, candidatos têm migrado para outras áreas do serviço público, como a Justiça. Ele lembra que seleções como a do INSS, que não ocorreu este ano, costumam atrair até 1 milhão de pessoas: — Houve de fato diminuição no Executivo federal. O concurseiro precisou olhar para outras oportunidades. Um exemplo foi o concurso do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. O número de inscritos na seleção deste ano dobrou em relação ao último, de 2014.

O Globo - Economia