Número
representa 30% do total de brasileiros em prisões fora do Brasil, diz Itamaraty
Além do brasileiro
Marco Archer Cardoso Moreira, cuja execução por tráfico de drogas ocorreu
sábado, pelo menos outros 962
brasileiros estão presos no exterior pelo mesmo crime. O balanço foi
divulgado pelo Itamaraty, com base em dados de dezembro de 2013. O número
representa 30% dos 3.209 brasileiros em prisões fora do país.
O número de
brasileiros presos, cumprindo pena ou aguardando julgamento no exterior flutua
entre 2.500 e 3.000 pessoas (Thinkstock
Images/VEJA)
Moreira
foi condenado na Indonésia, e os dois pedidos de clemência apresentados foram
negados. Um novo apelo foi feito nesta sexta-feira pela presidente Dilma
Rousseff em conversa telefônica com o presidente indonésio, Joko Widodo, que se
recusou a suspender a execução.
Na
Indonésia há ainda outro brasileiro no corredor da morte por tráfico de drogas,
o
paranaense Rodrigo Muxfeldt Gularte. Além da Indonésia, há outros países nos quais todos os brasileiros presos foram
condenados por tráfico: Turquia (45 brasileiros), África do Sul (36),
Austrália (seis) e China (quatro), além de Cabo Verde, Catar, Jordânia, Líbano,
Moçambique, Nicarágua, Nova Zelândia, República Dominicana, Singapura e
Tailândia, cada um com entre um e três brasileiros presos. A maior quantidade de brasileiros presos por
causa desse tipo de crime está na Europa, com 496, ou 44%, de um total de
1.108. Eles são 150 na Espanha, 118 na Itália, 76 em Portugal, 45 na França, 45
na Turquia, 36 na Alemanha, treze na Bélgica e treze no Reino Unido.
Américas
– Na América do Sul, são 128
brasileiros presos por envolvimento com drogas no Paraguai, 48 na Bolívia, 34
na Argentina, 23 no Peru, dezessete na Venezuela, catorze na Colômbia e doze no
Uruguai. Na América Central, dos dezoito brasileiros presos, seis foram
acusados de tráfico de drogas. Na
América do Norte, são catorze presos por tráfico nos Estados Unidos e um no
México, entre mais de 700 tipos diferentes de delitos.
Na África, todos os quarenta brasileiros
presos no fim de 2013 respondiam por envolvimento com drogas. Na Ásia, a proporção é de 26%, com 110
dos 417 brasileiros presos, sendo que 101 respondiam por tráfico ou porte de
drogas somente no Japão. No Oriente
Médio, de vinte brasileiros presos, dez o foram por envolvimento com
drogas. Na Oceania, nove dos treze
detidos (69%) o foram pelo menos motivo.
Assistência
psicológica – Os demais brasileiros presos no
exterior respondem a crimes leves ou pesados, como situação migratória
irregular, falsificação de documentos, desacato, roubo, fraude, dano material,
violência doméstica, porte ilegal de armas, formação de quadrilha, tráfico de
pessoas, latrocínio, garimpo ilegal e até suspeita de atividade terrorista.
Entre os
3.209 brasileiros em prisões estrangeiras no fim de 2013, os registros mostram que 2.459 são homens, 496 mulheres e 36
transexuais. Os 218 restantes não foram especificados. Apesar de presos,
pelo menos 1.421 ainda aguardavam julgamento. O Itamaraty afirma prestar
assistência psicológica e jurídica aos presos, o que
não inclui pagamento de honorários dos advogados. No caso de Marco
Archer, o acompanhamento psicológico ocorre desde 2012, quando sua situação
piorou, após a recusa dos dois pedidos de clemência a que tinha direito.
Segundo o Itamaraty, no fim de 2010,
existiam 2.659 brasileiros encarcerados em alguma parte do globo.
Entre os sentenciados, dois estão condenados à
morte [resta um, já que um dos condenados foi executado anteontem.]
João Paulo
Escudeiro de Mauro, 20 anos, é piloto de corridas. Ricardo Costa, 39, é modelo.
Rodrigo Moreto Cubek, 30, é advogado. Rodrigo Gulart, 37, é surfista - condenado à morte na Indonésia e deve ser executado em fevereiro/2015; . Marco
Archer Cardoso Moreira, 48, é instrutor de voo livre - tinha 53 anos e foi executado anteontem; Luiz Antonio Scavone
Neto, 20, é estudante. Esses seis brasileiros têm algo em comum. Todos estão ou
estiveram presos em países estrangeiros. Segundo o Itamaraty, no fim de 2010,
existiam 2.659 brasileiros encarcerados em alguma parte do globo. Entre os
sentenciados, dois foram condenados à morte.
Enquanto
Ricardo Costa prepara a volta ao Brasil depois de mais de 1.100 dias preso sem
julgamento nos Estados Unidos, dois novos casos ganharam as manchetes dos
jornais em janeiro deste ano. Durante um cruzeiro do Allure of the Seas, o
maior transatlântico do mundo, Luiz Antonio Scavone Neto foi detido em
território americano sob suspeita de ter estuprado uma garota de 15 anos. A
adolescente, nascida nos Estados Unidos, relatou à polícia ter sido forçada a
manter relações sexuais com Scavone e com outro brasileiro menor de idade numa
das cabines do navio. No último dia 19, João Paulo Escudero Mauro acabou preso
em Miami acusado de dirigir sob a influência de entorpecentes, homicídio
culposo e posse de cocaína. Todos juram inocência.
De acordo
com o Itamaraty, o número de brasileiros presos, cumprindo pena ou aguardando
julgamento no exterior tem flutuado nos últimos anos entre 2.500 e 3.000
pessoas. Entre os países com maior quantidade de brasileiros detidos estão a
Espanha (465), Portugal (256) e Estados Unidos (243). Nos EUA e na Europa, um
dos crimes mais comuns é “situação imigratória irregular”. Nos países vizinhos
da fronteira norte do Brasil, principalmente na Guiana Francesa “atividade
ilegal de garimpagem”. Só em Caiena, capital da Guiana Francesa, existem 114
brasileiros detidos.
Garimpo
ilegal - Na Guiana
e no Suriname, embora não sejam presos por garimpo ilegal, a maior parte dos
detentos cometeu crimes vinculados a essa prática, como contrabando de combustível, tráfico de mercúrio e homicídios. "O garimpo é uma atividade
extremamente violenta e normalmente envolve dezenas de outros crimes",
explica Luiza Lopes da Silva, diretora do Departamento Consular e de
Brasileiros no Exterior do Itamaraty. Na primeira vez em que são flagrados pela
Justiça, essas pessoas são deportados para o Brasil. Da segunda em diante,
ficam alguns meses detidas, o que faz com que muitas usem identidades falsas,
dificultando o trabalho dos diplomatas brasileiros.
"A
detenção máxima na Guiana Francesa é de três anos", revela Luiza. "A
intenção deles não é manter essas pessoas na prisão e aumentar o contingente
carcerário, mas mandá-las o mais rápido possível de volta para o país de
origem". De acordo com Luiza, esse crime tem se mantido estável nos
últimos anos. Na Venezuela, entretanto, onde era bastante comum, praticamente
desapareceu. "A polícia venezuelana militarizou as regiões de garimpo,
coibindo a prática", diz Luiza. Moradores dos estados do Amapá, Pará ou
Amazonas, os garimpeiros são homens, de uma classe social baixa.
Acima
dessas particularidades regionais, a acusação que lidera o ranking é a de
tráfico de substâncias ilícitas, normalmente cometido por homens, com idade
entre 18 e 35 anos, sem antecedentes criminais. São os chamados mulas. Os
países onde os brasileiros mais cometem esse delito estão na Europa e na
América do Sul. As cidades campeãs em número de detentos são Ciudade del Este
(75) e Pedro Juan Caballero (79), no Paraguai, Buenos Aires (128), na
Argentina, Lisboa (250), em Portugal, Roma (65) e Milão (94), na Itália, e
Madri (300) e Barcelona (141), na Espanha – muitos brasileiros também estão
presos na Espanha por falsificação de documentos e violência doméstica (a
legislação local sobre o tema é bastante rígida).
"As
mulheres também cometem esses crimes, mas os homens ainda são maioria",
afirma Luiza. "Esses chamados mulas são atraídos por promessas de dinheiro
fácil e enxergam nisso uma possibilidade de conseguir recursos para começar uma
nova vida num país estrangeiro. De 10 mulas, só um é pego. Já que normalmente
não têm antecedentes criminais, eles costumam alegar que não sabiam que estavam
portando drogas". Esses presos raramente ganham notoriedade. Os casos que
costumam ganhar visibilidade envolvem algumas particularidades (veja galeria
abaixo).
Pena
capital - Na
categoria "narcotráfico" se enquadram Marco Archer Cardoso Moreira,
hoje com 48 anos, e Rodrigo Gularte, 37, condenados à morte na Indonésia por
tráfico de drogas. Moreira foi preso em 2003 e, Gularte, em 2005. O primeiro
transportava 13,4 quilos de cocaína numa asa delta. O segundo, 6 quilos da
droga em pranchas de surfe. Pedidos de clemência do então presidente Luiz
Inácio Lula da Silva e da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados
não comoveram o presidente indonésio, Susilo Bambang Yudhoyono.
Também
condenado por tráfico de drogas, Rogério Paez, 54, ficou encarcerado na
Indonésia por oito anos, antes de ser solto em 2011. Parado numa blitz em Bali,
onde morava fazia 10 anos, foi preso por causa de um cigarro de 3,8 gramas de
haxixe. Engenheiro civil, fluente em oito idiomas, Rogerinho Rock’n’roll – como
era conhecido nas areias de Niterói, sua terra natal – afirmou em entrevistas
que foi salvo pelo budismo, religião a qual se converteu quando já estava atrás
das grades.
Ricardo
Costa, preso em Sedona, no estado do Arizona, em 19 de dezembro de 2008, foi
acusado pela ex-mulher de abusar sexualmente dos próprios filhos. Ele ficou
mais de 1.100 dias atrás das grades, sem julgamento. A fiança, que só poderia
ser paga em dinheiro, foi estipulada em 75 milhões de dólares – uma das maiores
da história dos EUA. Michael Jackson, por exemplo, acusado do mesmo crime,
pagou 3 milhões de dólares para recuperar a liberdade.
O
reencontro - Embora
ignore o dia, a hora e o local, Cristina Costa, mãe de Ricardo, espera abraçar
o filho antes do Carnaval. “Eles dizem que não podem revelar os detalhes por
uma questão de segurança”, diz ela. “Sei apenas que ele será deixado em solo
brasileiro. Pode ser em Porto Alegre, ou em Manaus, de manhã, ou à noite”. O
Itamaraty só admite que Ricardo estará no Brasil “nos próximos meses” (o
Ministério das Relações Exteriores evita aprofundar-se em casos específicos
“para preservar a privacidade dos cidadãos envolvidos”).
O
pesadelo de Ricardo começou durante uma audiência do processo de divórcio com a
ex-mulher Angela Denise Martin. Cristina e o pai de Ricardo, Sérgio de Souza
Costa, testemunharam a chegada dos policiais incumbidos de capturá-lo. A
denúncia se baseou na palavra da psicóloga Linda Bennardo, que na época atendia
os três filhos do casal. Segundo Linda, as crianças descreveram os crimes durante
as sessões de psicoterapia. Meses depois, a terapeuta foi acusada pela entidade
que regulamenta a profissão no estado de induzir pacientes menores de idade a
mentir, declarando-se vítimas de abuso sexual. Ela renunciou à profissão antes
que fosse formalmente proibida de exercê-la. Mesmo alegando inocência, Ricardo
continuou preso.
O
imbróglio jurídico se estende desde então. A família de Ricardo acredita que a
demora excessiva do julgamento do caso pela Justiça americana resulta da
ausência de provas e dos equívocos processuais. “Conceder a liberdade era o
mesmo que confessar que mantiveram um inocente preso por anos”, afirma
Cristina. “As irregularidades começaram no momento em que detiveram meu filho e
se estenderam durante todo o processo, que passou pelas mãos de cinco juízes e
cinco promotores. Ninguém queria assumir essa culpa”. Ricardo recusou dezenas
de acordos que, em troca da confissão e do completo afastamento dos filhos,
garantiriam a liberdade e a deportação para o Brasil.
A
campanha pela soltura de Ricardo mobilizou o Itamaraty, a Secretaria de
Direitos Humanos, embaixadores, senadores e deputados. “Recebemos toda a ajuda
possível”, agradece Cristina. “Não somos de família influente, não temos
pistolão e mesmo assim a solidariedade e o apoio foram totais”.
Relações
exteriores - Conforme
explica o Ministério das Relações Exteriores, as autoridades consulares começam
a agir assim que são comunicadas oficialmente das detenções. O primeiro passo é
entrar em contato com a Divisão de Assistência Consular do Itamaraty e visitar
o preso para verificar sua condição física e psicológica. Caso seja autorizado
pelo detento, o Itamaraty entra em contato com os familiares. “Alguns presos
pedem que a detenção não seja informada, ou que alguns dados relativos à acusação
não sejam divulgados, o que é respeitado”, afirmou o ministério, em nota. “A
partir daí, a atuação da autoridade consular depende dos dados concretos de
cada ocorrência. No entanto, a assistência consular tem como diretriz
acompanhar os casos de que o consulado toma conhecimento, sempre buscando se
certificar de que os direitos dos brasileiros estão sendo respeitados”. Os
parentes podem apelar para a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos
Deputados.
Segundo
Luiza Lopes, o Itamaraty sempre procura transferir o preso de volta para o
Brasil. Dependendo do país onde estão detidos, entretanto, alguns preferem não
retornar. "Na Escandinávia, na Austrália e na Nova Zelândia, por exemplo,
eles têm estudo e trabalho de qualidade na prisão", conta. "No Paraguai
a situação é diferente. Muitos querem continuar por lá porque já respondem a
crimes, as vezes mais graves, no Brasil".
Apesar da
atuação ser condicionada às leis de cada país, bons advogados podem ter papel
determinante para que o caso chegue com mais rapidez a um final feliz. O
empenho das autoridades brasileiras também pode ajudar bastante, como atesta o
exemplo de Ricardo Costa. Nem sempre dá certo, como comprovam os casos de
Cardoso Moreira e Gularte. As muitas tentativas fracassadas não diminuíram as
esperanças. Eles ainda acreditam que podem converter em prisão perpétua a
condenação à morte.
Com Agência Brasil