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sábado, 18 de novembro de 2023

Por miopia, ignorância e preconceito, esquerda apoia ditaduras - Carlos Alberto Sardenberg

sexta-feira, 10 de novembro de 2023

Casos de antissemitismo e de islamofobia triplicam com guerra Israel-Hamas

Fúria e ressentimentos são continuamente atiçados e se espalham pelo mundo. A solução só virá quando se abrir uma brecha no império do rancor 

A member of the Israeli security forces scuffles with a protestor as Palestinian and Israeli peace activists demonstrate at the entrance of Huwara in the occupied West Bank, on March 3, 2023, following deadly violence by Israeli settlers. Late on February 26, the Palestinian town of Huwara came under attack by Israeli settlers, hours after two settlers were shot dead as they drove through the northern West Bank town. Credito: Jaafar ASHTIYEH/AFP

 DO LADO DE CÁ - Violência: soldado de Israel usa a força para reprimir manifestante palestino na Cisjordânia (Jaafar Ashtiyeh/AFP)
 
As guerras são a mais extrema expressão da barbárie e desgraçadamente não faltam exemplos de horrores e mortandade ao longo da história. 
 Mas poucas vezes a violência sem limites escalou de maneira tão vertiginosa quanto a que se observa no duelo atual entre a força militar de Israel e os militantes do Hamas, que acaba de completar um mês. 
A trágica contabilidade de mortos partiu do altíssimo patamar de 1 400 pessoas massacradas no dia 7 de outubro, quando o grupo palestino cruzou os limites da Faixa de Gaza em um devastador ataque-surpresa. 
A resposta israelense foi deslanchar uma ofensiva para aniquilar o inimigo que, na conta do Ministério da Saúde da superpovoada Gaza, já matou mais de 10 000 pessoas, quase metade delas crianças.  
Os sangrentos trinta dias de confronto desembocaram em uma agressividade de proporção inédita no campo de batalha da opinião pública, com o disparo maciço nas redes sociais de cenas de execuções, bombardeios de escolas, colapso de hospitais e bebês sem vida.

O mundo se repartiu entre contra e a favor, sufocando o meio-termo e abrindo espaço para o mais virulento preconceito. “A mente está cheia até a borda com nossa própria dor e não sobra espaço nem para reconhecer a dor dos outros”, escreveu o historiador e filósofo israelense Yuval Harari. Pairando sobre tudo, o ódio, sentimento que cega e escraviza, vai cumprindo seu papel de aprofundar as históricas desavenças entre árabes e judeus, fazendo delas uma questão pessoal, de indivíduo contra indivíduo, com ecos em toda parte e sem solução à vista.

DO LADO DE LÁ - Mais violência: suástica na fachada da casa em Lyon, na França, onde uma judia foi esfaqueada
DO LADO DE LÁ – Mais violência: suástica na fachada da casa em Lyon, na França, onde uma judia foi esfaqueada (Reprodução/Twitter)

Nos últimos dias, tanques e tropas cercaram a cidade de Gaza, a maior do enclave, e iniciaram a incursão pela rede de túneis controlada pelo Hamas. “Estamos em uma nova etapa da guerra”, declarou o porta-voz do Exército Daniel Hagari, ao mesmo tempo em que o secretário-geral da ONU, António Guterres, subia o tom, afirmando que Gaza está se tornando “um cemitério de crianças”. Discute-se a implantação de “pequenas pausas humanitárias” nos combates — as forças israelenses deram quatro horas para moradores da Cidade de Gaza deixarem o local —, e as listas para a saída de estrangeiros e feridos graves pelo Egito são divulgadas a conta-gotas (34 brasileiros estão na fila).

Não se sabe o que será de Gaza após a ofensiva militar. Negociações estão em curso para que a mais moderada Autoridade Palestina, que administra a Cisjordânia, assuma o território, mas ela terá que conviver com a presença israelense — o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu antecipou que o país “será responsável pela segurança por um período indefinido”. A marcha da insensatez se acelerou com a declaração de Amihai Eliyahu, ministro do Patrimônio — cargo criado para acomodar a extrema direita religiosa que faz parte do governo —, de que o uso de bombas nucleares em Gaza “seria uma opção”. Foi afastado e desautorizado, mas o estrago estava feito. 

Nada do que se discute agora sinaliza um caminho para a paz — pelo contrário, são ações que, como já aconteceu outras vezes, cristalizam raiva e ressentimentos que se espalham pelo planeta.

POLARIZAÇÃO - Atos pró-Palestina em Tulane (à esq) e em Harvard: o conflito entre árabes e judeus se espalha pelas universidades americanas
POLARIZAÇÃO - Atos pró-Palestina em Tulane (à esq) e em Harvard: o conflito entre árabes e judeus se espalha pelas universidades americanas (Reprodução/Joseph Prezioso/AFP)
Os casos de antissemitismo e de islamofobia mais do que triplicaram na Europa e nos Estados Unidos no último mês. No estado de Illinois, o menino de origem palestina Wadea Al Fayun, 6 anos, foi esfaqueado pelo dono do apartamento onde ele morava com a família, um septuagenário que, segundo sua mulher, “escuta talk shows conservadores no rádio” e andava obcecado pelo conflito no Oriente Médio. 
Em Lyon, na França, uma mulher judia foi ferida a facadas por um homem que bateu à sua porta e, para não deixar dúvida quanto à motivação do crime, pichou uma suástica na entrada da casa.
Estrelas de Davi apareceram pintadas na fachada de prédios habitados por judeus em Paris. 
No longínquo Daguestão, país muçulmano às margens do Mar Cáspio, uma turba invadiu o saguão de um aeroporto pretendendo linchar passageiros que desembarcavam de Tel Aviv. “No mundo conectado em que vivemos, quem já têm inclinação para a violência reforça sua visão. As pessoas estão buscando motivos para confirmar seus preconceitos”, diz Wendy Via, cofundadora do Global Project Against Hate and Extremism.
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As expressões de ódio despertadas pelo conflito entre árabes e judeus derramaram-se, com força nunca vista, pelas universidades americanas, um terreno minado pela polarização política e pelo racha talhado pela cultura woke, que leva às últimas consequências o conceito do politicamente correto. Em Harvard, trinta organizações estudantis não só condenaram Israel como abraçaram o execrável slogan “Do rio ao mar, a Palestina será livre— à primeira vista inocente, mas que embute a sumária destruição total do Estado judeu (por repetir o desatino, Rashida Tlaib, única deputada de origem palestina dos Estados Unidos, recebeu um raríssimo voto de censura da Câmara). 

Em Cornell, outra instituição de elite, um aluno disparou nas redes sociais ameaças de morte a estudantes judeus. Tulane, em Nova Orleans, foi palco de agressões generalizadas entre apoiadores dos dois lados quando um manifestante tentou incendiar uma bandeira de Israel. Em Stanford, na Califórnia, a polícia investiga como crime de ódio a morte de um judeu nas proximidades de um ato pró-Palestina. “O discurso, no meio universitário, repisa que os dois povos não podem viver naquela região porque um lado representa o domínio imperialista e o outro rejeita a civilização ocidental. É a islamofobia batendo boca com o antissemitismo”, resume Michel Gherman, professor de história da UFRJ nascido em Israel e tachado de antissemita em um debate na PUC carioca.

O antissemitismo observado nos dias de hoje é uma chaga que teve origem no fim do século XIX, concentrado principalmente na Europa. 
As aceleradas mudanças políticas e econômicas da época, um processo repleto de conflitos que iriam descambar em duas guerras mundiais, desagradaram a nacionalistas que, em busca de um bode expiatório, atribuíram os problemas surgidos à minoria religiosa que controlava parte das instituições financeiras — início de uma perseguição movida pela intolerância que culminou no Holocausto e nos 6 milhões de mortos pelas atrocidades nazistas.
 A fogueira da islamofobia se acenderia meio século depois, quando árabes começaram a migrar para países europeus em busca de vida melhor. Ela explodiria neste século, em que as imensas levas de imigrantes ilegais, associadas à violência latente nas periferias pobres das grandes cidades, desencadearam um turbilhão antimuçulmano. “O antissemitismo e a islamofobia têm a mesma raiz ideológica e é justamente isso que impede que as duas vítimas se reconheçam em pé de igualdade e possam dialogar”, ressalta Arlene Clemesha, professora de história árabe da USP.
TERROR - Ruínas do World Trade Center: civis chacinados em plena Nova York
TERROR - Ruínas do World Trade Center: civis chacinados em plena Nova York (Beth A. Keiser/AFP)

O clima de animosidade entre árabes e judeus se fez presente já na origem dos dois povos: como era comum na convivência das tribos naquela época, as escrituras relatam choques entre os descendentes dos dois filhos de Abraão — Ismael, que viria a formar a nação árabe, e Isaac, tronco do judaísmo. “Os dois povos semitas entraram em conflito por terras já em XVII a.C.”, relata o teólogo Jacir de Freitas, autor de A História de Israel e as Pesquisas Mais Recentes. Apesar dessas diferenças, árabes e judeus repartiram o que é hoje a Palestina com relativa civilidade durante milênios. 

O conflito do qual a guerra atual é a mais recente e mais mortífera consequência tem como ponto de partida as movimentações que resultaram na proposta, apresentada pela ONU em 1947, de divisão da Palestina para a formação do Estado de Israel.  
Nacionalistas palestinos e sionistas se mobilizaram contra e a favor da partilha, a Liga Árabe tomou partido e os tiros começaram a ser disparados. 
Três guerras entre israelenses e alianças militares árabes, inúmeros e horripilantes atentados terroristas e seguidas revoltas sufocadas a bala e bombas depois, judeus e palestinos vivem no mesmo espaço, mas separados por uma montanha de fúria e desconfiança. “O ódio não é a causa dos acontecimentos históricos, mas sim seu subproduto. Frequentemente políticos e ideólogos incitam esse sentimento para ganhar poder e influência”, ensina Norman Naimark, professor de história da Universidade de Stanford.
HORROR - Judeus sendo levados de trem para campo de concentração nazista: barbárie movida pela disseminação do ódio
HORROR - Judeus sendo levados de trem para campo de concentração nazista: barbárie movida pela disseminação do ódio (Austrian Archives/IMAGNO/APA-PictureDesk/AFP)

Sentimento inerente à condição humana, o ódio se situa entre a raiva e o nojo, duas das seis emoções básicas universais descritas pelo psicólogo americano Paul Ekman. Ambas têm lá sua justificativa: enquanto a raiva pressupõe ação diante de algo percebido como errado ou injusto, o nojo serve para evitar contato com perigos e ameaças — na evolução, manteve humanos longe de comidas venenosas ou estragadas. “Mas a combinação é destrutiva”, explica Robert Sternberg, professor de psicologia da Universidade Cornell. “Seu estímulo provém de narrativas falsas, que convencem as pessoas de que o outro está roubando seus recursos e seu destino.” O psicólogo social Aharon Levy completa: “Em uma situação de ódio entre grupos, cada lado acredita que está moralmente correto, ao passo que o inimigo é imoral e não pode mudar”.

SEM PAZ - Salman Rushdie: cabeça a prêmio, anos escondido e, três décadas depois, facadas que lhe tiraram a visão
SEM PAZ - Salman Rushdie: cabeça a prêmio, anos escondido e, três décadas depois, facadas que lhe tiraram a visão (Arne Dedert/Getty Images)
A dinâmica do ódio já serviu de base para episódios estarrecedores de massacres de populações. Em 1995, 8 000 muçulmanos foram brutalmente assassinados por forças sérvias em Srebrenica, na Bósnia e Herzegovina. Um ano antes, os hútus executaram 800 000 tútsis, só por serem tútsis, em Ruanda. 
No mais impactante ato de terrorismo jamais visto, dois aviões lotados derrubaram as torres gêmeas do World Trade Center, em plena Nova York, matando cerca de 3 000 pessoas, todas civis
Individualmente, o escritor indo-britânico Salman Rushdie passou anos escondido, com a cabeça posta a prêmio por citar o profeta Maomé no romance Os Versos Satânicos
Voltou a circular e em 2022, mais de três décadas depois, um fanático o esfaqueou. 
Sobreviveu, mas perdeu a visão de um olho e teve o fígado perfurado. 
Por outro lado, conflitos que pareciam impossíveis de ser contornados deixaram de existir: franceses se reconciliaram com ingleses após séculos de enfrentamentos, japoneses fizeram as pazes com americanos, depois da II Guerra, alemães assumiram a responsabilidade e se penitenciaram pelos crimes nazistas. No sofrido Oriente Médio, resta torcer para que uma brecha se abra e a voz da razão possa um dia ser ouvida.
 

 

Publicado em VEJA, edição nº 2867, de 10 de novembro de 2023


domingo, 5 de novembro de 2023

Antissemitismo ressurge sob disfarce de apoio à ‘causa palestina’ - O Estado de S. Paulo

J. R. Guzzo

Guerra entre Israel e Hamas é usada para legitimar ódio aos judeus, crime hoje praticado como virtude ‘progressista’

Geoffroy van der Hasselt/AFP Casa de residentes judeus pichada com uma Estrela de Davi - Foto Geoffrey van Hassel/AFP
 
Uma loja na maior cidade da Turquia coloca o seguinte cartaz em sua fachada: “É proibida a entrada de judeus” – como se dizia “é proibida a entrada de negros” na África do Sul nos tempos do apartheid, ou nos Estados Unidos na época da segregação racial. 
Na capital da Inglaterra, onde nasceram as ideias centrais da democracia moderna, uma jovem levanta um cartaz que afirma: “Mantenha o mundo limpo” – e mostra um cesto de lixo com a Estrela de Davi dentro. 
Em Paris a polícia anota mais de 700 ataques contra judeus e seus símbolos nos primeiros vinte dias da guerra de Israel contra os terroristas do Hamas e outros grupos da mesma natureza. 
Na Alemanha, justo na Alemanha onde o nazismo produziu o Holocausto, a estrela de seis pontas é pichada nas paredes de residências e outros imóveis pertencentes a cidadãos de origem judaica, como aviso: “Aqui tem judeu. Pode quebrar”. O nome correto disso tudo é antissemitismo. Costumava, até certo tempo atrás, ser uma das formas mais pervertidas de crime contra a humanidade. Hoje é praticado como virtude “progressista” e sob o disfarce de apoio à “causa palestina”.
 
Tão tóxico quanto esses atos declarados de ódio aos judeus é o antissemitismo hipócrita que se esconde nas declarações indignadas contra a reação militar de Israel após as chacinas que sofreu no começo de outubro. 
Sentimentos humanitários são descobertos de repente, exigindo cessar-fogo por parte do país que foi atacado e cuja única escolha é atacar de volta para manter-se vivo. 
Como na treva nazista, falsifica-se os fatos, as palavras e os pensamentos para inventar razões de ordem política e moral que pretendem transformar a selvageria antissemita numa causa legítima. 
Acusam Israel de genocídio, quando quem prega o genocídio são os inimigos que se propõem abertamente, em seu programa oficial, a eliminar o Estado de Israel e a jogar 9 milhões de israelenses “no mar”. 
Condenam, também, a reação “desproporcional” contra os terroristas. 
Mas isso só poderia ocorrer se os ataques de Israel estivessem indo além do seu alvo militar e estratégico – a destruição do Hamas, que anuncia publicamente o propósito de continuar atacando o território israelense, até a “eliminação total” do Estado judeu. O que Israel está fazendo é lutar por seu objetivo legal: a sobrevivência.
 
Lamenta-se o veto dos Estados Unidos a uma resolução da ONU que não admitia o direito de Israel agir em sua própria defesa. 
Querem o quê? Se não fosse o direito de veto, a ONU já teria aprovado uma dúzia de vezes a extinção de Israel; na verdade, ela própria já não existiria mais. Não é racional. Mas o antissemitismo também não é.

J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S. Paulo


quinta-feira, 2 de novembro de 2023

Antissemitismo é só racismo e ódio, mas agora vem disfarçado de “causa justa” - Gazeta do Povo

VOZES - J. R. Guzzo

Israel - Hamas - Guerra - Manifestações - manifestantes
Manifestante em frente à embaixada de Israel, em Madri, no dia 18 de outubro de 2023 (imagem ilustrativa)| Foto: EFE

O mundo está vivendo a sua pior onda de antissemitismo desde a perseguição aos judeus no regime nazista da Alemanha de Hitler. 
Desta vez, vem disfarçado de apoio à “causa palestina”. Mentira: é antissemitismo puro, direto na veia, e não um tipo de ação política legítima. Esse surto de ódio vem sendo armado, peça por peça, há muito tempo – desde que as pessoas começaram a descobrir que podiam se comportar como nazistas sem correr nenhum risco. Ao contrário: o preconceito racial foi se tornando a atitude politicamente mais correta.

A desculpa era perfeita. O sujeito podia ser antissemita dizendo que era “antissionista”, ou anti-Israel, ou anti-imperialismo dos Estados Unidos – e a favor da “libertação da Palestina”, do Terceiro Mundo e do “campo progressista”. Depois do último ataque terrorista contra Israel, no qual 1.400 civis foram mortos, bebês assassinados e mulheres estupradas, o racismo antijudeu deu o seu maior salto desde o holocausto promovido na Alemanha nazista. Israel reagiu, exercendo o seu direito à autodefesa. Imediatamente deixou de ser vítima e passou a ser acusado de agressor.

    Junto com as condenações a Israel, as cobranças de “paz” e os apelos humanitários, vieram imediatamente as manifestações explícitas de ódio aos judeus.


Israel está combatendo um grupo terrorista, o Hamas, que cometeu os crimes em massa do começo de outubro e prega, oficialmente, o genocídio do povo israelense – diz que os judeus devem ser jogados coletivamente no mar, e que o seu Estado tem de ser “extinto”. Por ter reagido à agressão com bombardeios e a invasão de Gaza, a região controlada pelo Hamas, vem sendo denunciado por “genocídio”, por “crimes contra a humanidade”, por manter uma “prisão a céu aberto”, por massacrar civis e daí para baixo.

Não se diz, nunca, que não haveria nenhum palestino morto se os terroristas não tivessem feito a chacina que fizeram contra Israel. 
Exige-se um “cessar fogo” por parte de quem foi agredido – algo como exigir dos Estados Unidos um cessar fogo em resposta ao ataque do Japão contra Pearl Harbour. 
Cobram “proporcionalidade”, quando o direito internacional determina que só pode ser considerada desproporcional a reação que ultrapassa os limites do seu objetivo estratégico. O objetivo de Israel é destruir o Hamas, para não ser destruído por ele – e é isso, exatamente, o que está fazendo.

Foi a oportunidade para se abrir a comporta do antissemitismo. Junto com as condenações a Israel, as cobranças de “paz” e os apelos humanitários, vieram imediatamente as manifestações explícitas de ódio aos judeus. Gritos e cartazes de passeatas não ficam só no “antissionismo” – exigem com todas as letras que o mundo “se livre dos judeus”, estejam onde estiverem.

Estrelas de David são pintadas em residências e outros imóveis de cidadãos de origem israelita, como denúncia: “Aqui tem judeu”. 
Atacam-se sinagogas. Passageiros de um voo internacional vindo de Israel sofrem tentativas de ataque físico
O que qualquer coisa dessas tem a ver com a “defesa do território palestino”? É racismo, de novo, e em escala mundial – agora com a máscara de uma “causa justa”.

Conteúdo editado por: Jocelaine Santos

J.R. Guzzo, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


segunda-feira, 31 de maio de 2021

Antissemitismo, em outros tempos, era coisa da direita mais intratável - O Estado de S. Paulo

J.R. Guzzo

O veneno antissemita

Psiu! Vem cá... Aproveita que ninguém está olhando.  
Quer botar para fora toda essa raiva de judeu que você tem aí dentro e precisa segurar, porque é feio mostrar para os outros quem você realmente é por dentro? 
Quer ser um antissemita cinco estrelas, tipo “platinum plus”, daqueles que desenham suástica em parede de sinagoga? 
Melhor ainda: quer fazer tudo isso em perfeita segurança, sem que ninguém, em nenhum momento, diga que você é antissemita?
Ao contrário: vai ganhar no ato um atestado de militante do “campo progressista”. Que tal?

É a coisa mais fácil do mundo. Basta esperar a próxima vez em que os terroristas que se apresentam como representantes do “povo palestino” dispararem uma bateria de mísseis contra homens, mulheres ou crianças em Israel – e assine imediatamente um manifesto, ou vá protestar no meio da rua, denunciando os “crimes cometidos pelos israelenses” quando reagem às agressões que acabam de sofrer, atirando de volta contra quem atirou neles. 

[um único comentário: temos o maior apreço, consideração, respeito pela capacidade intelectual e jornalística do ilustre JOSÉ ROBERTO GUZZO. Também ousamos supor que temos o   que chamamos de afinidade de idéias. De forma que, transcrevemos no Blog Prontidão Total, várias matérias do ilustre jornalista, praticamente sem comentários - se os apresentássemos seriam apenas de total concordância.

Mas desta vez   nos sentimos (por consideração ao jornalista J.R. Guzzo, quando aos nossos dois leitores) no DEVER de apresentar alguns esclarecimentos sobre nossa postura de defender os civis palestinos, incluindo mulheres e crianças, das ações vingativas que Israel pratica contra eles, quando é atacado por organização pró terrorismo.
O que condenamos é que integrantes de grupos terroristas contrários ao Estado de Israel desfecham ataques de foguetes contra o território israelense, causam algumas baixas (em sua maior parte apenas de instalações, com pouca ou nenhuma perda de vida de israelenses - já que a capacidade defensiva do estado hebreu, o IRON DOME, impede que os foguetes atirados contra o território de Israel, alcancem seus alvos = são destruídos sem maiores danos.
 Que faz Israel como retaliação contra os palestinos da Faixa de Gaza? - bombardeiam de forma implacável, com caças e misseis de última geração, matando centenas de civis palestinos desarmados, não só homens, mas também mulheres  e crianças, destruindo edificações, deixando milhares ao desabrigo.
 
Procedimento inútil, já que os atacantes do território de Israel, que usam foguetes que são neutralizados na quase totalidade pela escudo protetor - Iron dome - não estão nem aí para os mortos palestinos. A eles interessa os mortos - visto que a situação na qual foram abatidos (Israel possui um dos mais poderosos exércitos do mundo) em uma batalha de estilingue x caças os beneficia politicamente.
 
A impressão que se tem é de um cidadão que  possui  uma casa muito bem protegida, praticamente inexpugnável e tem uma rixa com o vizinho.  
Todas as vezes que tem oportunidade, ou lhe convém, o vizinho causa danos a propriedade do desafeto (danos de pouca monta, já que a casa do inimigo é super protegida). 
 
O vizinho, proprietário da casa atacada retorna e ao constatar o ataque e alguns danos (mais para arranhões) acha mais confortável e seguro que em vez de  desafiar o vizinho para um confronto mano a mano = igualdade de condições = escolha atacar uma pequena propriedade do inimigo, localizada em área com condições de vida sub-humana, e parte para lá, devidamente protegido por um aparato de segurança, joga bombas, destrói casebres e barracos ocupados por trabalhadores do desafeto, desarmados; não poupa mulheres, nem crianças. Derruba armazéns, pouco importando se estão ocupados ou não.
 
O cidadão  que age assim está correto? 
está sendo justo?
está promovendo uma retaliação corajosa?  
Com todo o respeito ao Guzzo e aos nossos dois leitores nossa opinião é que as respostas, as classificações atribuídas às  perguntas apresentadas nesse parágrafo, são as corretas se aplicadas em relação ao comportamento  de Israel. 
 
Para não prolongar o assunto - e, por nos faltar capacidade para tanto - deixamos de abordar sobre ao origens do conflito palestino x israelenses, da licitude de transformar áreas habitadas por palestinos em colônias agrícolas exploradas por judeus. 
Além de nos faltar a capacidade que sobra ao ilustre jornalista, fizemos este comentário de uma forma apressada, buscando apenas expressar nosso entendimento e que nos leva a recomendar outros artigos: 
- Como funciona o Iron Dome, poderoso escudo antimíssil israelense - DefesaNet

Judeus não têm direito a defender sua integridade física ou suas vidas; a única atitude decente que poderiam tomar quando são agredidos é começar, imediatamente, “negociações” com os “palestinos”, nas quais a primeira condição é aceitarem que seu país seja extinto. Não existe truque melhor, hoje em dia, para odiar os judeus sem ter de responder legalmente, ou moralmente, por isso.

Antissemitismo, em outros tempos, era coisa da direita mais intratável – uma tara do nazismo, especialmente, e, antes disso, de tiranias como a do czar e coisa pior ainda. Não mais. Antissemitismo, hoje, é esquerda – no Brasil e no mundo. O caçador de judeu em 2021, em sua representação mais fiel, é quem fica “solidário” com o Hamas e outros aglomerados que dizem lutar pela “libertação da Palestina”. É um disfarce perfeito. Rende uma ladainha sem fim em favor da “justiça”, dos direitos dos “oprimidos”, e até, para os mais antigos, da “autodeterminação dos povos”, tudo embrulhado em papelório da ONU. Tire-se a fantasia e aparece na hora o que realmente existe por trás do amor pela Palestina.

Nas manifestações de rua – sempre na Europa, Estados Unidos e outros países livres; não acontecem nunca na China – que se seguiram aos últimos conflitos na área de Gaza, militantes do “campo progressista” colocaram, lado a lado, uma bandeira nazista e uma bandeira de Israel, com a pergunta: “Qual é a diferença?”

Eis aí, melhor talvez que em qualquer grito de guerra pró-Palestina, a exibição real daquilo que é, de fato, a alma do antissemitismo de esquerda dos nossos dias. O que eles queriam, mesmo, não era fazer a comparação safada; era mostrar, impunemente, a bandeira nazista. Era, ao mesmo tempo, revelar seu ressentimento e frustração diante do fato de que os nazistas, no fim das contas, não conseguiram extinguir o povo judeu.

É isso, mais do que tudo, o que incomoda a esquerda que sai à rua em favor do Hamas, Jihad Islâmica e coisas assim – por que os judeus continuam existindo? Por que não permitem que o Hamas, Jihad etc. resolvam o problema que os nazistas não resolveram? Eis aí, no fundo, o incômodo central de Israel para os espíritos progressistas desse mundo: os israelenses de hoje não se deixam matar. Por que reagem – com técnica, precisão e competência militar muito superiores às do inimigo – quando o “povo palestino” joga bombas em cima deles? Deveriam aceitar a própria morte e a destruição do seu país, e submeter-se à “justiça da história”. Do jeito que se comportam, estão sendo um claro inconveniente para a esquerda e os seus associados.

É o sonho nazista enfim realizado: matar judeu passou a ser progressista. 

J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S. Paulo

 

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

Mello defende enquadrar homofobia dentro do crime de racismo

Caso prevaleça no plenário do STF, entendimento do relator de ação movida pelo PPS valerá até que Congresso criminalize a homofobia por meio de lei

[Suprema Corte brasileira desperdiça hoje o seu quarto dia de trabalho para 'promulgar' entendimento com força de lei e com validade até que...;

passo inicial  para aumentar a INSEGURANÇA JURÍDICA - com o entendimento-lei acima, prestes a ser promulgado,  estão abertas as portas para que um outro entendimento decrete que 'esse entendimento-lei vale até que outro ministro promulgue outro entendimento-lei mudando o aqui entendido.

Parece que a PEC da Bengala e outras normas precisam realmente ser revistas.]


Depois de se posicionar no sentido de que o Congresso foi omisso ao não votar um projeto de lei que prevê a criminalização da homofobia, em sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) na semana passada, o ministro Celso de Mello defendeu nesta quarta-feira, 20, que a homofobia deve ser equiparada ao crime de racismo e enquadrada no mesmo artigo do Código Penal. 
[em outras palavras, o decano propõe que o Supremo vista a 'suprema toga' de legislador e decrete que o artigo tal, do Código Penal passa a vigorar a com redação acima;
 
Estupra-se a Constituição Federal, o que o decano propõe é que o Poder Judiciário se torno Poder Legislativo, sempre que o Congresso Nacional não editar leis com a celeridade estabelecida pelos movimentos disso e daquilo;
não agiu no prazo estabelecido e o Poder Legislativo é declaro omisso e a Constituição violada  à pretexto de suprir a omissão.
 
Tudo maravilhoso, o único inconveniente é o estupro ao texto constitucional - no Brasil, coisa boba.
Outro detalhe irrelevante é que toda essa violência contra a separação e independência dos Poderes é para punir supostos crimes, supostamente causados devido a opção sexual da vítima e que em 2017, ultrapassaram  300 - isto em um país que no mesmo ano mais de 60.000 foram assassinados por outras causas.
 
Pergunta boba: e quando o Supremo leva anos e anos para decidir um processo judicial - está sendo também omisso e dando margem a que um outro Poder assuma funções judicantes?  Não deixa de ser um interpretação razoável.]

Conforme o voto de Mello, essa deve ser a interpretação judicial até que o Legislativo aprove uma lei que criminalize a homofobia. Ao contrário do que havia indicado, ele não estipulou um prazo para que o texto seja analisado pelo Congresso.
A sessão foi suspensa após a conclusão do posicionamento de Celso de Mello, que é relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) movida pelo PPS que pede ao STF a declaração de omissão do Legislativo. O julgamento será retomado hoje, (21) a partir das 14h.

Em seu voto, o ministro alegou que ataques homossexuais e transexuais se inserem no aspecto social do racismo, e não simplesmente na aparência física e no que ele classifica como “construção artificial e equivocada do conceito de raça”. [tudo é possível em um país que um individuo de cabelos loiros, olhos verdes, se declara negro e é aprovado em um concurso público, pelo sistema de cotas raciais - concurso Itamaraty.]
“A identidade fundamental que evidencia a correlação entre homofobia e a transfobia, de um lado, e o racismo, do outro, torna-se mais acentuada se considerado que, tanto no plano internacional quanto na ordem interna, os critérios que identificam a discriminação racial resultam da conjugação de dois fatores presentes em ambas as situações: a motivação orientada pelo preconceito e a finalidade de submeter a vítima a situações de diferenciação quanto ao acesso e gozo de bens, serviços e oportunidades”, afirmou Celso de Mello.

Ele cita diversas vezes uma decisão tomada pelo plenário do Supremo em 2003, que definiu o conceito de racismo como “instrumento de controle ideológico, dominação política, subjugação social, negação da alteridade, da dignidade e da humanidade de minorias”.
“O conceito geral e abstrato de racismo reveste-se de caráter amplo, sob cuja égide tornam-se enquadráveis as práticas de homofobia e de transfobia (…) nesse conceito geral e abstrato de racismo, a homofobia e a transfobia se enquadram que a mesma forma que a negrofobia, a xenofobia, a etnofobia e o antissemitismo”,
sustentou Celso de Mello.

Ainda conforme o voto do ministro, “o preconceito e a discriminação resultantes da aversão aos homossexuais e aos demais integrantes do grupo LGBT constituem a própria manifestação cruel, ofensiva e intolerante do racismo por representarem a expressão de sua outra face, o racismo social”.
Se na sessão da semana passada Celso de Mello afirmou que não cabe ao STF legislar e criminalizar a homofobia no lugar do Congresso, nesta quarta-feira ele pontuou que seu voto não está criando um tipo de crime. [pode até não estar criando um tipo de crime mas está estabelecendo espaço para que as decisões do STF passem a ter horas como tempo de vigência, é o suporte para que as decisões do Supremo passem a ter como vigência o limite temporal 'até que algum ministro modifique'.]
“O que estou a propor limita-se à mera subsunção [inclusão] de condutas homotransfóbicas aos diversos preceitos primários de incriminação definidos em legislação penal já existente, na medida em que atos de homofobia e transfobia constituem concretas manifestações de racismo, compreendido este em sua dimensão social, o denominado racismo social”, argumentou.

Depois de ter seu voto classificado na semana passada como “histórico” pelos colegas Luís Roberto Barroso e Rosa Weber, em função da forte crítica à intolerância, Celso de Mello declarou hoje que “este julgamento assume importância fundamental no processo de ampliação e consolidação dos direitos fundamentais das pessoas”.
“Os homossexuais, transgêneros e demais integrantes do grupo LGBT têm a prerrogativa, como pessoas livres e iguais em dignidade e direitos, de receber a proteção das leis e dos sistema político-jurídico instituído pela Constituição, mostrando-se arbitrário e inaceitável qualquer estatuto que, por ação ou por omissão, exclua, discrimine, fomente a intolerância, que estimule o desrespeito e desiguale das pessoas em razão de sua orientação sexual e sua identidade de gênero”, disse ele, em crítica indireta à dita omissão do Congresso.

Na sessão prevista para essa quinta-feira, 21, o ministro Edson Fachin, relator do Mandado de Injunção movido em 2012 pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), que têm pedidos semelhantes à da ação do PPS, dará seu voto nesta ação.
Em seguida, Celso de Mello votará em relação ao Mandado de Injunção e Fachin lerá sua posição em relação à ADO movida pelo PPS. Os demais ministros votarão a seguir nas duas ações. [óbvio que o assunto não se encerra nesta semana; na próxima semana, os ministros podem mudar de opinião e tudo começar de novo.] 

Revista Veja

sexta-feira, 17 de agosto de 2018

Riscos à democracia

Manipulando assim os medos e promovendo desinformação, candidatos podem ter acesso estável ao poder, sem ter que liderar um processo de melhoria expressiva e não excludente de seus países


Na semana passada, tivemos o primeiro debate entre candidatos à Presidência na televisão, um embate que foi percebido pela imprensa e por boa parte dos telespectadores como morno ou desprovido de propostas concretas.   O ponto alto, nos comentários das redes sociais, foi um tal dePlano Ursal”, que, segundo um dos candidatos, estaria pondo em risco a nação por propor o fim das fronteiras e uma pretensa união das repúblicas socialistas da América Latina.

As postagens jocosas incluíam duas versões de um hino da Ursal, uma delas recuperando uma música cantada pela Xuxa nos anos 1990 e memes, os mais diversos.
Independentemente da diversão proporcionada pelo infeliz candidato, há muito o que se refletir a partir do que vem ocorrendo recentemente no Brasil e sobre os riscos (estes reais) que estamos correndo.  A História nem sempre se repete, mas pode ser boa conselheira. Ao ouvir o debate, lembrei-me do Plano Cohen, de 1937, um documento forjado pelo então capitão integralista Olímpio Mourão Filho (com um título que diz muito sobre o antissemitismo dos anos 1930).

Este foi utilizado para justificar a decretação do estado de guerra e, certamente, parte do clima de medo que precedeu o golpe do Estado Novo. Mas não é esse, sem dúvida, o único candidato que, ao adotar uma retórica voltada a instilar o temor no eleitorado, deixa de falar de suas propostas de políticas públicas e de divulgar sua visão para o futuro do país. Além disso, o Brasil não está sozinho, nestes tempos sombrios, ao tentar ressuscitar práticas associadas ao período em que floresceu o nazifascismo.

Madeleine Albright, em seu livro “Fascism, a Warning” (fascismo, um alerta, em tradução livre), chama a atenção para os riscos do uso de expedientes parecidos em países como a Hungria, a República Checa, a Turquia ou a nossa vizinha Venezuela.  Em cada um destes casos, candidatos ou governantes que querem se perpetuar no poder usaram o medo como arma e o ódio em seus discursos.  O perigo adviria da modernidade, com seus costumes “devassos” a corromper as novas gerações, da insegurança advinda do aumento da violência (atribuída a um menor rigor com o crime ou a “esse pessoal dos direitos humanos”), do afluxo de imigrantes ou de uma conspiração em curso, seja dos “comunistas”, seja dos americanos (de acordo com a narrativa mais conveniente ao contexto de cada país).

Manipulando assim os medos e promovendo desinformação, candidatos podem ter acesso estável ao poder, sem ter que liderar um processo de melhoria expressiva e não excludente de seus países. Esse sim é o risco real à democracia que precisa ser enfrentado!

Claudia Maria Costin, professora universitária 

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

A Polônia foi invadida e subjugada pelos alemães; os poloneses não tinham condições de garantir sua sobrevivência; o que os coloca diante de um dilema: como poderiam impedir que mortes de pessoas de outras nacionalidades ocorressem? morrendo junto.



A Polônia massacra a História

Num retrato da intolerância europeia, a ‘Lei do Holocausto’ pune com três anos de cadeia quem falar o que não deve 

Na semana passada, o Senado polonês aprovou uma lei “protetora da reputação” do país, que pune com até três anos de prisão quem sustentar “publicamente, contrariando os fatos”, que “a nação polonesa ou a República da Polônia é responsável ou corresponsável pelos crimes cometidos pelo Terceiro Reich”. Simulando uma defesa da liberdade de expressão, excluiu do alcance da lei “atividades artísticas ou acadêmicas”.

A menos que a pressão internacional cresça, o presidente Andrzej Duda sancionará o texto. Ele já declarou que o povo polonês “como nação” jamais participou do Holocausto. Isso não quer dizer nada. O que se vê é seu governo querendo calar uma discussão incômoda.  Poucas coisas seriam piores para a reputação da Polônia do que essa “Lei do Holocausto”. Até as pedras sabem que os campos de extermínio de Treblinka e Auschwitz foram concebidos, construídos e administrados pelos alemães. O problema está mais adiante: na atividade de poloneses que massacraram judeus e saquearam suas propriedades.

Em 1941, quando a Alemanha invadiu a parte do país ocupada pelos soviéticos desde 1939, poloneses mataram judeus sem a participação da tropa do Reich. Na cidade de Jedwabne, de 2.500 habitantes, seus 1.500 judeus foram massacrados nas ruas ou queimados vivos num celeiro. Metade dos homens adultos de Jedwabne participou do massacre e foi nominalmente identificada. (Em outra cidade, o pai de Yitzhak Shamir, que veio a ser primeiro-ministro de Israel no século passado, foi morto pelos vizinhos depois de fugir dos alemães.) 

Atrás do antissemitismo, em Jedwabne, Varsóvia, Viena e Berlim, estava o poderoso fator da cobiça de seus bens. Poloneses que escondiam judeus pediam-lhes que não revelassem suas identidades, por medo de serem saqueados ou mortos. Quem viu o filme “Ida” aprendeu uma parte dessa história. Terminada a guerra, as terras vizinhas ao campo de Treblinka viraram uma Serra Pelada, com centenas de poloneses escavando-as em busca de corpos de judeus. Quando alguém achava um crânio, levava-o escondido para casa e lá procurava por ouro nas arcadas dentárias. O livro “Golden Harvest” (“Colheita dourada”), de Jan Gross, está na rede, com sua capa estarrecedora.)

Em maio de 1946, quando já havia sido instalado o Tribunal de Nuremberg para julgar a cúpula do III Reich, 42 judeus foram mortos na cidade de Kielce. Entre julho e setembro, 63 mil judeus fugiram da Polônia para a Alemanha ocupada. No primeiro ano do pós-guerra, poloneses mataram perto de 1.200 judeus.  O antissemitismo de uma parte considerável da nação polonesa conviveu com o regime comunista. Em 1969, a ditadura do proletariado forçou a saída de 20 mil dos 30 mil judeus que ainda viviam no país.

A Polônia não precisa ser marcada pela “Lei do Holocausto”. Sua história é maior que esse espasmo radical da xenofobia e do racismo europeu redivivo neste início de século. A resistência polonesa ao Reich foi maior, de longe, que a dos franceses e a dos italianos, somados. A guerra custou ao país 20% de sua população, um terço dos moradores de suas cidades desapareceram. Metade dos advogados, 40% dos médicos e um terço dos professores universitários e padres católicos morreram. E três milhões de judeus.


Elio Gaspari é jornalista