Honra ao demérito
Não deve ser agradável, mas
tampouco parece especialmente desconfortável à presidente Dilma Rousseff ler, ver e ouvir diariamente a massa
de críticas à formação de seu Ministério, cuja
proeza foi conseguir unanimidade na insatisfação e na atribuição de demérito
(moral e profissional) a alguns dos
ministros em relação às pastas para as quais foram escolhidos. A presidente
simplesmente fez as coisas ao modo que lhe pareceu o mais pragmático sob a
ótica do carcomido e ineficiente presidencialismo de coalizão.
Da
obsolescência e ineficiência do método dão notícias os conflitos entre o
Planalto e sua base aliada de 394 deputados no primeiro mandato. Desta vez, a partir de 1º de fevereiro serão, só na Câmara, 329
parlamentares pertencentes a 10 partidos acomodados em ministérios. Em tese, maioria de votos de sobra. Na prática, um
ministro não corresponde necessariamente à votação de uma bancada.
Ainda
mais nessa situação em que o time já entra em campo reclamando da escalação e
emitindo sinais de insubmissão à diretoria. Basta ver a plataforma dos dois candidatos à
presidência da Casa oriundos das principais bancadas governistas. Ambos
- Eduardo Cunha, do PMDB, e Arlindo
Chinaglia, do PT - disputam o lema da "independência"
em relação ao Poder Executivo.
Pois
muito bem, nesse cenário seria um excelente gesto da presidente na direção da
recuperação da credibilidade do governo a formação
de um ministério de excelência. Bons
quadros não faltam ao País nas mais diversas áreas: Esportes, Saúde, Educação,
Minas e Energia, Previdência, Comunicações e assim por diante.
Com
certeza absoluta teria o apoio da sociedade contra o qual o Congresso não
ousaria reagir. Ocorre, porém, que gente com notório
saber, biografia e nome a zelar não aceita determinados papéis. Um Ministério de alto nível teria
de obter da presidente compromisso de autonomia para estruturar projetos,
negociar com o Congresso e cuidar das respectivas execuções.
Contrariando, muitas vezes, interesses que o grupo no poder não está
disposto a contrariar. Daí
a governar há 12 anos sem ter promovido reformas estruturais nem avanços que
direcionem o Brasil ao futuro. A lógica meramente eleitoral e a servidão à
longevidade de uma liderança - no caso, o
ex-presidente Luiz Inácio da Silva - afastam quaisquer expectativas de que
o País deixe de patinar e passe a andar.
A opção pela mediocridade é a regra. Não foi por
outra razão que Lula escolheu Dilma Rousseff como sua sucessora. Pela
certeza de que não lhe faria sombra. Ele nunca deu espaço para que florescessem
novas lideranças no PT. Embriões de
líderes não faltavam. Muitos abatidos por escândalos, mas outros deixados
propositadamente em segundo plano em prol do brilho de uma única estrela.
Assim
é a mecânica adotada para a formação do governo do segundo mandato. Muito criticada, mas que atende perfeitamente
aos planos, que não incluem compromisso com resultados concretos e sim com a
capacidade de mistificação da realidade. Como, aliás, se viu no discurso de
posse da presidente. O diagnóstico de que os brasileiros esperam do governo "mais e melhor" está correto.
Mas
a receita oferecida, ao menos em termos de equipe, não condiz com o prometido. Basta observar as manifestações de
ministros que tomaram posse na sexta-feira. O titular do Esporte confessou:
não entende do riscado e vai "ouvir" quem
entende; o da Educação prometeu "diálogo com os professores",
acesso a creches, à pré-escola e mudança do currículo do ensino médio para
daqui a dois anos; o da Integração
Nacional anunciou mais um adiamento da conclusão da transposição das águas
do rio São Francisco; e o de
Comunicações acenou com "debate profundo" sobre o projeto de
regulamentação da mídia.
Um resumo do prólogo que não
recomenda o conjunto da obra.
Fonte: Dora Kramer, colunista do Estadão
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