O
discurso de defesa política de Lula como candidato envolve
necessariamente afirmar uma conspiração de todo o Judiciário, toda a
grande mídia e ainda grande parte dos partidos políticos. Exige também, a
partir da semana passada, pedir a violação da lei em prol de um
cidadão. Quem acreditasse e propusesse isso a sério não teria como
participar normalmente da vida democrática do país, pois negaria
frontalmente nossas instituições e defenderia, se possível, sua anulação
na marra. Por sorte, embora muitos repitam esse discurso, ninguém está
disposto a realizá-lo.
Esse é o sinal claro de que a polarização
tem aumentado: a necessidade de negar as instituições normais da vida
política e social -em particular a mídia, que é de onde vêm informações
que não se pautam pela narrativa paranoica- para sustentar a própria
posição. O único jeito de fazer isso e preservar uma aura de
justiça é enxergar, por trás delas, uma vontade maléfica e todo-poderosa
em operação. No caso do lulismo, essa entidade é o "golpe", que já foi
elevado em entidade metafísica que se transforma e age no tempo. O
julgamento de Lula é mais um desdobramento do golpe.
Lula diz que
"não vê motivos" para respeitar a decisão da Justiça; Gleisi Hoffmann
afirma que "vai morrer gente" caso Lula seja preso; João Pedro Stedile
ameaça tomar as ruas para mostrar que quem manda no país não é o Estado.
Seriam afirmações muito graves em qualquer país. A julgar por esse
discurso, estamos próximos de uma guerra civil, de uma quebra
irremediável do vínculo elementar de respeito à estrutura de poder
vigente, que só pode se resolver na violência. [seriam afirmações graves se fossem formuladas por pessoas sérias em um país sério; mas, são apresentadas por três criminosos (um já condenado, o outro réu - ela e o marido - e o terceiro criminoso contumaz, que inexplicavelmente continua em liberada - o que não deixa de ser vantagem, devido as grandes possibilidades de acontecer com ele o que aconteceu com o seu parceiro, Zé Rainha, vivia cometendo crimes e solto, de repente sumiu.) É verdade que o Stédile é bem mais covarde que o outro.]
Mas estamos no
Brasil, o país em que a palavra declamada aos quatro ventos não
prenuncia ação nenhuma. Muito pelo contrário: ela preserva seu
radicalismo justamente para não ter que se transformar em ação, posto
que o custo seria alto demais. Um país em que se prega a revolução
armada ao mesmo tempo em que se busca apoio do PMDB. O discurso
do "golpe" é usado pelas lideranças do lulismo para afagar o ego de
seguidores sinceros. Esses, por sua vez, não farão absolutamente nada
com essas palavras, a não ser um ou outro post nas redes sociais e, caso
não chova, marcar presença em algum protesto na avenida Paulista. Estão
do lado correto da história, e isso basta.
Não tenho a menor
ilusão de ver Lula preso. Sua condenação é o momento perfeito para o STF
reverter a prisão em segunda instância. Prender político graúdo já é
demais, né? Não casa com nosso amor pelo caminho do meio, pelo tal
acordo que a todos salva, e que muda apenas lentamente o equilíbrio do
poder (sem que ninguém abra mão de seus ideais). Entretanto, a
Lei da Ficha Limpa será mantida e não veremos reação relevante nas ruas.
O discurso do lulismo radical jamais foi levado a sério. Na prática, no
campo que importa, o jogo segue, usando das palavras necessárias para
colar com cada público. Se colar, colou. Se não colar, bola para a
frente. [talvez a coisa mude um pouco e a mudança de posição do STF tenha que ser adiada, haja vista que Lula exagerou na bazófia quando chamou a Corte Suprema de 'corte acovardada'.
foram os latidos exagerados da ré Gleisi Hoffmann, do Lindbergh e do próprio Lula que deu ao TRF-4 mais firmeza do que a que já lhe é habitual e seria, por si só, suficiente para enquadrar Lula e sua corja.
Afinal, há sempre o risco de se deixando o cão latir demais ele assustar alguém e causar um acidente - no caso o alguém seria algum militante desesperado por ter perdido o emprego fazer alguma bobagem. Por isso o TRF-4 entendeu, e há o risco do STF também pensar da mesma forma, e enquadrar os cães que ladram.] Para quem, como eu, participa desse jogo como público, um
conselho: ser um pouco menos crente na santidade dos líderes, um pouco
menos virtuoso no campo fácil do discurso e tentar se colocar de forma
mais responsável no debate, pensando não em estar do lado "do bem", e
sim no melhor resultado para a sociedade.
Joel Pinheiro da Fonseca - Folha de S. Paulo
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