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quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

Juiz de garantias - Merval Pereira

O Globo

Em causa própria

As surpresas natalinas que Bolsonaro deu aos brasileiros, ao assinar indulto que, por vias tortuosas, coloca em vigor o excludente de ilicitude para os agentes de segurança, que fora barrado pelo Congresso, e também permitir a instalação do juiz de garantias que o ministro Sergio Moro havia pedido que vetasse, dão bem a dimensão pessoal com que o presidente lida com questões de Estado.
Ele também sancionou a limitação da delação premiada ao caso em investigação, restringindo, assim, sua abrangência. Não é à toa que ontem a hashtag Bolsonaro traidor foi das mais comentadas. 
[IMPÕE-SE REGISTRAR:
- o indulto se aplica apenas aos condenados, e no caso dos policiais aos condenados por CRIMES CULPOSOS. Aplicar um decreto que mesmo sendo competência do Presidente da Repúlica, conforme a CF vigente e recente decisão do STF, não pode se aplicar a não condenados e as normas do necessário, mas, ainda não editado, excludente de ilicitude, já constam do Código Penal brasileiro e com isto aquele atenuante pode ser usado em processo em curso e nos que surgirem, desde que o advogado do acusado requeira, cabendo até mesmo ao MP - que antes de ser o órgão acusado é o fiscal das leis - requerer.
Por alcançar apenas condenados, o indulto presidencial não se aplica ao senador Flávio Bolsonaro, que não é condenado, denunciado, sequer é acusado, situação que também torna impossível ser favorecido na parte sancionada do pacote anticrime.

- quanto ao 'juiz de garantias' sabemos ser uma excrescência concebida e parida no Congresso Nacional e cujo único objetivo é embolar os processos judiciais,   que já andam a passo de cágado.
Além de travar a Justiça - praticamente duplica o número necessário de magistrados - cada decisão motivará um recurso extra, etc, etc.
Tornou tão fácil recorrer, postergar o andamento de um processo, que a suprema decisão de 7 nov pretérito que antes favorecia só os réus endinheirados passou a favorecer também os arremediados.] 

O indulto a policiais e agentes de segurança condenados por homicídio culposo, isto é, sem intenção de matar, e a soldados que, participando de ações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), tenham tido o mesmo fim, é uma maneira que o presidente Bolsonaro encontrou de suplantar a vontade expressa do Congresso, que rejeitou o excludente de ilicitude no pacote proposto pelo ministro Sergio Moro. [o indulto é matéria de competência do presidente da República - consta na CF e em que pese a ministra Carmén Lúcia, quando presidente do STF, ter conseguido ler de forma diversa, o Plenária da Corte Suprema corrigiu a leitura da então presidente.]

O subprocurador-geral da República, Domingos Sávio da Silveira, coordenador da Câmara de Controle Externo da Atividade Policial da Procuradoria-Geral da República (PGR), considera que este é um dos pontos inconstitucionais do indulto, que classificou, em declaração ao GLOBO, de um “ornitorrinco jurídico”, um “excesso de poder” por parte do presidente. [só DEUS impede que o presidente Bolsonaro seja reeleito em 2022 - torcemos para que Moro seja o vice - e os fatores são vários.

E um deles, que produzirá muitos votos, são os provenientes dos que graças ao nosso presidente, conseguiram alguns segundos de holofotes.]

Para o subprocurador, Bolsonaro confundiu a clemência com o indulto individual, que é o instrumento da graça, previsto na Constituição. O presidente cogitou usá-lo para beneficiar os policiais condenados pelos massacres do Carandiru e de Eldorado dos Carajás, mas foi desaconselhado. [destacamos que uma das características do indulto é ser coletivo e não depende de pedido do condenado - inexistindo o indulto individual;

quando a graça, que é individual tendo destinatário certo, também deve ser pedida pelo condenado - tais características a diferenciam, total e radicalmente, do indulto.

Discrodamos do uso do termo massacre, para definir os policiais que agindo dentro do estrituo devel legal, controlaram situações em que bandidos poderiam fugir em massa e ter o seu exemplo seguido em outras cadeias e outros bandidos bloqueavam rodovia, buscando obstruir a Justiça e acabar com a Ordem Pública.
O presidente Bolsonaro poderia ter usado concedido o indulto, visto que a ação dos policiais que atuaram naqueles eventos restabelecendo a ordem e a livre circulação - direitos consagrados na CF 88, em pleno vigor - tem atenuantes no Código Penal em vigor.
Aliás, nos dois casos, pela omissão em aplicar normas do Código Penal são passíveis de anulação, o que tem anulado alguns julgamentos e , estando o processo ainda em  curso e os acusados respondem em liberdade e muitos faleceram.]
O indulto tem que ser genérico, e muitos juristas consideram que o presidente, mesmo indultando policiais e agentes de segurança condenados por determinados crimes, estaria ampliando seu poder além do permitido pela lei. Certamente esse indulto será tema de debate que chegará ao Supremo Tribunal Federal (STF), assim como o do então presidente Michel Temer, que atingia até mesmo os condenados por corrupção. Depois de uma liminar da ministra Cármen Lúcia sustar o indulto, meses depois a maioria do STF considerou que ele é uma prerrogativa presidencial “discricionária”. Resta saber se a maioria dos ministros vai considerar que Bolsonaro usou adequadamente essa discricionariedade.

Tudo indica que essa posição deve prevalecer também em nova discussão do plenário do Supremo, mesmo que uma liminar seja concedida por um dos ministros que foi vencido naquela ocasião. Já a permissão para que a figura do juiz de garantias seja adotada no sistema judiciário brasileiro, mesmo com o pedido de veto do ministro Sergio Moro, parece uma decisão precipitada, com objetivos imediatos.  O juiz de garantias é aquele que vai presidir o inquérito, autorizar ou não ações de investigação pedidas pelo Ministério Público. Um segundo juiz julgará o caso, ao contrário do que acontece hoje no país, onde o mesmo juiz preside o inquérito e dá a sentença.

Eu gosto da ideia, mas admito que precisaríamos de bom tempo para que os tribunais se organizassem, e muita verba para contratar novos juízes, até mesmo para comarcas que não têm nem um, quanto mais dois juízes. O veto foi sugerido, entre outros motivos, porque os proponentes não se preocuparam em tratar como vai ser em comarcas de juiz único, como em cerca de 40% dos municípios brasileiros, de acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Não está esclarecido também como vai ser nos tribunais superiores, se vale ou não para ações penais em andamento. No Supremo, por exemplo, os processos da Segunda Turma serão distribuídos para a Primeira Turma e vice-versa? A lei sancionada pelo presidente Bolsonaro entrará em vigor em 30 dias a partir de ontem, mas os tribunais estão em recesso até 20 de fevereiro, e depois vem o carnaval. Será preciso também alterar os códigos de organização judiciária. 

 
Necessitará, pois, muito mais tempo para se organizar e definir casos como os processos em andamento. Por exemplo, o sobre o senador Flávio Bolsonaro. Se o efeito for imediato, o juiz Flávio Itabaiana, que preside o inquérito sobre Bolsonaro e já foi criticado pelo presidente, não poderá mais autorizar investigações, mas seria o juiz prevento (competente) para dar a sentença. Se indulto visa a atender base eleitoral, sanção de pacote anticrime pode beneficiar Flávio Bolsonaro


Merval Pereira, jornalista - O Globo

 

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