Há um
déficit de investigação no caso do porteiro que enfiou indevidamente o nome de
Jair Bolsonaro no inquérito sobre a morte de Marielle Franco. Juntando aos
fatos já divulgados o resultado da perícia feita nos áudios da portaria, há
sobre a mesa um lote de informações que já estavam disponíveis no final de
outubro do ano passado. Está entendido que, ao contrário do que dissera o
porteiro, a voz do "seu Jair" não pode ter soado no interfone da casa
58 do condomínio Vivendas da Barra, no Rio, no dia 14 de março de 2018. O
proprietário do imóvel, Jair Bolsonaro, dava expediente na Câmara, em Brasília.
Bolsonaro
não teria como autorizar a entrada de Élcio Queiroz, hoje preso sob a acusação
de matar Marielle e seu motorista Anderson Gomes. [atualizando: Queiroz e Lesss estão presos, não pela suspeita de que participaram do homicidio da vereadora e sim acusados de tráfico de armas.] A voz que soa no sistema de
áudio da portaria, como confirma a perícia, é a do morador da casa 65, Ronnie
Lessa, outro suspeito preso pelo mesmo crime. Falta esclarecer duas coisas:
Primeiro: Quem colocou na tuba do inquérito um porteiro capaz de inventar em
dois depoimentos à polícia que falou com "seu Jair"? Segundo: por que
a polícia civil do Rio demora tanto a responder a essa pergunta?
Afora os depoimentos, o áudio da portaria e os rastros de Bolsonaro em
Brasília há também sobre a mesa a planilha com os lançamentos feitos pelo
porteiro naquele fatídico 14 de março de 2018, dia da execução de Marielle.
Nesse documento, está anotado o nome do visitante Élcio Queiroz e o número da
casa 58 de Bolsonaro, não do imóvel 65 de Ronnie Lessa. Tudo isso já era
conhecido há pelo menos quatro meses. A perícia adicionou um mistério novo à
trama: a voz do porteiro que liberou a entrada do miliciano Élcio não é a
daquele funcionário do condomínio que citou Bolsonaro em depoimentos prestados
nos dias 7 e 9 de outubro. Na noite do dia 7 de outubro, data do primeiro
depoimento do porteiro, soube-se que Bolsonaro disputaria o segundo turno da
eleição com Fernando Haddad.
Cabe
perguntar: por que o interesse em meter Bolsonaro nessa encrenca? Ou, de novo:
quem colocou o porteiro na tuba? O déficit de respostas nesse caso é tão
desmoralizante para a polícia quanto o excesso de interrogações que ainda ronda
a apuração sobre o próprio assassinato de Marielle Franco.[apenas um registro: além de enfatizar a inutilidade de toda o procedimento de perícia para identificar as razões do porteiro ter mentido (buscando identificar a origem de - eventual, talvez - tenttiva envolver o presidente Bolsonaro - na ocasião, comprovadamente, a mais de 1.000km de distância do condomínio - insistimos em questionar: qual a razão do homicidio da vereadora Marielle Franco ter prioridade sobre a investação de milhares de assassinatos que ocorreram no mesmo ano? grande parte deles no Rio.]
Blog do Josias - Josias de Souza, jornalista - UOL
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