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terça-feira, 24 de novembro de 2020

Coup D´Presse - Bolsonaro joga pólvora em companheiros de guerra - DefesaNet

Discurso do presidente como resposta à pressão de Joe Biden no problema das queimadas na Amazônia está mais para a história de crises de governo e o anedotário político

  Foi justamente sob o comando de generais dos Estados Unidos que os militares brasileiros tiveram um triunfo aplaudido no País e no exterior. Mais de 25 mil homens da Força Expedicionária Brasileira (FEB) integraram uma divisão do V Exército americano para forjar a saída dos alemães do norte da Itália na 2ª Guerra Mundial. Uma geração de pracinhas oriunda das periferias e dos cafezais enfrentou o gelo e o poder bélico dos nazistas num capítulo surpreendente da história bélica nacional.

O discurso do presidente Jair Bolsonaro de sugerir o uso da pólvora como resposta à pressão do democrata Joe Biden no problema das queimadas na Amazônia está mais para a história de crises de governo e o anedotário político. Posturas diversionistas de autoridades permeiam a trajetória do Exército brasileiro, que, desde o treinamento de um grupo de oficiais no Fort Leavenworth War School, no Kansas, em 1943, nunca deixou de pedir ajuda aos americanos para evoluir na doutrina e na tecnologia de guerra.

A aliança pioneira da turma dos generais Castelo Branco, Henrique Teixeira Lott e Zenóbio da Costa, gente que mandou no País, foi lembrada em março deste ano pelo ministro da Defesa. Fernando Azevedo comemorou, numa viagem de Bolsonaro à Flórida, um dos muitos pequenos acordos de cooperação firmados por governos brasileiros com a maior potência militar do mundo. “Temos os Estados Unidos como um parceiro importante. Estivemos juntos pela democracia e liberdade na Segunda Grande Guerra”, disse na época, um discurso padrão adotado nas últimas décadas.   O conflito mundial citado pelo ministro foi um hiato na história da caserna no Brasil. Antes e depois da presença da tropa na Europa, a cúpula militar só colecionou desgastes públicos nas suas vitórias nos territórios de países vizinhos e mesmo na repressão a populações sertanejas revoltadas.

Num museu no Forte de Copacabana, o Exército destaca os conflitos na Tríplice Fronteira (1864-1870) e em Canudos (1897) como momentos de sua história. Falta espaço para expor o uso político do emprego de tropas tanto no Império quanto na incipiente República. Essas guerras encobriram batalhas fratricidas pelo poder e crises econômicas ao custo de muito orçamento e sangue aqui e lá fora. Em Assunção, os brasileiros são acusados ainda hoje por massacres de crianças e saques – puseram nos navios até móveis de famílias paraguaias.
 
Já no interior baiano, a degola de sertanejos marcou a presença de oficiais na Caatinga. Essa prática seria usada também na Guerra do Contestado (1912-1916), onde os militares combateram caboclos que usavam facões esculpidos na madeira. A propósito, guerras assimétricas, em especial, costumam ser refluxos no tempo por excelência, reais ou imaginárias.

Guerra é um termo genérico, mas pode ser usado para relatar um caso recente em que os americanos jogaram militares brasileiros numa arapuca. O general da reserva Augusto Heleno Ribeiro, atual ministro do Gabinete de Segurança Institucional, conhece essa história. Em 2005, ele comandava a Missão de Paz das Nações Unidas no Haiti. No mês de julho daquele ano, cerca de 440 homens de sua tropa entraram em Cité Soleil, maior favela de Porto Príncipe, para caçar o criminoso Emmanuel Wilmer, o Dread. Heleno vivia pressionado. Os Estados Unidos criticavam uma suposta falta de agressividade no enfrentamento à violência no país caribenho.

 

 [Antes de tudo precisamos considerar que o comentário do presidente Bolsonaro foi mais para descontrair o ambiente - os Estados Unidos da América são aliados tradicionais do Brasil.

Óbvio que a disparidade de forças é enorme, mas cada guerra é uma guerra e a natureza do confronto [caso houvesse um) favorece em muito aos brasileiros - os EUA eram muitas vezes superiores as do Vietnam e eles perderam.

O imenso poderio militar dos norte-americanos jamais seria utilizado em  sua totalidade. Para começar, seriam descartados todo o armamento nuclear. E, por aí vai. Mas, pensar nisso é desperdiçar pensamento.]

Na operação de sete horas, cinco ou seis pessoas morreram, incluindo Dread, na estimativa do Exército Brasileiro. Entidades de direitos humanos ligadas ao ex-presidente Jean Bertrand Aristide, críticas da missão da ONU, calcularam 63 mortes. A agência Reuters estimou 70 vítimas fatais. Heleno contestou os números e reclamou de uma versão, segundo ele, política da história. De forma moderada, observadores internacionais avaliaram que um dos erros da operação foi não monitorar a favela nos dias seguintes. A falta de patrulha teria facilitado um acerto de contas local.

A guerra do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Haiti empoderou uma geração de “oficiais sem espada”. O País não conseguiu maior inserção nos fóruns internacionais, como desejava o governo. Mas os militares saíram de Porto Príncipe com a lição de que o quartel não forma dirigentes especializados em tornar competitiva a economia interna, mudar o jogo diplomático controlado por países desenvolvidos e atrair investimentos externos, preceitos para garantir a paz.

Por sua vez, Bolsonaro alimenta uma guerra permanente para encobrir questões políticas e familiares e salvar seu governo  – é o caso das rachadinhas, que envolve o filho e senador, Flávio (Republicanos-RJ).  O discurso da pólvora, uma das batalhas desse conflito travado pelo presidente, foi recebido com deboche pelo embaixador americano. Todd Chapman, nomeado por Donald Trump, divulgou vídeo do Corpo de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos para lembrar que a força está de prontidão em tempos de crise. Numa interpretação livre, evidenciou que, antes de uma suposta relação de amizade de seu chefe e Bolsonaro, existem interesses históricos. A embaixada afirmou que o vídeo estava sendo preparado havia uma semana e não tem relação com o presidente.

É, dentro desses limites, que os militares brasileiros tentam há décadas ter proveitos da parceria com Washington e expandir a indústria de defesa nacional como um aliado preferencial da OTAN, a Organização do Tratado do Atlântico Norte.  No front imaginário do presidente, a prioridade nos interesses particulares é pólvora que só chamuscou mesmo as fardas dos militares do lado de cá do campo de guerra, que chancelam o seu governo. No rastilho da semana, Bolsonaro ainda atacou a vacina da covid-19 e ironizou os brasileiros preocupados com a pandemia. Até o momento, pelo menos 163 mil pessoas morreram vítimas da doença. 

Coup D´Presse - DefesaNet - MATÉRIA COMPLETA

quarta-feira, 11 de novembro de 2020

Qual o tamanho da 'pólvora' do Brasil? Comparamos o poderio com o dos EUA; americanos têm 5.800 armas nucleares [usem uma que seja e a Amazônia estará perdida por dezenas e dezenas de anos.]

O Estado de S. Paulo

Maior potência militar do planeta, EUA investem US$ 750 bilhões em Defesa; no Brasil, valor é de US$ 27,8 bilhões; americanos têm 5.800 armas nucleares

Um dia depois de o presidente Jair Bolsonaro dizer que "quando acaba a saliva, tem que ter pólvora" em referência ao presidente eleito dos Estados Unidos, Joe Biden, o Estadão fez um comparativo do poderio militar entre as duas nações. O presidente brasileiro é um dos líderes mundiais que ainda não reconheceu a vitória de Biden - ao seu lado estão nomes como o russo Vladimir Putin, o chinês Xi Jinping e o norte-coreano Kim Jong-Un

"Assistimos há pouco um grande candidato à chefia de Estado dizer que se eu não apagar o fogo da Amazônia, ele levanta barreiras comerciais contra o Brasil. E como é que nós podemos fazer frente a tudo isso? Apenas a diplomacia não dá, né, Ernesto (Araújo, chanceler). Porque quando acabar a saliva, tem que ter pólvora, se não, não funciona. Precisa nem usar a pólvora, mas precisa saber que tem", afirmou Bolsonaro em evento na terça à tarde. 

Horas depois da declaração do presidente, o embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Todd Chapman, publicou em seu Twitter um vídeo exaltando o Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA. 

De acordo com o ranking realizado pelo site Global Firepower, os EUA investem US$ 750 bilhões em Defesa. No Brasil, o investimento estimado é de US$ 27,8 bilhões, em uma diferença que se traduz em números, estrutura, força e capacidade de projeção de poder. Os EUA detêm cerca de 5.800 armas nucleares - o Brasil não tem nenhuma. Os americanos têm cerca de 715 caças de combate, enquanto o Brasil tem 78. As Forças Armadas dos EUA têm ainda 5.768 helicópteros e 6.289 tanques - por aqui, são 242 e 437, respectivamente. 

Ainda por terra, os EUA têm 39.253 veículos blindados de combate e 1.366 lançadores de foguete - no Brasil, são 1.820 e 84. No mar, os EUA têm 20 porta-aviões, 91 destroyers e 66 submarinos. O Brasil não tem nenhum porta-avião, nenhum destroyer e seis submarinos. "As duas únicas forças armadas no mundo que conseguiriam se contrapor um pouco às Forças Armadas dos EUA seriam a China e Rússia", explica Gunther Rudzit, professor de relações internacionais da ESPM e especialista na área de segurança e defesa. "A capacidade e a organização das Forças Armadas dos EUA estão num patamar tão, mas tão elevado, que nenhuma outra no mundo consegue chegar perto".

[indiscutível que os EUA possuem um poder militar imenso comparado com o do Brasil.

As forças militares do Brasil, para ações invasoras, são mínima, possuindo capacidade para invadir poucas nações - e desde que próximas do Brasil.

Só que o palco dessa hipotética guerra - tem tudo para ser mais uma 'batalha de Itararé' ´o Brasil sendo invadido = o francês demonstrou interesse em invadir a Amazônia e o Biden em aplicar sanções. Assim, o Brasil está na posição de nação a ser invadida e os demais países, no caso presente os EUA, de invasor.

O que o Brasil possui em termos de Forças Armadas, aliado as condições do teatro de  operações, nos deixa em posição privilegiada - seja para nos defendermos dos fuzileiros, ou de qualquer outra unidade de elite.

É mera tentativa de apavorar incautos cogitar do uso de armas nucleares.]

Mourão minimiza declaração de Bolsonaro sobre ‘pólvora’: ‘Aforismo antigo’

Vice-presidente avaliou que pronunciamento do presidente não causa consequências negativas para a relação entre Brasil e Estados Unidos; general negou atrito com Bolsonaro

O vice-presidente Hamilton Mourão disse nesta quarta-feira, 11, que a declaração do presidente Jair Bolsonaro sobre usar "pólvora" para proteger a Amazônia é uma referência a um "aforismo antigo". Mourão evitou entrar em mais detalhes sobre o discurso dessa terça-feira, 10, do presidente. Ele avaliou, contudo, que a fala de Bolsonaro não deve causar consequências às relações com os Estados Unidos.

"Acho que ele se referiu a um aforismo antigo que diz que quando acaba a diplomacia entram os canhões, foi isso que ele se referiu”, afirmou na chegada à vice-presidência. Ontem, em evento no Palácio do Planalto, Bolsonaro afirmou que "quando acaba a saliva tem que ter pólvora", ao citar possíveis sanções econômicas dos Estados Unidos ao Brasil caso o desmatamento na Amazônia não seja controlado.

"Assistimos há pouco um grande candidato à chefia de Estado dizendo que, se eu não apagar o fogo da Amazônia, ele vai levantar barreiras comerciais contra o Brasil. E como é que podemos fazer frente a tudo isso? Apenas pela diplomacia não dá", declarou Bolsonaro nesta terça, sem citar o nome de Joe Biden.  

O governo brasileiro é um dos poucos que ainda não se pronunciaram sobre a vitória do democrata nas eleições americanas. Aliado de Donald Trump, Bolsonaro aguarda o fim das ações judiciais movidas pelo atual presidente americano, que ainda não admitiu derrota.Questionado se a fala de Bolsonaro poderia trazer consequências para a relação diplomática com os EUA, uma vez que o Brasil ainda não reconheceu a vitória de Biden, o vice-presidente minimizou o ocorrido e pediu calma. "Não causa nada. Isso aí tudo é figura de retórica, vamos aguardar, dê tempo ao tempo", disse Mourão.

Mourão x Bolsonaro
O vice-presidente também colocou panos quentes na relação com Bolsonaro e negou que não estejam conversando. "Eu falei com o presidente na segunda-feira, pô. Vocês não viram na cerimônia que estávamos os dois lado a lado conversando?", perguntou aos jornalistas. Na segunda, 9, os dois estiveram juntos em evento no Planalto relacionado ao Programa Pátria Voluntária.

Na conversa com a imprensa nesta quarta, Mourão citou ainda que tem uma relação "ética e de lealdade" com o chefe do Executivo. O distanciamento entre o vice-presidente e Bolsonaro foi exposto, contudo, pelo próprio presidente. Na segunda-feira de noite, Bolsonaro disse em entrevista à emissora CNN Brasil que não estava falando com Mourão sobre "qualquer assunto".

O chefe do Planalto deu a declaração ao comentar fala de Mourão, que afirmou que "na hora certa" o Brasil iria cumprimentar o novo eleito para presidente nos Estados Unidos. "O que ele (Hamilton Mourão) falou sobre os Estados Unidos é opinião dele. Eu nunca conversei com o Mourão sobre assuntos dos Estados Unidos, como não tenho falado sobre qualquer outro assunto com ele", disse Bolsonaro à CNN. [dizer que não está falando com uma pessoa sobre qualquer assunto, significa apenas que não está falando com a pessoa - tão óbvio que Mourão preferiu não perder tempo explicando o óbvio.

Declarar que Mourão tem a posição dele é apenas uma forma respeitosa de reconhecer o direito que cada ser humano tem de ter uma opinião.]

Sobre a fala, Mourão adotou ontem uma postura pacificadora e se limitou a comentar que a sua visão é que o Bolsonaro está "aguardando" para se pronunciar sobre o resultados das eleições nos EUA.

Política - O Estado de S. Paulo


domingo, 23 de fevereiro de 2020

Cabo Anselmo - Nas entrelinhas

“Bolsonaro tem uma militância armada e radicalizada muito numerosa, que intimida pela truculência, não apenas nas redes sociais. Aonde isso vai parar, ninguém sabe ainda”

É domingo de carnaval, mas vou falar de coisa séria. José Anselmo dos Santos, o Cabo Anselmo, nasceu em 13 de fevereiro de 1941, em Sergipe. Foi um dos protagonistas do golpe militar de 1964, atuando como um agente provocador. Em 1962, filiou-se à Associação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais do Brasil (AMFNB), da qual se elegeu presidente. Em 25 de março de 1964, durante as comemorações do 2º aniversário da AMFNB no Sindicato dos Metalúrgicos do Rio de Janeiro, protestou contra a punição imposta a 12 dirigentes da associação por apoiarem as reformas de base propostas pelo então presidente da República, João Goulart.

O cenário era de radicalização política: derrotado no Congresso, e diante da forte oposição dos governadores da antiga Guanabara, Carlos Lacerda; Minas Gerais, Magalhães Pinto; e São Paulo, Adhemar de Barros, Goulart resolvera se apoiar nos sindicatos de trabalhadores e nas ligas camponesas. Os marinheiros, porém, roubaram a cena: decidiram não acatar a ordem de prisão dada aos colegas e permanecer no prédio do sindicato. No dia 26, parte dos fuzileiros navais enviados pelo ministro da Marinha, almirante Sílvio Mota, para reprimir o levante, aderiu ao movimento. Diante da recusa do comandante do Corpo de Fuzileiros Navais, almirante Cândido Aragão, em sufocar o motim, Sílvio Mota recorreu à Polícia do Exército e demitiu Aragão. [Uma vez PE, sempre PE.]

Goulart acabou se colocando ao lado dos marinheiros, gerando uma crise na Marinha, que culminou com a saída de Sílvio Mota, a nomeação do almirante Paulo Mário da Cunha Rodrigues para a pasta e a recondução de Cândido Aragão ao comando do Corpo de Fuzileiros Navais, além da libertação dos amotinados. No dia 28, José Anselmo, comemorou a vitória com uma passeata de marinheiros pelo centro do Rio, e, no dia 30, levou o presidente Goulart ao ato promovido pela Associação de Subtenentes e Sargentos da Polícia Militar, no Automóvel Clube do Rio de Janeiro. Envolver-se com os amotinados foi um erro fatal do presidente da República, era o pretexto que faltava para que os principais líderes militares da época, à frente o marechal Castelo Branco, assumissem o poder.

Cassado pelo Ato Institucional nº 1, em abril, José Anselmo asilou-se na embaixada do México. Quinze dias depois, deixou a embaixada, mas foi preso no dia seguinte. Em março de 1966, fugiu novamente, em circunstâncias estranhas; porém, era reconhecido como líder político de esquerda. No final do ano, seguiu para o Uruguai. Em 1967, ao lado do líder comunista Carlos Marighella, participou da 1ª Conferência da Organização Latino-Americana de Solidariedade, realizada em Havana, que deflagrou uma onda de guerrilhas na América Latina. Ainda em Cuba, participou da formação do primeiro núcleo de treinamento de guerrilha da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR).

Retornando ao Brasil, em 1970, foi designado para trabalhar em São Paulo. Meses depois, uma onda de prisões e mortes de militantes que tiveram contato com Anselmo levantou suspeitas de que fosse um agente policial infiltrado. Como fora detido em junho de 1971, era inexplicável sua aparição em liberdade dias depois. Anselmo negou o fato. Em janeiro de 1972, voltou a ser alvo da mesma acusação, dessa vez pela Ação Libertadora Nacional (ALN), após a apresentação de um relatório de testemunhas da sua prisão em 1971. Em fevereiro de 1973, a VPR acusou-o formalmente de ser agente da Central Intelligence Agency (CIA). Suspeita-se de que era agente do Centro de Informação da Marinha, sob a supervisão da CIA, antes mesmo de 1964.

Motins
Em 1984, a revista IstoÉ publicou uma entrevista de Anselmo, na qual se assumia um colaborador dos órgãos de repressão. Desaparecido desde então, voltou a ser localizado em 1999, pela revista Época, quando confirmou que fora o principal responsável pelo desmantelamento da VPR e da ALN. Em 1973, havia sido submetido a uma cirurgia plástica e recebera documentos falsos, fornecido pelos serviços de inteligência. Manteve-se na clandestinidade, apesar do direito à anistia.

Na quinta-feira, o Solidariedade expulsou de seus quadros o vereador Sargento Ailton, de Fortaleza, flagrado como um dos líderes do motim da Polícia Militar do Ceará, no qual foi baleado o senador Cid Gomes (PDT-CE), ao investir com uma retroescavadeira contra o portão de um quartel ocupado por grevistas encapuzados. Em outros estados, movimentos semelhantes estão sendo organizados para exigir aumentos salariais e outros benefícios.

O presidente Jair Bolsonaro aceitou o pedido do governo cearense e decretou uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), a cargo do Ministério da Defesa, cuja missão é garantir a segurança pública, e não, reprimir os amotinados. Em 72 horas, houve mais de 80 assassinatos no Ceará. A tarefa de resolver o problema da disciplina na PM continua sendo do governador petista Camilo Santana. Bolsonaro flerta com os amotinados, que são parte importante de sua base social.

Há muitos sargentos Aíltons na política, [também há muitos irresponsáveis da laia do senador licenciado Cid Gomes - são tipos como ele, que querem tocar fogo no Brasil custe o que custar.] fazendo agitação entre os policiais militares, alguns dos quais ligados às milícias, utilizando métodos que não são os da política propriamente dita. Bolsonaro tem uma militância armada e radicalizada muito numerosa, que intimida pela truculência, não apenas nas redes sociais. Aonde isso vai parar, ninguém sabe ainda. Sabe-se, porém, que nem é preciso um novo Cabo Anselmo para que a indisciplina nos quartéis das polícias militares vire uma crise institucional.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - Correio Braziliense




quinta-feira, 4 de julho de 2019

Democracia: "Governo do Povo, Pelo Povo, para o Povo"

Obsessão  

Bolsonaro insiste em paparicar seu núcleo duro de eleitores, que o elegeram para mandatos sucessivos de deputado

O presidente Jair Bolsonaro tem uma fixação: não depender do Congresso para governar. É o sonho de consumo de todo político populista com pendores autoritários. Várias vezes ele já abordou o assunto, que ontem voltou a ser seu tema, no encerramento do discurso no Comando Militar do Sudeste, na transmissão de posse do general Andrade Ramos, que será o novo ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência.

O presidente repete com constância desagradável que só deve “lealdade absoluta” ao povo, numa visão de democracia muito peculiar, que coloca essa entidade, o povo, acima de todas as instituições. [Constituição Federal - "Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
...
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição."]

Ontem, além de agradecer às Forças Armadas, que seriam responsáveis por tudo o que alcançou na vida, Bolsonaro se dirigiu ao “povo brasileiro”: “Devo isso a vocês, povo brasileiro. Que são muito mais importantes que qualquer instituição nacional. Vocês conduzem nosso destino. A vocês, povo brasileiro, e somente a vocês, eu devo lealdade absoluta. Contem comigo, que eu conto com vocês.”

Bolsonaro parece não saber que “o povo brasileiro” tem seus representantes, eleitos pelo voto popular tanto quanto ele, trabalhando no Congresso Nacional, onde ele atuou por 28 anos. E que o presidente da República deveria representar todos os cidadãos, mesmo aqueles que não votaram nele. Mas ele insiste em paparicar seu núcleo duro de eleitores, que o elegeram para mandatos sucessivos de deputado federal. Mas, se bastava esse eleitorado, basicamente de militares e congêneres, como guardas municipais, policiais militares, para elegê-lo deputado federal, agora teria que ampliar o alcance de seus atos.

Mas não, e o exemplo recentíssimo está na sua intervenção na reforma da Previdência para abrandar as condições de aposentadoria dos policiais militares e federais, entre outros.Essa fixação em um apoio direto do eleitor não é de hoje. Em março, na cerimônia do 211º aniversário do Corpo de Fuzileiros Navais, no Rio, Bolsonaro disse que a democracia só existe se as Forças Armadas quiserem. Ele fez o comentário quando descrevia sua vitória nas eleições do ano passado: “A missão será cumprida ao lado das pessoas de bem do nosso Brasil, daqueles que amam a pátria, daqueles que respeitam a família, daqueles que querem aproximação com países que têm ideologia semelhante à nossa, daqueles que amam a democracia. E isso, democracia e liberdade, só existe quando a sua respectiva Força Armada assim o quer”.

Recentemente, em Santa Maria, interior do Rio Grande do Sul, durante evento em memória ao marechal Emílio Mallet, o patrono da Artilharia, Bolsonaro voltou a defender a ditadura militar, mas, desta vez, foi mais longe, e ligou a atuação dos militares na ocasião ao armamento dos cidadãos que propõe hoje. Bolsonaro disse: “(…) Além das Forças Armadas, defendo o armamento individual para nosso povo, para que tentações não passem na cabeça de governantes para assumir o poder de forma absoluta”. De lá para cá, alguma coisa mudou, porque a democracia tem contrapesos que contêm o eventual voluntarismo do incumbente. A aproximação com países com ideologia semelhante à nossa nos afastaria da China, nosso principal parceiro comercial. [a Suíça é uma "ilha" de tranquilidade, de progresso, de estabilidade - ficou neutra durante a 2ª Guerra Mundial, apesar de territorialmente envolvida por países beligerantes, uma 'neutralidade armada' - e lá todos os cidadãos possuem uma arma casa - propriedade do governo suíço, mas, sob a guarda do cidadão.]

O que parecia uma ameaça da nova administração não passou de bravata, que a certa altura o chanceler Ernesto Araújo pensou que era verdade. Mantivemos nossas relações com os chineses, e os interesses nacionais superaram as idiossincrasias oficiais. A possibilidade de fazer parte da OCDE, que reúne as maiores economias do mundo ocidental, e também o acordo do Mercosul com a União Europeia, obrigarão a que o governo se enquadre em exigências como preservação do meio ambiente e defesa de parâmetros democráticos.

Defender a ditadura militar é um mote caro ao presidente, que considera a instituição militar sua segunda família. Não seria necessário fazê-lo, e é especialmente perigoso quando a liga à ampliação do direito ao porte e à posse de armas. Também aqui as instituições colocaram um limite às vontades do presidente, e o Congresso barrou os decretos, considerando-os inconstitucionais. Agora, outra instituição da democracia, o Supremo Tribunal Federal, vai cuidar do tema. [o Congresso não merece nenhum encômio por perceber o óbvio: a 'inconstitucionalidade' dos chamados decretos das armas; 
infelizmente, ocorreu por parte da assessoria jurídica do presidente Bolsonaro um lamentável equívoco ao não barrar, no nascedouro, o uso de decreto presidencial para modificar uma lei.
Desnecessário também é a intervenção do STF no tema, basta uma decisão de um juiz federal de primeira instância para decretar a inconstitucionalidade das normas em questão.]
 
 
 

sexta-feira, 8 de março de 2019

A última do Bolsonaro

“Temos um governo assumidamente de direita, com uma agenda liberal na economia e conservadora nos costumes”


O presidente Jair Bolsonaro foi eleito no segundo turno por 55,13% dos votos válidos; no primeiro turno, teve 46,03% dos votos. Embora seja presidente de todos os brasileiros, está fazendo a opção de governar apenas para os que votaram nele. Os que optaram por outros candidatos no primeiro turno e votaram nele, no segundo turno, não desejavam a volta do PT ao poder. O petista Fernando Hadadd obteve 44,97% dos votos no segundo turno, ao qual chegou graças aos 29,28% dos votos válidos obtidos no primeiro turno. O PT obteve 15% dos votos a mais no segundo turno, pela razão inversa.

Um candidato de centro, após a eleição, estaria mais empenhado em construir um certo consenso nacional para governar, isolando os extremos. Não é o caso de Bolsonaro. Sua estratégia é manter a fricção direita versus esquerda a qualquer custo e ancorar seu governo nas Forças Armadas, seja recorrendo a oficiais de alta patente para compor o governo e ocupar suas posições mais estratégicas, seja resgatando o velho positivismo que embalou as revoltas tenentistas, a Revolução de 1930 e o golpe militar de 1964. Bolsonaro revela uma estratégia política na qual o povo não é o protagonista, mas seus companheiros d’armas.

Ao discursar na cerimônia de aniversário do Corpo de Fuzileiros Navais no Rio de Janeiro, num discurso curto e grosso, deu seu recado: “Temos uma missão de mudar o Brasil. Esse foi nosso propósito, essa foi nossa bandeira ao longo de quatro anos andando por todo o Brasil. […] O que eu quero para os senhores, meus irmãos militares. Sou do Exército brasileiro, mas tenho uma formação muito semelhante a de vocês. A minha última unidade foi a Brigada de Infantaria Paraquedista. Eu quero vocês conversando, ouvindo, debatendo uma retaguarda jurídica para que vocês possam exercer seus trabalhos, em especial nas missões extraordinárias da tropa.”

Depois, arrematou: “A segunda missão será cumprida ao lado das pessoas de bem do nosso Brasil, daqueles que amam a pátria, daqueles que respeitam a família, daqueles que querem aproximação com países que têm ideologia semelhante à nossa, daqueles que amam a democracia e a liberdade. E isso, democracia e liberdade, só existe quando a sua respectiva Forças Armadas assim o quer”, disse o presidente, arranhando a concordância verbal. Depois do discurso, o vice-presidente Hamilton Mourão e o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno, tentaram reinterpretar o discurso, mas o leite já estava derramado. Bolsonaro se viu obrigado a gravar uma “live” na internet, na qual minimizou o comentário feito na cerimônia militar.

Previdência
Bolsonaro utilizou o argumento para justificar a inclusão dos militares na reforma da Previdência, uma exigência que está sendo feita pelo Congresso para começar a debatê-la, porque a proposta do governo deixou os militares de fora. Chegamos ao ponto que mais interessa. Gregos e baianos, com exceção dos de oposição, sabem muito bem que o país não tem a menor possibilidade de crescer na escala que precisa sem a reforma da Previdência. A desaceleração da economia mundial e a nossa crise fiscal não permitem que isso ocorra, mesmo que a reforma seja meia-boca, descarregando o peso do ajuste nos assalariados para manter os privilégios dos grupos de pressão mais poderosos, como magistrados, procuradores, militares e policiais. O sucesso de Bolsonaro passa por esse rubicão.

Para aprovar a reforma, Bolsonaro depende dos políticos, principalmente do Congresso, cujos 513 deputados e 81 senadores representam a totalidade dos eleitores e não apenas a parcela que votou no presidente da República. Não há a menor possibilidade de aprovar a reforma sem a mobilização de 308 deputados e 54 senadores. A forma como o governo foi organizado não garante esse apoio, ainda mais porque os políticos nomeados para o ministério são representantes de frentes parlamentares com fortes interesses corporativos, que nada têm a ver com a reforma da Previdência.

Não se pode dizer que Bolsonaro não saiba como funciona o parlamento, no qual atuou por quase 30 anos. Na prática, porém, o eixo de sua atuação não vem sendo a articulação política do governo no Congresso: mira a mobilização ideológica de seus apoiadores, entre os quais os militares, dos quais é o “comandante supremo”, como presidente da República. Ninguém se engane com o significado da eleição de Bolsonaro. Temos um governo assumidamente de direita, com uma agenda liberal na economia e conservadora nos costumes. A oposição terá de aprender a conviver com isso. Entretanto, Bolsonaro também não pode ignorar que vivemos num regime democrático, com um Congresso que preza suas prerrogativas constitucionais.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - CB

Bolsonaro reforça compromisso com militares em hora difícil

Alvo de críticas em início de governo tumultuado, presidente reacende controvérsia sobre Forças Armadas

Esta não foi a primeira vez que Jair Bolsonaro procurou valorizar as Forças Armadas como um dos pilares da democracia no Brasil, mas foi a primeira desde que se tornaram evidentes os sinais de desconforto entre os militares com o tumulto dos seus primeiros meses no poder. As declarações do presidente, durante cerimônia do Corpo de Fuzileiros Navais, causaram controvérsia por causa das três palavras que ele escolheu para encerrar uma frase. "Isso, democracia e liberdade, só existe quando a sua respectiva Força Armada assim o quer", afirmou Bolsonaro.
Dito assim, foi como se ele sugerisse que a continuidade do regime democrático no país dependesse da tutela dos militares, e não da vontade popular ou do funcionamento das instituições cujo papel é definido pela Constituição. [saber mais, clique aqui.]
No fim do dia, numa tentativa de esclarecer o significado da declaração durante pronunciamento ao vivo nas redes sociais, o presidente disse que os brasileiros devem a democracia e a liberdade às Forças Armadas e acrescentou que elas "sempre estiveram ao lado" desses dois valores. Bolsonaro apareceu na internet ladeado por dois militares, o general Otávio Santana do Rêgo Barros, seu porta-voz, e o ministro que chefia o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, que é general da reserva. Ambos tiveram a chance de falar durante o pronunciamento do chefe. Heleno afirmou que os críticos do governo distorceram as declarações do presidente, como se ele tivesse caracterizado a democracia como "um presente dos militares para os civis". Mas era exatamente o que Bolsonaro tinha feito segundos antes, à sua direita, ao dizer que o Brasil deve sua democracia e sua liberdade aos militares.
Heleno lembrou então que a Constituição inclui entre as atribuições das Forças Armadas a manutenção da lei e da ordem interna, disse que elas são um "fator fundamental" em qualquer regime político e citou Cuba e Venezuela como exemplos de países em que ditadores sobreviveram por contar com apoio militar. De acordo com o artigo 142 da Constituição, as Forças Armadas brasileiras tem como atribuições a defesa do país, a "garantia dos poderes constitucionais" e, se convocadas por um dos três Poderes, a garantia "da lei e da ordem". [alguns comentaristas estão 'criando'  na CF, a suposta necessidade da concordância dos três poderes, o que não representa a verdade;
o texto é claro: "...
Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem."
Com um detalhe: As FF AA são organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República.] É com base nesse dispositivo que os militares foram chamados a participar de atividades de natureza policial em diversos momentos nos últimos anos, como durante a intervenção decretada pelo ex-presidente Michel Temer (MDB) na segurança do Rio.
Mas muitos seguidores de Bolsonaro acreditam que o artigo 142 também poderia ser usado para justificar uma intervenção militar na política, e até o vice de Bolsonaro, o general Hamilton Mourão, admitiu essa possibilidade numa entrevista durante a campanha eleitoral do ano passado. Segundo Mourão, que hoje é visto em toda parte como uma força de moderação dos excessos bolsonaristas, o texto constitucional permitiria que o próprio presidente desse um autogolpe, convocando as Forças Armadas para garantir os Poderes numa situação extrema que definiu simplesmente como anarquia. "Os militares supõem que a Constituição lhes dá esse papel de guardião da democracia, mas é um equívoco", diz o historiador Carlos Fico, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro. "Bolsonaro expressou esse sentimento com suas declarações." [mais um especialista dizendo o que os adversários do governo Bolsonaro gostam de ouvir.
O Comando Supremo é do presidente da República e a hierarquia e disciplina sempre estarão presente nas Forças Armadas.
Se o artigo 142 foi, segundo o especialista, uma imposição dos militares, o fato é que, imposto ou não,  ele está em plena vigência.]
Ele aponta a redação do artigo 142 como uma imposição dos militares aos parlamentares que escreveram a Constituição de 1988, uma das concessões feitas pelos políticos para garantir a suavidade da transição para a democracia após o fim da ditadura inaugurada pelo golpe de 1964. Capitão reformado do Exército, que se afastou da corporação para entrar na política após um episódio de indisciplina, Bolsonaro sempre foi visto com desconfiança pela cúpula das Forças Armadas, mas conquistou seu apoio na reta final da campanha e tem feito de tudo para preservá-lo.
Para Daniel Aarão Reis Filho, da Universidade Federal Fluminense, as dificuldades encontradas pelo presidente no início do governo e a clareza com que militares como Mourão têm exposto suas diferenças com ele levaram o presidente a procurar reforçar seus laços com os antigos companheiros de farda."Suas declarações têm o sentido de reafirmar os compromissos que ele firmou com a cúpula das Forças Armadas, numa hora difícil em que ele se vê alvo de críticas e precisa manter uma base de apoio que tem muito prestígio na sociedade", diz Aarão. "Isso não quer dizer que esses laços vão durar a vida inteira, porque vai depender do que ele conseguirá realizar no governo."
 

Ricardo Baltasar - Folha de S. Paulo


 

domingo, 15 de abril de 2018

Lula não é o marechal Philippe Pétain


Quando ex-presidente vive rotina semelhante à de um marechal usurpador, alguma coisa está errada


Passará o tempo e o regime carcerário imposto a Lula deixará um travo amargo na memória nacional. Algo semelhante ao que resultou do embarque da família imperial para o exílio no meio de uma noite chuvosa, ou a ordem para que o caixão com o corpo de João Goulart percorresse os 180 quilômetros da fronteira argentina a São Borja, sem paradas no caminho.  Lula é um ex-presidente da República. [lembrando sempre que antes de tudo é um malfeitor condenado por NOVE JUÍZES e encarcerado com o aval de SEIS ministros do STF.] Está sozinho numa sala com cama, mesinha e banheiro. Não pode deixá-la e para se comunicar com os carcereiros deve bater na porta. À primeira vista deram-lhe uma regalia, pois está muito melhor que os detentos do sistema penal brasileiro. 

As condições da solitária-light de Lula assemelham-se ao regime imposto na França de 1945 ao marechal Philippe Pétain. Ele traíra seu país e presidira uma ditadura pró-nazista. Foi condenado à morte, teve a sentença comutada e morreu no cárcere, em 1951.
Indo-se para um exemplo brasileiro, Lula está num regime muito pior que aquele vivido em 1969 por Darcy Ribeiro, ex-chefe da Casa Civil de João Goulart. Ele ficou preso no Batalhão de Comando do Corpo de Fuzileiros Navais, no Rio.  Darcy ficava num quarto iluminado e espaçoso. Fazia suas refeições e via a novela “Nino, o Italianinho" com os oficiais. Podia conviver com outros presos e, depois do expediente, circulava no pavilhão onde estava seu alojamento. Pelas paixões da época, Darcy era detestado, uma espécie de José Dirceu de Jango. 

A prisão de Darcy havia sido ordenada pelo auditor Oswaldo Lima Rodrigues, que mandou-o para o Corpo de Fuzileiros Navais, comandado pelo almirante Heitor Lopes de Souza, um militar duro e direto a ponto de ter ganho o apelido de “Cabo Heitor”. Suas simpatias pelos janguistas, a quem chamava de “gregórios”, eram nulas.  Não havia emoções políticas no tratamento dado a Darcy, apenas uma espécie de cavalheirismo. Nessa época, a poucos quilômetros de distância, a Marinha institucionalizara a tortura de presos, massacrando jovens do MR-8. Lula passa os dias só, trancado. Sem muito esforço, a Polícia Federal, o Ministério Público e o juiz Sergio Moro podem redesenhar esse regime carcerário, sem estimular um circo petista.

Moro seguiu o manual. Em 1889 não existia protocolo para o embarque de um imperador deposto e em 1976 improvisou-se uma regra para o transporte de um ex-presidente morto. Nos dois casos os donos do poder fizeram o que achavam certo para a hora, sem perceber que estavam numa esquina da História.  Lula é um ex-presidente da República, levado ao poder pelo voto popular. Quando ele vive numa rotina semelhante à de um marechal usurpador e colaboracionista, alguma coisa está errada.

A PROVA HOROSCÓPICA DE RODRIGO JANOT
Uma amostra do grau da insanidade que foi injetada nas denúncias do ex-procurador-geral Rodrigo Janot.
Em 2015 a presidente Dilma Rousseff e a marqueteira Mônica Moura passaram a se comunicar por meio de um dissimulado sistema de mensagens eletrônicas dentro do endereço 2606iolanda@gmail.com.
Segundo Janot, “2606” é uma referência “à data de 26 de junho de 1968, em que o grupo Vanguarda Popular Revolucionária, integrado por Dilma Rousseff, praticou um atentado com carro-bomba em um quartel em São Paulo, durante a ditadura militar”.
Em junho de 1968 Dilma Rousseff não era militante da VPR. Ela estava no Comando de Libertação Nacional, o Colina. A prova horoscópica de Janot relacionou o “2606” ao atentado em que um grupo de terroristas matou o soldado Mário Kozel Filho em São Paulo. Tudo bem, mas naquele mesmo dia realizou-se no Rio a “Passeata dos Cem Mil”. Janot também poderia dizer que era uma homenagem a Gilberto Gil, pois é a data de seu nascimento.
Depois do realismo mágico, Janot expôs a prova mágica.
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(...)
 
LULA E A VERDADE
Quem se der ao trabalho de ler a íntegra do discurso de Lula antes de se entregar à Polícia Federal verá que pela primeira vez ele reconheceu publicamente a derrota da greve que comandou em 1980.
Nas suas palavras:
“Ninguém aguentou 41 dias porque na prática o companheiro tinha que pagar leite, tinha que pagar a conta de luz, tinha que pagar gás, a mulher começou a cobrar o dinheiro do pão, ele então começou a sofrer pressão e não aguentou. Mas é engraçado porque na derrota a gente ganhou muito mais sem ganhar economicamente do que quando a gente ganhou economicamente. Significa que não é dinheiro que resolve o problema de uma greve, não é 5%, não é 10%, é o que está embutido de teoria política de conhecimento político e de tese política numa greve.
Agora, nós estamos quase que na mesma situação. Quase que na mesma situação.”

Tradução: Lula acha que transformará a derrota da condenação numa vitória. A ver.

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A CARAVANA
Lula tem todo o direito de dizer que não é mais um ser humano, pois se transformou numa ideia, mas foi Temer quem zerou a fila do Bolsa Família, que chegou a ter 6 milhões de pessoas na espera e reajustou o benefício acima da inflação.  Hoje o programa atende 14,3 milhões de famílias, 160 mil acima do recorde de 2014.

Elio Gaspari, jornalista