Essas declarações constituem um crime militar de ofensa às Forças
Armadas, segundo o general da reserva Paulo Chagas. “É cabível uma
representação criminal para a Procuradoria-Geral da República”, afirmou,
em entrevista concedida a Oeste. O militar da reserva
amparou-se no artigo 219 do Código Penal Militar, que prevê que
“propalar fatos, que sabe inverídicos, capazes de ofender a dignidade ou
abalar o crédito das Forças Armadas ou a confiança que estas merecem”
são cabíveis de pena de um mês a seis anos de detenção.
Na entrevista, Chagas também comentou as atuações dos ministros do
Supremo Tribunal Federal (STF), qualificando-as como parciais; defendeu a
instauração do voto impresso auditável, como forma de garantir a
transparência das eleições; e assegurou que o Exército poderá agir caso
as instituições democráticas sejam corrompidas. “Quando isso sair do
controle e tivermos de perguntar quem está de fato mandando no país,
será necessária a ação de alguém que esteja fora desse imbróglio.
Precisa ser uma instituição. E, nesse caso, o último recurso da nação
sempre foram as Forças Armadas.”
A seguir, os principais trechos da entrevista.
— Como o senhor avalia os recentes insultos do ministro Luís Roberto Barroso às Forças Armadas?
O Exército, que possui um departamento de defesa cibernética, foi
convidado pelo Tribunal Superior Eleitoral para fazer uma avaliação dos
equipamentos eletrônicos. As Forças Armadas analisaram todas as
vulnerabilidades dos equipamentos. Qualquer analfabeto sabe que
aparelhos desse tipo são vulneráveis. Então, o Exército mostrou essas
deficiências. No entanto, como a Suprema Corte está infelizmente
politizada, o ministro Luís Roberto Barroso fez uma alusão infeliz. Ele
disse que as Forças Armadas estavam sendo induzidas a boicotar as urnas
eletrônicas. Pessoas de altíssimo gabarito foram enviadas para avaliar
as urnas eletrônicas. Militares da Força Aérea Brasileira e da Marinha
também participaram do processo. Esses profissionais são formados nos
mais altos institutos de engenharia das Forças Armadas. Em vez de
Barroso interpretar essa atitude como uma grande contribuição, resolveu
tratar como um boicote. Ele quis dizer que o Exército estava querendo
agradar ao presidente da República. Barroso acredita, de fato, que as
Forças Armadas querem boicotar as eleições. Mas sabe que não poderia
fazer uma acusação dessas, por mais que esteja convencido dessa tese.
Por isso, levou uma carraspana do ministro da Defesa, Paulo Sérgio
Nogueira.
— O presidente Jair Bolsonaro desempenhou algum papel nessa crise?
O presidente tem por costume querer dizer para a sociedade que as
Forças Armadas estão partidarizadas para o seu lado. Isso não é verdade.
O Exército não possui partido. Certa vez, o general Augusto Heleno
disse algo muito importante: “O partido das Forças Armadas é o Brasil”.
Individualmente, posso querer votar em Bolsonaro — ou não. É um direito
que tenho. Moralmente, sou obrigado a ter uma opinião. Mas as Forças
Armadas pertencem ao Estado. Se outro candidato for eleito, será apoiado
exatamente como está sendo apoiado o presidente Jair Bolsonaro. O
Exército cumprirá seu dever constitucional.
— Barroso pode responder judicialmente pelo insulto às Forças Armadas?
Está escrito o seguinte no artigo 219 do Código Penal Militar: é
crime falar mal das Forças Armadas, ou atentar contra a imagem do
Exército, sem ter provas do que diz. O cometimento de um crime militar
não depende de o autor ser vinculado ao Exército. O Superior Tribunal
Militar (STM) será responsável por eventual julgamento desse caso. Um
operador de Direito, que conhece essa área, disse-me que a conduta de
Barroso poderia ser enquadrada como crime militar. Não é uma invenção
minha. Agora, o Ministério Público Militar terá de analisar a situação e
ver se há crime. A minha intenção é mostrar para o ministro Barroso que
ele também está sujeito à lei. Devemos ter cuidado ao dizer as coisas,
justamente para não cometer esse tipo de erro.
— Como o senhor qualifica a atuação do Supremo Tribunal Federal?
Não me permito falar mal do STF enquanto instituição. Trata-se de um
órgão extremamente importante para a democracia. Agora, permito-me
analisar a competência dos ministros, suas intenções e seus
comprometimentos. As atitudes dos magistrados não são aquelas que os
cidadãos esperam das pessoas que foram escolhidas para dar a última
palavra em termos de justiça. Os ministros se contradizem
frequentemente. Certas vezes, vão para um caminho; depois, seguem para
outro rumo.
— Em quais ocasiões os ministros agiram de maneira controversa?
O caso do deputado federal Daniel Silveira é um exemplo. Em outros tempos, o ex-presidente Lula entrou com vários pedidos de habeas corpus,
e tudo foi concedido. Agora, o advogado de Silveira usou esse mesmo
recurso apenas uma vez e recebeu uma reprimenda. São dois pesos e duas
medidas. Há 11 Constituições no Brasil. Os ministros agem de maneira
monocrática. Infelizmente, os magistrados não sabem se comportar de
maneira isenta — como deveria ser. Pelos discursos, pelas conferências e
palestras das quais participam, percebemos que são facciosos. Eles têm
um partido e não escondem isso. É péssimo para a democracia. Essas
pessoas não deveriam estar lá. Elas foram colocadas na Suprema Corte por
decisões políticas. Não excluo disso os dois ministros indicados pelo
presidente Jair Bolsonaro. O chefe do Executivo disse que, “para ser
indicado como ministro do STF, teria de tomar um chope comigo”. Isso não
é critério. Essa declaração diminui a importância da Suprema Corte.
Essa instituição é necessária. Sua história orgulha o Brasil. No
entanto, os ministros atuais são populares. É o “populacho”. Não é assim
que funciona. Os próprios ministros se intitularam como Poder Moderador
— algo que não existe. E ainda determinaram que, no Brasil, há um
semipresidencialismo. Eles ultrapassaram os limites.
— As Forças Armadas poderiam agir, amparadas no artigo 142 da Constituição Federal, para restabelecer a ordem no país?
Apoiadas no artigo 142, não. O texto não prevê isso. Mas o Exército
poderia agir, sim, amparado no juramento feito por todos os soldados. O
juramento está acima da Constituição, porque diz, literalmente, que os
militares estão dispostos a morrer pela pátria.
As Forças Armadas
poderão agir no momento em que perceberem uma situação de anomia social e
identificarem um conluio inaceitável do Legislativo e do Judiciário
contra o Executivo.
Por ora, isso está acontecendo em um nível
controlável. Quando isso sair do controle e tivermos de perguntar quem
está de fato mandando no país, será necessária a ação de alguém que
esteja fora desse imbróglio. Precisa ser uma instituição. E, nesse caso,
o último recurso da nação sempre foram as Forças Armadas.
— Como o senhor avalia o processo eleitoral brasileiro?
Todos os equipamentos eletrônicos são vulneráveis às ações inteligentes dos hackers.
Sempre há uma maneira de invadi-los. Não vejo nenhuma razão plausível
para não ter um acessório na urna eletrônica que possa dar ao eleitor a
absoluta certeza de que sua vontade será expressa no momento do voto.
Muitas pessoas confundem voto impresso com impressão do voto. O primeiro
deveria ser obrigatório, independentemente do modelo da urna. Se cair
um raio em determinada cidade, e todos os equipamentos forem queimados,
como faremos para votar? É preciso ter papel, de forma que possamos
votar e inserir o documento na urna. Todas as seções eleitorais deveriam
possuir uma quantidade de votos em papel. A eleição não pode ser refém
de panes. A impressão do voto, por sua vez, é ainda mais simples. Isso
prestigia o eleitor. Você vai lá, digita o número que quer e, antes de
confirmar o voto, aperta um botão da urna para visualizar, em papel, o
número do candidato que escolheu. O eleitor não terá contato direto com o
documento, apenas poderá visualizá-lo e se certificar de que a urna
seguiu exatamente seu comando. Esse papel ficará na urna. Não sei qual a
dificuldade de fazer isso. “Ah, é muito caro!”. Não é, não. Essas
maquininhas de cartão de crédito, por exemplo, custam merreca. Basta
colocar um aparelho similar nas seções eleitorais. Não sei por que há
tanta ojeriza à impressão do voto. Isso tornará as eleições mais
transparentes.
Leia também: “A provocação do STF ao Executivo chegou ao limite”, artigo de J.R. Guzzo publicado em Oeste