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domingo, 3 de janeiro de 2021

O que leva as pessoas a terem medo da vacina chinesa? Diário da Vacina

Laryssa Borges - VEJA

Tudo vem da China

“Aceito tomar a vacina de Oxford, mas não a vacina chinesa”, me diz um familiar no almoço de Ano Novo.

 3 de janeiro, 9h21: O que faz as pessoas espalharem temer o uso de vacinas chinesas durante a pandemia de Covid-19? Nas reuniões de fim de ano com familiares, a chegada dos imunizantes ao Brasil foram assunto obrigatório, mas a resistência em aceitar receber o antígeno se ele tiver sido desenvolvido na China permanece. “Aceito tomar a vacina de Oxford, mas não a vacina chinesa”, me diz um familiar no almoço de Ano Novo. Meu estômago embrulha.

Como voluntária de um estudo clínico em busca de um imunizante contra a doença que já matou mais de 1,8 milhão de pessoas em todo o mundo, sinto-me impotente diante do negacionismo e da força de movimentos criminosos anti-vacina. Mas voltemos aos chineses. A CoronaVac será desenvolvida no Brasil pelo Instituto Butantan, e a Sinopharm, o mais novo antígeno da China, já é ministrada nos Emirados Árabes durante esta pandemia e tem taxa de eficiência de 79%, segundo o fabricante, e agora teve aprovação para uso emergencial no Egito.

 E a vacina de Oxford? Também tem insumos chineses. A fábrica da AstraZeneca, por exemplo, recentemente visitada pela Anvisa para atestar qualidade na linha de produção, fica na China. Mais especificamente, no distrito de Wuhan, o primeiro epicentro da pandemia do novo coronavírus, e um grande pólo industrial no país.

Para tentar agilizar a vacinação de brasileiros, a Anvisa anunciou ontem que aprovou um pedido de importação excepcional de dois milhões de doses da vacina de Oxford, enquanto a Fiocruz desenvolve as 100 milhões de doses previstas no acordo com a farmacêutica AstraZeneca. Só para que fique registrado: o insumo farmacêutico ativo, conhecido como IFA, que será usado para produzir a vacina de Oxford no Brasil, também vem da China.

Parem de espalhar teorias conspiratórias. Tudo vem da China.[aí é que mora o perigo. A procedência dos fármacos e as inconsistências na não divulgação dos testes da vacina chinesa,  se somam a uma má fama (que já foi maior) dos produtos chineses.]

Diário da Vacina - Laryssa Borges, VEJA

segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

Uma vacina contra a estupidez - Fernando Gabeira

In Blog
Com a vacina no horizonte, a dois meses de completar 80 anos, a Covid-19 me visitou. Se a ideia era me matar na praia, o vírus perdeu. Tornou-se apenas uma memória no meu sangue, na forma de IgG reagente. Um retrato na parede, como dizia Drummond. Pouca febre, muita dor de cabeça: é bom vencer uma batalha, mesmo sabendo que, no final, perde-se a guerra. [os quase 80 anos e o passado agitado do articulista, não deixam dúvidas ser ele 'duro na queda'. No agitado passado perdeu batalhas, agora venceu a peste chinesa.  
A seu favor teve, e tem, um fato reconhecido pelo nosso presidente: devemos combater e nos prevenir contra o coronavírus, mas a covid-19 é na maior parte das vezes uma "gripezinha". Graças a DEUS,  seu índice de contágio é inferior ao da influenza e sua letalidade a torna menos mortífera do que muitas outras doenças tradicionais que continuam, e infelizmente continuarão matando milhares e milhares de brasileiros.]

Ainda assim, estarei na fila da vacina. Dizem que um raio não cai duas vezes no mesmo lugar, mas a Covid-19 tem negado essa crença popular. Bolsonaro está tirando o bumbum da seringa. E o faz em situações diferentes. Em primeiro lugar, quer que as pessoas assumam um termo de responsabilidade ao tomar a vacina. Ele não leu a Constituição no trecho que afirma que a saúde como direito de todos é dever do Estado.

Em segundo lugar, afirma que não vai se deixar vacinar e ponto final. Em muitos lugares do mundo, os estadistas se vacinam em público para estimular as pessoas. Obama, Clinton e Bush se dispuseram a isso. O vice-presidente dos EUA o fez. A rainha da Inglaterra espera na fila de vacinação. Depois de muito resistir à CoronaVac, que chama de vacina chinesa, Bolsonaro decidiu autorizar o general Pazuello a comprá-la, no Instituto Butantan. [essa vacina tem um problema: não aparece, não existe pedidos de registro, encalhou na FASE 3 de TESTE e em todo o mundo conta apenas com aprovação da China e do 'bolsodoria'.]

Aqui, o movimento de tirar o bumbum da seringa é mais sutil. Ele percebeu que não será fácil conseguir vacinas rapidamente, além da CoronaVac. E o exame cotidiano das pesquisas mostra que a incapacidade de oferecer vacinas derrubará seus índices de popularidade. A ideia de sabotar a CoronaVac não era boa. Na década de 1980, no auge da epidemia de aids, o governo francês sabotou uma técnica de exame de sangue, formulada pelo Abbott. Havia uma iniciativa semelhante, porém mais atrasada, no Instituto Pasteur.

Quando se descobriu que o governo empurrou com a barriga a licença de uma técnica que salvaria muitas vidas, foi um deus-nos-acuda. Famílias de hemofílicos entraram na Justiça, houve até uma tentativa de explodir uma bomba. Para simplificar a história: dois diretores do Centro Nacional de Transfusão de Sangue foram condenados a quatro e dois anos de cadeia. São eles Michel Garreta e Jean-Pierre Allain.

Em síntese: atrasar por razões políticas uma vacina que possa salvar vidas dá cadeia. É importante que os militares da Anvisa saibam disso. O próprio general Pazuello também deveria entender. Se for difícil para ele, sempre haverá alma caridosa para explicar com desenhos e animação. Outro dia, vi nas redes um vídeo em que o general Pazuello, numa festa, cantava “Esperando na janela”. O ministro da Saúde cantando numa festinha, em plena pandemia, é sempre estranho. Pazuello já teve Covid. Foi tratado com todos os recursos disponíveis, não lhe faltou leito.

Ao dizer em discurso que não entende a ansiedade de todos nós, ele se esquece de milhões de pessoas que têm medo de não encontrar vaga em hospital, medo da falta de ar, medo de ser intubadas, medo da morte. A frase de Pazuello é a versão edulcorada do “país de maricas” que Bolsonaro enunciou num dos seus discursos no Planalto. No fundo, são pessoas que não entendem o medo em nossa economia psíquica, muito menos as qualidades do feminino. Associam ideias estupidamente.

Percebo agora como subestimei o perigo que Bolsonaro representava em 2018. Calculava apenas a ameaça à democracia e contava com os clássicos contrapesos institucionais: STF e Congresso, imprensa. Não imaginei que um presidente poderia enfrentar uma tragédia como o coronavírus ou precipitar dramaticamente a tragédia anunciada pelo aquecimento global.

Os Estados Unidos passaram por um flagelo semelhante e o superaram, apesar das marcas. A versão tropical é mais devastadora, não só pela profundidade da ignorância de Bolsonaro, mas também pelas circunstâncias. Trump deixa os Estados Unidos com pelo menos uma vacina produzida nos EUA e quantidade de doses contratada suficiente para imunizar o país. No seu lugar, entra Biden: consciência ambiental e sintonia absoluta com a ciência no combate ao coronavírus. [ser recorrente torna-se necessário: quanto estiver disponível para compra a vacina chinesa, ou outra, devidamente registrada na Anvisa ou no FDA, e o governo Bolsonaro se recusar a comprar, pode, e até deve, ser denunciado.

Por conquanto, cabe preocupação aos muitos que desde o inicio da pandemia adotam medidas estapafúrdias, conflitantes, inúteis, quase sempre cerceiam ações governamentais, . Estes certamente terão que prestar contas.]

Não tenho dúvidas de que também vamos acordar do pesadelo. Mas uma importante tarefa, assim como aconteceu com uma geração de intelectuais alemães no pós-guerra, será estudar as causas disso tudo: as raízes no imaginário nacional que nos tornam tão vulneráveis à barbárie, tão seduzidos pelo discurso da estupidez.

Blog do Gabeira - Fernando Gabeira,  jornalista

Artigo publicado no jornal O Globo em 21/12/2020

 

sábado, 7 de novembro de 2020

Os vendilhões da liberdade

Por Guilherme Fiuza - Vozes - Gazeta

Era uma vez um vírus. Ele nasceu numa ditadura e sonhava dominar o mundo. Por coincidência, essa ditadura também sonhava dominar o mundo. Do outro lado desse mundo que eles queriam dominar estava o país mais poderoso. Era preciso, portanto, vencê-lo. E eles foram à luta. Havia uma pedra no caminho: o país mais poderoso do mundo era livre. E nem todos os exércitos virais da galáxia são mais fortes do que a liberdade. Era preciso, então, quebrar as pernas dela. Como? Eles não tinham certeza da eficácia, mas resolveram tentar um coquetel esperto: medo, vaidade e dinheiro fácil.

Na potência livre o dinheiro estava associado a trabalho duro, pelo menos para a imensa maioria. Na ditadura emergente o dinheiro advinha do sangue do povo, cuja dignidade não podia ser reclamada por ninguém. E era muita gente, muita mesmo. O coquetel começou a funcionar quando o dinheiro fácil da ditadura emergente passou a jorrar sobre os vaidosos (e esganados) do resto do mundo. Aos pouquinhos, aqueles que viviam sob os códigos da liberdade e do mérito começaram a concordar em reconhecer liberdade e mérito nos concorrentes obscuros. Estavam sendo docemente comprados.

A ditadura brutal levou um banho de loja enquanto aumentava a sua brutalidade – alcançando o ponto mais autoritário do regime em décadas. Mas do lado de fora o mercado da futilidade continuava encantado com o dinheiro fácil e fazia o seu papel direitinho – conferindo atestado de modernidade e idoneidade a uma tirania selvagem. A tirania foi comprando a potência livre. 

Aí sujou. Cidadãos que teimavam em não vender a sua liberdade provocaram uma mudança política que ameaçou estragar tudo. O novo governo da potência livre achou que não era uma boa continuar se entregando de corpo e alma ao capitalismo pirata da ditadura moderninha e começou a trazer o jogo das sombras para a luz. Foi então carimbado como “fascista” – maneira encontrada pela pirataria de inserir a propaganda em seu coquetel.

Essa estratégia pareceria tosca a qualquer observador sensato
– mas o que é a sensatez diante da malandragem, num mundo que consegue transformar picaretagem em virtude? Um exército de formadores de opinião carimbando como falsidade e onda de ódio qualquer contestação à teoria do novo “fascismo” revoga qualquer ameaça de sensatez. É realmente difícil contrapor uma massa de propagadores amestrados, ornados com vistosa fantasia humanitária e adoçados com dinheiro fácil e farto. Mesmo assim o “fascismo” dos livres e democratas se impôs, e aí chegou o vírus.

O medo como pretexto para controlar os terrenos que a vaidade e a venalidade não tinham conquistado foi genial. Se a pirataria da ditadura emergente tivesse se imposto só no terreno material, não daria em nada. Mas a pirataria evoluiu para os valores civilizatórios e os espíritos – e foi um espetáculo exuberante a coletividade renunciando à vida para se enclausurar numa falsa ética, em casamento inédito do pavor com o cinismo.

Parabéns! Não seria possível quebrar as pernas de uma democracia sem operar o instrumento básico dela – o voto. Foi encantador ver a pirataria embaçando tudo, transformando a vontade do eleitor confinado em malotes voadores ao sabor da picaretagem diligente.Não deixa de ser uma escolha. Vocês optaram pelo fingimento. Fingiram defender a liberdade enquanto a envenenavam. Fingiram mal, mas colou. Convivam com essa escolha para sempre. Quem prefere ser livre continuará buscando isso – mesmo sabendo que, com o êxito da tirania viral, a paz vai ficar mais difícil.

Guilherme Fiuza, jornalista  - Vozes - Gazeta do Povo


segunda-feira, 6 de julho de 2020

Os valores e a nova normalidade - Denis Lerrer Rosenfield

O Estado de S.Paulo

Medo da morte, medo da insegurança social e econômica. Como viver sob tais circunstâncias?

Talvez não nos tenhamos dado conta devidamente de que o mundo mudou. O que vivíamos antes não se faz mais presente senão sob o modo da lembrança e do anseio, enquanto o que nos espera está sendo apenas vislumbrado. Falamos uma linguagem fruto de nossa condição anterior, como quando verbalizamos a nossa situação sob o modo da pré e da pós-pandemia, como se este período atual fosse passageiro, a ser apenas atravessado. Se há, estrito senso, um pós-pandemia, ele se situa posteriormente à descoberta, industrialização e distribuição maciça de uma nova vacina, capaz de controlar esta doença, se é que não teremos no futuro outros eventos do mesmo tipo.

Religiosos diriam que voltamos a ter pandemias, tempestades, pragas bíblicas como a dos gafanhotos e mortes que se acumulam em escala planetária. Moralmente, as relações humanas estão mudando, seja na quarentena, seja no desrespeito a regras que sejam melhores para a saúde de todos. A transgressão não deixa de ser um reconhecimento de que há uma nova normalidade, por mais que possamos ter dificuldades de admiti-la.

Seria tentado a dizer que antes de um “pós-pandemia” viveremos ainda bons meses, nãos se sabe quantos, de um lento e doloroso processo de saída, em que os caminhos a serem trilhados estão sendo somente vislumbrados. E nesta travessia as relações humanas estão sendo transformadas, comparecendo outros valores e formas de comportamento. A pandemia nos põe diante dos limites da condição humana e do seu próprio significado.

A finitude da condição humana, enquanto questão, surge com a irrupção do coronavírus, atingindo o corpo mesmo das pessoas e confrontando-as com a ameaça da morte súbita, imprevista. As pessoas são extraídas do seu cotidiano, passam a viver uma reclusão forçada e são levadas, queiram ou não, à introspecção. Algumas se voltam para a solidariedade, o fortalecimento da família, outras se sentem desorientadas ou mesmo abandonadas. Dentre elas aparecem diferentes demandas, como a ajuda familiar, o apoio dos amigos, até as mais propriamente “políticas”, decorrentes de pedidos de maior intervenção estatal.

A sociedade foi atingida por um inimigo presente e invisível, que tudo controla e ameaça, não deixa nenhum espaço para o descuido. Qualquer um pode ser atingido, sem sequer se dar conta de que o seu destino pode ter mudado, quiçá para sempre. Milhões de pessoas são afetadas pela crise econômica, o desemprego é estratosférico, a renda familiar cai vertiginosamente, as empresas menores não têm como se sustentar, cria-se um clima geral de insegurança. De um lado, o medo da morte; de outro, a insegurança social e econômica. Como viver sob tais circunstâncias?

Atentemos para o uso de máscaras e a relação que assim se estabelece com o outro. Crianças nas escolas, na volta às aulas, serão obrigadas a usar máscaras e a guardar uma distância sanitária dos colegas. O que isso significa? Significa que o outro não é uma companheira ou um companheiro, mas uma ameaça, nela e nele serão vistas a doença e a morte. Num shopping, num comércio, numa empresa, numa repartição pública surge o medo do outro, o sentimento de uma ameaça constante. Os valores morais sofrem uma grande transformação, seja ela consciente ou não. Em todo caso, as relações humanas estão sendo profundamente alteradas.

Pensa-se hoje na retomada da economia, como se estivéssemos na iminência de uma volta à normalidade anterior, com, por exemplo, os mesmos patamares de renda e de consumo. Há uma questão que se impõe: será que as pessoas voltarão a consumir da mesma maneira? Será que o consumo como valor não teria ele mesmo se tornado problemático? Talvez não baste a reabertura de shoppings e de comércios se essa mudança de valores e de comportamentos não for pensada e outras mensagens não forem transmitidas, baseadas na vida e na valorização dos outros.

Na quarentena as pessoas aprenderam a viver com menos bens materiais e apreciando mais as relações humanas nos microcosmos em que foram obrigadas a se inserir, como a família, o casamento, as relações amorosas e os amigos. Desapareceu a noção do entretenimento como era antes: ida a bares, restaurantes, lojas, shoppings, cinemas. Surgiram outros entretenimentos, como os streamings, a leitura de livros e a conversa – ou mesmo o silêncio – com o próximo. Todavia, para além desses entretenimentos, perguntas relativas à doença, à morte e à vida ganharam relevância. Sentimentos como o medo e a insegurança tomaram conta das pessoas.

Nos Salmos já aparecia a ideia de que “o início da sabedoria é o medo do Senhor”, que pode também ser lida em nosso contexto como uma indagação sobre o sentido mesmo da condição humana no recurso a um Senhor que venha em nosso auxílio se o soubermos reconhecer. Em Hegel aparece a mesma ideia: o “início da sabedoria é o medo (da morte violenta)”; em nossa condição, o medo da morte que pode irromper a qualquer momento sob a forma do coronavírus. Não caberia uma indagação sobre o saber e os nossos valores?

Denis Lerrer Rosenfield, professor de filosofia - O Estado de S. Paulo


domingo, 1 de março de 2020

É nós ou eles (os micróbios) - O Globo

Dorrit Harazim 

Com seu poder de disseminação planetária em redes sociais, o medo encontra neste novo milênio um hospedeiro frondoso

Nada a ver com o nosso medo natural e real que convida à ação e começa com a luta do embrião por oxigênio. Trata-se aqui do medo do invisível e do desconhecido, onde expectativas ansiosas e interpretações agourentas favorecem crendices. É esse tipo de medo que induz à paralisia ou a comportamentos irracionais.

Coube ao financista americano Bernard Baruch escrever o prefácio para a reedição de 1932 do clássico sobre nossos desvarios coletivos. Não por acaso. A nova edição chegou às livrarias americanas em 1932, com a Bolsa de Nova York ainda em pandarecos, e Baruch fora um dos grandes especuladores que escapara ileso da histórica hecatombe financeira. Ele atribuía o fato de ter economizado milhões à leitura do inventário de maluquices humanas feito por Mackay no século anterior. Baruch concluiu que boa parte das ruínas do crash de 1929 poderia ter sido evitada se os bípedes da época tivessem continuado a repetir que 2+2 são apenas e sempre 4.

Não é de hoje nem de ontem que nações sensatas, tidas como evoluídas, se agarram a um desvario e nele arrastam milhões de seguidores. Afinal, foi na Idade de Ouro da Holanda do século 17 que ocorreu a famosa “tulipamania”— o desejo insano e insaciável de todo um povo por uma flor de origem turca, forma de turbante (daí seu nome) e cotação nas Bolsas da época. Especuladores ofereciam valores extravagantes, além de propriedades, charretes, cavalos ou pratarias por um único bulbo da raríssima Semper Augustus, enquanto cidadãos comuns vendiam o que tinham ou se endividavam por espécies menos nobres. Ao final do surto, houve fartura de donos com tulipas que não valiam mais nada por falta de comprador. Coube à Câmara de Amsterdã decidir pela anulação dos contratos de compra e venda originais, para que os holandeses voltassem a olhar para uma tulipa pelo que ela é: uma tulipa.

Agora, para quem quiser mergulhar fundo e sem medo nos desafios que a natureza coloca na marcha humana sob forma de doenças infecciosas, recomenda-se o monumental “A próxima peste”, da jornalista americana Laurie Garrett, especializada em ciências e saúde pública. O livro não lida com medos irreais. É um trabalho de jornalismo investigativo científico apaixonante, que mergulha nos micróbios que nos cercam e deixa lições duradouras sobre a vasta gama de pragas com que aprendemos a conviver. Ou a morrer. A obra não é recente, data de 1995, mas ajuda a compreender como chegamos ao coronavírus. 

A autora conclui as mais de 600 páginas com uma constatação: do ponto de vista dos micróbios, nosso planeta de seis bilhões de humanos majoritariamente carentes se parece com a Roma do século 5 a.C. Enquanto a raça humana lutar intestinamente, brigando por espaço cada vez mais abarrotado de gente e carente de recursos, a vantagem continuará no campo dos micróbios. Eles são nossos predadores e sairão vitoriosos se não aprendermos a viver numa aldeia global racional que deixa poucas chances ao inimigo. Ou é isto ou devemos nos preparar para a próxima praga.

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sexta-feira, 27 de setembro de 2019

Matar e morrer - Eliane Cantanhêder e morre - Eliane Cantanhêde

O Estado de S.Paulo

Há um Fla-Flu macabro, mas as crianças e os policiais são vítimas do mesmo sistema
 
Em 2019, Ágatha é a quinta criança morta por bala perdida no Rio de Janeiro. Em 2018, foram 87 policiais mortos no País em serviço e em decorrência de confrontos nas ruas. Também em 2018, 104 policiais cometeram suicídio em meio a tragédias, tensão, medo, impotência diante da violência. E o que faz o nosso Brasil tão varonil? Repete o Fla-Flu macabro da época do assassinato brutal da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, em que as vítimas viram réus e até uma juíza espalhava as mais ofensivas, indignas e grosseiras fake news contra... a assassinada!
 
 
[pergunta de um brasileiro: com qual fundamento só os policiais são acusados  pela morte de inocentes no Rio?
qual o motivo das mortes dos policiais - mortos em combate, outras vezes de folga e mais de uma centena se suicidaram,  só em 2018, e pouco se encontra na imprensa sobre estas mortes?
O que motiva os policiais serem sempre apontados como responsáveis pelas mortes decorrentes de balas perdidas?
qual o motivo de ser ignorado que os bandidos também atiram? - quem atira pode ser o responsável por uma bala perdida que matou um  inocente -  (especialmente que eles tem ganho político, que pode levar à suspensão das operações policiais contra o tráfico e contra o crime em geral)
Sempre os policiais são os acusados - ora de forma clara, ora meio disfarçada.
 
Parte da imprensa já insinua que é a política do Presidente Jair Bolsonaro que incentiva as mortes e o aumento da violência - tem que ser lembrado que a política do Presidente Bolsonaro de oferecer aos brasileiros que desejarem a oportunidade de reagir a um ataque de bandidos e tornar a 'profissão' de assaltante mais perigosa para o 'profissional', ainda não foi implantada.
Tem sido vítima de um boicote sistemático de todos os lados - especialmente daqueles que tem uma tendência a achar que os bandidos devem ter o direito de matar impunemente?]


Criou-se novamente agora uma guerra insana pelas redes sociais. Defensores de Ágatha, das crianças mortas e suas famílias despedaçadas destilam ódio contra policiais. Do outro lado, grupos policiais, ligados à polícia ou simplesmente anacrônicos e intrinsecamente violentos têm a coragem – e a desumanidade – de relevar as mortes e desqualificar a dor das famílias.

[o Estado de S. Paulo publica declaração de Rodrigo Janot:
'Ia matar Gilmar e me suicidar', afirma Janot 

Janot: ‘Ia ser assassinato mesmo. Ia matar ele (Gilmar) e depois me suicidar

Ex-procurador-geral da República diz ao ‘Estado’ que chegou a ir armado para uma sessão do Supremo com a intenção de matar a tiros o ministro, mas 'mão de Deus' o impediu. 
Será que foi a política de desarmamento que Bolsonaro prometia na campanha - - promessa ainda não cumprida já que não deixaram nem pretendem permitir que ele cumpra -  despertou instintos assassinos em Rodrigo Janot.]

Em que mundo nós estamos? Ou melhor, que país é esse? É tão difícil compreender e admitir que Ágatha, os policiais mortos, os que se suicidaram e todas as famílias e suas comunidades são vítimas? Além de respeito, merecem enorme solidariedade e um grito de todos os grupos pela paz, democracia, empatia, solidariedade. E pela responsabilidade do Estado.

Quais são as reais políticas públicas dos sucessivos governos federais, estaduais e municipais não apenas contra a violência, mas contra o mal maior do nosso país, a exclusão, a desigualdade social? Bolsas isso e aquilo da era do PT? Ótimo, mas só são paliativos, migalhas, não têm nada de estruturantes. Tanto que a miséria continua aí, à vista de todos, a céu aberto. [Liberar armas e munições a torto e a direito, como o presidente Jair Bolsonaro fez questão de inaugurar as medidas de seu governo?] Como assim? A ciência, as pesquisas, os estudiosos dizem o oposto: não se combate crime e tráfico dando mais armas, mas sim fazendo o oposto: produzindo políticas entre as várias esferas da Federação justamente para reduzir as armas em circulação. Com inteligência e ação.

Ação não é sinônimo de uma operação atrás da outra nas áreas mais vulneráveis das cidades, como os bairros pobres e as favelas do Rio. A polícia entra, ataca, mata, morre. E tudo continua igual, sob aplausos do governador Wilson Witzel, cada vez mais ousado no estímulo à matança e na sua investida política para alçar voos mais altos, certamente imaginando: “Se deu Bolsonaro, por que não dar Witzel?”. Como não há intenção, decisão e esforço para realmente intervir e melhorar a realidade, o jeito é remediar. Como? Matando. No caso dos policiais, matando e morrendo. É cômodo para poderosos sem escrúpulos, mas é uma tragédia para o País. E, como nunca é demais repetir, tragédias quase sempre se abatem sobre os mais fracos, as favelas, a base da pirâmide.

Soa assim: se o preço para garantir a segurança dos bairros ricos e das elites é matar uma Ágatha daqui, outra dali, o que fazer não é? É o preço! Trata-se do chamado “efeito colateral” de tratamentos graves de saúde e de guerras. [caso as operações não sejam realizadas, os bandidos vão continuar livres, impunes, matando policiais, matando crianças e inocentes.
Se forem combatidos sem trégua, ainda que ocorra o indesejado efeito colateral, os bandidos vão recuar, procurar outras atividades, outras áreas.]

E quem reclamar e chorar, vai ter de ouvir os governos dando de ombros e dizendo que opositores querem “usar caixões como palanques”. É cruel, desumano, inacreditável, tanto quanto as estatísticas: nenhuma das mortes de crianças com tiros na cabeça, tiros pelas costas e em situações absurdas foi esclarecida, ninguém está sendo processado, foi condenado ou preso. E dificilmente será. Pobres crianças mortas, pobres policiais trucidados, pobres famílias, pobre Brasil.

Corrupção. De paulada em paulada, lá se vai a Lava Jato. [a decisão que está sendo gestada no Supremo significa a INSTITUCIONALIZAÇÃO da INSEGURANÇA JURÍDICA TOTAL, PLENA, ABSOLUTA e DEMOCRÁTICA.]
 
 Eliane Cantanhêde - O Estado de S. Paulo

sábado, 9 de fevereiro de 2019

PRIMEIRA PENCA DE CADÁVERES DE MORO 5: duas alterações que ministro quer no Código Penal tornarão rotina entregar carne preta

[por respeito ao ilustre autor do Blog - Reinaldo Azevedo - cujo saber jurídico pode não ser tão notório quando o de alguns ministros do nosso excelso pretório, mas, certamente, é superior - mantivemos na transcrição o título, do qual discordamos.

Portanto o título interno, passa a ser: todos os procedimentos legais estarão previstos em lei e sob o crivo do Poder Judiciário e do Ministério Público.]

Moro decidiu reescrever dois artigos do Código Penal, o 23 e o 25, para situações como a do Rio. 
                                                           
O 23 trata da legitima defesa. Hoje, é assim:
Não há crime quando o agente pratica o fato:
I – em estado de necessidade;
II – em legítima defesa;
III – em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.
Parágrafo único – O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.
 
Ficaria assim:
Não há crime quando
I – em estado de necessidade;
II – em legítima defesa;
III – em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.
1º O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.
§2º O juiz poderá reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la se o excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção.

ACRÉSCIMOS:
Parágrafo único. Observados os requisitos do caput, considera-se em legítima defesa:
I – o agente policial ou de segurança pública que, em conflito armado ou em risco iminente de conflito armado, previne injusta e iminente agressão a direito seu ou de outrem; e
II – o agente policial ou de segurança pública que previne agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes.”  [Em qual mudança se encontra o erro ou eventual excesso?                                 as circunstâncias excludentes de ilicutudes invocadas podem ser constatadas e uma vez comprovadas, devem ser aplicadas.
O artigo 24 continua em vigor tal qual está na legislação atual.]

Fim de papo. O Inciso I do Parágrafo 2º do Artigo 23 relido por Moro põe um ponto final à questão. Pode mandar enterrar os mortos. Sem questionamento. [o artigo 23, vigente, tem apenas o parágrafo único.]

Mas o doutor achou pouco e resolveu dar nova redação também ao Artigo 25, que define legítima defesa:
Hoje, o caput diz o seguinte: Art. 25 – Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.[caput inalterado.]
 
Moro conservou o caput e acrescentou um parágrafo único com dois incisos:
I – o agente policial ou de segurança pública que, em conflito armado ou em risco iminente de conflito armado, previne injusta e iminente agressão a direito seu ou de outrem; e
II – o agente policial ou de segurança pública que previne agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes.” [acréscimo para tornar mais clara, reduzindo a elevada subjetividade existente na redação ainda em vigor, as situações.
Normalmente, quem busca a impunidade se vale da subjetividade e Moro fez o contrário.]
 
Mais uma vez, no caso do Rio, convenham, não se faz necessário investigar nada. Basta assegurar, quando menos, que os policiais estavam “prevenindo injusta e iminente agressão”. Sem contar, né?, que, voltando ao Artigo 23, o “agente” policial ou não pode ter justificado seu excesso por “medo”, “surpresa” e “violenta emoção”. [o agente, policial ou não, é um ser humano, portanto sujeito as reações humanas, que incluem medo, surpresa e violenta emoção.]
 
Essa foi apenas a primeira penca de cadáveres que deve ser moralmente debitada na conta de Moro. Virão muitas outras.  E antes que algum cretino afirme que estou prejulgando os policiais, noto. Não terei como “pós-julgar” porque a cena do crime desapareceu, e a investigação está condenada. Certamente os cadáveres não foram retirados de lá por “medo”, “surpresa” ou “violenta emoção”. [na maior parte das vezes,  em  tiroteios, decidir que todos estão mortos e que é inútil qualquer tentativa de socorro é impossível se a polícia não adentrar, ainda que com prudência, à cena do crime e nessa manobra pode ocorrer alterações que modifiquem algum ponto da mesma cena.

A polícia não entra, para preservar a cena, 'decreta' todos mortos e se após for constatada que uma das vítimas estava viva e que por decisão da polícia foi declarada morta, a acusação de 'omissão de socorro', será implacável.

Ah, sim: ainda sobraram algumas balas de borracha em familiares e amigos de um grupo que estava escondida em uma casa. As pessoas temiam que tivessem o mesmo destino dos demais. [balas de borracha e gás lacrimogênio são usados pela polícia, o que evidencia o esforço da policia em não usar armamento letal; 
não logrando êxito teve que se valer do armamento letal - tudo indica em legítima defesa.] 
 
Continua aqui

Blog do Reinaldo Azevedo