O ajuste que a reforma da Previdência traz à economia transcende as contas de ano. Estamos falando das contas de várias gerações. Em política, muitas vezes, é preciso deixar de lado o ótimo em nome daquilo que é possível
Leio que o presidente Michel Temer estaria disposto a sacrificar
uma parte do ajuste fiscal em benefício da reforma da Previdência. Para aprovar
o texto, o governo se mostraria propenso a manter o reajuste do funcionalismo
em 2018, que havia sido suspenso; renegociar dívida do setor rural e adotar
novo cronograma para o pagamento de pendências dos Estados com a União. Sei lá se isso vai acontecer ou não. Se vai ser assim mesmo ou
não. Se são esses os itens negociáveis ou não. O que sei, desde há muito, é que não há política onde não há
negociação. E se inexiste a negociação, então resta como saída única a lei do
mais forte e não há mais nada, rigorosamente, que se possa fazer a respeito.
A imprensa brasileira lida mal com isso. Governos negociam com
seus respectivos parlamentos no mundo inteiro. Ocorre as grandes democracias
são, na sua maioria, bipartidárias. Mesmo quando a França surpreende com um
Emannuel Macron, se vocês notaram bem, o que se tem lá são duas forças majoritárias.
Ele tomou o lugar do Partido Socialista e manteve a polarização. Fica mais
fácil governar. Quando se tem parlamentarismo, de resto, é preciso, com
exceções muito raras, formar a maioria apenas uma vez. Dada a forma como o poder existe no Brasil, cada caso é um caso;
cada negociação é uma negociação, e o governante sempre tem se ficar se
equilibrando entre várias forças.
Não foi Michel Temer que inventou os 35 partidos (!) com
representação no Congresso. Esse desatino, diga-se, é uma das obras do gosto
legiferante do Supremo, quando decidiu, no passado, que cláusulas de barreira
asfixiavam a democracia… Olhem aí. Sim, Temer vai ter negociar. Bem, digamos, então, que seja mesmo verdade que o presidente
pretenda sacrificar parte do esforço fiscal em benefício da reforma da
Previdência. Pergunta-se: é por seu próprio bem que o faz? É para garantir
algum projeto político seu? Por ora, que se saiba ao menos, a mudança mais pode
tirar do que dar votos.
O ajuste que a reforma da Previdência traz à economia transcende
as contas de ano. Estamos falando das contas de várias gerações. Em política,
muitas vezes, é preciso deixar de lado o ótimo em nome daquilo que é possível,
não? E não há nada de novo nem de formidável nisso. No fim das contas, o chefe
do país é obrigado a escolher: vale a pena transgredir uma combinação
contingente em nome de um efeito permanente? A resposta, obviamente, é
sim! Diga-se o mesmo em relação à reforma ministerial. Não se sabe
ainda a forma final, mas é evidente que o presidente tem de pensar nessa
mudança também de olho na votação da Previdência. Que mal há nisso? Se você é
do tipo que acredita que políticos deveriam ser orientados apenas pelo sentido
de missão, então, lamento dizer, precisa se ocupar um pouco mais dessa que muitos
julgam ser uma “arte”. Refiro-me, sim, à política. Sim, há as convicções, e elas são importantes. Mas é preciso saber
operar com a realidade.
Blog do Reinaldo Azevedo
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