O trem da Transnordestina continua a ser uma lenda, agora com risco real de prejuízo aos cofres públicos porque, segundo o TCU, o governo nem sabe o custo das obras
De camisa
vermelha e calça preta, desafiava os sertanejos reunidos na tenda branca,
protegidos contra o sol que devorava a tarde em Missão Velha (CE), a 530
quilômetros de Fortaleza: “Tão vendo esse pescocinho curto aqui? É de tanto
carregar lata d’água na cabeça lá em Garanhuns...”— a plateia riu. Completou:
“Mas eu posso garantir a vocês, em 2012 nós vamos inaugurar a totalidade da
transposição do Rio São Francisco. E, sabe o que é engraçado? Também vamos
inaugurar a Transnordestina”. O comício daquela segunda-feira, 13 de dezembro
de 2010, acabou com Lula abraçado a Benjamin Steinbruch, empresário da
siderurgia e dos produtos têxteis. [o coisa ruim do condenado Lula é tão cara de pau que 'inaugurou' quatro vezes a ferrovia Transnordestina e os idiotas dos seus eleitores acreditaram na fraude;
chegaram ao requinte de uma das inaugurações os vagões ferroviários foram levados para o local da palhaçada em carretas rodoviárias.]
Exalavam
alegria. O presidente, em fim de mandato, porque autorizara obras aguardadas há
mais de 160 anos, quando D. Pedro II mandou projetar uma ferrovia ligando o
sertão ao mar do Nordeste. O dono da CSN, de Volta Redonda (RJ), porque ficaria
ainda mais rico com os 1,7 mil quilômetros de trilhos da Transnordestina
cortando outros 80 municípios de Ceará, Piauí e Pernambuco — negócio de R$ 6
bilhões extraídos do Orçamento da União, do BNDES e dos fundos regionais.
Missão
Velha empobreceu, desde então. Assistiu ao fim das agências bancárias e à
migração de aposentados para o comércio de Barbalha, 25 quilômetros adiante.
Não recebe água do São Francisco, nem trem da Transnordestina. As obras
da ferrovia concedida sem licitação pararam há três anos, embora já tenham sido
gastos recursos públicos equivalentes a 80% do investimento previsto. Agora,
depois de um ano de investigações pedidas pela Câmara dos Deputados, o Tribunal
de Contas comprovou que o contrato de construção e exploração da
Transnordestina foi assinado com o grupo de Steinbruch em 2013, no governo
Dilma Rousseff, “sem estudos e análises que justificassem o interesse público”,
e sem comprovação “do equilíbrio econômico-financeiro” do projeto.
Descobriu,
também, que no governo Michel Temer os ministérios dos Transportes e do
Planejamento, a empresa de planejamento logístico (Valec) e a agência
reguladora do setor (ANTT) permanecem sem saber quantos e quais trechos da obra
foram executados. E não conseguem demonstrar os gastos efetivados nas etapas
que, supostamente, já teriam sido concluídas. Sobram irregularidades, segundo o
tribunal, indicando R$ 1,2 bilhão em despesas sem prévia autorização. Nos
arquivos da Casa Civil da Presidência não há registros sobre a ferrovia. Existe
“risco concreto de dano ao Erário”, acha o Tribunal de Contas da União, porque
“sequer é sabido o custo real das obras”.
Pelo
contrato de concessão, a ferrovia deveria ser concluída até o próximo 22 de
janeiro. O grupo privado enfrenta limitações no BNDES, relatadas ao TCU. Só em
outubro a nave-mãe CSN conseguiu divulgar balanços auditados de 2015 e de 2016.
Na virada do mês, o empresário Benjamin Steinbruch passou ao centro de uma
investigação da Operação Lava-Jato. O empreiteiro Marcelo Odebrecht confessou
que, a seu pedido, deu R$ 14 milhões em propina ao ex-ministro da Fazenda do
governo Lula Antonio Palocci e R$ 2,5 milhões ao presidente da Fiesp, Paulo
Skaf.
O trem da
Transnordestina continua sendo uma lenda do Império, renovada por um enigma
bilionário.
José Casado - O Globo
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