Folha de S. Paulo - O Globo
Ele mandou na economia americana e quebrou o Terceiro Mundo. Vestia-se mal e morava numa quitinete
Volcker respondeu ao curioso:
— Esse era o meu serviço (“That was my job.”), e a conversa migrou para amenidades.
Volcker assumiu o Federal Reserve Bank em 1979, com a inflação americana acima de dois dígitos. Como presidente do banco central mais poderoso do mundo, paulatinamente jogou os juros para cima, e eles chegaram a 21% ao ano. Com isso, num cenário de alta do petróleo e baixa de outras matérias-primas, as dívidas dos países do Terceiro Mundo atreladas às taxas americanas explodiram. Em 1982, o México não conseguiu pagar suas contas. Meses depois, foi a vez do Brasil, e em alguns meses, só na América Latina, 16 países estavam quebrados. Deu-se a esse período o nome de “Crise da Dívida do Terceiro Mundo”.
Em 1982 não houve a tal “Crise da Dívida do Terceiro Mundo”, houve uma crise da banca internacional que emprestou dinheiro a quem não devia, mas os credores, com a ajuda dos governos caloteiros e do Fundo Monetário Internacional, inverteram o jogo. (Em 2007, quando a banca atolou-se, ninguém disse que havia uma crise dos devedores americanos inadimplentes.)
“A crise da dívida latino-americana não foi apenas uma punição a excessos de endividamento. Foi também uma crise bancária.”
Volcker salvou a banca porque os servidores públicos americanos defendem os interesses de seu país. Ele era um economista do Federal Reserve de Nova York e aceitou a presidência do banco central sabendo que perderia metade do salário. Mudou-se para uma quitinete de estudante em Washington, e sua mulher alugou um dos quartos de seu apartamento em Manhattan. Fumava charutos baratos, comia congelados de mercearias e, certa vez, o presidente Jimmy Carter mandou-lhe um recado: ou comprava um terno novo, ou não o receberia na Casa Branca. (Há uns 20 anos, o milionário presidente da Goldman Sachs chegou em casa com um sobretudo novo, de uma loja caríssima. A mulher mandou que o devolvesse, pois já tinha abrigo para o inverno.)
Volcker tinha dois caminhos: quebrava os endividados do Terceiro Mundo ou quebrava os grandes bancos americanos. Seu serviço, como presidente do Fed, era defender o sistema financeiro dos Estados Unidos. Pouco importava se o presidente da estatal petrolífera da Indonésia havia fechado um empréstimo de 25 milhões de dólares assinando numa caixa fósforos de boate.
Nenhum comentário:
Postar um comentário