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domingo, 2 de julho de 2023

O sanguessuga que inibe as vitais soluções inovadoras - Alex Pipkin, PhD

       Numa nova era, de suposta “nova consciência”, em que retoricamente só se fala em inovação, que significa criar formas inovadoras de resolver os problemas da sociedade (disruptiva), e/ou melhorar produtos e serviços já existentes no mercado (incremental), é kafkiana a incongruência entre a narrativa e a prática das políticas estatais.

O setor privado, apesar do ambiente institucional peçonhento, necessita ir além da criatividade e da ousadia racional para inovar em processos, produtos, serviços e experiências a fim de criar diferenciais e/ou enfatizar valores distintivos para ofertar nos mercados. 
Se assim não fizer, a soberania do consumidor atuará para que determinadas empresas percam o impacto e a relevância na criação de valor para clientes e para a sociedade como um todo.

Ao mesmo tempo, são surreais o comportamento e as ações governamentais. Além do governo não implementar novas práticas de gestão e maneiras de atender melhor e com menores custos à população, é justamente esse que impede e/ou joga no abismo as inovações a serem praticadas pela iniciativa privada.

Em vez de reduzir o seu tamanho mastodôntico, sua sanha por intervir nos mercados, com regulação, licenças e outras exigências burocráticas, variados e múltiplos documentos para várias entidades estatais - o que não agrega nenhum valor -, adicionando custos e mais custos com tais licenças, taxas e cobranças, o governo inibe e penaliza as empresas quanto à geração de novas soluções para os cidadãos.

Por óbvio, toda essa parafernália burocrática se justifica para manter e aumentar “ad aeternum” a oxidada e gigantesca máquina estatal.

Mais uma vez, uma típica situação da pregação de moral de cueca, em que o governo impõe suas regras draconianas e seus procedimentos antiquados a iniciativa privada, sufocando as fundamentais soluções inovadoras, mas ele próprio, além de não inovar em suas práticas, retrocede em seus processos da idade do gelo para, populista e ideologicamente, dar mais proteínas a famigerada casta estatal.

Não sei se rio ou choro. Em plena era da digitalização, as “autoridades burocráticas estatais”, ainda exigem que determinados documentos e certificados tenham que estar no papel. Sou justo, o governo é um exímio inovador quando se trata de aperfeiçoar o improdutivo, aquilo que já nem deveria existir mais!

Na prática, objetivamente, é o governo arcaico o principal gerador de barreiras à entrada de novas empresas no mercado, o que criaria mais da saudável competição e às imprescindíveis inovações.

Não canso em dizer que o governo deveria “sair da frente” dos empreendedores, o que acarretaria em mais atividade econômica, maiores soluções inovadoras para a sociedade, e a geração de mais impostos arrecadados para a provisão de bens públicos de efetiva qualidade.

O “nosso mundo” realmente é outro, porém, os semideuses estatais persistem em viver no reino das benesses, da ineficiência e da improdutividade, do vetusto e do compadrio.

Esses mortais divinizados forçam e, ao mesmo tempo, inibem as salvadoras inovações no setor privado, enquanto enchem suas bocas para arrotar frases feitas sobre o futuro e as tais inovações.

Se já não bastasse a legítima batalha contra as soluções inovadores da esfera privada, o governo, de fato, sempre busca abraçar o retrocesso na sua ânsia pela manutenção do Estado grande e dos privilégios para os agentes estatais.

Site Percival Puggina - Alex Pipkin,PhD


segunda-feira, 23 de março de 2020

Para saber se o sujeito é mesmo ateu, certifique-se de que ele não apela a Deus nas horas extremas - Alon Feuerwerker

E uma conta sobre a “imunidade de rebanho"


Dos grandes países afetados pela pandemia da Covid-19 o Brasil parece ser o mais atolado na guerra política. É um grave fator de risco no enfrentamento do problema. Outra variável fundamental é a rapidez da reação ou, ao contrário, o atraso para cair a ficha. Está matematicamente comprovado que tomar providências ontem em vez de hoje, ou anteontem em vez de ontem, produz efeitos benéficos para lá de significativos.

O atraso nas ações contra o novo coronavírus tem duas raízes principais: a subestimação do problema e o receio de ferir de morte a economia com medidas excessivamente drásticas. A primeira raiz mistura legítimas curvas de aprendizado e wishful thinkings. O pensamento mágico supõe a prevalência da vontade sobre a razão. É humano tender a acreditar nas explicações que minimizam os sacrifícios necessários e projetam o futuro menos doloroso. Aliás esta é uma crise inanalisável, inclusive no aspecto político, sem alguma dissecção da natureza humana.

Nos últimos dias a ficha parece finalmente ter caído.
As ruas das cidades brasileiras esvaziaram-se e o país entrou em forte desaceleração. Na falta de um sistema coerente e centralizado capaz de impor rapidamente a necessária disciplina social, tivemos de esperar pela decantação da consciência coletiva. E adianta pouco reclamar. Assim como as pessoas, países também têm suas naturezas, que precisam enfrentar situações extremas para finalmente mudar.

Uma pergunta ainda não respondida, talvez por não ser mesmo prioritária, é “como vai ser o Brasil quando a Covid-19 passar?”. Os otimistas dirão um país mais solidário, menos tolerante às desigualdades, mais exigente quanto ao padrão dos governantes e mais atento à qualidade dos serviços que o Estado precisa prover para atender às necessidades da sociedade que o financia.

Um aspecto em que talvez os otimistas estejam certos:
a valorização do Sistema Único de Saúde parece ter enveredado por um caminho sem volta. Os governos, em primeiro lugar o federal, precisarão enfrentar para valer a equação do financiamento do SUS. Quando até um governo em que a área econômica é fortemente liberal apresenta, principalmente pelas palavras do ministro da Saúde, o SUS como nosso grande trunfo, fica claro que uma página foi virada.

Mesmo que os otimistas sejam lá na frente frustrados,
sempre a maior probabilidade, outra coisa parece que veio para ficar: a reabilitação do papel do Estado. Na hora da dificuldade extrema, o setor privado aparece bem quando se coloca à disposição para ajudar, mas a sociedade volta-se mesmo, e unanimemente, para os governos. É aquela história: para saber se o sujeito é mesmo ateu, procure verificar se ele não apela a Deus nas horas extremas.

LEIA TAMBÉM: Nova York e São Paulo. E o oportunismo

*

O Reino Unido desistiu de deixar o pessoal se infectar para o coletivo adquirir a “imunidade de rebanho”. 
Mudou de ideia quando lhe contaram que morreriam pelo menos uns 250 mil súditos da rainha. 
Qual seria a conta a pagar aqui se essa opção fosse adotada? 

Alon Feuerwerker, jornalista e analista político - Análise Política



sexta-feira, 5 de julho de 2019

Nas entrelinhas: Reforma avança na Câmara

“A reforma da Previdência modifica as regras de aposentadoria para o setor privado e servidores da União. Valerá para quem ainda não trabalha. Os que já estão trabalhando terão regras de transição”

A Comissão Especial da Câmara aprovou ontem, por 36 votos a 13, o texto-base da reforma da Previdência, de autoria do relator Samuel Moreira (PSDB-SP), que analisou e fez alguns ajustes na proposta original do governo. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ainda acredita que possa aprovar a reforma em plenário antes do recesso. Dezessete destaques foram apresentados à comissão, mas 16 foram rejeitados, inclusive dois que contavam com o apoio do presidente Jair Bolsonaro, para flexibilizar as regras propostas para aposentadorias de policiais. O único aceito excluiu policiais militares do texto.

A reforma da Previdência é a principal proposta da equipe econômica para resolver o problema da crise fiscal. Ontem, o ministro da Economia, Paulo Guedes, em encontro com empresários em São Paulo, era só elogios ao Congresso por causa da aprovação do texto-base. Guedes não só aposta numa economia de R$ 1 trilhão, com aprovação da reforma, como voltou a falar que não perdeu a perspectiva de implantar um plano de capitalização.  A reforma da Previdência modifica as regras de aposentadoria para funcionários do setor privado e servidores públicos da União. Valerá para quem ainda não começou a trabalhar. Os que já estão trabalhando e contribuindo para o INSS ou o setor público terão regras de transição. Servidores estaduais e municipais foram excluídos da reforma; governadores e prefeitos terão que fazer reformas específicas nos seus estados.

A idade mínima de aposentadoria passou a ser 65 anos para homens e 62 anos para mulheres do setor público e do privado; no caso dos professores, 60 anos para homens e 57 anos para mulheres. O tempo de contribuição no setor privado passou a ser de 20 anos para homens e 15 anos para mulheres; no setor público, 25 anos para homens e mulheres. Essas regras valerão para quem ainda não começou a trabalhar.  Os que já trabalham e contribuem para o INSS ou o setor público terão regras de transição. A idade mínima subirá gradativamente: começa em 61 anos (homens) e 56 anos (mulheres) e terá acréscimo de seis meses por ano. Em 2021, por exemplo, será de 62 (homens) e 57 (mulheres).

De fora
O relator Samuel Moreira excluiu de seu relatório propostas polêmicas do projeto original do governo, como a capitalização, por meio da qual cada trabalhador poderia fazer a própria poupança. Essa proposta continua sendo, porém, uma meta a ser alcançada para o ministro da Economia, Paulo Guedes, que pretende apresentar um novo projeto sobre essa questão depois de aprovada a reforma pelo Congresso.

Estados e municípios também ficaram de fora, apesar das pressões dos governadores. A ampla maioria dos deputados não quis estender a reformas aos demais entes federados, com medo de retaliação dos servidores estaduais e municipais nas eleições. O relator também deixou de fora a “desconstitucionalização” das regras de idade e tempo de contribuição e as mudanças nas regras do Benefício de Prestação Continuada (BPC), no valor de um salário mínimo, que é pago a pessoas com deficiência e idosos de baixa renda. O governo queria pagar um salário mínimo após os 70 anos (hoje é a partir dos 65), com a possibilidade de pagar R$ 400 a partir dos 60 anos. [esclarecendo: nada será alterado no BPC pela reforma previdenciária; só que após aprovada a reforma da Previdência, tudo que diga respeito ao BPC, não estará mais na Constituição, podendo ser alterado por Lei Ordinária - bem mais fácil de aprovar do que uma PEC.

Ou seja, o relator, deputado Samuel Moreira do PSDB/SP, para não se queimar, excluiu do seu relatório p aumento da idade do idoso para ter direito ao BPC, mas, excluiu também da Constituição, facilitando assim mudanças futuras que podem prejudicar o idoso.] 
 
Atritos
As pressões de última hora de Bolsonaro para incluir na reforma as reivindicações dos policiais agastaram ainda mais as relações do líder do governo na Câmara, deputado Vitor Hugo (PSL-GO), com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Na quarta-feira, os dois chegaram a ter uma discussão ríspida na reunião de líderes por causa da insistência de Bolsonaro em mudar o relatório de Samuel Moreira por causa dos desgastes que teve com os policiais que sempre o apoiaram.

Além de ser um parlamentar de primeiro mandato, sem amplo trânsito entre os líderes da Câmara, Vitor Hugo sofre um permanente fogo amigo da líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-PR), que trabalhou pela derrubada dos destaques. Joice tem muito mais trânsito entre os colegas da Câmara e é respeitada por cumprir acordos. Vitor Hugo, porém, tem a confiança de Bolsonaro.  Ontem, o general Luiz Eduardo Ramos foi empossado por Bolsonaro como novo ministro da Secretaria de Governo, passando a responder pela articulação política. General de Exército e amigo de Bolsonaro, o militar teve uma breve experiência como assessor parlamentar do Exército no Congresso. 

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - CB
 

Demonstração de força das corporações

Início da votação é positivo para a reforma, mas lobby dos servidores tem o reforço até do presidente 

[atenção: o relatório da Comissão Especial = deputado Samuel Moreira -  PSDB/SP = DESCONSTITUCIONALIZOU o BPC - Beneficio de Prestação Continuada. 

Sendo recorrente, destacamos que DESCONSTITUCIONALIZAR = RETIRAR DA CONSTITUIÇÃO = o que significa que qualquer mudança no BPC, tipo aumentar idade para ter direito, reduzir valor, poderá ser feita por Lei Ordinária, bem mais fácil de ser aprovada, do que uma PEC.]

As corporações em geral e as dos servidores públicos em particular, em que estão representantes de segmentos privilegiados na sociedade brasileira, agem há algum tempo contra a reforma na Previdência, por meio de seus representantes no Congresso e no próprio Executivo. Para que não reste dúvida, o presidente da República, Jair Bolsonaro, pegou o telefone na quarta-feira para defender junto a congressistas reivindicações de policiais federais e rodoviários também federais. O lobby do presidente é em defesa da reivindicação das categorias para, por exemplo, não cumprirem o limite de idade de 55 anos para a aposentadoria, muito baixo considerando a expectativa de vida do brasileiro adulto. [alguém imagina o quanto é complicado para alguém com idade superior a 50 anos - que não seja atleta, que por vários anos trabalhou sob stress constante, colocando a vida constantemente em risco -  ter que correr atrás de bandido, muitas vezes entrando em luta corporal, dirigir viaturas em operações policiais, etc`? 

Para satisfazer capricho do presidente da Câmara, que quer aparecer como o paladino da reforma da Previdência - originada no Poder Executivo e desfigurada na Câmara - o relator aceitou que em alguns anos tenhamos uma PRF formada por senhores fora de forma, ou mesmo a própria PF.
Lembramos que não será possível aproveitar todos os cinquentões  em serviços burocráticos - a renovação dos quadros da PF e PRF é sempre lenta.

O risco dessa conduta do relator é que a reforma trave no Plenário ou mesmo seja modificada no Senado e tenha que voltar a Câmara - a postura de alguns parlamentares deixa a impressão que querem a reforma, mas, também deixa dúvidas se preferem é que fique como está = sem reforma. Quando se quer emperrar uma coisa o melhor caminho é a intransigência - seja por omissão seja por ação.]

O pedido não entrou no relatório do deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), cujo texto básico foi aprovado ontem na Comissão Especial da reforma, por 36 votos a 13. Também foi tentada, sem êxito, a inclusão de uma emenda ainda mais generosa para esses policiais. Isso não significa muito, porque haveria entendimentos para as benesses entrarem na reforma, na votação em plenário. O deputado Bolsonaro passou 28 anos na Câmara representando esses grupos. Sempre foi contra mudanças na Previdência. Evitou ao máximo o assunto na campanha, mas, eleito, não havia como escapar do tema, o mais estrutural dos obstáculos à volta do crescimento e, consequentemente, do emprego.

Mas, como os compromissos corporativistas de Bolsonaro se revelam mais fortes que suas responsabilidades como chefe da nação, o presidente engrossou o lobby dos policiais. Não é um trabalho fácil o do agente de segurança, mas é preciso reconhecer que são categorias privilegiadas em relação à grande massa do povo brasileiro, que se aposenta por volta dos 65 anos de idade, para receber um salário mínimo ou pouco mais.

Esta primeira fase da tramitação da reforma sinaliza positivamente para o projeto, mas confirma o poder de lobbies dos servidores públicos. Há sinais da atuação deles. Na redação original do relatório, por exemplo, Samuel Moreira suavizou a transição do funcionalismo e, para compensar a injustiça do benefício, fez concessões para a grande massa dos empregados no setor privado, segurados do INSS.  [quais concessões?] O resultado é reduzir o impacto fiscal da reforma. O objetivo, em dez anos, é de uma economia de R$ 1 trilhão. Por enquanto, o alvo está sendo atingido. Mas é necessário saber como. Recuos diante de pressões de grupos organizados implicam reduzir a “potência fiscal” do projeto, termo do ministro Paulo Guedes, da Economia.

Como a tendência é estes lobbies ficarem ainda mais ativos, cabe lembrar: o aposentado na iniciativa privada recebia em média, em 2017, R$ 1.369

no Executivo federal, R$ 8.478; 
no Ministério Público, R$ 14.656;
R$ 18.065, no Judiciário, 
e extravagantes R$ 26.823 no funcionalismo do Congresso.
[por favor LEIAM ESTA INFORMAÇÃO: o trabalhador da iniciativa privada contribui no máximo com 11% sobre o valor máximo de R$ 5.839,45 - mesmo os que tem salário maior só contribui até o valor citado (sendo que o percentual é escalonado em faixas, começando de 8% indo até os 11%);  

as demais categorias  contribuem com 11%, sobre TODO O SALÁRIO - tanto os que ganham menos de R$ 5.000,00, quanto os que ganham mais R$20.000,00.
É justo que ao se aposentar você receba o valor sobre o qual contribuiu.
QUER MAIS INFORMAÇÕES? de outras fontes: clique aqui ou aqui.]  

Editorial - O Globo

 

sexta-feira, 7 de junho de 2019

A pressão dos governadores

‘O lado mais fraco são os trabalhadores do setor privado. Há dois motivos: primeiro, o desemprego em massa, que os mantêm acuados; segundo, o fim do imposto sindical, que quebrou a maioria dos sindicatos’


Cresce a pressão de governadores e prefeitos para que a reforma da Previdência inclua estados e municípios, matando todos os coelhos com uma só cajadada no Congresso. Somente os governadores da Bahia, Rui Costa (PT), e do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), não assinaram carta contra o fatiamento da reforma entre entes federados. Mesmo assim, Dino discorda da proposta do governo, mas também é contra uma reforma que não inclua todos: “Essa reforma que está tramitando eu não apoio. Precisa melhorar muito. Em melhorando, é claro que regime previdenciário dos servidores tem que ser para todos. Inclusive militares. Existirem milhares de regimes previdenciários diferentes no Brasil seria, aí sim, uma balbúrdia jurídica”, pondera.

O relator da reforma da Previdência, Samuel Moreira (PSDB-SP), trabalha para elaborar seu relatório neste fim de semana e apresentá-lo na segunda ou terça-feira à Comissão Especial da Câmara que apreciará o projeto. Sua dificuldade é conseguir elaborar um substitutivo que forme maioria no plenário, sem descaracterizar a reforma original, o que não é nada fácil. Foram apresentadas mais de 400 emendas. Deputados têm feito pressão para que estados e municípios fiquem fora do texto, porque não querem arcar sozinhos com o desgaste político de aprovar uma matéria considerada impopular. Segundo Samuel Moreira, se os estados ficarem fora do texto, os governadores que queiram sanear as finanças estaduais terão de aprovar uma proposta própria de reforma da Previdência nas assembleias legislativas.

Na carta que divulgaram ontem, os governadores argumentam que aprovar uma regra local, no estado, dificulta a uniformidade para o território nacional e é um obstáculo para a efetivação de normas. Eles também afirmam no documento que o regime de Previdência é “substancialmente deficitário”, constituindo uma das causas da “grave crise fiscal enfrentada pelos entes da Federação”. Segundo a carta, “o deficit nos regimes de aposentadoria e pensão dos servidores estaduais, que hoje atinge aproximadamente R$ 100 bilhões por ano, poderá ser quadruplicado até o ano de 2060, conforme estudo da Instituição Fiscal Independente — IFI, do Senado Federal”. O governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), é um dos principais articuladores da carta, em dobradinha com o governador de São Paulo, João Doria (PSDB).

Há uma dupla esperteza dos deputados que se opõem à inclusão de estados e municípios na reforma: de um lado, se livram das pressões dos sindicatos de servidores estaduais e municipais dos seus respectivos estados (a maior concentração de servidores federais está localizada em Brasília e no Rio de Janeiro, ex-capital federal); de outro, no caso dos que vão disputar eleição como candidatos de oposição, põem uma saia justa nos governadores e prefeitos adversários, às voltas com despesas cada vez mais elevadas para pagar aposentados e pensionistas. Em alguns estados, como Rio de janeiro, Minas e Rio Grande Sul, já houve o colapso do sistema previdenciário.

Lobbies
A aprovação do relatório de Samuel Moreira pela Comissão Especial será um jogo de xadrez. Existem outros lobbies atuando para mitigar a reforma no setor público. Magistrados e procuradores têm enorme poder de pressão sobre o Congresso; de igual maneira, corporações poderosas do Executivo, como auditores-fiscais, delegados federais e professores universitários. Mesmo categorias sem o mesmo status político na alta burocracia, como os agentes penitenciários, trabalham intensamente nos bastidores do Congresso para não perder privilégios. No âmbito das categorias estaduais, policiais militares e civis, professores e pessoal da saúde exercem enorme pressão sobre suas respectivas bancadas. Todos organizam caravanas a Brasília para pressionar o Congresso.



O lado mais fraco da moeda são os trabalhadores do setor privado, que têm mais dificuldades de mobilização. Há dois motivos: primeiro, o desemprego em massa, que os mantêm acuados; segundo, o fim do imposto sindical, que quebrou a maioria dos sindicatos e centrais sindicais. Para de fato acontecer, a greve geral que está sendo convocada pelas centrais sindicais para o dia 14 de junho dependerá, sobretudo, da paralisação dos serviços de transporte públicos: trens, metrôs e ônibus. É o tipo de greve que pode tumultuar a vida das cidades, mas não tem fôlego para barrar a reforma.

Se o critério adotado para avaliar o resultado da reforma for essa correlação de forças, pode-se ter uma expectativa de que a reforma apresentada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, será mitigada pelo relator. O regime especial de algumas categorias será mantido; o alívio possível para os trabalhadores do setor privado será nas regras de transição.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - CB

 

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

O valor da reforma: R$ 1 trilhão

Maia tem compromisso com a reforma, mas advertiu Guedes de que o governo precisa se esforçar para votá-la em dois meses”

 O ministro da Economia, Paulo Guedes, depois de encontro com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), anunciou que a proposta de reforma da Previdência que o governo Bolsonaro pretende encaminhar ao Congresso poderá representar uma economia aos cofres públicos de R$ 1 trilhão. Guedes também conversa com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). Faz articulações junto ao Congresso e ao Judiciário para negociar a tramitação do projeto, que ainda depende de aprovação de Jair Bolsonaro. 

Guedes disse que o governo fez simulações sobre o tempo mínimo de contribuição e também sobre a idade mínima, mas ainda depende de o presidente bater o martelo.
Guedes esteve também com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, na noite de segunda-feira. A conversa foi sobre o risco de judicialização da reforma, que não é pequeno. O governo quer blindar a reforma na Corte. [Guedes joga tempo fora ao conversar sobre o que fatalmente vai ocorrer: a judicialização da reforma - será que o 'Posto Ipiranga' esqueceu que desde a 'constituição cidadã', tudo pode ser judicializado no Brasil - até decidir se é crime você não gostar de conviver com gays - mesmo os respeitando, desde que o respeito seja recíproco; é possível e normal a Suprema Corte discutir se banheiios públicos podem ser unissex; 

Guedes também esquece que não existirá nenhuma blindagem efetiva para a reforma, visto que o Plenário do STF pode ao final da noite decidir algo sobre a reforma e na madrugada um ministro decidir monocraticamente que o decidido não é bem, aquilo que todos estão pensando e mudar tudo.

A notória INsegurança Jurídica somada a que tudo pode ser judicializado é suficiente para que nada funcione na Pátria Amada.]   Também trataram da situação dos estados, cuja crise fiscal gerou várias Ações Diretas de Inconstitucionalidade, que deverão ser julgadas no próximo dia 27 de fevereiro. O ministro da Economia quer desafogar financeiramente os estados, que estão quebrados e podem complicar o cenário econômico; em contrapartida, espera o apoio dos governadores para que a reforma inclua estados e municípios.

O giro do ministro de Guedes também tem por objetivo evitar que a reforma esbarre numa ampla coalizão institucional, como aconteceu em outras tentativas. Corporações poderosas atuam no Congresso e no Judiciário contra a reforma, que atinge privilégios do setor público. A reforma do ex-presidente Michel Temer estava pronta para ir a plenário, mas não foi adiante depois das denúncias feitas contra ele pelo ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot, com base na delação premiada do empresário Joesley Batista, do grupo JBS. [denúncias até hoje não provadas; faz mais de ano que o STF está para decidir se anula ou não as delações dos dois açougueiros.] Enfraquecido, o seu governo não teve como garantir a base necessária para aprovação da reforma. Agora, a situação é completamente diferente, com um governo recém-eleito e com alta taxa de aprovação popular.

Corporações
A articulação da base do governo na Câmara e no Senado para aprovação da reforma, porém, ainda é muito incipiente. Maia tem compromisso com as reformas e pode se empenhar nessa direção, mas advertiu Guedes de que o governo precisa se esforçar para votá-la em dois meses. Como exige emenda à Constituição (PEC), precisa do apoio mínimo de três quintos dos deputados (308 dos 513) para ser aprovada e enviada ao Senado. “O nosso problema é garantir, em dois meses, que a reforma da Previdência tenha 320, 330 deputados a favor. Esse é o desafio”, disse Maia [sem torcer contra, apenas apontando outra obviedade: que esse número de deputados esteja a favor do governo na primeira votação e também na segunda, que ocorrerá na sequência, alguns dias depois.] Quem conhece o Congresso sabe que esse prazo é muito curto.

Maia destacou que o governo precisa esclarecer bem o teor das propostas, com um bom plano de comunicação, para evitar que a opinião pública fique confusa. Caso a Câmara aprove a proposta até maio, o Senado teria condições de sacramentar a reforma até julho. A pressa dificulta a mobilização dos setores contrários à reforma. Os servidores públicos fazem uma oposição muito mais eficiente à reforma do que os trabalhadores do setor privado, cujos sindicatos estão em crise por causa do fim do imposto sindical. Como as corporações estão incrustadas no aparelho de Estado, principalmente a alta burocracia, o poder de fogo de algumas categorias é muito grande e concentrado, ao contrário da mobilização difusa dos trabalhadores do setor privado. Daí a importância, por exemplo, de os militares serem incluídos na reforma. O núcleo fundamental da base eleitoral do próprio presidente da República (militares, policiais, policiais militares, promotores e juízes) não apoia a reforma.[o governo tem condições de atuar em várias frentes e nada impede que enquanto negocia com o Congresso, o Poder Executivo dê inicio a uma ampla operação de COMBATE À SONEGAÇÃO e às FRAUDES NO PAGAMENTO DE BENEFICIOS.

A população precisa ver que é para valer - sonegador e fraudador tem que ir para a cadeia e devolver o que sonegou/fraudou/roubou.]
 
Partilha

As negociações para composição da Mesa e das comissões do Senado estão num impasse. Com a vitória de Davi Alcolumbre (DEM-AP), que quebrou a regra da distribuição de cargos de acordo com a proporcionalidade entre as bancadas, o MDB pleiteou a primeira vice-presidência e o comando da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O grupo vitorioso, porém, exigiu que a legenda derrotada escolhesse um cargo ou outro. Além disso, ameaça levar a presidência da CCJ o a voto se o MDB indicar o senador Renan Calheiros (MDB-AL). O PT quer a presidência da Comissão de Relações Exteriores (CRE), mas também não há acordo; o ex-presidente Collor de Mello, que já ocupava o cargo, reivindica a recondução. As decisões serão tomadas hoje.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - CB
 

sexta-feira, 9 de novembro de 2018

Querem saber? Não faz sentido tentar votar neste ano necessária reforma da Previdência. Bolsonaro se mete em confusão contraproducente

Tenho a impressão, às vezes, de que Jair Bolsonaro, presidente eleito, está atravessando a rua só para pisar na casca de banana quando dá curso à possibilidade de votar agora aspectos da reforma da Previdência. Que se saiba, o entusiasta da tese é Paulo Guedes: seria mais um sinal aos tais “mercados”. Com as vênias todas, convenham: os ditos-cujos já foram devidamente contemplados, no que respeita àquilo que consideravam o espantalho, com a derrota do PT. Não se esperava que o agora eleito Bolsonaro fosse se ocupar desse tema ainda na fase da transição.

Sou favorável à reforma, sim, mas acho uma desnecessidade fazer esse aceno agora quando se considera o eventual custo. Caso se faça o esforço efetivo e não se consiga votar, sobra um saborzinho de derrota; caso de coloque algo em votação e sobrevenha a derrota, aí é estrear já com cara de perdedor. Pra quê?

Mesmo essa conversa de que se podem votar mudanças infraconstitucionais, que não dependem de emenda, traz para o presente um estresse que já está combinado para o futuro, mas aí num ambiente mais favorável a Bolsonaro no Congresso — talvez com pessoas entusiasmadas até demais. Se não houver cuidado, ainda acaba sobrando para o trabalhador da iniciativa privada, que não é o vilão do caixa da Previdência.

Vamos ser claros? A principal tarefa da reforma será igualar os servidores aos trabalhadores do setor privado, certo? Isso só pode ser feito por emenda constitucional. O sistema de capitalização, que viria a substituir o de repartição, nem sequer pensando está. Bolsonaro admite que tem mais de 10 propostas nas mãos.

Os mercados podem muito bem esperar que o novo Congresso tome posse em fevereiro. Quem sabe Bolsonaro e seu ministro consigam, até lá, elaborar um plano que faça sentido e que fuja do improviso.

Blog do Reinaldo Azevedo

 

domingo, 30 de julho de 2017

"O reajuste do funcionalismo"

A secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, informou que o governo estuda adiar os reajustes salariais do funcionalismo já aprovados para 2018 e que resultarão em um custo adicional de R$ 22 bilhões. A simples menção a essa possibilidade bastou para que sindicatos de servidores partissem para a ameaça de greve, desconsiderando o delicado momento pelo qual passam as contas públicas. O País não pode continuar refém de corporações para as quais nada interessa senão benesses, em total desconexão com a realidade nacional.

A maior parte dos reajustes ao qual Ana Paula Vescovi se referiu foi concedida pelo presidente Michel Temer em junho do ano passado, quando ainda era interino, durante o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Compreende-se que, naquela ocasião, na interinidade, Temer se sentisse obrigado a respeitar os compromissos assumidos por Dilma, além de precisar arrefecer a pressão dos funcionários públicos, incitados pelo PT. Uma vez efetivado no cargo, Temer anunciou um severo regime de austeridade de gastos. E hoje, quando a equipe econômica luta para encontrar uma forma de cumprir a meta fiscal e paira no ar a ameaça até mesmo de suspensão do funcionamento de partes da máquina estatal por falta de recursos, está claro que a concessão aos servidores foi um erro.

Durante os governos de Lula da Silva e de Dilma Rousseff, o quadro de funcionários públicos cresceu exponencialmente. Foram adicionados 131 mil servidores nesse período, um acréscimo de 27%, depois de uma tentativa de enxugamento na administração de Fernando Henrique Cardoso. Além de mais numerosos, esses funcionários, de um modo geral, foram contemplados com generosos aumentos salariais, tornando-se mais bem remunerados, em média, do que empregados com formação equivalente no setor privado.

Em junho e dezembro de 2016, foram concedidos aumentos ao funcionalismo que, somados, representam um custo de R$ 64 bilhões até 2019. Na ocasião, Temer argumentou que esses reajustes haviam sido negociados por Dilma Rousseff. Entre os benefícios estão, por exemplo, o pagamento de bônus de eficiência de R$ 3 mil para auditores fiscais da Receita Federal inclusive aposentados e pensionistas. Dos 45 mil beneficiados, 27 mil já não trabalham, razão pela qual é difícil compreender como se pode falar em “eficiência” nesse caso. Além disso, o vencimento básico inicial de um auditor da Receita foi fixado em R$ 19.211,01. Em 2019, esse valor salta para R$ 21.029,09. Não há nada parecido com esse piso no setor privado.

Assim, é compreensível que um dos primeiros sindicatos a manifestar repúdio à possibilidade de adiamento do reajuste tenha sido o dos auditores fiscais. “Certamente as entidades não ficarão paradas”, informou o presidente do Sindicato dos Auditores Fiscais (Sindifisco), Claudio Damasceno. Já a Confederação Nacional dos Servidores Públicos (CNSP) anunciou que entrará na Justiça para impedir o adiamento. Seu argumento é que, durante a negociação, o governo de Dilma Rousseff não mencionou o estado deplorável das contas públicas. “A outra parte (o governo) tinha de ter colocado o problema na mesa”, disse o presidente da CNSP, Antonio Tuccilio. Ou seja, a notória falta de transparência de Dilma tornou-se desculpa para a manutenção de um reajuste que obviamente não deveria ter sido acertado. “Uma vez que o aumento foi decidido, tem de ser cumprido”, disse o sindicalista. [há leis autorizando estes reajustes e que não podem ser descumpridas - o descumprimento de uma lei, especialmente pelo governo, baseado apenas na conveniência, significa o fim do 'estado democrático de direito'.
Que país pode condicionar o cumprimento das leis as conveniência do governo?
que segurança jurídica pode existir em um país no qual as leis são promulgadas, não contestadas tempestivamente, mas, o governo entende ter opção para cumprir ou não?
é inconcebível, inaceitável e mentirosa a alegação do governo Temer de que quando promulgou as leis concedendo os reajustes desconhecia a real situação econômica do Brasil.]
 
Assim, mais uma vez, a incapacidade dos governantes de enfrentar a corporação dos funcionários públicos resulta em prejuízo para o País. Enquanto a maioria dos trabalhadores do setor privado luta para manter seu emprego e para ter um salário ao menos suficiente para pagar as contas, em meio aos efeitos da gravíssima crise econômica, o setor público, beneficiando-se de seu livre trânsito no meio político, mantém privilégios e deles não abre mão. O adiamento de um reajuste salarial que nem deveria ter sido concedido seria uma rara vitória da sensatez num ambiente em que predomina a irresponsabilidade.

Fonte: Editorial -  O Estado de S. Paulo

quinta-feira, 11 de maio de 2017

A Corte dos amigos e parentes

Nenhum problema quando a família atua no setor privado. Mas a coisa muda quando se chega ao setor público

Capitalismo de amigos em um ambiente de capitalismo de Estado, com o governo distribuindo verbas, créditos e obras para as empresas da casa — isso destruiu a economia brasileira. Mas a coisa vai além. Temos uma República inteira de parentes e amigos. Três casos exemplares chamaram a atenção nesta semana. Começou com o procurador-geral, Rodrigo Janot, pedindo o cancelamento do habeas corpus concedido pelo ministro Gilmar Mendes que tirou da cadeia o empresário Eike Batista. Segundo Janot, o ministro estaria impedido porque a mulher dele, Guiomar Mendes, é sócia do escritório de advocacia Sergio Bermudes, do qual Eike é cliente.

Logo a bola voltou para Janot, cuja filha, Letícia Ladeira Monteiro de Barros, advoga para a OAS e para a Braskem, do grupo Odebrecht, empresas que estão no dia a dia da Lava-Jato e suas ramificações. O procurador deveria ser impedido nos casos daquelas empresas, disse o advogado Sérgio Mendes, que saiu em defesa do casal Mendes.  O terceiro caso está no Congresso. Parece diferente, mas, pensando bem, é um caso da Corte política. O deputado Newton Cardoso Jr. foi designado relator de uma medida provisória que permitia o parcelamento de dívidas com a Receita em até cinco anos. Pois o deputado incluiu no seu relatório perdão de juros e multas, dobrou o parcelamento e mais tantas bondades com devedores, todas medidas que beneficiam diretamente as empresas de seu pai que acumulam mais de 30 processos fiscais.

Todos os envolvidos responderam com a mesma lógica. Algo mais ou menos assim: qual o problema? Sou imparcial e republicano, sei separar o público do privado (familiar, nos casos).  Na área jurídica, a argumentação em defesa de Janot e Mendes, feita por eles e por outros, foi quase idêntica. A filha de um e a esposa do outro advogam no cível e os casos da Lava-Jato e ramificações estão obviamente no âmbito criminal. Logo, não tem problema.

Curioso que, se esse argumento está correto, Janot não poderia pedir o impedimento de Mendes. Do mesmo modo, o advogado Sergio Bermudes não poderia dizer que o procurador-geral deveria ser impedido.  E se os dois lados estiverem certos, um contra o outro? Ok, o escritório Sergio Bermudes só advoga para Eike nos processos civis. Mas Bermudes, conforme admitiu, aparece como advogado do empresário no processo criminal e chegou a acompanhá-lo pessoalmente numa audiência.

Prestigiou o cliente num momento difícil, claro, mas olhem pelo outro lado, o do juiz do caso. Ele olha e vê ali um cliente do doutor Bermudes, o que não é pouca coisa. Trata-se de um dos mais brilhantes advogados brasileiros, titular de um superescritório, com sócios do primeiro time. Faz diferença, não é mesmo?

Janot se defendeu em nota oficial com uma tese que pode ser assim resumida: ele, procurador-geral, não atuou pessoalmente, não assinou nenhum ato em partes do processo envolvendo a empresa OAS; e o que envolve executivos da OAS está a cargo dos promotores do Grupo de Trabalho da Lava-Jato.  Mas a empresa e seus executivos estão na Lava-Jato e quem manda na operação, em última instância, é Janot.

De maneira que a história vai mais longe. Janot, Mendes e Bermudes parecem convencidos de suas posições e seus argumentos. Nota-se mesmo uma indignação de todos os três quando dúvidas ou suspeitas são levantadas de um lado para outro. É que, no ambiente da Corte, essas relações familiares e de amizade têm sido consideradas normais há tanto tempo que o pessoal estranha quando alguém estranha.

Ok, é normal que filhos sigam a carreira dos pais. Há famílias de médicos, jornalistas, advogados. Nenhum problema quando a família atua no setor privado. Mas a coisa muda quando se chega ao setor público.  Claro que a filha de Janot e a mulher de Gilmar Mendes podem ser advogadas. Mas pai e marido deveriam admitir, quando assumem altos cargos no Judiciário, que de duas, uma: ou eles passam longe de qualquer caso no qual atuam filha e cônjuge ou estas não atuam em casos que podem chegar a seu pai e marido.

Simples assim. Qualquer outra situação gera as dúvidas que este caso está suscitando — e enfraquece o Judiciário e, pois, o governo e a República.  Qualquer pessoa de bom senso percebe isso. Esqueçam as tais argumentações técnicas, de alto teor jurídico. Não pode o juiz decidir sobre um caso que envolve ainda que remotamente um parente ou mesmo um amigo.

É a mesma situação de Palocci e Dirceu, que ganhavam dinheiro fazendo consultoria para empresas clientes do governo do PT. Como se pode imaginar que saía daí uma consultoria independente? E tem mais: o pessoal da alta Corte acha normal que advogados que atuam nos tribunais superiores sejam amigos do peito de juízes que decidem seus casos. Dividem jantares, festas, viagens.
Não pode, é claro.
Eis outro efeito indireto da Lava Jato. Está exibindo as perigosas relações da Corte.

Fonte: O Globo - Carlos Alberto Sardenberg, jornalista