O perigo é quando agendas são mentirosas, candidatos mais fortes se desviam das principais questões e vendem soluções fáceis
Muita gente está desanimada com o cenário para as eleições
presidenciais de 2018. E - quer saber? - o quadro, visto de hoje,
mostra uma polarização perigosa. Esclarecendo: a polarização não é
necessariamente perigosa. Não raro as sociedades ficam diante de opções
opostas, entre uma agenda liberal e outra de esquerda, por exemplo. O
perigo é quando as agendas são mentirosas, quando os candidatos mais
fortes se desviam das principais questões e vendem soluções fáceis.
Para quem acha que isso está por acontecer no Brasil, sugiro
voltarmos a 1992. Collor caiu, Itamar Franco assumiu em meio a uma crise
econômica parecida com o pós-Dilma, recessão com inflação, mas ainda
pior porque o país não tinha moeda com um mínimo de credibilidade.
Haviam circulado nada menos que cinco moedas desde 1985, ano da
redemocratização. Em poucos meses de governo, Itamar teve três ministros da Fazenda.
As expectativas só pioravam diante do então evidente despreparo do
presidente para lidar com tamanha crise. No meio disso, Itamar recebe
uma mensagem iluminada sabe-se lá de onde e nomeia Fernando Henrique
Cardoso ministro da Fazenda.
Talvez ninguém tenha sido mais surpreendido
do que o próprio FHC, até então um satisfeito ministro das Relações
Exteriores. A escolha não entusiasmou. De fato, foi recebida com algum
ceticismo. Fernando Henrique tinha mais credibilidade do que seus
antecessores no cargo, mas não era economista nem especialmente
familiarizado com a prática de política macroeconômica. Foi, portanto, uma boa surpresa quando FHC, sociólogo do campo da
esquerda à moda europeia, montou uma equipe com economistas de primeira e
deu início a um programa claro: liquidar a inflação, introduzir a nova
moeda e reformar as instituições econômicas na linha mais liberal e
ortodoxa. Deu no Plano Real e na eleição de FHC, em primeiro turno, em 1994 e
98, batendo Lula nas duas vezes. Não parecia, mas acabou sendo o homem
certo na hora exata em que o país mais precisava.
O Real não foi apenas a introdução de uma moeda estável,
reconhecida como tal pela população, mas o início de uma sequencia de
reformas que retiraram o caráter estatizante da Constituição de 1988.
Modernizou a administração, do Ministério da Fazenda às estatais e
bancos públicos, e introduziu a noção e as leis de responsabilidade
fiscal. Portanto, pessoal, milagres acontecem e sempre tem um jeito de
sair da crise. Esta história parece dar razão à tese segundo a qual a
sociedade encontra o líder que precisa na hora em que precisa. A crise
gera sua solução. Acrescente aí a doutrina econômica das expectativas
racionais - as pessoas sempre tomam as decisões mais racionais e mais
adequadas a seus interesses e necessidades - e pronto, é só esperar que
surja o FHC de 2018.
Fácil demais, simples demais para ser verdade. O prêmio Nobel de
economia deste ano, Richard Thaler, demonstra exatamente o contrário,
que as pessoas frequentemente tomam decisões irracionais, contrárias a
seus interesses. Falava das decisões econômicas, pessoais, mas pode-se
aplicar à política. Quantos povos em quantos países não votam de maneira
totalmente equivocada? Ou seria Trump um líder selecionado pela história? E Dilma? Temer?
Por outro lado é um fato que os franceses, colocados diante de
radicais de esquerda (Mélenchon) e de direita (Marine Le Pen) e
representantes da velha política, elegeram Macron, que se apresentou com
uma agenda clara de reformas ditas impopulares (previdência, com
aumento da idade mínima, trabalhista, com aumento da jornada de
trabalho, e privatizações).
Portanto, pessoal, o Brasil não está perdido. Tampouco está salvo.
Fonte: Carlos Alberto Sardenberg, jornalista
Fonte: Carlos Alberto Sardenberg, jornalista
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